domingo, junho 17, 2007

Dos Leitores

Comentário na sua mensagem "Estratégia de defesa deverá ser orientada para o m...":

COMENTÁRIO AO ARTIGO DO AUSTRALIAN NEWS (08JUN07)
“Plano de Defesa Irrealista” – “Plano Secreto de Mísseis”

Introdução

O presente comentário é referido ao artigo publicado em 08JUN07 pela edição electrónica do jornal “The Australian” com o título “Secret Missile Plan for East Timor” e que no vosso Blog aparece sob o titulo “East Timor Military Blueprint Unrealistic: Downer”.

Sei que o Blog “Timor Online” é de reconhecida isenção na forma como relatam as noticias e no entendimento do que deve ser um órgão de comunicação social, cujo principal objectivo é informar (transmitir o que se passa e não o que se houve dizer), o que não significa abdicarem da linha editorial assumida.

Sou um timorense naturalizado australiano, que vive há alguns anos em Camberra. Felizmente tenho uma boa rede de amigos em diversos sectores da sociedade timorense, portuguesa e australiana e, por isso, tenho acompanhado muito de perto a crise que se vive em Timor-Leste

Depois do artigo que li não resisti a fazer o meu comentário, que poderá não ser aprovado pelo autor do Blog correndo o risco de não vir a ser publicado. No entanto, foi a forma que encontrei de tentar dar o meu contributo para o esclarecimento da opinião pública timorense e internacional. Sei que o comentário é um pouco extenso, por isso o divido em três partes: análise do artigo, o modelo de Forças Armadas para Timor-Leste e a relação entre a estratégia australiana e a crise politico-militar que se instalou em Timor-Leste. Depois da Parte III tenciono apresentar uma compilação das referências públicas de Xanana Gusmão e do actual Presidente da República (Ramos Horta).

PARTE I

Análise do artigo

Alguns media australianos não passam de “caixas de ressonância”, fazendo a ampliação dos interesses estratégicos do seu governo, através de ligações perigosas a elementos dos serviços secretos, que dessa forma vão fazendo autênticas campanhas de contra-informação ou desinformação orientada. Desde o início da crise politico-militar que essas campanhas visam desacreditar o governo timorense e o Estado de direito procurando fragilizar as instituições, através da utilização de argumentos falaciosos com objectivos e intenções de carácter duvidoso.

É dentro dos parâmetros mencionados que se enquadra o artigo de Mark Dodd publicado no “The Australian”, em que as afirmações do jornalista e os comentários do Ministro dos Negócios Estrangeiros (Alexander Downer) procuram confundir a opinião pública fazendo afirmações que não conseguem provar, pois como o Plano “Força 2020” não terá sido divulgado publicamente, entram em puras especulações, que não podem nem devem ser confundidas ou justificadas com a liberdade de imprensa.

Como é possível aquele jornal ter tido acesso a um documento do governo timorense, de carácter estratégico, se no próprio artigo refere que teve distribuição restrita? Ou estão a fazer “bluff” ou de facto, conseguiram obter o documento, através da tal promiscuidade com os serviços secretos o que não deixa de ser grave e preocupante, mas de certa forma normal em Timor-Leste (quem estiver interessado poderá analisar com mais detalhe as ligações daquele jornalista e dos proprietários do Jornal com os meios politico-militares australianos). Fui informado que o Plano foi distribuído aos Embaixadores acreditados em Timor-Leste. Esta situação deveria exigir uma intervenção enérgica dos políticos timorenses ao mais alto nível o que, estranhamente, não aconteceu e por isso vão perdendo credibilidade também ao nível internacional. No entanto, basta ter presente o que tem sido referido pelo actual Primeiro-Ministro e Presidente da República de Timor-Leste, nas suas intervenções a diversos níveis, que consideram como uma das prioridades a reforma do sector da segurança, que também é apoiada pela ONU e outros países no âmbito bilateral.

Já agora se tiveram acesso ao tal Plano seria importante lerem com atenção o Prefácio escrito pelo Dr. Ramos Horta que, de acordo com fontes do governo, considera o Plano “Força 2020” “um trabalho louvável e contributo imprescindível para o levantamento das necessidades das Forças Armadas timorenses, apontando os desafios que se lhes colocam nos tempos modernos”; Para além disso, refere expressamente que o “notável documento sobre o desenvolvimento das Forças Armadas, identifica exactamente os mesmos desafios” considerados pelo actual Presidente da República como fundamentais para que toda a sociedade timorense se empenhe na consolidação das F-FDTL como vector importante do desenvolvimento do país. Assim, talvez o Chefe de Estado possa explicar ao governo australiano que já chega de interferências e ingerências nos assuntos internos do país, pois ele próprio considera “imperativo tomar as medidas adequadas para a modernização das F-FDTL” como também terá sido escrito no referido Prefácio.

A Austrália teve oportunidade de interferir e apoiar o desenvolvimento do sector da segurança no âmbito multilateral (ONU) e bilateral; No entanto, não foi por falta de especialistas militares, altamente qualificados, que não concretizou o apoio efectivo, mas sim porque os seus objectivos estratégicos passavam por impedir a existência de Forças com credibilidade para assim poderem interferir nos processos de decisão e na soberania nacional. A ONU também falhou, como já foi assumido ao nível internacional, porque não é uma organização imparcial como seria suposto, uma vez que depende dos financiamentos de países como os EUA e Austrália e, por isso, está manietada pelos objectivos estratégicos daqueles países.

