sábado, junho 24, 2006

Alkitiri apela à mediação de Sampaio e de Chissano

DN
24.06.2006

Armando Rafael

Mari Alkatiri lançou ontem um apelo à intervenção da comunidade internacional em Timor-Leste, afirmando ao DN estar convencido de que só a dimensão dos ex-presidentes Jorge Sampaio e Joaquim Chissano pode - com o apoio das Nações Unidas - travar uma guerra civil no país. "O tempo está a escassear", frisou, advertindo que "tudo teria de ser muito rápido".

"A minha intenção visa contribuir para a resolução dos problemas de Timor-Leste, evitar um banho de sangue e reforçar o Estado de direito no país", acrescentou Mari Alkatiri, que ontem se desdobrou em diversos contactos a nível internacional. A começar por Kofi Annan, o secretário-geral da ONU, uma organização sem apoio da qual só muito dificilmente Sampaio e Chissano poderão a aceitar o repto que lhes foi lançado. E mesmo assim, ainda faltaria saber o que pensam disso as autoridades portuguesas e moçambicanas, já para não mencionar o próprio Xanana Gusmão, a Austrália, os EUA e até o Vaticano.

Uma tarefa de que Ian Martin se poderá encarregar quando chegar a Díli, admitindo que o enviado especial do secretário-geral da ONU ainda chegue a tempo de evitar aquilo que parece inevitável: um conflito aberto entre partidários do Presidente e do primeiro-ministro. Sobretudo se as próximas horas vierem a confirmar que a Fretilin se prepara para cerrar fileiras atrás de Alkatiri, insistindo na sua continuidade. Contrariando todos os cenários que ontem circulavam em Díli e que davam como certa a sua substituição por Ramos-Horta ou por um outro nome indicado pelo partido: Ana Pessoa ou Estanislau da Silva.

Soluções que não convencem Mari Alkatiri. "A demissão, pura e simples, do Presidente da Repíblica ou do primeiro-ministro não resolvem nada. Não contribuem para a resolução dos problemas, não evitam um banho de sangue, nem reforçam o Estado de Direito", acentuou Mari Alkatiri, para quem "só o respeito pela Constituição timorense poderá permitir um acordo entre as partes".

Interrogado sobre os mediadores desejados, o primeiro-ministro não hesitou, apontando uma "troika": Jorge Sampaio, Joaquim Chissano e Ian Martin. Três personalidades com um profundo conhecimento de Timor-Leste e que dispõem de um bom relacionamento com os principais protagonistas desta crise. Especialmente com Xanana, que nunca escondeu uma relação muito especial com os ex-Presidentes de Portugal e de Moçambique ou a admiração que nutre pelo antigo responsável da ONU em Timor-Leste, durante o período em torno do referendo que levou os timorenses à independência.

"Pelo que conheço do Presidente Xanana Gusmão, não tenho dúvidas que lhes daria ouvidos e de que eles seriam bem recebidos".

Uma avaliação que tanto Jorge Sampaio, como Ian Martin, poderão estar em condições de fazer pessoalmente, atendendo às visitas que têm efectuado nos últimos anos a Díli.

Avaliação idêntica poderá fazer igualmente Joaquim Chissano, que era titular da pasta dos Negócios Estrangeiros de Moçambique, quando a Indonésia invadiu Timor-Leste em 1975, tendo Maputo sido, nessa altura, uma espécie de porto de abrigo para os exilados timorenses. Entre os quais estava o próprio Alkatari .

Uma solidariedade que se manteve ao longo dos anos e que foi até reforçada no período em que Chissano foi Presidente da República, tendo Moçambique apoiado sempre os esforços diplomáticos desenvolvidos pela resistência timorense. Designadamente os que foram desenvolvidos pelo actual titular da pasta dos Negócios Estrangeiros e da Defesa de Timor-Leste, José Ramos -Horta.

Como se isso não fosse suficiente, o DN sabe também que o ministro na Presidência para os Assuntos Diplomáticos de Moçambique, Francisco Madeira, esteve há dias por Díli.

Sendo que Madeira é particularmente próximo de Joaquim Chissano, habituado que está aos bastidores da diplomacia internacional, razão pela qual este discreto embaixador foi uma personalidade-chave do processo que conduziu aos acordos de paz com a Renamo, em 1993.

É no peso destas pessoas que o primeiro-ministro Mari Alkatiri parece apostar agora, tentando inverter a inevitabilidade de uma guerra civil. Mesmo que isso lhe custe o lugar de primeiro-ministro. Mas, aparentemente, nunca nas condições impostas por Xanana Gusmão. "Se a minha saída ajudar, estou pronto. Mas só nas condições que referi."

O que, em termos práticos, significa que a Fretilin, que dispõe de maioria no Parlamento, se prepara para desafiar o Presidente Xanana, que ainda ontem proclamava aos manifestantes que o apoiavam no centro de Díli: "Ganhámos a guerra!"

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1 comentário:

Anónimo disse...

Xanana Gusmão está preocupado, não quer a FRETILIN: quer o poder absoluto!

A FRETILIN não tem estado a facilitar as coisas a australianos e aos poucos* timorenses que se manifestam contra Mari Alkatiri.

Há, no entanto, aqui vários problemas.

Primeiro acharam que seria massacrando Mari Alkatiri que conseguiriam alterar as coisas. Agora perceberam que Mari Alkatiri não está agarrado ao Poder, mas sim agarrado à Constituição da República.

