Entrevista ao Presidente de Timor-Leste
16.04.2008 - 22h49 Adelino Gomes
Ao chegar a Díli, José Ramos-Horta irá de imediato reassumir a chefia do Estado. Prioridade: o diálogo com os partidos no ponto em que se encontrava antes do atentado de 11 de Fevereiro – isto é, na exigência de eleições antecipadas, feita pela Fretilin. Revelações do presidente timorense ao PÚBLICO, numa entrevista por telefone, poucas horas antes da partida de Darwin para Díli.
Com que sentimentos, enquanto cidadão e presidente, regressa a Timor-Leste?
JOSÉ RAMOS-HORTA - Preparo o meu regresso com muita emoção. Saí de lá, há dois meses, entre a vida e a morte. Sei que, entretanto, dezenas de milhares de timorenses têm rezado por mim e que aguardam ansiosamente o meu regresso. Desde os bispos aos padres e madres, estudantes, população pobre e humilde, tenho recebido mensagens de simpatia e apoio. Regresso a um país que esteve em estado de choque.
Mas regressa também a um país onde persistem ainda sinais de insegurança...
Devo salientar uma nota extremamente encorajadora, porque positiva: depois da tentativa de assassinato da minha pessoa, ao contrário do que aconteceu em muitos países, que imediatamente caíram em guerra civil, as instituições do Estado em Timor-Leste continuaram a funcionar – ministérios, escolas, etc. O presidente do Parlamento assumiu as funções de Presidente interino e, por outro lado, as duas instituições de segurança – F-FDTL [Forças de Defesa] e a PNTL [Polícia Nacional] – estabeleceram um comando conjunto sob cujo comando foram lançadas operações que, só pelo seu impacto psicológico, levaram à rendição, já, de mais de dois terços dos homens do senhor Alfredo [Reinado] e do senhor Salsinha [que comandou a operação contra a comitiva do primeiro-ministro, Xanana Gusmão, e tomou a liderança do grupo rebelde, após a morte do primeiro, no ataque à residência de Ramos-Horta].
A verdade também, contudo, é que o sucessor de Reinado continua a monte e, por outro lado, não se avançou no esclarecimento sobre quem esteve por detrás dos ataques, havendo sinais de que estiveram envolvidas pessoas do lado indonésio e, talvez, australiano. As investigações correm muito lentamente.
Caso Gastão Salsinha: pelos que sabemos, neste momento não tem com ele mais de umas 12 pessoas, com não mais de umas oito, dez armas. Ele tem dito que aguarda pela minha chegada porque não se quer entregar a mais ninguém.
Vai chamá-lo, quando chegar, para que ele se entregue?
Se ele não tiver sido apanhado, entretanto, ou não se tiver entregado, direi em que condições ele se deve entregar e quando. Darei um prazo para que ele o faça. Não tem que o fazer directamente a mim; pode entregar-se a um padre, aos bispos. Será transportado depois para a Presidência e dali o Procurador-geral da República, o tribunal toma conta do resto.
E quanto à lentidão das investigações?
Não as acho tão lentas. Já recebi informações do Procurador-Geral da República e da comissão de investigação que o está a apoiar e eles dizem que o mais tardar em Julho têm o dossier completo. As informações que me deram tranquilizam-me quanto ao processo de investigação. Creio que é necessário agir com prudência. As investigações não devem ser apressadas. Tem que se ir ao fundo e apurar todos os envolvidos directa ou indirectamente, quer internos quer externos.
Chega a Díli dentro de poucas horas. O que é que pensa dizer ao povo e aos deputados?
Primeiro vou felicitar o Presidente interino [Fernando ‘Lasama’ de Araújo] pela dignidade e serenidade com que assumiu as rédeas do país. Felicitarei também os deputados e partidos políticos que têm sabido manter-se unidos, apesar de umas trocas de insinuações, e em particular o povo timorense. Os jovens, os gangues que se guerreavam, todos pararam. Não houve qualquer incidente desde a tentativa de assassinato. O povo timorense mostrou a sua maturidade. As pessoas ainda hoje não compreendem por que é que Ramos-Horta foi atingido, ele que era o que mais buscava o diálogo e por isso era até criticado por alguns que não entendiam a delicadeza da situação em Timor. Mas à medida que a investigação progride, começa a fazer sentido por que é que se tenta liquidar Ramos-Horta e Xanana Gusmão.
Qual é o sentido?
Liquidando Ramos-Horta e Xanana Gusmão o país pode entrar em caos e isso serve interesses estratégicos de certos interesses [Reinaldo e a sua amiga Angelita Pires detinham uma conta de um milhão de dólares na Austrália e há indicações de que elementos da linha dura do Kopassus, forças especiais militares indonésias, estiveram ligados aos atentados, declarou Horta à Lusa, pouco antes desta entrevista].
Os factores de insegurança persistem e o país parece tardar em seguir um rumo. De resto, informação dadas por si, precisamente, indicavam que era sua intenção dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas em 2009.
Não. Eu nunca dei tal informação. O que eu disse foi que, se os partidos com assento no parlamento concordassem todos com eleições antecipadas, que é uma exigência da Fretilin, obviamente que eu não ia opor-me. Não se dissolve o parlamento por dá cá aquela palha.
Qual é a sua medida prioritária, agora no regresso, para fazer com que o país entre na via da segurança e da prosperidade?
Vou continuar o diálogo, que corria tão bem antes da minha ida ao Brasil e que continua, após o regresso, ouvindo as lideranças da Fretilin e da AMP [Aliança para a Maioria Parlamentar, no poder] – pela primeira vez pus todos sentados à minha volta. A Fretilin agiu com muita moderação, felicitei-os pelo sentido de responsabilidade. A Fretilin queria um mecanismo que a envolvesse na resolução do caso do senhor Alfredo Reinaldo – está resolvido; no caso dos peticionários – o processo está em curso; no processo dos deslocados; na reforma do poder judicial, da defesa e segurança. São propostas construtivas, que apoiei. O único ponto controverso e que ainda está por acordar é a exigência de eleições antecipadas. Vou continuar o diálogo e tenho a certeza de que chegaremos a um consenso.
Vai retomar de imediato as suas funções?
Sim, assumo de imediato as minhas funções.
Sente-se física e psicologicamente preparado para tal?
Fisicamente estou preparado, eu diria, a 80/90 por cento. Ainda tenho dores persistentes, resultado dos nervos que foram afectados e que levam tempo a sarar. Emocionalmente, só posso dizer depois de regressar.
domingo, abril 20, 2008
Ramos-Horta: “Regresso fisicamente preparado a 80/90 por cento. Emocionalmente, só posso dizer depois”
Por Malai Azul 2 à(s) 02:08
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Traduções
Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006
"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
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