domingo, fevereiro 25, 2007

"Não houve fogo indiscriminado", diz ISF

Díli, 23 Fev (Lusa) - O comandante das Forças de Estabilização Internacionais (ISF) em Timor-Leste afirmou hoje que "não houve fogo indiscriminado" no campo de deslocados do aeroporto de Díli, versão contestada pelos refugiados ali instalados.
Hoje, pouco antes das 09:00 locais (zero horas em Lisboa), "as ISF responderam a distúrbios" junto ao aeroporto e abriram fogo sobre civis timorenses, provocando um morto e dois feridos graves.


"Apenas dois soldados dispararam" durante a operação, declarou o brigadeiro Mal Rerden, das Forças de Defesa Australianas e comandante dos efectivos australianos e neozelandeses que integram as ISF. "Isso prova que os nossos soldados mostraram grande contenção", insistiu o comandante das ISF numa conferência de imprensa realizada após uma reunião sobre segurança com o primeiro-ministro, José Ramos-Horta, e oito horas depois do tiroteio no campo de deslocados.

Os deslocados do campo do aeroporto contam uma versão bastante diferente dos acontecimentos e acusam as ISF de terem iniciado os confrontos.

Diferentes residentes do campo repetiram ameaças aos australianos em Timor-Leste.

O civil morto pelas ISF era Jacinto Soares, um estudante da Universidade de Timor-Leste, oriundo de suco Laruca, subdistrito de Ossú, distrito de Viqueque, disseram à Lusa coordenadores do campo de deslocados e familiares da vítima.

Jacinto era casado. A viúva, a residir numa aldeia de Ossú "porque está grávida", foi informada durante a manhã de hoje da morte do marido, através de um telefonema feito por um dos irmãos de Jacinto, "soldado das F-FDTL", as Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste, de acordo com os testemunhos recolhidos pela Lusa.

"Os australianos arrastaram o corpo do Jacinto para fora do campo", contou um ex-coordenador do campo, José Gusmão, porta-voz dos cerca de 8 000 deslocados que vivem em três instalações na periferia do aeroporto internacional de Díli.

O brigadeiro Rerden, na versão oficial repetida pela missão das Nações Unidas (UNMIT), declarou que os seus soldados intervieram para sanar um distúrbio à ordem pública e foram atacados com lanças metálicas.

"Lanças e catanas são potencialmente armas letais", sublinhou o brigadeiro, "e já vimos muitos timorenses serem mortos com estas armas". "As ISF responderam a um incidente em que pessoas estavam a apedrejar carros na estrada" do aeroporto, acrescentou o brigadeiro, que falou com tradução simultânea em tétum feita por um soldado australiano. "Os soldados das ISF operam segundo regras muito rigorosas", sublinhou Mal Rerden, explicando que "essas regras permitem aos soldados das ISF defenderem-se a eles e a outras pessoas que estiverem sob sua protecção".

Dentro do campo, depois do incidente, vários deslocados contaram à Lusa que o apedrejamento começou em resposta à perseguição e agressão, dentro dos portões do campo, de um jovem que "estava à espera de transporte" na rotunda do aeroporto, onde se situa uma das entradas do centro de refugiados.

"Houve quatro soldados australianos que o chamaram", segundo um deslocado ouvido pela Lusa. "Ele começou a correr para dentro do campo e os soldados vieram atrás dele, apanharam-no, deitaram-no ao chão e deram-lhe coronhadas". "Foi por causa disto que as pessoas do campo começaram a atirar pedras aos australianos", contou a mesma testemunha.

A situação, ainda segundo o mesmo relato, piorou rapidamente "com lançamento de gás lacrimogéneo e, depois, de vários tiros". "Os ISF dispararam contra os civis fazendo pontaria de joelho no chão", disseram vários deslocados.

Segundo estas fontes, dois veículos blindados de transporte de tropas forçaram o portão sul e entraram no campo, tendo o corpo de Jacinto Soares sido inicialmente colocado num destes blindados das ISF.

Juntamente com o cadáver foi levada uma outra vítima, com "o peito furado por uma bala", em estado tão crítico que José Gusmão pensou que "havia dois mortos".

O ferido mais grave foi levado para o hospital central e sujeito a uma intervenção cirúrgica de emergência.

A calma regressou ao campo depois de a situação ter sido controlada pela UNPol e pelas unidades policiais autónomas, incluindo soldados do subagrupamento Bravo da Guarda Nacional Republicana portuguesa.

O aeroporto internacional, que foi fechado ao início da manhã pelas ISF e para onde fugiram muitas mulheres e crianças, foi reaberto ao tráfego normal - os dois únicos voos comerciais diários.

Junto ao arame farpado, no local onde caiu Jacinto Soares, os deslocados acenderam velas e montaram uma tenda "para a chuva não levar o sangue".

"O Jacinto não fez nada. Estava a cavar uma vala para desviar a água da chuva quando os australianos atacaram", acusam os coordenadores do campo. "As ISF continuarão a responder a situações ilegais como o apedrejamento de carros", afirmou o brigadeiro Rerden no encontro com a imprensa. "Os dois soldados que dispararam, depois de terem sido questionados, vão voltar aos seus deveres normais", informou ainda o comandante das ISF.

PRM Lusa/Fim

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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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