Diário Económico, 3/12/07
Por Pedro Rosa Mendes
1. Timor-Leste está como a sua meteorologia. Altas temperaturas e dias sufocantes adivinham borrasca.
Vai ter início hoje, 3 de Dezembro, o julgamento de Alfredo Reinado. Um dos crimes por que o major vem acusado, o mais grave, é o de rebelião. Outro, o de posse ilegal de material de guerra. Também por crime de homicídio.
Alfredo Reinado vai ser julgado segundo a legislação de um país e de um regime – a Indonésia de Suharto – que valorizava (e protegia) mais o Estado do que a vida humana. Não é apenas a ordem jurídica anterior a 1999 que sobreviveu à independência timorense. Em Timor-Leste continua hoje a “vigorar” uma ordem moral invertida, típica de um contexto de resistência, em que a dissidência é um acto patriótico e a obediência é, afinal, uma forma de cobardia.
Xanana sabe-o, porque foi essa a resiliência timorense.
Esta distopia moral representa o mesmo: uma sabotagem da cidadania e, portanto, o desprezo pela coisa pública.
A geração de Xanana insiste em mostrar um caminho à geração de Reinado. A geração de Reinado não rejeita apenas seguir por esse caminho; nem sequer aceita calçar os sapatos da geração de Xanana. Ficam-lhe, aliás, largos.
A geração da luta e a geração integrada partilham, hoje, apenas um valor forte entre si: o desafio, a insolência, a fúria fácil, em suma, a rebeldia. Um detalhe perigoso: a nova rebeldia privilegia a atitude em detrimento da causa.
Reinado sabe-o.
2. Em ditadura, a rebeldia criava heróis. Em democracia, cria foras-da-lei. Uns e outros disputam hoje, contudo, uma legitimidade única e una.
Com a parada militar de há uma semana, Alfredo Reinado fez o seu primeiro xeque-ao-rei: preencheu, em Ermera, com centenas de peticionários das Forças Armadas, o vazio criado pelo próprio Xanana Gusmão, uma semana antes, em Aileu.
O primeiro-ministro convocara os 592 peticionários para uma reunião. Apareceram apenas 20.
Como é caso de escola, o vácuo expandiu-se. Primeiro, na retórica. Esta semana, Reinado e Gastão Salsinha escreveram ao secretário-geral da ONU. Pediram-lhe que mediasse um “acantonamento” para solucionar o “conflito militar timorense”.
A “zona”, mesmo que apenas mental, cresce – no medo.
Díli, entretanto, é uma favela retalhada por 53 campos com 30 mil deslocados internos, onde a situação humanitária apodreceu ao ponto de constituir também a principal preocupação de segurança.
Em surdina – nas agências internacionais, no Governo, na população, até na Igreja -, cresce um cansaço e um ressentimento inverosímil com uma franja dos deslocados. É a impaciência com os deslocados que politizaram a sua tragédia. E com os que traficam às claras o que lhes é oferecido. Ou os que escolhem entrar nos campos para alugar as suas casas a estrangeiros. É, enfim, um ressentimento com a intolerância da desgraça.
Vários campos de deslocados multiplicam, em Díli, outras “zonas” onde se expandem bolsas de ingovernabilidade. O magnetismo dos campos sobre uma larga juventude sem emprego, numa cidade dividida pela territorialidade dos grupos de artes marciais, completa a bomba-relógio.
A tudo isto, o sistema revela uma aflitiva incapacidade de resposta. O último sinal, preocupante, veio da Presidência da República, que, a bem das “negociações” com Reinado, fez fogo sobre o juiz português que insiste na via judicial, num comunicado caceteiro e xenófobo.
Das Nações Unidas, por fim, não se esperam milagres. A delegação do Conselho de Segurança que esteve em Díli mostrou uma ignorância que irritou até as chefias da missão internacional em Díli.
3. Na primeira queixa no seio das Forças Armadas, em Janeiro de 2006, os signatários eram 159. Dias depois, na primeira manifestação, eram já 418. Depressa ficaram 592. Xanana Gusmão tem dito que “Alfredo é Alfredo, peticionários são peticionários”. Ainda é verdade. Mas é no mato, hoje como ontem, que se forjam solidariedades novas entre os homens.
terça-feira, dezembro 04, 2007
Estação das chuvas
Por Malai Azul 2 à(s) 21:50
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Traduções
Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006
"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
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