Austrália desmente envolvimento na queda de Mari Alkatiri
Camberra, 29 Jun (Lusa) - A Austrália desmentiu hoje qualquer envolvimento na demissão do primeiro-ministro timorense, Mari Alkatiri, rejeitando alegadas ingerências na política interna do país.
"É absolutamente falso que a Austrália tenha tido uma intervenção seja por que modo fosse nos assuntos políticos de Timor-Leste", afirmou o ministro das F inanças, Peter Costello, numa entrevista a uma cadeia de televisão australiana.
Costello respondia às acusações de apoiantes do primeiro-ministro demissio nário, segundo as quais a queda de Mari Alkatiri, após algumas semanas de violên cia no país, teria sido orquestrada por Camberra e pelas forças militares austra lianas destacadas para Timor-Leste.
"As nossas forças militares estão lá (em Timor-Leste) a convite do preside nte e do então primeiro-ministro, Mari Alkatiri. Foram eles que nos pediram para ir para lá", recordou.
Mari Alkatiri demitiu-se no início da semana, no fim de um braço de ferro com o presidente Xanana Gusmão, que ameaçara resignar ao cargo se o primeiro-min istro não abandonasse o cargo.
Apesar do Comité Central da Fretilin ter recusado o pedido de demissão de Alkatiri, apelando à continuação do diálogo entre o presidente e o primeiro-mini stro para resolver a crise política, o chefe do governo e secretário-geral do pa rtido no governo acabou por se demitir para, nas suas palavras, impedir a resign ação do presidente da República.
Alkatiri vai responder sexta-feira às acusações de ter ordenado a distribu ição de armas a civis para assassinar adversários políticos.
A Austrália tem sido frequentemente acusada de ingerência nos assuntos int ernos de Timor-Leste e de ter instigado a queda de Mari Alkatiri.
JPA.
Lusa/fim
Alkatiri diz que se demitiu para evitar vazio inconstitucional - Visão
Lisboa, 29 Jun (lusa) - O líder da FRETILIN, Mari Alkatiri, afirmou à V isão que se demitiu do cargo de primeiro-ministro para evitar um "vazio instituc ional" em Timor-Leste, face a informações de que o presidente Xanana Gusmão iria resignar ou dissolver o Parlamento.
"Havia a informação de que o Presidente poderia resignar a todo momento ou dissolver o Parlamento. Qualquer uma dessas hipóteses seria pior do que a mi nha demissão", disse Alkatiri, entrevistado em Díli pela Visão terça-feira passa da, um dia depois de ter cedido à exigência de Xanana Gusmão para deixar a chefi a do governo.
"Foi o dia mais difícil da minha vida", admitiu Alkatiri, frisando que decidiu demitir-se por entender que "não devia atiçar ainda mais os ânimos".
A demissão de Mari Alkatiri, 56 anos, ocorreu um dia depois de o comité central da FRETILIN ter renovado a confiança no seu líder para que continuasse a chefiar o governo.
"Não tive a aprovação de todos, mas todos procuram compreender a minha posição", disse Alkatiri.
Sobre a posição de Xanana Gusmão de considerar ilegítima a liderança do partido maioritário por ter sido eleita por braço no ar no congresso de Maio, A lkatiri começou por dizer que não prevê uma repetição do escrutínio, mas depois admitiu essa possibilidade, "se isso ajudar a resolver algum problema".
"Mas não se organiza um congresso em poucos dias", frisou.
Alkatiri disse querer ver esclarecidas as acusações sobre o seu envolvi mento numa alegada distribuição de armas a civis para eliminar adversários polít icos, mas admitiu que a sua audição pelo Ministério Público, prevista para sexta -feira, possa ser adiada.
"Fui eu que pedi que se acelerasse essa audiência. Quanto mais se demor asse, pior ficava a minha imagem. No entanto, estou ainda à espera de um advogad o de fora e ela pode ser adiada", disse, sublinhando estar de "consciência tranq uila".
Alkatiri disse preferir "não falar mais, agora", sobre as suas denúncia s anteriores de que foi vítima de um golpe de Estado constitucional e recusou pr onunciar-se sobre se se referia à Austrália quando implicou interesses externos a Timor-Leste na actual crise no país.
