sexta-feira, março 30, 2007

O "Tanque de Guerra"

Jornal de Notícias - Sexta-feira, 30 de Março de 2007

Pedro Sousa Pereira, António Cotrim, em Díli - Exclusivo JN/Lusa

Longos dragões chineses descansam nos braços tatuados dos jovens de Becora, em Díli, Timor-Leste, que se juntam na oficina de motorizadas do "Tanque de Guerra", à beira da estrada asfaltada. A hora de almoçar já passou e, por isso, ao lado da oficina, debaixo de um tecto de chapa um grupo de amigos joga bilhar, enquanto outros rapazes se preparam para novas tatuagens. Apenas um deles, de fato de macaco, desmonta lentamente o motor de uma motocicleta. A vida dos jovens do "Tanque de Guerra" corre normalmente e como indica uma placa aqui pode-se arranjar um motor, jogar bilhar, fazer tatuagens, ou simplesmente ficar a ver os carros a cruzar o último bairro periférico de Díli, antes da estrada que sobe em direcção a Baucau.

Horas antes, as Nações Unidas, no centro da cidade congratulava-se com as informações difundidas pela Comissão Nacional de Eleições e pelo Serviço Técnico da Admnistração Eleitoral sobre o número de votantes e o recenseamento que dizem ter superado as expectativas. Ainda sem números oficiais exactos há cerca de meio milhão de eleitores. Os novos eleitores são, ou os jovens que atingem os 17 anos de idade até ao próximo dia 9 de Abril, data da realização das presidenciais, ou então eleitores que tinham perdido o cartão para votar.

De acordo com informações oficiais, a nível nacional, não se registaram até ao momento situações irregulares, apenas incidentes esporádicos que, segundo as autoridades, não perturbam o processo eleitoral.

No "Tanque de Guerra", em Becora, os rapazes que têm idade para votar não falam de eleições. Encolhem os ombros e passam o tempo a batalhar sobre um pano de bilhar que já foi verde enquanto outros dormem estendidos em cadeiras de plástico ou fumam cigarros indonésios que cheiram a cravinho na casa do tatuador, atrás da oficina.

Sem cartazes de campanha

No "Tanque de Guerra" não há cartazes de campanha de qualquer um dos oito candidatos que andam na estrada desde sexta-feira passada. Em plena campanha para as presidenciais, o presidente da República Xanana Gusmão aceitou juntar-se ao Congresso Nacional da Reconstrução Timorense, um novo partido com a velha sigla do extinto Conselho Nacional da Resistência Timorense e já afirmou que está "preparado" para ser primeiro-ministro após as eleições legislativas de 2007 que ainda não têm data marcada.

José Ramos-Horta, chefe do Governo, afirma que tem o apoio da Igreja timorense e do presidente da República e a FRETILIN, o partido maioritário que domina a Assembleia Nacional, mobilizou a máquina partidária.

Francisco Guterres "Lu Olo", presidente do Parlamento, que faz campanha ao lado do ex-primeiro-ministro Mari Alkatiri, disse esta semana que conseguiu juntar 10 mil pessoas em Ossu, na zona leste do país e cerca de três mil apoiantes na vila de Liquiçá, a pouco menos de 40 quilómetros a oeste de Díli.

"Nós conseguimos fazer muita coisa mas as pessoas só vêm o lado negativo e não o lado positivo de tudo o que a FRETILIN fez enquanto Governo.

Conseguimos erguer uma estrutura de Estado através da maioria no Parlamento. Conseguimos implementar coisas prioritárias como escolas, postos sanitários, em todos os distritos, e água potável para parte da população. A FRETILIN tentou avançar mais para a frente mas, entretanto, deu-se esta crise e houve um retrocesso. Mas a FRETILIN continua determinada em viabilizar o país, num futuro próximo, depois das eleições", afirmou Francisco Guterres "Lu Olo" sobre o desempenho da FRETILIN como partido de Governo.

A imprensa timorense publica sondagens. José Ramos-Horta e Francisco Guterres "Lu Olo" são os favoritos, mas os jornais que se vendem no centro da cidade, onde há estrangeiros, não chegam a Becora, no sopé da montanha, onde os jovens timorenses com idade para votar jogam bilhar e não falam de política.

Aqui os dias são todos iguais. Não há empregos, desmontam-se motores e fazem-se tatuagens. Pode ser que até ao dia das eleições nasçam mais dragões chineses no "Tanque de Guerra".

João da Silva, o halterofilista de Becora

Não muito longe do "Tanque de Guerra" vive João da Silva, na casa onde sempre viveu. Como muitos jovens de Díli vive entre halteres e máquinas de ginástica.

No final de Julho de 1999, nos dias que antecederam a consulta popular, João da Silva, membro da rede clandestina e líder do grupo "Choque" durante a ocupação indonésia, armado de catana, arco e flecha defendeu o bairro da milícia pró-indonésia e um dia não deixou passar Eurico Guterres, líder Aitarak. Nesse dia morreram pelos menos duas pessoas, uma de cada lado.

"Em 1999, depois do referendo, tudo foi queimado e fui deportado para o lado indonésio, mas eu não morri", diz, em inglês, enquanto mostra os halteres que o ajudam a manter a forma.

"Não tenho trabalho e isto não anda para a frente", referindo-se à situação em que vive. Sobre as eleições diz apenas que vai votar mas não diz em quem.
Entretanto, vai continuar a levantar halteres, como sempre, no pátio da casa, em Becora.

1 comentário:

Anónimo disse...

