Há dois anos atrás estive em Timor.
E, como tantos outros portugueses, hoje, sofro à distância.
Em 2004 vi um povo iludido e esperançado com um futuro que tardava em aparecer, e preso numa ilha que já passara de moda, para o mundo.
Vi um país recém saído de uma economia de subsistência, após décadas de opressão e subserviência, ressacado da guerra e da ajuda humanitária, e ainda com muitas feridas por cicatrizar. Timor acordava então para uma economia que não compreendia e onde parecia não ter lugar.
Vi um país alimentado e anestesiado pelo dinheiro dos malai.
Petróleo? O de consumo era importado, e não se sabia o que lá vinha dentro. O outro, o do mar de Timor, era uma miragem, chamada Timor Gap. Um imbróglio político e jurídico, com a macabra forma de caixão desenhado no mar, que continua ainda hoje, a iludir, entreter e alimentar muita gente.
Vi o olhar timorense, que escondia muita tristeza e raiva mal contida.
As oportunidades não abundavam e o desemprego era visível.
Vi um timorense, alcoólico mas muito educado, que vendia bugigangas pela cidade toda, a pé descalço. Outro, que falava e ria sozinho, discretamente, na esplanada, todas as manhãs. Outro ainda, que circulava pela cidade pedindo emprego a todo o malai que encontrava, sem sucesso.
Vi jovens e velhos de olhar vazio deambulando sem destino pela cidade.
Vi uma criança carregar às costas uma dúzia de garrafas de mel, o dia todo.
Vi uma cidade, e uma sociedade, em que nada era bem o que parecia.
Vi um país com um parque automóvel de fazer inveja a muito país rico, mas onde uma garrafa de água custava cinco vezes mais que um isqueiro.
Queimar é tradição em Timor. Queima-se tudo... o lixo, o mato, as vidas.
Mas não vi loromonus nem lorosaes... apenas lorotimores.
Em Santa Cruz, vi centenas de famílias encher o cemitério de cor e vida, pintando e restaurando alegremente os túmulos dos seus mortos.
Vi um povo pobre, mas honrado. Um país dependente, mas digno.
Mas hoje vejo um país ardido, dividido e invadido... um Palácio das Cinzas.
Vejo um povo assustado, traumatizado, desesperado, necessitado.
Um povo que gosta de nós, e que precisa de nós.
Dizem que quem bebe a água do coco, regressa a Timor.
Eu bebi... por isso, hoje, sofro à distância.
Não abandonemos Timor, quando Timor mais precisa de nós.
terça-feira, junho 13, 2006
Dos leitores
Por Malai Azul 2 à(s) 14:01
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Traduções
Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006
"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
4 comentários:
Tu abandonas-te....
Belíssimo comentário. Parabéns
AC
Br
Sofre como todos nos os timorenses sofremos, e no seu sofrimento encontramos a solidariedade.
Continue a olhar e com olhos de ver.
A verdade nao se encontra ao de cimo, na superficie. E' mais profunda. Mas quem procura a verdade encontra-la-a
Lia_fanun
Nao chega sofrer a distancia. Quem bebe a a agua de coco timorense tem que voltar a Timor. Ha sempre qualquer coisa que os timorenses esperam dos que gostam de Timor.
Enviar um comentário