"Não retiro uma vírgula, mas não vou insistir mais. Não porque tenha me do. É tempo de reflectir sobre o que se passou", respondeu.
Mais adiante, ao referir-se às futuras negociações com as companhias pe trolíferas, sublinhou que "onde há petróleo, há problemas".
Na entrevista à Visão, Mari Alkatiri admitiu que "houve erros" por part e do seu governo nos conflitos institucionais e que a crise o fez conhecer "melh or muitas pessoas", incluindo alguns dos seus ministros.
Sobre José Ramos-Horta, ministro dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, que em várias ocasiões fez declarações contraditórias em relação às do primeiro -ministro, comentou: "Num governo normal, em qualquer parte do mundo, [isso] ser ia inadmissível".
"Mas ele teve um papel de diálogo positivo. Prefiro, neste fase, destac ar só os melhores aspectos", acrescentou.
Mari Alkatiri recusou pronunciar-se sobre qualquer nome para o substitu ir na chefia do governo, mas garantiu que "quem for", terá o seu apoio.
A eleição de Rogério Lobato para vice-presidente da FRETILIN depois de se ter demitido do cargo de ministro do Interior foi considerada por Alkatiri co mo "mais uma prova de que o partido e o governo são órgãos diferentes".
"Quero que fique claro que não foi o secretário-geral da FRETILIN que d esignou Rogério Lobato para o cargo [vice-presidente do partido]. Ele foi propos to pelo presidente [Francisco Guterres "Lu-Olo"]. Mas já sei que, neste país, a culpa é sempre minha", afirmou.
Alkatiri disse ainda concordar com a presença em Timor-Leste de uma for ça da ONU "com uma componente policial mais substancial do que a militar", pelo menos durante um ano, em que defende um envolvimento de Portugal.
"Não tenho dúvidas de que Portugal terá um papel importante nas duas [c omponentes militar e policial da força da ONU]", frisou.
O líder da FRETILIN e primeiro-ministro demissionário disse igualmente confiar no envolvimento de Portugal na discussão diplomática sobre a futura miss ão das Nações Unidas em Timor-Leste.
"Já se provou, no passado, a importância da diplomacia portuguesa, ao c riar uma dinâmica institucional própria em conjunto com a CPLP [Comunidade dos P aíses de Língua Portuguesa, de que Timor-Leste faz parte] e assim afirmar uma ou tra influência", sublinhou.
Mari Alkatiri negou "terminantemente" que a FRETILIN utilize o Estado p ara os seus interesses partidários e garantiu que o seu partido vai ganhar de no vo as eleições.
"Esta crise foi criada para não permitir a vitória do partido. Mas não tenho dúvidas de que vamos ganhar, mesmo com os prejuízos que nos causou", afirm ou.
Na sequência da crise que afecta o país desde o final de Abril, e que j á provocou três dezenas de mortos e mais de 145 mil deslocados, as autoridades t imorenses solicitaram a intervenção de uma força policial e militar de Portugal, Austrália, Nova Zelândia e Malásia.
PNG.
GNR dispersa jovens que apedrejavam manifestantes FRETILIN
Díli, 29 Jun (Lusa) - Efectivos da GNR foram hoje obrigados a intervir no bairro Mascarenhas, perto do antigo mercado municipal de Díli, para dispersar grupos de jovens que apedrejaram a caravana de manifestantes da FRETILIN.
Alguns dos manifestantes saíram das viaturas e responderam aos atacante s arremessando pedras.
A caravana dos apoiantes da FRETILIN integra viaturas de militares aust ralianos e da GNR e o incidente no bairro Mascarenhas coincidiu com a passagem d e uma viatura dos efectivos portugueses.
Os militares da GNR dispersaram os atacantes e obrigaram os manifestant es a voltar para as suas viaturas.
Um helicóptero militar australiano Black Hawk tem estado a sobrevoar a baixa altitude a zona por onde vai passando a caravana de manifestantes da FRETI LIN.
