domingo, dezembro 02, 2007

Sobre as razões de Ramos-Horta...

Acho que há aqui uma certa confusão.

Quem condenou os militares assassinos não foi um "juíz português", "juíz internacional", etc.

Foi um tribunal timorense, representado por três juízes, dos quais dois são timorenses. A sentença é, pois, da responsabilidade desse colectivo de 3 juízes.

Na sentença elogia-se o comportamento dos réus, porque todos os seus actos até ao julgamento contam para o mesmo, para o bem e para o mal. Nela se refere o respeito pelo tribunal, porque este órgão de soberania representa o povo na aplicação da Justiça. Está escrito na Constituição (ver sublinhado no Nº 1 do Artº 118, em baixo).

Para além disso, o Estado pôde livremente acusar e os advogados puderam livremente defender os seus constituintes, num julgamento que mereceu elogios de observadores internacionais.

Foram ouvidas mais de 120 testemunhas, incluindo o Cor Fernando Reis, que identificou os autores dos disparos. Ele próprio viu tudo acontecer ao vivo e a cores, melhor do que no YouTube... ia morrendo também. E outros funcionários da ONU foram feridos.

Não tenho conhecimento de ninguém ou alguma entidade que tenha posto em causa a isenção ou legalidade deste julgamento: nem Xanana, nem Ramos Horta, nem a UNMIT, nem organizações privadas.

Portanto, se os militares foram "sem dúvida" comandados, a(s) pessoa(s) que têm essas certezas devia(m) ter falado durante o julgamento e informado o Ministério Público e os advogados de defesa, a bem da Justiça.

"Este género" de Justiça, bem ou mal, é da exclusiva responsabilidade dos tribunais. (v. Artº 118, Nºs 1 e 3, e Artº 121, Nº 2, da CRDTL). Mas se alguém quiser mostrar melhor serviço, que tire o curso de Direito e o de magistratura e candidate-se. Pode ser que consiga uma vaga, quando os juízes "internacionais" se forem embora.

Enquanto isso não acontecer, cada macaco no seu galho.

Quanto às intenções de Ramos Horta quando deu ordem a Hutcheson para não cumprir o mandato judicial, elas podem ser as melhores possíveis, embora eu tenha dúvidas. Por um lado, ele justifica essa ordem dizendo que quer evitar mortos, sangue, etc. Mas não foi ele que justificou os mortos e feridos no campo de refugiados do aeroporto causados por balas australianas, dizendo que "se há acção, tem que haver reacção"?

Então em que ficamos? ou RH quer evitar derrame de sangue e manda parar as incursões dos australianos nos campos de refugiados, tal como mandou parar a captura de Reinado, ou então, se não se importa com a "reacção" dos malais no aeroporto, também não se deve importar se houver "reacção" contra Reinado. Para mim, isto é uma grande incoerência do PR, ou, como diriam os nossos vizinhos, "kepala dua".

Essa incoerência não terá a ver com o facto de Reinado ter recentemente dito que só se entrega à Justiça se Xanana e Ramos Horta forem também julgados? Não estará aqui a verdadeira explicação para RH ter mandado parar as operações de captura de Reinado?

Eu também não quero mais sangue derramado em Timor e já lamentei os 5 mortos em Same.

Mas não arranjemos bodes expiatórios, culpando o juíz Ivo Rosa, pois ele nunca mandou disparar contra ninguém. Só cumpriu a Lei timorense, mandando capturar aqueles que estavam presos e se evadiram da prisão, para poderem ser julgados no próximo dia 3. Se é com tiros ou sem eles, isso dependerá das forças de segurança e de Reinado. Especialmente deste, pois só dispararão contra ele se ele disparar primeiro.

Há duas maneiras de resolver a questão: a bem ou a mal. A bem, se Reinado se entregar voluntariamente. A mal, se este não acatar as ordens do tribunal. Portanto, a decisão está nas mãos dele. Foi ele que criou este problema, evadindo-se e ameaçando o Estado, portanto a responsabilidade do que acontecer será também dele.

Sejamos objectivos: como é possível que 1000 homens, com blindados, helicópteros, mísseis, artilharia, satélites, aviões espiões e escutas telefónicas, não consigam capturar 15 foragidos, só com algumas metralhadoras? Rai Los não foi capturado sem problema? Nas Filipinas, há dias, um grupo bem mais numeroso de militares revoltosos foi facilmente dominado...

A não ser que haja alguém pouco interessado em que Reinado diga tudo o que sabe. Se ele exige o julgamento de Xanana e Ramos Horta, por alguma razão será. Então compreende-se que alguém tente evitar a todo o custo que Reinado esteja presente no tribunal, no dia 3 de Dezembro.

