quinta-feira, agosto 23, 2007

Se Rudd for PM é um bom augúrio para o Pacífico

Tradução da Margarida:

The Nation (Papua Nova Guiné) – Quarta-feira Agosto 22, 2007
Por Dr Tim Anderson

Que diferença trará a eleição do líder do Labor Kevin Rudd, como próximo primeiro-ministro da Austrália, para os seus vizinhos do Pacífico? Haverá mudanças significativas ou apenas mais do mesmo?

Ao contrário das por vezes tumultuosas mudanças democráticas noutros sítios, as eleições Australianas são assuntos calmos. Mas sondagens consistentes dizem-nos que está prestes a ocorrer em Canberra uma versão limitada de “mudança de regime” .

A equipa de Rudd “vendeu-se” a si própria com sucesso, e os grupos de investimentos, companhias mineiras e media corporativa que dominam a política Australiana – apesar do seu anterior apoio acrítico ao primeiro-ministro John Howard – aceitam de um modo geral a mudança proposta. O magnata dos media Rupert Murdoch deu-lhe mesmo a sua benção pessoal depois de Rudd o ter visitado em Nova Iorque.

Não foi pequeno o papel que jogou no sucesso da equipa de Rudd a brutalidade do opositor.

Era difícil manter a legitimidade doméstica face às privatizações impopulares, guerra sangrenta, política racista com imigrantes e refugiados, e ataques domésticos a direitos civis e industriais.

Não é bonita a semelhança da herança do Pacífico

Ao mesmo tempo que pregava “boa governação” e segurança na região, a intervenção e a corrupção foram marcas da administração Howard.

A intervenção regional esteve ligada a interesses comerciais e estratégicos, mas explicada em nome de “estabilidade” e “assistência”.

A intervenção Ramsi nas Ilhas Solomão, apesar de ter sido inicialmente por convite, levou a um novo colapso nas relações entre os governos Australianos e das Ilhas Salomão.

A intervenção de 2006 em Timor Leste, no seguimento de um longo conflito sobre rendimentos do petróleo e do gás, afrontaram o maior partido político.

A Fretilin agora na oposição, acusa a Austrália de apoiar um golpe.

E o planeado Programa de Cooperação Reforçada para a Papua Nova Guiné (PNG) entrou em colapso depois de o Tribunal Supremo da Papua Nova Guiné ter descartado as imunidades inconstitucionais que procuraram obter para funcionários Australianos.

Sob o patrocínio de Alexander Downer dos negócios estrangeiros e comércio, o Australian Wheat Board (AWB) pagou pessoalmente perto de A$300 milhões em subornos ao regime de Saddam Hussein, para assegurar no período pré-invasão, contratos de trigo.

Como mostrou uma investigação oficial, depois Downer defendeu o caso da participação Australiana na invasão ilegal do Iraque, com a base de que o apoio para a guerra liderada pelos USA beneficiaria “a posição comercial da Austrália no Iraque”.

O que aconteceu é que a revelação do escândalo da AWB permitiu que os USA pressionassem completamente os fornecedores de trigo Australianos para fora do mercado Iraquiano.

Líderes vizinhos foram tratados com desprezo.

Quando o Primeiro-Ministro da PNG Sir Michael Somare foi forçado a descalçar os sapatos no aeroporto de Brisbane, Downer afirmou que era uma “operação vulgar” que se aplicava a “toda a gente”.

Contudo, quando o vice-presidente dos USA Dick Cheney chegou à Austrália, mudaram as leis do Estado do dia para a noite, a pedido de Howard e Downer, para possibilitar que os guarda-costas de Cheney usassem as suas armas através do aeroporto e nas ruas de Sydney.

Depois quando o primeiro-ministro das Ilhas Salomão, Manasseh Sogavare tentou nomear o advogado Australiano Julian Moti como Procurador-Geral, Canberra e a polícia federal Australiana decidiram marginalizar Moti com acusações de que se tinha engajado em sexo com crianças em Vanuatu.

De facto, Moti tinha sido inocentado de todas as acusações e não era procurado em Vanuatu. O seu crime verdadeiro, parece, foi ter aconselhado uma investigação ao papel da polícia Australiana nos distúrbios de Abril de 2006 em Honiara.

Quando Moti passava em Port Moresby, o Governo da PNG não alinhou com um pedido de extradição Australiano e optou por deportá-lo para as Ilhas Salomão, Howard e Downer viraram-se depois contra o Governo da PNG.

Com um historial destes, a maioria dos Australianos e os seus vizinhos do Pacífico estão desejosos de ver as costas de Howard.

Na verdade, a mudança de regime em Canberra no mínimo traz a perspectiva de algumas caras novas, e talvez de uma mudança de tom na conversa.

Rudd e o seu ministro sombra dos negócios estrangeiros Robert McClelland podem bem dar um passo atrás no racismo visível que caracterizou o regime Howard-Downer, que disse descaradamente aos governos vizinhos o que era bom para eles.

