quinta-feira, dezembro 11, 2008

O homem pragmático, voz internacional da Indonésia e que terminou amigo de Timor-Leste

*** António Sampaio, da Agência Lusa ***

Lisboa, 11 Dez (Lusa) - Ali Alatas, durante anos a voz internacional da política indonésia sobre Timor-Leste, foi sempre visto, pela maioria dos timorenses, como um homem pragmático cuja posição política pessoal desaparecia sob o peso do regime de Suharto.

Ele próprio, em Timor-Leste, na primeira visita que efectuou a Díli depois da independência do país, admitiu por um lado que nunca viu nenhum dos líderes timorenses como “inimigo” e que serviu a Indonésia e não os seus líderes.

“Durante mais de 45 anos no governo tentei servir o governo e não alguém em particular”, sublinhou, numa visita onde o pragmatismo se misturou com o “real politik” e os esforços, mais ou menos conseguidos de esquecer o passado.

Na altura, apresentando o anterior chefe da diplomacia indonésia, o próprio Xanana Gusmão desafiava os timorenses a “beneficiarem” da presença de Alatas: “um diplomata de reconhecido talento mas que teve a ingrata tarefa de defender o dóssier de Timor-Leste, quando servia um regime contrário às aspirações” do povo timorense.

Uma tentativa clara de distinguir Ali Alatas, diplomata, de Ali Alatas representante da ocupação indonésia, como explicou na altura José Ramos Horta, ironizando.

“Foi um extraordinário diplomata. O único problema é que estava a servir o lado errado”, disse, provocando risos de Alatas e da plateia.

Numa entrevista à Lusa, feita nessa altura, o próprio Alatas admitia a dualidade da sua posição, admitindo estar feliz com a independência mas triste com a violência que marcou essa conquista.

Uma longa conversa em que se referiu também às negociações com Portugal, considerando Durão Barroso, então ministro dos Negócios Estrangeiros, o seu mais duro adversário português.

“O período mais duro, talvez pelas circunstâncias na altura, tenha sido com Durão Barroso. Nessa altura as nossas posições eram totalmente contrárias uma à outra”, admitiu, referindo porém que “os compromissos, de ambos os lados, vieram no período de Jaime Gama”.

Ali Alatas disse estar “triste” pela violência que marcou o processo do nascimento de Timor-Leste, manifestando, ainda assim, optimismo no futuro.

“Sinto tristeza por este processo ter sido acompanhado por tanta violência, tantas vítimas. É algo que não podia corrigir, porque era ministro dos Negócios Estrangeiros e o meu papel era negociar”, afirmou.

“Tentei negociar a melhor solução possível, e os resultados são conhecidos. Sinto-me feliz pelo povo de Timor-Leste mas desejo que tivesse sido sem tanto sofrimento”, comentou.

Para Ali Alatas, não se tratou de perder “uma batalha”, já que enquanto diplomata indonésio - e desde 1983, quando primeiro pegou no processo - sempre procurou “uma solução pacífica” para o problema de Timor-Leste.

“Fui destacado para chefiar o diálogo com o lado indonésio, e enfrentei três ministros portugueses. Tudo o que tentámos foi um compromisso pacífico”, recordou então.

Uma solução que acabou por ser encontrada mas que para Ali Alatas - e ele acreditou sempre nessa alternativa - poderia ter surgido sem a onda de violência que marcou a transição.

“Fiz o que os meus homólogos fizeram, defender as políticas dos nossos países. Mas ambos partilhamos um sentimento de que talvez com melhor diplomacia de ambos os lados, com mais tempo de ambos os lados, poderíamos ter menos sofrimento”, disse.

“Penso que poderíamos ter encontrado uma melhora solução. Sempre temi que quem perdesse não iria aceitar muito bem o que aconteceu. Estava convencido de que precisávamos de mais tempo, de mais negociações, para conseguir uma solução pacífica em vez de um choque político como um referendo”, afirmou.

Conhecido em todo o mundo como a face da política indonésia em Timor-Leste foi regularmente insultado, criticado e condenado pela resistência timorense e pela solidariedade internacional.

De entre as muitas frases célebres do “megafone internacional do ditador Suharto” - como foi apelidado pelos timorenses -, uma das que mais rapidamente se tornou slogan da resistência, data de meados dos anos 90, quando considerou Timor-Leste “uma pedra no sapato” da Indonésia.

Na entrevista à Lusa explicou que a frase não pode ser tirada do contexto, traduzindo apenas o facto de que, ao contrário do que os opositores de Jacarta pensavam, Timor-Leste era, internamente, um assunto de menor importância para a Indonésia.

“Os meus oponentes viam a questão de Timor-Leste como se fosse tão grande na Indonésia como era em Portugal. Quando disse que só era uma pedra no meu sapato nunca pensei que se transformaria em manchete no mundo todo”, comentou, rindo.

E ainda que a independência de Timor-Leste tenha sido uma derrota política para a Indonésia, Alatas adoptou desde então uma postura mais conciliatória e pragmática, negando até que o problema no território lhe tenha danificado a carreira internacional.

Considerou, por exemplo, que sempre houve algum exagero nos que sugeriram que Timor-Leste o impediu de assumir as rédeas das Nações Unidas.

“Foi uma possibilidade de que se falou, mas uma possibilidade que não era realista. Mesmo sem Timor-Leste seria muito difícil para um país como a Indonésia ter um secretário-geral na ONU que prefere países mais pequenos, neutrais”, disse.

A última conversa de Ali Alatas com a Lusa foi em Janeiro deste ano, altura em que o seu ex-chefe, Suharto, estava doente e o país “suspenso” à espera do que acontecia.

Na explicação sobre os sentimentos dos indonésios relativamente a Suharto, parece haver um toque autobiográfico: “Todos os líderes têm as suas forças e as suas fraquezas. Com o tempo ambas são reconhecidas. Mas há sempre um período sensível, especialmente em momentos como este em que o líder está gravemente doente”, disse à Lusa em Madrid.

Ali Alatas morreu hoje aos 76 anos, uma semana após ter sofrido um ataque cardíaco.

Foi o chefe da diplomacia indonésia de 1988 a 1999. Mais tarde, Ali Alatas foi nomeado representante permanente nas Nações Unidas e, mais recentemente, era conselheiro do Presidente Susilo Bambang Yudhoyono.

ASP
Lusa/Fim

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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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