terça-feira, outubro 16, 2007

Abençoados Sortudos

Blog Timor Lorosae Nação - Segunda-feira, 15 de Outubro de 2007
Ana Loro Metan
Ai dos poderosos que usufruem bens terrenos!

Se nós por cá estamos todos bem devemo-lo a nós próprios e a mais ninguém. Eventualmente, devemo-lo também a Deus por nos proteger, de vez em quando, com uma mãozinha, se bem que com a outra também nos envie ventos e tempestades que enchem os céus de timorenses, de africanos, árabes e tuti-quanto é terceiro mundo. A morte deve ser mesmo o prémio de Deus Nosso Senhor para os pobres, fracos e desprotegidos.

Em compensação os ricos e fortes são castigados a prolongar a sua estada neste mundo através de mimos, cuidados de saúde de alta qualidade e inovação, abundância a todos os níveis e completa realização neste inferno. Bem feito para eles que assim têm muito mais que penar.
Sem muitas delongas só quero explicar que esta foi a ilação de uma homilia por mim escutada na missa dominical a que nunca falto.

Foi aí que entendi que afinal os que nós julgamos viverem bem estão por cá a sofrer e não são eleitos de Deus.

“Parece que vivem bem mas aquilo não é viver, é estar na antecâmara do purgatório”, ia dizendo o orador do alto do seu púlpito. “Aos nossos olhos parece que são eles os eleitos de Deus, mas Deus protege é os carentes, os pobres, desprotegidos e ignorados na partilha terrena”. Estas foram as palavras.

Fiquei a saber que os timorenses voltaram a ser uns sortudos e que o paraíso os espera.
“Por isso não os devemos invejar”, aos que aparentemente quase tudo têm. Afirmou o Ministro Eclesiástico para explicar aos pobres que, afinal, são ricos por Deus e que não devem ser portadores da inveja.

Se eu não soubesse a minha idade juro que logo que saísse da missa dava um pulo à Praia do Farol – nesses tempos era boa - e ia brincar com os meus amigos e colegas de escola um pouco antes de caminhar para casa juntamente com o meu “Kribas” - um cão que meu pai me trouxe exactamente desse suco. É que aquela homilia transportou-me para cinquenta anos atrás, talvez mais.

Nesses tempos saímos da igreja felizes e absolutamente crédulos relativamente ao que ouvíramos. Felizes, porque acreditávamos na palavra do senhor… celebrante da missa.
Acontece que estamos no ano de 2007, não nos anos de 1950…

Pelo caminho e chegada às imediações de casa tive o cuidado de reparar ainda mais atentamente nos sortudos dos timorenses que por mim passavam acabrunhados, escanzelados, rotos, quase descalços ou descalços e alguns muito sujos.

Apeteceu-me ir ter com eles e dar-lhes os parabéns pela sorte que têm ao sobreviverem assim e avisá-los para que não tenham inveja dos que cheiram bem, vestem bem, comem bem, têm boas casas e carros, ar condicionado, criados, e pouco ou nada fazem – para além de gastarem dinheiro que não sabemos, mas imaginamos, como ganharam.

Sortudos são também os bandos de crianças abandonadas, sub-nutridas, sem roupa e sem escola, sem atenção, que testemunham a indiferença dos adultos com capacidades para lhes proporcionar o que lhes falta, o que lhes é negado pelos egoístas e falsos moralistas que nos querem enfiar patranhas pelo cérebro e os dedos pelos olhos dentro.

Sortudos acabam por ser todos os timorenses carentes de governantes que antes e depois ainda não conseguiram entender-se e olhar para as crianças abandonadas de Díli. Olhar para os campos da miséria e da vergonha com origem em lutas pelos poderes terrenos de que não devemos ter inveja, que devemos não contestar. Fiquemos quietos, expectantes de que chegue a nossa passagem para o paraíso.

Os timorenses são uns sortudos por ter uma igreja que os flagela com enormidades extremamente apelativas à ignorância, como há cinquenta anos. Não dando para perceber porque criticam certos líderes muçulmanos que convencem os crentes de que quando explodirem vão para um lugar de leite, mel e… mulheres.

Afinal, os obscurantistas são todos iguais.

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Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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