Esta mudança de tom pode vir a reflectir-se nalgumas mudanças políticas actuais, por exemplo no regresso no ensino de línguas Asiáticas em escolas Australianas, e num aumento de bolsas de estudo da AusAID.

Rudd tem falado de um “Plano Colombo do Pacífico”, sugerindo números significativos de bolsas de estudo.

Também indicou um aumento planeado do orçamento da AusAID, de 0.3% para 0.5% do PIB para 2015-16.

A maior parte disto, como sabemos, regressará como “ajuda bumerangue” para a meia dúzia de companhias Australianas que são as “contratadoras preferidas” da AusAID.

Apesar disso, o dinheiro da ajuda é claramente um meio central por meio do qual Rudd espera salvar a influência Australiana. Ele reconhece os estragos que Howard tem provocado, ao falar de um “movimento a longo prazo na postura estratégica da Austrália nesta região” e ao expressar um desejo de controlar o “anti-Australianismo” e de evitar “intervenções militares caras”.

O que é que isto na prática pode significar?

Pode incluir aumento da intervenção.

O partido de Rudd fala agora de uma “retirada por estágios” de tropas do Iraque, mas um aumento no Afganistão e no Pacífico, incluindo possivelmente Timor-Leste.

O orçamento da Polícia Federal Australiana no Pacífico já quase que excede o seu orçamento doméstico, mas Rudd prometeu-lhe ainda mais recursos.

Será visada a ajuda na educação. Rudd seguirá provavelmente Howard nos planos para aumentar as bolsas de estudo para Timor.-Leste, agora que as tropas Australianas ajudaram a marginalizar a Fretilin.

Devido às relações geladas de Howard com o governo de Alkatiri, as bolsas de estudo para universidades Australianas para estudantes Timorenses caíram de 20% por ano para apenas 8% por ano. Podem aumentar agora.

McClelland, que será o provável novo ministro dos estrangeiros num governo de Rudd, tem falado do desejo do Labor de treinar “uma nova geração de jovens líderes” de Timor-Leste, PNG,Ilhas Salomão e Fiji, mais leais à Austrália.

Isto traz-nos de volta às continuidades entre Howard e Rudd. Podemos esperar que como primeiro-ministro Rudd continue a apoiar as companhias mineiras Australianas e a trabalhar contra competidores potenciais, no Mar de Timor e na PNG.

Será hostil a planos para desenvolver capacidades de processamento de gás em Timor-Leste e na PNG, se não estiverem envolvidas companhias Australianas.

Rudd provavelmente continuará a oposição de Howard e Downer a programas de treino de saúde e à saúde Cubana na região, mas a oposição manter-se-à em privado porque a Austrália não consegue competir.

Timor-Leste já tem um dos sistemas de saúde de mais rápido crescimento do mundo, graças largamente à generosidade Cubana.

As relações com a China são de outra categoria por causa do seu poder económico.

Rudd, que fala Chinês, tem dito que procurará um maior engajamento com a China e que ao mesmo tempo manterá a aliança forte com os USA.

Uma outra continuidade mais, será o apoio de Rudd ao “mercado aberto” ou à abordagem da agricultura orientada para a exportação .

Isto é ditado pelas ambições globais dos negociantes agrícolas Australianos.

Nesta base, a Austrália recusou ajudar a reconstruir a produção de arroz de Timor-Leste depois de 1999, mesmo apesar de não vender arroz a esse país.

A Austrália tem exportações substanciais de arroz para a PNG, e tipicamente não apoia programas da semente mais importante.

Um governo Labor liderado por Rudd não será rápido a meter-se na questão dos “trabalhadores migrantes”, por causa de receios dos sindicatos.

Um atalho possível pode vir para trabalhadores especializados no sector mineiro.

A solução mais simples, obviamente, será estender aos jovens do Pacífico os vistos aos viajantes de mochila agora oferecidos aos jovens “turistas trabalhadores” de países mais ricos como Grã-Bretanha, Alemanha e Coreia do Sul.

Contudo o racismo residual no sistema de imigração Australiano pode tornar isto difícil.

Como diz Rudds, ele “escutará” o que diz a região.

Em relação a isto, o seu passado como diplomata e linguista dá-lhe alguma vantagem.

Contudo sendo um tecnocrata – que choraminga mais contra os métodos do que contra os objectivos de Howard – pode ser esperado que mantenha o apoio a todos os interesses comerciais importantes e estratégicos apoiados por Howard.

A pressão e influência provavelmente será menos grosseira e menos pública, mas de certo modo mais guiada pelo livro de cheques e mais “sala dos fundos”.

Nota: O autor é um professor académico senior de Economia Política na Universidade de Sydney

Sem comentários:

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
This is my blogchalk: Timor, Timor-Leste, East Timor, Dili, Portuguese, English, Malai Azul, politica, situação, Xanana, Ramos-Horta, Alkatiri, Conflito, Crise, ISF, GNR, UNPOL, UNMIT, ONU, UN.