Via Fórum Loriku
É preocupante, revoltante e lamentável o que se passou. Não há nada que possa justificar acto tão hediondo.
Quero condenar este acto violento e desesperado contra a pessoa de Ramos Horta, a figura do Presidente da República e o Estado timorense. Quero igualmente desejar-lhe as melhoras, de modo a que possa regressar rapidamente a Timor e ao seu "bulevar JFK".
Quero lamentar as mortes ocorridas, sejam de quem for. Timorenses continuam a matar timorenses e isso é uma terrível sina que parece não ter fim.
No entanto, este era um desfecho esperado. Só faltava saber quando, onde e como.
Xanana e Ramos Horta comeram o pão que o diabo amassou. Foram vítimas do monstro que Xanana criou e ambos alimentaram e engordaram, com "tasqueforces", "guias de marcha", chás em Balibar, pousada de Maubisse e muitos, muitos "diálogos". Xanana tinha acabado de afirmar que Reinado não representava ameaça. Também Kirsty Gusmão garantiu, em 2006, que Reinado não era perigoso nem tinha cometido nenhum crime.
Foi a isto que levou ano e meio de pura inépcia contra Reinado, sempre com o argumento de que tudo se resolveria pelo "diálogo" e não pela "violência". O tempo ia passando sem que nenhuma decisão tivesse sido tomada, excepto interferir com os tribunais. Esta brincadeira inconsciente ia custando muito caro a Ramos Horta.
No entanto, outros não tiveram tanta sorte: várias pessoas morreram neste ataque, começando por aqueles que tinham por missão defendê-lo e não abandonaram o seu posto. Provavelmente, deve-lhes a vida. À custa de querer evitar derramamento de sangue com o "diálogo" com Reinado, o resultado foi precisamente o contrário.
A estas horas, Ramos Horta já deve estar arrependido mil vezes da irresponsabilidade de ter desrespeitado o poder judicial e dos nomes indignos que chamou ao juíz Ivo Rosa. Se ele não tivesse interferido no mandado de captura que pendia sobre Reinado e tivesse obrigado a tropa australiana a capturá-lo, há muito que Reinado já teria sido julgado e estaria preso. Que lhe sirva de emenda.
Só que Reinado nunca poderia chegar vivo ao tribunal, onde certamente iria explicar melhor aquilo que já deixara no ar: como Xanana arquitectou toda a "crise". Foi isto que ditou a sua sentença de morte e se não fosse agora seria mais dia, menos dia.
Qual o papel da tropa australiana no meio disto tudo? Começaram por sair de Dili para "inspeccionar estradas" em Ermera e no Suai, foram para Baucau e Viqueque fazer não se sabe o quê e de repente Dili ficou livre para Reinado e seus homens terem total liberdade de movimentos. Como é possível um ataque à casa do PR sem qualquer oposição dessas tropas?
Como é possível elas não terem detectado os seus movimentos desde Ermera até Dili, sabendo que estavam a ser permanentemente observados?
Isto faz lembrar a fuga de Reinado da prisão, que foi também precedida de uma "retirada estratégica" das forças ANZAC.
A prova que os australianos conheciam perfeitamente os movimentos de Reinado é que há escassos dias interromperam uma reunião entre este e três deputados, "casualmente", evitando assim que eles pudessem informar Reinado de como se poderia entregar e impedindo este de contar aos deputados mais alguma coisa do que sabe.
Depois inventaram uma história de que Reinado é que os quis atacar, que evidentemente já vem publicada em toda a imprensa australiana.
O que pretende afinal essa tropa australiana? Que objectivos tem afinal? O que estão a fazer em Timor-Leste? Apesar de o seu comandante repetir que estão lá para zelar pela "segurança" e "estabilidade", a realidade diz-nos o contrário, começando pelos atentados de hoje.
Australianos ficaram completamente à margem dos acontecimentos, como se estivessem a ver um filme, enquanto os timorenses se matavam uns aos outros. Se calhar, à espera de ir recolher o cadáver do PR. É assim que eles retribuem todas as mesuras que Ramos Horta lhes tem dedicado.
