NOTA INFORMATIVA
SOBRE OS PODERES DA COMISSÃO ESPECIAL DE INQUÉRITO
Tendo surgido dúvidas sobre o alcance dos poderes atribuídos à comissão de inquérito internacional referenciada, importa esclarecer o seguinte:
O exercício da acção penal, a instauração de inquéritos criminais e o julgamento de crimes são da competência única e exclusiva dos órgãos constitucionais do Estado de Timor-Leste, a começar pelo Ministério Público, encabeçado pelo Procurador-Geral da República.
A comissão especial de inquérito internacional que foi autorizada a investigar os factos violentos ocorridos em Abril e Maio de 2006 não é um tribunal nem tem poderes para acusar ou mandar abrir investigação criminal. O mandato da comissão de inquérito limita-se à investigação dos factos e ao apuramento das circunstâncias de tempo, modo e lugar da sua ocorrência. Está a investigar apenas factos, não a determinar a culpa ou a responsabilidade criminal de pessoas envolvidas na prática desses factos. Não tem competência para indiciar suspeitos da prática de crimes, mas apenas para reunir nomes, factos e provas.
Os inquéritos criminais, depois de seleccionadas as provas, são da competência exclusiva do Ministério Público, das autoridades policiais e dos tribunais de instrução criminal, após a apresentação de uma queixa ou denúncia.
Esta queixa ou denúncia, que, aqui sim, tem de identificar factos concretos susceptíveis de constituir crime e/ou pessoas suspeitas de os terem cometido, abre o inquérito criminal propriamente dito.
Se vier a ser formulada acusação contra pessoas concretas pelo cometimento de crimes baseados nos factos em causa, tem de ser observado o seguinte procedimento:
1) A comissão de inquérito internacional apresenta os resultados das investigações realizadas, indicando as circunstâncias de tempo, modo e lugar dos factos que conseguiu apurar, baseados nas provas documentais, testemunhais e periciais recolhidas, e indica, quando muito, o eventual envolvimento de pessoas.
Procedeu a uma mera investigação sobre factos e pessoas.
2) Os órgãos do Estado que recebam o relatório verificam se há factos apurados que possam constituir crime e suspeitos da sua prática e decidem se deles devem dar conhecimento às autoridades policiais ou ao Ministério Público.
Se decidirem afirmativamente, apresentam denúncia, queixa ou participação.
3) A denúncia, queixa ou participação é recebida pelo Ministério Público, cabendo a este determinar, então, a abertura de um ou mais inquéritos criminais, com base nas provas apresentadas e em função do número e tipos de crimes de que entende haver indícios suficientes.
O inquérito criminal é conduzido pelo próprio Ministério Público ou pelas autoridades policiais, embora sob a sua direcção, e com a intervenção, em certos casos, do tribunal de instrução criminal.
É aqui que começa a fase extra-judicial do procedimento criminal, através de um inquérito. Nesta fase não há acusados nem condenados, mas apenas factos e/ou suspeitos da prática de crimes. Os suspeitos só podem ser presos preventivamente em casos muito excepcionais.
4) Concluído o inquérito, o Ministério Público pode:
a) Mandar arquivar os autos, se entender que não há provas suficientes da prática dos crimes imputados aos suspeitos ou se não for possível identificá-los;
b) Deduzir acusação contra os suspeitos, passando estes a ser considerados arguidos (caso ainda não tenham sido constituídos como tal), se houver indícios suficientes de terem cometido os crimes denunciados.
5) Se houver acusação, o processo transita para o Tribunal, que, se a receber, aprecia livremente as provas apresentadas e faz o julgamento do caso.
É ao Tribunal que compete julgar e determinar a eventual responsabilidade criminal e a culpa dos acusados pela prática de crimes que lhes sejam imputados.
Se vier a ser provada a verificação dos crimes denunciados e a responsabilidade criminal dos seus autores, o Tribunal condena, aplicando a pena que lhe couber (prisão ou multa).
Mas pode também absolver os acusados por falta de provas ou verificação de causas legais que excluam a culpa ou a ilicitude do crime (a legítima defesa é um caso típico de ausência de ilicitude).
Parlamento Nacional, 11 de Outubro de 2006.
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