segunda-feira, julho 03, 2006

Díli regressa à normalidade possível em período de transição política

3.07.2006
DN
João Pedro Fonseca
Em Díli


Canta-se na rua, festas em campos de deslocados, jovens de organizações civis limpam as ruas da cidade, miúdos jogam à bola, famílias limpam as casas que abandonaram (mas não regressam à noite), Díli foi ontem uma cidade paradisíaca, não fosse toda a destruição dos últimos meses. Enquanto isso, os políticos tiveram os seus encontros e reuniões. Para a semana haverá novo Governo.

José Ramos-Horta será o primeiro-ministro de Timor-Leste, é quase certo. Hoje a normalidade possível regressará aos ministérios, realizando-se logo pela manhã um Conselho de Ministros. Ramos-Horta presidirá, a pedido de Mari Alkatiri, já que é o número dois do Executivo. Coordenador do Governo é a designação utilizada para este lugar que não é mais que o substituto do primeiro-ministro na sua ausência. Como se fosse uma substituição por férias, ou doença.

A maior parte das vezes quem ocupava o cargo era a ministra Ana Pessoa, que também é ministra de Estado, como Horta, mas este é efectivamente o número dois do Governo, e assim até bate tudo certo. Ramos-Horta habitua-se já a conhecer os cantos à casa, e faz a transição para o lugar que deverá ocupar já na próxima semana.

Os próximos passos serão dados pelo Presidente Xanana Gusmão. Já terá ouvido grande parte dos partidos, e outras figuras proeminentes da sociedade timorense, depois negociará com a Fretilin a formação do Governo. Por lei é o partido mais votado que indica o nome do primeiro-ministro, que por sua vez escolherá a sua equipa.

Mas este processo será sui generis. A Fretilin não está interessada em criar mais obstáculos a Xanana e sabe-se que este tem a sua própria escolha: Ramos-Horta. O ainda líder da diplomacia timorense faz a ponte entre a Fretilin e a Presidência, e assim tudo se encaminha.

Para o final da semana será apresentado publicamente o nome do novo primeiro-ministro. Este terá dois ou três dias para escolher a sua equipa e a tomada de posse pode ocorrer logo no fim-de-semana ou na segunda-feira seguinte, apurou o DN junto de fonte próxima do Presidente. Hoje mesmo Xanana Gusmão deverá ter um encontro com uma delegação da Fretilin e tudo ficará acertado.

Para se evitar problemas constitucionais, formalmente é a Fretilin a apresentar o nome do futuro primeiro-ministro, daí que se fale numa discussão para consensos e não numa proposta que esperaria depois a resposta do Presidente.
Recomeçar

Junto ao Palácio do Governo, onde nas últimas semanas se concentraram milhares de manifestantes, contra e pró-Alkatiri, havia uma autêntica lixeira. Ontem estava tudo limpinho. Vários jovens pertencentes a associações decidiram "pensar no futuro, fazer alguma coisa de positivo por esta terra", e começaram a limpar. De vassoura e sacos de lixo na mão, em algumas horas dezenas de jovens fizeram um trabalho exemplar.

No campo de deslocados "Obrigado Barak", junto à Unotil, onde residem mais de seis mil pessoas, outra ONG decidiu organizar um momento de alegria para as crianças. Cantaram, dançaram, divertiram-se. Um esforço para retirar dos mais pequenos o trauma da violência das últimas semanas.

Mesmo assim, ninguém pretende voltar a suas casas. O senhor Tomás Gonçalves, residente no bairro Pité, vai todos os dias ver a sua casa, mas garante que não volta tão cedo. "À noite há grupos de jovens que assaltam as casas, levam tudo o que há de bom." D. Justina já tem a casa vazia. "Arrombaram os portões e roubaram as coisas boas, televisão, frigorífico, tudo o que era electrónico. Devem vender." Lamenta que a segurança não esteja garantida e não percebe porque não deixam os GNR tomar conta de toda a cidade. "Tenho a certeza de que resolviam este problema de segurança."

Ainda ontem apareceram queimadas mais três casas em Becora. "Pelas 03.00 ou 04.00 da madrugada, vêm queimar as casas, são vinganças", diz o senhor Plácido Gomes. Diz que há grupos que se afirmam de segurança do bairro, andam de catana na mão, mas "desconfio que são eles próprios que vão roubar e queimar as casas".

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5 comentários:

Anónimo disse...

Que se caminhe para a normalidade nesta imensa estupidez desenvolvida nos últimos tempos.

Anónimo disse...

... e da normalidade faz parte, como prometido no início, estender a acção da GNR a toda a cidade de Dili e não apenas a Comoro.
Ou será que o responsável pela área de segurança do país --- o PR, pois claro! --- já esqueceu o prometido?
Já lá vão 4 semanas e nada de estender a acção da GNR ao resto da cidade. Pressão australiana? Se ao é parece...

Anónimo disse...

De um dia para o outro "Dili regressa à normalidade".
Estranho heim?!
Apetece perguntar novamente a Xanana:
Porque é que só agora os mandou parar?!
É chocante a evidência....

Anónimo disse...

Claro que agora a GNR brevemente será autorizada a estender a sua acção. Já tudo "está feito". Já não há o perigo da GNR impedir seja o que fôr ou testemunhar situações incómodas.

Anónimo disse...

E eu lembro que foi o próprio Ramos Horta que prometeu que dentro de DIAS ou semanas, a GNR ficaria com a responsabilidade de toda a cidade.

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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