Os partidários do primeiro-ministro demissionário e líder da FRETILIN, Mari Alkatiri, dirigiram-se para o bairro Caicoli, onde se situa a Presidência d a República, para entregar um documento a Xanana Gusmão, cujo teor ainda não foi divulgado.
No entanto, militares australianos impediram o acesso ao Palácio das Ci nzas, obrigando os manifestantes a prosseguir a sua marcha pela cidade.
EL.
Lusa/Fim
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quinta-feira, junho 29, 2006
Lusa
Por Malai Azul 2 à(s) 20:36
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Traduções
Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006
"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
5 comentários:
"É absolutamente falso que a Austrália tenha tido uma intervenção seja por que modo fosse nos assuntos políticos de Timor-Leste", afirmou o ministro das Finanças, Peter Costello.
Talvez que o ministro das Finanças tenha falta de memória ou ande a leste e nem ouça o que diz o seu PM Howard. É que foi à uma semana que o PM da Austrália disse: «Gusmão conta com muito apoio em Timor-Leste e é uma personagem muito popular», acrescentou John Howard, em declarações à cadeia de televisão australiana «Channel Nine». (em 23/06/06)
http://tsf.sapo.pt/online/internacional/interior.asp?id_artigo=TSF171811
É impressionante a arrogância e tacanhez politica de Xanana Gusmão.
Xanana era um mito, um modelo exemplar, conciliador, acima de todos os ódios e conflitos.
O Presidente dos diálogos nacionais, da reconciliação com a Indonésia e do Palácio das Cinzas.
Exemplar, intocável, o mito.
Mas Xanana veio a revelar-se um homem comum.
Adaptou-se ao mundo, rodeou-se de ódios e ficou ofuscado com o seu próprio poder de influência.
E como ser superior acima de quaisquer valores terrenos avançou para "guerra" que "venceu" mesmo antes de ela terminar.
E de mito passa a herói e em nome do povo pratica proezas que degeneram em conflito.
Mas um herói é respeitado e reconhecido pela sua humildade e pela sua arrogância Xanana perde o papel do herói.
Mito também já não é porque esse estatuto pertencia-lhe por uma outra guerra que não esta.
E se a guerra que iniciou era tão gloriosa quanto o invocou - a defesa do Povo - também falhou.
Falhou porque toda a violência da "guerra" recaiu e só sobre o Povo.
Este cabeçalho da Lusa “Austrália desmente envolvimento na queda de Mari Alkatiri” e as afirmações do Ministro das Finanças Australiano fez-me lembrar uma entrevista que saiu no final de Maio no DN e que consegui recuperar. Cá vai:
Diário de Notícias, 31 de Maio de 2006, entrevista de Helena Tecedeiro com Moisés Silva Fernandes
“Há forças externas a desestabilizar”
Moisés Silva Fernandes garante que a crise timorense era previsível desde as eleições de 2001. O investigador, que recebeu o DN no seu gabinete do ICS, afirma que o petróleo é a “força motriz” por detrás dos interesses de potências externas, que usaram as divisões étnicas e tensões políticas em Timor-Leste para reforçar a sua posição no país e em toda a região.
Helena Tecedeiro: Um relatório de 2002 do Australian Strategic Policy Institute já alertava para a possibilidade de conflitos nas forças de segurança timorenses. Esta crise era previsível?
Moisés Silva Fernandes: Já era previsível desde as eleições de 2001, porque se olharmos para os resultados eleitorais, já se nota uma certa divisão, do que agora se fala, entre a parte oriental e a parte ocidental de Timor-Leste. O problema que se coloca é saber até que ponto estas divisões são exploradas a partir do exterior para fragilizar as instituições timorenses, limitando a sua capacidade negocial. Esta crise remete-nos para um problema muito grave: o facto de os órgãos de poder terem apelado a uma intervenção externa é um sinal de grande debilidade de Timor-Leste e vai deixar muito limitados os próximos líderes.
Helena Tecedeiro: A crise começou com a expulsão de 591 militares das forças timorenses, alegadamente por discriminação étnica. As divisões étnicas explicam toda esta violência?