Relembremos as declarações de Reinado em entrevista à Lusa [28-2-2007]:

"O senhor Xanana e o senhor Horta não queriam que isto fosse dito. Porquê fazer isso? É só propaganda, só mentiras.
[...]
Penso que a razão desta acção [ataque em Same] é porque me querem abater.

Querem fechar-me a boca, não querem que diga a verdade
[...]


Hakoak
Henrique

4 comentários:

Margarida disse...

Transcrição por não estar on-line:

Juízes enviados para Díli põem Portugal em tribunal
Expresso, 1 de Dezembro de 2007
Por Micael Pereira
Rui Teixeira, juíz do caso Casa Pia, foi o primeiro a deixar de receber ordenado por ir como magistrado em missão de cooperação.

Dois juízes que estiveram em Timor como cooperantes vão pôr o Estado português em tribunal por se sentirem lesados pelo Ministério da Justiça, podendo ser secundados por outros colegas ainda em missão.
A primeira acção judicial está prevista para as próximas semanas pela Juíza Teresa de Sousa, colocada em Timor de Abtil de 2006 a Julho de 2007, e será patrocinada pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), que também decidiu boicotar a divulgação de novas candidaturas para magistrados internacionais. O boicote ameaça desequilibrar o fráfil sistema judicial de Timor, que corre o risco de ficar sem um único juíz português já a partir de Janeiro, numa altura em que os magistrados timorenses ainda não conseguem assegurar o funcionamento dos tribunais e em que o sistema legal é replicado do modelo português.

Os Juízes enviados para Díli ao abrigo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) deixaram em 2006 de receber os vencimentos e de lhes ser garantidos os descontos para a segurança social, considerando que estão a ser discriminados em relação ao resto dos cooperantes portugueses no território – professores, militares, médicos -, que nunca viram ser postos em causa essas regalias.

Teresa de Sousa diz que o corte dos vencimentos é “um gesto manifestamente persecutório” do estado em relação aos juízes, tendo decidido recorrer aos tribunais no momento em que percebeu que os militares colocados em Díli mantêm o vencimento e as regalias em Portugal a par do pagamento da ONU, “como, aliá, tem acontecido sempre quando está envolvido o interesse nacional”.

O problema começou com Tui Teixeira, o juíz do processo Casa Pia. Ao chegar a Timor em Abril de 2006, Rui Teixeira constatou que não lhe pagavam. Agora, aguarda apenas uma resposta oficial do secretário de Estado da Justiça, a confirmar a decisão de não pagamento dos ordenados pela Direcção-Geral da Administração da Justiça, para processar também o estado. “No meu contrato dizia que mantinha as regalias que tinha no país de origem”.

“O Estado tem de ser uma pessoa de boa fé. Como é que se composta de maneira diferente para situações iguais?”, argumenta António Martins, presidente da ASJP, dando o exemplo de um juíz português colocado na Bósnia ao abrigo do PNUD e que não está a ter os mesmos problemas. “Há uma inversão do que tem sido a prática em Timor, onde até 2006, e ao longo de anos, os juízes receberam sempre os vencimentos”.

Anónimo disse...

12 anos para quem matou cobardemente gente desarmada e sob a protecção das Nações Unidas. Dá vontade de chorar de raiva. Enfim, a história desse sangrento 25 de Maio de 2006 ainda está por desvendar e contar ao Mundo.
O à vontade e os sorrisos que os assassinos demonstraram no cruzamento onde se encontravam já antes da emboscada nada fazia prever que iriam disparar. Foi de um cinismo e de uma crueldade incrível.

Anónimo disse...

Para Jose Horta nao e uma historia nova tinha saido da Fretilin nos anos 80 para fazer aquilo que queria. Na luta externa fazia o que apeticia aqueles que trabalharam com ele eram paus mandados fazia o que ele mandava.Com a presidencia tenciona um poder absoluto nao ha ninguem que o apoio o padrinho John Howard perdeu as eleicoes e este que ele estava as penduras com o apoio das tropas australianas tudo este jogo e dele levando tambem o Xanana para o abismo.Estas manobras vao ser desmacaradas com o tempo talvez sera o Alfredo conhece lhe bem fizeram de Timor Leste dum ninho so para os dois.

Anónimo disse...

Irmao Katuas, sou tao katuas como tu e as experiencias da vida ensinaram-nos muita coisa.Eu nao teria sabido por em palavras o que eloquentemente escreveste, mas ao escrever estas palavras ainda choro de dor, pensando como seres humanos sao capazes de balear os seus semelhantes da forma mais cruel e animalistica! Deus esta para julgar e dar as sentencas justas ja que os homens nao o fazem. Obrigado Katuas por expressares tao bem o que vonha sentindo sem saber como expressar as minhas dores. Quando um avanca em idade quer evitar a todo o custo ter dores de coracao

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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