A tropa OZ só apareceu quando já não era preciso: o ataque já tinha terminado e Reinado estava morto. É incrível como meia-dúzia de guarda-costas de Ramos Horta conseguiu fazer em minutos o que a tropa de elite australiana não foi capaz de (ou não quis) fazer em ano e meio. Isto mostra bem a total inutilidade da sua presença em Timor-Leste (pelo menos para os timorenses).
Por último, não quero deixar de realçar que esta atitude ostensivamente passiva da tropa australiana torna os seus sucessivos comandantes também co-responsáveis neste triste episódio, que poderia ter sido uma grande tragédia.
Aliás, foi preciso a GNR ir buscar Ramos Horta à sua casa, onde esteve uma hora a sangrar, para ele receber assistência médica. Senão, tinha morrido no local, porque os “ISF”, UNPOL, etc, limitaram-se a cortar a estrada e a ficar ali parados à distância, com medo de que ainda houvesse algum escondido... COBARDES!
Quanto a Reinado, foi usado e manipulado enquanto foi preciso, descartado quando já não era necessário e andava a falar demais. Agora nunca saberemos o resto da história e alguém terá finalmente suspirado de alívio, mas não foi por ter escapado do atentado.
O que terá levado Reinado a tomar esta desesperada decisão? Provavelmente também nunca saberemos. Aventureiro, idealista, nacionalista, rebelde romântico ou defensor de causas perdidas? Tenho pena dele, mas mais ainda da sua família. Foi um sacrifício inglório que não serviu para nada. Paz à sua alma.
Henrique Correia
segunda-feira, fevereiro 11, 2008
Para reflectir. E fazemos destas as nossas palavras.
Por Malai Azul 2 à(s) 15:07
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Traduções
Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006
"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
3 comentários:
É mais um dia muito triste para Timor!!!
Espero as rápidas e boas melhoras de Ramos Horta.
Quando será que os Timorenses vão perceber quais os verdadeiros propósitos da presença militar Australiana em Timor?
Senhor Xanana, já reparou como foi traído?
Escapou desta, seu amigo Ramos Horta... vamos ver...
Senhor Xanana, corra com esses senhores militares australianos daí! Mande-os "treinar" às guerras para o seu País!!
Tá mais que provado que eles não estão aí não para estabilizar coisa nenhuma, antes, têm contribuido para destabilizar TIMOR!!!
Exmº Senhor Taur Mata Ruak, sei que tem nervos de aço e é uma pessoa paciente e astuta, mas talvez esteja na ora de tomar uma atitude, face à ingerência australiana que tantos homens e irmãos lhe custou!
Pressione diplomáticamente o PM para que eles saiam! A GNR e as FDTL são imparciais e os unicos que estão do lado de Timor!!
Uma vergonha para as ISF, ter que ser a GNR a dar auxílio ao Ramos Horta ferido!!! Inqualificável... só se queriam que ele morresse... enfim!!
Peço serenidade ao povo de Timor, mais mortes inglórias, nada de bom vos trás Irmãos!
Malai Muti
Não acredito que o Presidente José Ramos Horta esteja “arrependido mil vezes” por ter questionado uma ordem judicial, ordem esta emanada de forma inconsequente por um juiz pouco sensível, desconectado da realizade política que imperava (e impera) sob Timor Leste.
A Sociologia Jurídica explica isso: a Lei é feita para acompanhar a sociedade e não o contrário. E a norma, ao ser aplicada, deve sê-la considerando o contexto social. A sociedade é mutável e consequentemente o Direito. Se tal premissa tivesse sido considerada pelo Tribunal enquanto se tentava negociar acordos em busca da pacificação social, possivelmente o evento de hoje não teria ocorrido.
Se Alfredo Reinado foi bandido ou herói, eu não sei exatamente. Mas seja o que for, facto é: Reinado foi o produto criado por um Judiciário intransigente e insensível, alheio à realidade que o cercava.