Moisés Silva Fernandes: A questão étnica é obviamente importante. Mas o que temos aqui é um problema político, com forças externas apostadas em desestabilizar Timor-Leste. Há anos que alguma imprensa australiana vem advogando um derrube do Governo de Alkatiri e espera ver no poder alguém mais maleável aos interesses de Camberra. Isto coloca problemas sérios, especialmente a Portugal. Porque a criação do Estado timorense obedeceu a duas opções: a escolha da língua portuguesa (com oposição da Austrália e da ONU) e a opção por uma base jurídica de matriz portuguesa, quando havia pressões para que fosse anglo-saxónica.
Helena Tecedeiro: Qual a responsabilidade de Portugal na situação em Timor-Leste?
Moisés Silva Fernandes: Quando assistimos à construção de um Estado, tem de haver um esforço colossal para que esse se afirme. Ora, a partir de 2002, Portugal desinvestiu em Timor-Leste; e isso tem consequências políticas. Além disso, este desinvestimento coincidiu com a saída das forças da ONU, o que, ao deixar os timorenses entregues a si próprios, abriu a porta a interesses mais poderosos. Se a situação se degradar, poderá haver mais atritos entre Lisboa e Camberra. O que não é novo: as nossas relações com a Austrália pós-75 foram muito conflituosas, porque a Austrália foi conivente com a invasão indonésia e era um dos poucos países que reconheciam a anexação de Timor-Leste. Já em 1963, a Austrália, a Nova Zelândia, Reino Unido e USA se haviam reunido em Washington, onde tomaram uma decisão: quando o império português terminasse ou se houvesse problemas em Timor-Leste, o território seria entregue à Indonésia.
Helena Tecedeiro: A Austrália instrumentalizou os grupos que protagonizaram a violência do último mês?
Moisés Silva Fernandes: Não há provas. Mas o facto é que os grupos que aparecem a fazer reivindicações, quer na polícia, quer nas forças armadas, têm uma certa ligação à Austrália. Na realidade, as ambições de Camberra em relação a Timor-Leste já vêm de longe. Em 1944, a Austrália quis, inclusive, comprar o território a Portugal.
Helena Tecedeiro: A acção dos australianos tem sido criticada e os timorenses pedem a presença da GNR. Como explica esta ânsia pela ajuda portuguesa?
Moisés Silva Fernandes: É uma ânsia que parte da população e de alguns sectores políticos, que estão interessados em que Portugal apareça para reequilibrar a balança. A chegada dos portugueses irá dar poder de manobra ao Governo para determinar o futuro de Timor-Leste. A ida da GNR é um aspecto político-simbólico.
“Questão das milícias remonta aos tempos coloniais”
Helena Tecedeiro: Como explica a “aversão” a Alkatiri?
Moisés Silva Fernandes: A imprensa australiana tem acusado o primeiro-ministro de ser comunista, um argumento que a indonésia já usara em 1974-75 para caracterizar o Governo de Dili. Mas não passa de poeira atirada aos olhos das pessoas. O que acontece é que a Austrália não aceita que Alkatiri tenha conseguido óptimas contrapartidas no que diz respeito ao petróleo.
Helena Tecedeiro: Como vê o papel de Xanana?
Moisés Silva Fernandes: Como Presidente terá de assumir as responsabilidades. Até porque é o futuro político destes líderes que está em jogo. Se Timor-Leste definhar e entrar num ciclo de violência imparável, tudo irá recair sobre estas pessoas. Também me preocupa o papel da sua mulher, que aparece a falar como sendo quase o Chefe do Estado.
Helena Tecedeiro: No meio desta crise, Ramos-Horta surge como ponte entre o Presidente e o primeiro-ministro e entre estes e os militares. Acha que já está a preparar uma candidatura à presidência ou a secretário-geral da ONU?
Moisés Silva Fernandes: Os próximos líderes de Timor-Leste terão cargos de pouca importância. Quem substituir estes dirigentes estará muito limitado, porque irá depender do entendimento com potências estrangeiras. Não vejo que os cargos de Chefe do Estado ou do Governo sejam muito ambicionados. Pode ser uma preparação para um cargo internacional. Não se sabe.
