segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Ramos-Horta em Laga, crónica de um anúncio anunciado

Pedro Rosa Mendes, da Agência Lusa Laga, Timor-Leste, 25 Fev (Lusa) - Os habitantes de Laga, 150 quilómetros a Leste de Díli, costumam justificar o calor que normalmente faz na sua aldeia informando o visitante de que neste sítio se localiza "o segundo Purgatório".

Talvez fique, acreditando que o primeiro existe. Facto à margem da fé é que foi numa fornalha de sol, azulado de pele sob um toldo das Nações Unidas e com a imagem de Cristo estampada ao peito, que José Ramos-Horta lançou hoje a sua candidatura às eleições presidenciais de 09 de Abril.

Foi um anúncio formal e oficial: "Hoje, aqui, nesta terra de Laga, digo a todo o povo de Timor-Leste, lorosae e loromonu, tasifetu e tasimane, e ao resto do mundo, a minha candidatura a Presidente da República".

José Ramos-Horta referia-se aos quatro nomes cardeais da geografia timorense. Lorosae, o Leste e o seu povo; loromonu, o povo do Oeste do país; tasifetu, literalmente "o mar mulher", na costa Norte; tasimane, "o mar homem", da bravia costa Sul.

Estas categorias, sobretudo a suposta divisão ou inimizade entre lorosaes e loromonus, têm sido o pretexto e o contexto de violência e tensão em Timor-Leste desde o início de 2006.

Foi contra uma alegada discriminação étnica que cerca de seiscentos militares das Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL) assinaram em Janeiro de 2006 uma petição ao Presidente da República, Xanana Gusmão, e às chefias militares, pondo em marcha a engrenagem de uma crise que rebentou no final de Abri l.

O candidato José Ramos-Horta deixou em Laga uma mensagem clara sobre isto: "Timor ida deit", em tétum, Timor é um ou uno, repetiu o primeiro-ministro e m várias ocasiões do seu longo improviso (seguiu, mas não leu, o discurso de várias páginas que escrevera antes do fim-de-semana).

"Conheço esta terra amada de uma ponta à outra, de Tutuala a Oécussi", isto é, da praia mais a Leste até ao enclave dentro da metade indonésia da ilha.

"Ajudei a fazer o diálogo em vários sítios de conflito", recordou José Ramos-Horta.

O comício de lançamento de Ramos-Horta à Presidência foi longo e organizado, respeitando o protocolo lido, à chegada, por um mestre de cerimónias.

Foi folclórico, com dançarinos tradicionais que receberam a comitiva com tambores.

Foi solene, porque o comandante Cornélio da Gama "L7" pediu, durante cerca de quinze segundos, um minuto de silêncio pelos heróis caídos pela pátria.

Foi inflamado, quando desfilaram ao microfone militantes de diferentes distritos do país.
Foi político, com as explicações do candidato sobre o que o preocupa e o motiva: o combate à pobreza.

Foi descontraído, pois José Ramos-Horta aconselhou as várias centenas de pessoas presentes no comício a "aproveitar" tudo o que os candidatos dão ao povo durante a campanha.

"Em 1999, o povo recebeu dinheiro, bicicletas, t-shirts vermelhas e brancas", as cores nacionais da Indonésia, "perdeu sangue, e depois votou pela independência", recordou José Ramos-Horta.

"Digo a esse povo analfabeto, pé-descalço: recebam todas as camisolas, vão às festas todas, onde se mata o búfalo e se come arroz, como eu hoje vos dou do meu búfalo", desafiou o candidato.

"Se depois votarem noutro, eu direi que esses malandros me enganaram. Mas serão malandros inteligentes que merecerão o meu respeito", concluiu o primeiro-ministro, sublinhando, perante a multidão sorridente, que respeitará o resultado das eleições.

O anfitrião do comício de José Ramos-Horta foi o veterano Cornélio da Gama "L7", que vive em Laga mesmo junto ao recinto onde decorreu o anúncio da candidatura.

"L7" é o líder do UNDERTIM, Unidade Nacional Democrática da Resistência Timorense, e a sua marca ficou na cerimónia de hoje, onde a palavra de ordem de abertura foi: "Resistir é vencer, a luta continua. Resistir sim, render nunca!".

A notícia da candidatura precedeu o anúncio em três dias. O primeiro-ministro timorense, sem que fosse essa a sua intenção, revelou os seus planos quinta-feira à tarde, em entrevista à Aljazzeera. O "scoop" foi difundido nessa noite, hora de Díli, "14h00, Hora de Meca".

A difusão global da notícia não estragou a festa em Laga. José Ramos-Horta subiu de véspera a Baucau (a 20 quilómetros de Laga), "como cidadão, em viatura particular e pagando todas as despesas", conforme frisou à Lusa numa entrevista que antecedeu o jantar com o bispo D. Basílio do Nascimento.

"Não devo grandes favores a nenhum partido", respondeu o primeiro-ministro sobre a aparente leveza de disposição no momento de entrar na corrida presidencial. "A minha candidatura é, em primeiro lugar, um dever de consciência", afirmou.

Lusa/Fim

NOTA DE RODAPÉ:

Vamos ver quantas vezes durante a campanha vai vestir a T-Shirt com o Che Guevara... Ou será que essa agora fica na gaveta?...

3 comentários:

Anónimo disse...

L-7, Dom Basílio... que grande misturada!

O homem dos sete instrumentos, ou "quem tudo quer, tudo perde"?

Anónimo disse...

A proxima T-shirt que ele vestir tera as fotografias do Bush-Howard!
Ze Cinico

Anónimo disse...

A proxima T-shirt que ele vestir tera as fotografias do Bush-Howard!
Ze Cinico

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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