Acima de tudo interessava a fragilidade das Forças de Segurança, especialmente das F-FDTL, aproveitando esse facto para criar a instabilidade política, militar e sócio-económica, que levou à grave crise politico-militar como se vai demonstrar neste comentário.

Não deixa de ser curioso e estranha a preocupação manifestada pelo governo australiano em relação à pobreza. Pode ser considerada, no mínimo, de carácter duvidoso, pois devia corresponder a uma verdadeira solidariedade para com o povo timorense, o que até à data não aconteceu, se tivermos em conta a sua atitude e comportamento no âmbito da discussão da fronteira marítima e em relação à exploração dos recursos do Mar de Timor, que prejudicam claramente os interesses dos timorenses. Já agora não deixa de ser pertinente colocar a seguinte questão: onde esteve a solidariedade do governo da Austrália durante 24 anos de ocupação Indonésia e grande sofrimento do povo Maubere?

Neste contexto, importa ressalvar a solidariedade do povo australiano, que não pode nem deve ser confundida com as posições do seu governo, no âmbito da politica externa, que têm vindo a contribuir para o declínio da sua reputação internacional e consequente redução da influência regional. Enfim, a hipocrisia politica acabará por afectar, irremediavelmente, a credibilidade do governo australiano que não tem olhado a meios para atingir os seus fins e que, por certo, acabará por ser penalizada pela opinião pública australiana e organizações internacionais.

O Plano “Força 2020”

Tendo em conta fontes seguras ligadas ao governo timorense talvez seja importante referir os seguintes aspectos relacionados com o Plano “Força 2020”, que foram omitidos no artigo:
- O estudo que esteve na origem da formação das F-FDTL (designado “Kings College”) foi elaborado com intervenção directa dos australianos, ingleses e americanos e revelou-se perfeitamente desajustado aos interesses timorenses, não permitindo a consolidação e desenvolvimento harmonioso, equilibrado e sustentado das F-FDTL como facilmente se pode constatar após 5 anos da sua criação (os factos falam por si). Os problemas da Instituição têm origem na sua criação e na falta de apoio financeiro e de assessores por parte da ONU, influenciada pelo governo australiano, que pressionou a comunidade internacional, no sentido de não existirem Forças Armadas em Timor-Leste mas apenas uma Força Policial (a PNTL teve apoio de milhões de USD e cerca de 160 assessores);

- O Plano “Força 2020” foi elaborado por um grupo multinacional onde também estiveram incluídos militares australianos que, portanto, não foram excluídos ou impedidos de dar o seu contributo como refere o artigo;

- Não está previsto nenhum programa de aquisição de helicópteros armados ou mísseis, apenas a longo prazo poderá vir a ser constituído um grupo de helicópteros ligeiros vocacionados para as missões de interesse público, nomeadamente carácter humanitário (evacuação) e no âmbito da Busca e Salvamento;

- O vector Mar surge como a grande prioridade do país e, consequentemente, da estratégia da Segurança e Defesa Nacional o que implica o desenvolvimento da Componente Naval das F-FDTL; Neste âmbito estará de facto previsto a constituição de uma Força Naval ligeira para patrulhamento e fiscalização das águas territoriais e Zona Exclusiva Económica, onde se encontram os importantes recursos para a sobrevivência e desenvolvimento sustentado de Timor-Leste. Será que o país não tem direito a fiscalizar as suas águas territoriais como acontece com a maioria de outros países da região, nomeadamente a Austrália e Indonésia (o governo australiano pretendia que fossem os seus navios a patrulhar e fiscalizar as águas timorenses como está expresso no estudo “Kings College”, ou seja uma transferência da soberania que, pelos vistos, não preocupa muitos responsáveis políticos;

- A reorganização das unidades de Infantaria será concretizada, tendo em vista a imperiosa necessidade de as Forças Armadas se articularem em unidades de escalão mais reduzido, que permitam a sua implementação em todo o território nacional, com maior operacionalidade e capacidade de resposta, aproximando os militares das populações e da PNTL obtendo, assim, uma confiança acrescida dos timorenses. As unidades terão de ser mais vocacionadas para as acções de cooperação civil-militar e empenhamento no âmbito das operações humanitárias e de apoio à paz;

- O reajustamento do conceito de Reserva através de uma melhor integração dos veteranos será também uma das prioridades;

- A formação e gestão dos Recursos Humanos, sendo uma área crítica, são consideradas como a principal prioridade para o desenvolvimento da Defesa Militar, pelo que será analisada com especial atenção e considerada como dos principais investimentos na Estratégia de Defesa Nacional.

São estes factores que, de facto, preocupam o governo australiano e levam a considerar o Plano “Força 2020” irrealista, desenvolvendo uma campanha delineada por especialistas em contra-informação e devidamente articulada com a imprensa, no sentido de promover a descredibilização daquele Plano e desacreditar o governo que o tenciona implementar. Este tipo de intervenção não deve constituir surpresa, pois está em perfeita sintonia com a estratégia australiana estabelecida para a região, que irei abordar na Parte III deste comentário.

Alfredo Ximenes

1 comentário:

Anónimo disse...

Aguardo com bastante interesse não só a Parte III mas particularmente "a compilação das referências públicas de Xanana Gusmão e do actual Presidente da República (Ramos Horta)".

Espero que com brevidade o Alfredo Ximenes o faço pois desde já presumo que vai ser muito, muitíssimo interessante! E que talvez aqui esteja a explicação do mutismo do Xanana.

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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