Helena Tecedeiro: Ramos-Horta apontou as semelhanças entre as técnicas usadas pelos grupos revoltosos e as usadas pelas milícias em 1999. Acha que estes são resquícios dessas milícias?
Moisés Silva Fernandes: É possível. Até porque Timor-Leste é uma sociedade com alto grau de violência. Esta questão remonta aos tempos coloniais, quando as milícias eram usadas na repressão. Em 74-75, foram usadas para desestabilizar o território. E em 1999 também foram usadas pelos indonésios. Essa aprendizagem permanece com as pessoas. E se houver factores de ordem externa e razões políticas e sociais que favoreçam certas conjunturas, isso poderá agravar-se.
Moisés Silva Fernandes, doutorado em Ciências Sociais pela Universidade de Lisboa, é investigador no Instituto de Ciências Sociais, e uma das suas áreas de investigação é “Timor-Leste nas relações luso-australo-indonésias contempoâneas.
"Fui eu que pedi que se acelerasse essa audiência. Quanto mais se demorasse, pior ficava a minha imagem. No entanto, estou ainda à espera de um advogado de fora e ela pode ser adiada" - Mari Alkatiri
E olhe que precisa mesmo de um bom advogado.
Com um Procurador Geral que revela publicamente, num processo em investigação, as declarações prestadas com clara violação do segredo de justiça e comprometendo a própria investigação, uma Juiza que acompanha de forma bastante intima o Embaixador Americano e, face à incompetência absoluta do Procurador Geral, o Hasegawa a dar orientações aos Procuradores Internacionais que são os mesmos que foram acusados de colonialismo pelo Rogério Lobato o que os deve ter deixado bastante ressaviados no minimo a independência da investigação está comprometida à partida.
Senhor Alkatiri para o seu próprio bem pessoal e politico e para o bem da História de Timor há todo o interesse de uma investigação séria e independente aconselho-o por isso a contratar um advogado profissional e com elevado valor de ética porque em Timor parece que quase todos têm um preço.
Transcrição completa da entrevista porque não está online:
Mari Alkatiri
“Onde há petróleo, há problemas”
Visão, 29/06/06, entrevista feita por Henrique Botequilha
Visão: Quando percebeu que tinha mesmo de se demitir?
Mari Alkatiri: Fiz todos os esforços no sentido de encetar um bom relacionamento com a Presidência da República. Mas a situação era complexa e foi a partir de rumores e boatos de todo o tipo que se chegou, na reunião do Conselho de Estado da semana passada, a um ponto de ruptura.
Visão: Mas só saiu na segunda-feira
Mari Alkatiri: Ainda acreditava numa solução, depois de o partido ter decidido manter-me no cargo, numa reunião do Comité Central, no domingo.
Visão: O que mudou de um dia para o outro?
Mari Alkatiri: Entendi que não devia atiçar ainda mais os ânimos. Foi o dia mais difícil da minha vida. Só me questionava sobre se esta decisão teria a compreensão dos militantes do partido. Mas, no final, foi a melhor.
Visão: Falou com Xanana Gusmão, antes de lhe comunicar a decisão?
Mari Alkatiri: Os mecanismos de diálogo com o Presidente da República já não eram assumidos pelo primeiro-ministro mas pelo partido. Havia a informação de que o Presidente poderia resignar a todo o momento ou dissolver o Parlamento. Qualquer uma dessas hipóteses seria pior do que a minha decisão.
Visão: Os órgãos da Fretilin apoiaram-no?
Mari Alkatiri: Não tive a aprovação de todos mas todos procuraram compreender a minha posição.
Visão: Foi apaziguar uns milhares de apoiantes da Fretilin que se dirigiam a Dili. Havia o risco de confrontos?
Mari Alkatiri: Fui a Metinaro (a poucos quilómetros da capital) no sentido de travar cerca de 20 mil pessoas que queriam entrar em Dili. Elas vieram enquadradas pelo partido, para reafirmar o apoio à liderança. Mas precisamente para evitar confrontos é que tivemos, Lu’Olo (presidente da Fretilin) e eu, de as travar.