CNE apela à calma
Presidenciais timorenses: Ramos Horta apedrejado em campanha em Viqueque
30.03.2007 - 11h26 Lusa
O porta-voz da Comissão Nacional de Eleições (CNE) de Timor-Leste disse hoje à Agência Lusa que 20 apoiantes do candidato presidencial José Ramos-Horta ficaram feridos após serem apedrejados numa acção de campanha em Viqueque, 220 quilómetros de Díli.
"Fomos informados de que 20 pessoas ficaram feridas em Viqueque, algumas foram hospitalizadas e quatro são feridos graves" na noite de ontem, disse o padre Marinho Gusmão, que apelou aos oito candidatos para controlarem os seus apoiantes.

A campanha para as eleições presidenciais em Timor-Leste, cuja votação decorre a 9 de Abril próximo, começou a 23 deste mês e, até ao momento, registaram-se incidentes em Viqueque, na quarta e quinta-feira, contra apoiantes da campanha de José Ramos-Horta e, na terça-feira, foram lançadas pedras contra a coluna de veículos de campanha da Fretilin em que seguiam o candidato Francisco Guterres "Lu Olo" e o secretário-geral do partido, Mari Alkatiri.

Também terça-feira, a sede da Fretilin na vila de Liquiçá, a 34 quilómetros de Díli, foi apedrejada mas não se registaram feridos.

A CNE foi notificada das ocorrências mas, apesar destes dois incidentes, o padre Martinho Gusmão disse que o processo eleitoral não está posto em causa.

"Não podemos dramatizar. Lamentados o que aconteceu, mas estes casos não vão impedir todo o processo", afirmou o porta-voz da CNE.

Apesar dos dois incidentes registados em Viqueque e Liquiçá não impedirem a continuação do processo eleitoral a CNE vai apelar aos oito candidatos presidenciais para que controlem os seus apoiantes.

"Vamos mandar uma carta de repreensão a todos os candidatos para tomarem conta dos seus apoiantes, para que não se repitam os incidentes que aconteceram esta semana", adiantou à Lusa o porta-voz da CNE.

De acordo com Dionísio Soares, porta-voz de campanha de José Ramos-Horta, as vítimas do ataque são oriundas de uma povoação da zona de Viqueque e ainda não regressaram a casa. "Nós já mandamos uma informação para a CNE e já contactamos a polícia, que mandou homens do Bangladesh (UNPOL) para ver se estas pessoas podem regressar amanhã (sábado) às suas casas em segurança", disse à Lusa Dionísio Soares, acrescentando que os atacantes não foram identificados. "Não quero acusar ninguém porque, primeiro, tem de ser tudo verificado", disse o porta-voz da campanha de José Ramos-Horta.

Quinta-feira, em Díli, Finn Reske-Nielsen, vice-representante especial do secretário-geral da ONU em Timor-Leste, declarou que o recenseamento eleitoral "superou as expectativas", ao registarem-se mais de 500.000 eleitores, embora o número final oficial de votantes das presidenciais ainda não tenha sido divulgado. Finn Reske-Nielsen e o chefe da missão internacional (UNMIT), Atul Khare, referiram que o processo eleitoral não está posto em causa por questões logísticas, de segurança ou legislativas.

O Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE), com o apoio da UNMIT, identificou e avaliou 504 mesas de voto nos 13 distritos e concluiu que 71 seriam de acesso muito difícil e 34 não podem ser atingidas por terra.

Nos próximos dias, a UNMIT apoiará a entrega de material eleitoral nos distritos, incluindo as áreas menos acessíveis, com quatro helicópteros, estafetas e cavalo.

As eleições vão ser acompanhadas por mais de mil observadores timorenses e por cerca de 100 observadores internacionais, cuja formação é assegurada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

Críticas ao uso da bandeira no boletim de voto

A FRETILIN, o maior partido politico de Timor-Leste, criticou hoje a decisão tomada por quatro candidatos presidenciais em usarem a bandeira nacional como símbolo da sua candidatura às eleições presidenciais de 9 de Abril.

Os quatro candidatos que decidiram usar a bandeira nacional como símbolo da sua candidatura são: Ramos Horta (candidato independente), Avelino Coelho (PST), Lúcia Lobato (PSD) e Xavier do Amaral (ASDT). O candidato da FRETILIN, Francisco Guterres “Lu Olo” usará a bandeira do FRETILIN como símbolo da sua candidatura.

Um membro do escalão superior da FRETILIN, Filomeno Aleixo, disse que era desonesto e perigoso fazer uso da bandeira desta maneira uma vez que os candidatos, ou são candidatos independentes ou são candidatos propostos pelos respectivos partidos.

“O uso da bandeira nacional no boletim de voto é uma tentativa deliberada de enganar o eleitorado quando se sabe que há mais de 50% de analfabetos”, disse Filomeno.

“Quatro candidatos levarão o mesmo símbolo no mesmo boletim de voto sendo assim difícil de distingui-los”, acrescentou Aleixo, membro da Comissão Política Nacional.

O mesmo disse também que a decisão de se permitir usar a bandeira como símbolo de candidatura no boletim de voto afectará seriamente as eleições deixando de ser justas e transparentes.

A FRETILIN apresentou recurso ao Tribunal de Recurso no sentido de anular a decisão da Comissão Nacional de Eleições (CNE) mas o Tribunal decidiu que o uso da bandeira no boletim de voto não era ilegal.
http://www.publico.clix.pt/shownews.asp?id=1289807&idCanal=20

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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