Não discuto a separação de poderes. De facto, o judiciário não pode sofrer intervenção externa. No entanto, se o Judiciário tivesse voltado sua atenção para o contexto social, lembrando que o que a Lei busca também é a pacificação social, não haveria porque insistir na prisão de Alfredo quando “outras medidas de coacção poderiam ser aplicadas, que não a medida de prisão preventiva”.
O Judiciário errou quando publicamente “bateu boca” com o Presidente, dando a entender que a insistência na captura de Reinaldo já não era apenas para atender o cumprimento da Lei, mas sim uma questão de honra. Evidenciou assim sua parcialidade quando o que rege a justiça é a imparcialidade.
Não basta pois, escolher um artigo da Lei para interpretá-lo sem ter-se a visão global da lei em todos seus aspectos, buscando-se uma avaliação quanto ao valor eleito e a finalidade almejada.
Timor tem hoje muitos juristas (cujo rol não se limita aos da CPLP). Mas bons aplicadores do direito, bem, aí já é uma outra história... Afinal de contas, ser legalista é fácil. Qualquer Código ou Manual de Direito indicam e explicam as leis. Contudo, sensibilidade e humanidade não se aprende lendo... Ou tem ou não.
Aceito a sua crítica, embora não concorde com ela.
Não está em causa "uma ordem judicial" ou um mero "artigo da lei", mas a própria separação de poderes constitucionais, um dos princípios fundamentais do Estado de Direito. Precisamente o que o ilustre Anónimo diz não "discutir".
Também não está aqui em causa "um juíz". Já tive oportunidade de esclarecer neste blog que foi um TRIBUNAL que tomou a decisão de mandar prender Reinado, tribunal esse constituido por 3 juízes de Direito.
O PR é livre de não concordar com as decisões dos tribunais. É livre de criticá-las. Mas não pode impedi-las, pois não tem poderes para isso. Ao extravasar as suas competências, o PR coloca-se acima da Lei, o que, além de mau exemplo, é um duro golpe na democracia e no estado de Direito.
A sociologia do Direito fala das leis, mas a concepção destas compete ao poder legislativo. Este não se confunde com os tribunais, que se limitam a aplicar as leis, mutatis mutandis, sejam elas quais forem. Nenhuma lei ou prática social pode sobrepor-se aos tribunais e às suas decisões.
As medidas de coacção, certas ou erradas, são da competência exclusiva do tribunal, observados que são todos os direitos de defesa do arguido. E são de rigoroso cumprimento, devendo ser executadas pelas forças de segurança.
Note-se que Reinado era um foragido, evadido da prisão. E o tribunal reiterou várias vezes a prisão preventiva, exigindo às forças de segurança que repusessem a legalidade, capturando-o.
Sem embargo de manter este comentário centrado no abstrato, acho estranho alguém responsável defender outra medida de coacção que não a prisão preventiva para alguém fortemente suspeito de homicídio, insubordinação, ameaças à segurança do Estado, assalto à mão armada, etc. E é evidente que os últimos acontecimentos só vieram confirmar a prisão preventiva como medida adequada, a qual, se tivesse sido cumprida, poderia ter evitado estes perigosos atentados.
Os tribunais não têm que conhecer qualquer "acordos" políticos ou outros factos estranhos ao processo. A decisão do tribunal tem apenas em conta a matéria de facto que lhe é livremente apresentada pelas partes, nomeadamente o Ministério Público, a quem compete acusar.
Argumentos como acusar juízes de "intransigência", falta de sensibilidade ou dizer que algum deles é "alheio à realidade social" pouco têm que ver com o Direito, sendo meras considerações de natureza subjectiva. Sensiveis ou não, intransigentes ou não, os juízes são soberanos na aplicação da Justiça e só a eles compete esse mister.
Os juízes, sem prejuízo do seu dever de reserva, são cidadãos com pleno uso dos seus direitos, nomeadamente o de livre expressão. E, também neste aspecto, nenhuma discordância com o discurso ou a conduta de um juíz pode servir de pretexto para obstar à acção da Justiça, para além dos meios processuais que a Lei coloca ao dispor dos cidadãos.
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