Visão: Vai continuar à frente da Fretilin?
Mari Alkatiri: Sim. Mas, mesmo que tal não se verifique, continuarei a dar tudo o que posso ao partido e à nação.
Visão: Xanana entende que a sua liderança é ilegal, por ter sido eleito por voto de braço no ar, quando a lei determina voto secreto. E exigiu a repetição de escrutínio. Vai cumprir?
Mari Alkatiri: Não prevejo. Cada um tem o direito de interpretar a lei como quiser.
Visão: Portanto, não vai repetir as eleições
Mari Alkatiri: É possível que sim, se isso ajudar a resolver algum problema. Mas não se organiza um congresso em poucos dias.
Visão: O que vai dizer em sua defesa, quando for ouvido, sexta-feira, no âmbito do processo de distribuição de armas a alegados “esquadrões da morte”?
Mari Alkatiri: Fui eu que pedi que se acelerasse essa audiência. Quanto mais se demorasse, pior ficava a minha imagem. No entanto, estou ainda à espera de um advogado de fora e ela pode ser adiada.
Visão: E como reage à acusação que o implica, e ao ex-ministro do Interior, Rogério Lobato, na criação desses grupos?
Mari Alkatiri: Só posso garantir que estou de consciência tranquila.
Visão: Acha legítimo ser demitido sem uma prova cabal?
Mari Alkatiri: Vou dirigir a sua pergunta ao gabinete de Sua Excelência o Presidente da República.
Visão: Analistas reagiram com estupefacção ao ser invocado um documento australiano, na base da exigência da sua demissão.
Mari Alkatiri: Se eles estão estupefactos, eu ainda mais.
Visão: Diria que é estranho ver Xanana a discursar perante uma multidão, ao lado de “Railós”, alegado líder de um suposto “esquadrão da morte”?
Mari Alkatiri: Tenho essa sensação.
Visão: Reafirma que foi vítima de um golpe de Estado constitucional?
Mari Alkatiri: Já disse isso várias vezes. Mas prefiro não falar mais, agora.
Visão: Disse, também, que se terão manifestado interesses externos a Timor para a retirada de uma força multilateral e a vinda de uma força bilateral. Refere-se à Austrália?
Mari Alkatiri: Não retiro uma vírgula, mas não vou insistir mais. Não porque tenha medo. É tempo de reflectir no que se passou.
Visão: A sua demissão vai dar tranquilidade a Timor?
Mari Alkatiri: Resisti, para não facilitar um mau precedente para o país. Fui até onde pude. Mas entre a minha demissão e o vazio institucional foi melhor assim.
Visão: Aos manifestantes já não basta a sua demissão. Exigem também a dissolução do Parlamento…
Mari Alkatiri: Vão exigir sempre mais. Só espero que não exijam a dissolução do próprio Estado.
Visão: O Governo podia ter feito mais para evitar a crise?
Mari Alkatiri: Sem dúvida. Houve erros. E, independentemente da conjuntura política, como primeiro-ministro, devia ter intervindo mais nos conflitos institucionais desde o início, porque, no final, fui apontado como o culpado de tudo.
Visão: Ramos-Horta diz que Rogério Lobato estava a criar um segundo exército. Quer comentar?
Mari Alkatiri: Não concordo. A polícia foi armada com espingardas automáticas para 200 ou 300 pessoas. Não é suficiente para se formar um exército. Tomámos essa medida porque foi entendido que as forças armadas não deviam intervir em situações de banditismo. Na altura, todos aplaudiram, agora todos reprovam.
Visão: Porque manteve tanto tempo no Governo um ministro com um perfil polémico como Rogério Lobato?
Mari Alkatiri: Ele foi demitido porque era responsável em termos políticos, pela situação que se estava a viver. Mantive outros que deviam ter sido mudados há muito tempo. Esta crise fez-me conhecer melhor muitas pessoas.
Visão: Durante a crise, Ramos-Horta fez declarações contraditórias em relação às suas, quase todos os dias.