E perceberam também que a FRETILIN sabe continuar a respeitar a Constituição da República e que o fará sempre - contrariando a vontade de Xanana Gusmão e seus pares.

Surge o independente ministro José Ramos Horta, não surpreendentemente, a posicionar-se para reentrar na FRETILIN, para tomar o poder por dentro - quiçá para aceder a primeiro-ministro sem ser por iniciativa presidencial -, controlar o partido e mudar o rumo do mesmo mais para os interesses de Camberra e de Washington -, e até já "autorizou" o seu embaixador americano a regressar a Dili.

Xanana Gusmão cometeu outro erro estratégico no processo do assalto ao poder- e aqui não leva aspas pois é mesmo de assalto ao poder que se trata em Timor -, na sua provincial declaração deixou escapar da primeira à última linha que o que se pretende é a decapitação da FRETILIN e a sua anulação política e partidária.

Xanana Gusmão, que esteve e está, desde a primeira hora, numa política de enfraquecimento da FRETILIN - criando** partidos políticos e estímulando a sua acção -, tem agora o maior desafio da sua estratégia comum a José Ramos Horta e aos amigos americanos e australianos, que é o de provocar o declínio do maior partido timorense.

A execução do plano de aniquilação do partido político FRETILIN ainda está em marcha.

O passo seguinte é o que está a acontecer.

A FRETILIN percebeu desde o início a estratégia de Xanana Gusmão. Conduziu as coisas até a ponto em que estamos.

Xanana Gusmão, provinciano que é, mal preparado e mal aconselhado, perdeu as estribeiras e veio a público gritar brejeiramente, em tom e conteúdo bulhento, contra a FRETILIN e pessoas às quais o país deve muito, como é o caso do comandante Lu'olo.

O plano seguinte também já está em marcha.

Xanana Gusmão, ontem de forma burlesca, dirigiu-se aos seus homens - aqueles que ele tem controlado desde a primeira hora e protegido -, em pleno centro da cidade, protegidos pelos militares australianos***, para lhes agradecer a dedicação, usando as suas palavras, a "esta guerra".

Agora a hora é de passar à destruição da FRETILIN.
As tropas pseudo-políticas (a quem Xanana vai ter da pagar as promessas, pois caso contrário ...), de Xanana Gusmão, com Fernando de Araújo, Leandro Isaac, Manuel Tilman, Mário Carrascalão, Ângela Carrascalão, Lúcia Lobato, Joe Gonçalves, entre tantos outros pela primeira vez, nestes últimos anos podem andar a gritar vitória com os manifestantes pelas ruas de Díli.

Provocar a FRETILIN para uma reacção violenta ao circo montado em seu torno é o objectivo dos manifestantes, coordenados com a chefia máxima, de forma a provocar o governo de iniciativa presidencial. De outra forma, na forma actual, será a FRETILIN a decidir quem e como governa. A Constituição está viva e a FRETLIN, ao contrário do Presidente da República continua a ser o único pilar que sustém a Democracia, a Soberania ea Unidade Nacional.

Xanana Gusmão e José Ramos Horta sabem-no e estão a desesperar, estão emparedados.

A ofensiva seguinte está aí, os desertores passaram a Frente Nacional - com o sorriso de Xanana Gusmão - e já tomaram várias medidas, como a do encerrar o Parlamento Nacional e tomar conta dos movimentos na cidade de Dili.

* Poucos manifestantes, duas a três mil pessoas não têm "quórum" para a representação de um Povo Soberano e Democrata;

** sobre a consituição do PD e do PSD todos sabem dentro e fóra destes partidos como se processou o seu nascimento nos bastidores e o contributo que o "fotógrafo" deu ao surgir nos comícios como que por acaso;

***A entrada dos militares australianos era fundamental. De tal forma, que José Ramos Horta, com o "cc" de Xanana Gusmão, assinou o acordo, à revelia do governo ao qual pertence, dotando de poderes totais as tropas australianas - há sempre um preço a pagar nestas coisas.
Sem as tropas inoperantes, mas a comandar internamente, Xanana Gusmão e José Ramos Horta não tinham conseguido levar o processo até ao ponto em que está.

Reparem como os manifestantes foram introduzidos na cidade com o apoio das tropas e a sua segurança é assegurada pelos militares. reparem como Xanana Gusmão não respeita os seus pares e "deixa" promover provocações em caravana automóvel a casa do primeiro-ministro e em frente às instalações da FRETILIN.

Enquanto isso, nas estradas do país, as tropas australianas estão a bloquear os militantes da FRETILIN que organizados por si e em grupos pretendem dirigir-se a Dili.

Conclusão prévia:

Mesmo sem Mari a dirigir o Governo, vitimado por um golpe de Estado presidencial, a FRETILIN continuará a ser o partido que formou o governo em funções, com ou sem Mari Alkatiri.

Sabemos, todos nós ,que as coisas não ficam por aqui.

Xanana Gusmão, os amigos e a Austrália não estão satisfeitos - não esquecendo os USA, que já manifestaram todo o apoio à Austrália nas suas decisões para com Timor-Leste -, daí que se esperem mais ofensivas contra a pacificidade da FRETILIN, hoje, amanhã, mas não para sempre - desde que José Ramos Horta consiga entrar lá para dentro.

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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