Mari Alkatiri: Todos viram isso acontecer. Num governo normal, em qualquer parte do mundo, seria inadmissível. Mas ele teve um papel de diálogo positivo. Prefiro, nesta fase, destacar só os melhores aspectos.
Visão: Ramos-Horta daria um bom chefe de Governo?
Mari Alkatiri: Se eu me pronunciar sobre uma pessoa, vão pensar que não concordo com outra escolha. Quem for, terá o meu apoio.
Visão: Xanana Teceu acusações gravíssimas à Fretilin, revelando conversas particulares e apontando nomes, a propósito de alegada corrupção e de utilização do Estado para um projecto de partido único. A Fretilin vai fazer algo em defesa da sua honra?
Mari Alkatiri: Julgo que sim, mas não publicamente. É importante colocar a história no seu devido lugar. Cada um tem a sua própria verdade. A nossa pode ser diferente.
Visão: Há corrupção no Governo?
Mari Alkatiri: Se houver factos, a Inspecção-Geral investiga. Em cerca de 600 casos, só se encontraram indícios em quatro ou cinco, que foram canalizados para a justiça.
Visão: A Fretilin utiliza, como sustenta o Presidente, o Estado para os seus interesses partidários?
Mari Alkatiri: Nego terminantemente essa acusação.
Visão: Por que foi nomeado Rogério Lobato vice-presidente da Fretilin já depois da sua demissão do Ministério do Interior?
Mari Alkatiri: É mais uma prova de que o partido e o Governo são órgãos diferentes. Quero que fique claro que não foi o secretário geral da Fretilin que designou Rogério Lobato para o cargo. Ele foi proposto pelo presidente (Lu’Olo), mas já sei que, neste país, a culpa é sempre minha…
Visão: Continuará Rogério Lobato, agora preso, como vice-presidente da Fretilin?
Mari Alkatiri: Quando ele foi nomedo, ainda não tinha sido indiciado. Até ao julgamento, existe presunção de inocência. Então, assim será.
Visão: Quais os danos para Timor desta crise?
Mari Alkatiri: Perdemos anos de trabalho, em três meses. Agora, é preciso encontrar uma plataforma de entendimento nacional. O Estado tem de assumir que aconteceu uma falha no sistema.
Visão: Como é que se recuperam instituições, como as forçar armadas ou a polícia, profundamente divididas, nesta crise?
Mari Alkatiri: Primeiro, tem de se definir novos critérios para a sua reconstrução. Segundo, tem de se saber o que faz cada uma delas. Terceiro, tem de se desarmar a população e armar apenas, e só o estritamente necessário, essas duas instituições. É importante, no entanto, dizer que esta crise não as afectou apenas a elas. Todo o Estado foi atingido e serão precisos muitos anos de trabalho, dedicação e, sobretudo, modéstia para o recuperar.
Visão: Timor precisa de uma força internacional no terreno?
Mari Alkatiri: Concordo que, pelo menos, durante um ano, deva existir uma força da ONU, com uma componente policial mais substancial do que a militar. Não tenho dúvidas de que Portugal terá um papel importante nas duas.
Visão: E na discussão diplomática?
Mari Alkatiri: Essa é outra questão. Já se provou, no passado, a importância da diplomacia portuguesa, ao criar uma dinâmica institucional própria em conjunto com a CPÇP e assim afirmar uma outra influência…
Visão: Como vê a hipótese de adiamento das eleições?
Mari Alkatiri: Nem antecipar nem adiar.
Visão: A Fretilin pode ganhar num novo acto eleitoral?
Mari Alkatiri: Esta crise foi criada para não permitir a vitória do partido. Mas não tenho dúvidas de que vamos ganhar, mesmo com os prejuízos que nos provocou.
Visão: Com a sua demissão, quem vai gerir a pasta do petróleo?
Mari Alkatiri: Depende do próximo primeiro-ministro. Estamos em negociações com as companhias. São discussões mais complexas e delicadas do que as de Estado a Estado.
Visão: Esta crise poderá ter a ver com essas negociações?
Mari Alkatiri: Não sei. A verdade é que onde há petróleo, há problemas.
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