Diário de Notícias – 8 de Abril de 2007
Armando Rafael
A menos de 24 horas de saber quem é que lhe sucederá na presidência de Timor-Leste, Xanana Gusmão é hoje um homem muito diferente daquele que há cinco anos foi eleito para o Palácio das Cinzas. Nessa altura, o “Mandela timorense”, como o herói da resistência à invasão indonésia era muitas vezes designado, fazia o pleno do país. Ao ponto de ter sido eleito com quase 83% dos votos.
Uma percentagem que poderia ter sido ainda maior não fosse o próprio Xanana ter andado atrás de quem o enfrentasse nas urnas.
Como explicar, então, que Xanana se tenha transformado num factor de divisão em Timor-Leste?
Nas sucessivas declarações e entrevistas que Xanana tem dado nos últimos meses, percebe-se que o Presidente está apostado na eleição de Ramos-Horta para o seu lugar. Porque se sente mais próximo do Nobel da Paz e porque acredita que só ele pode travar a eleição do candidato da Fretilin: Francisco Guterres (Lu-Olo). Um homem de quem Xanana já disse o pior, apesar de ter sido escolhido para liderar o Parlamento. Mas o que Xanana pretende é muito mais do isso. O que ele verdadeiramente quer é impedir que Mari Alkatiri volte a ser primeiro-ministro. Por isso, criou um partido – o Congresso Nacional para a Reconstrução de Timor-Leste (CNRT) – e impulsionou Ramos-Horta a avançar para o Palácio das Cinzas.
O que já é mais difícil de explicar é a razão de tanta animosidade contra o ex-primeiro-ministro, um dos poucos dirigentes timorenses que Xanana considerava incorruptível. Explicando as razões porque, ainda na prisão indonésia de Cipinang, Xanana lhe deu a gestão das verbas que o país haveria de receber do petróleo e do gás do Mar de Timor.
Amigos de juventude, Xanana e Alkatiri sempre foram suficientemente próximos para poderem ser considerados cúmplices. Sobretudo, em matérias que extravasavam a política e que ainda hoje são muitas vezes recordadas. Mas a política sempre fez parte do seu relacionamento. Quando Xanana anunciou, por exemplo, a sua saída da Fretilin em 1987, colocando-se acima de todos os partidos, não deixou de a tutelar e de a manter unida até ao regresso de Alkatiri, 12 anos depois.
Que sucedeu entretanto?
Aparentemente, nada. Se calhar, Xanana sempre foi o que é hoje. É certo que Alkatiri e a Fretilin cometeram muitos erros durante estes anos de governação e que a maioria dos timorenses vive como sempre viveu, sem que Díli lhes tivesse proporcionado melhores condições.
Mas o herói da resistência, que se habituou a nunca ser posto em causa, sempre conviveu mal com o formalismo do poder. De tal forma que nem sequer se deu ao trabalho de exonerar Mari Alkatiri do cargo de primeiro-ministro, quando optou por nomear Ramos-Horta. Mas como Timor-Leste é o que é, também não foi questionado. E se tivesse sido, o mais provável é que o Presidente não entendesse.
Já foi, assim, ao longo da crise que o país viveu há uns meses. Quem se lembra agora que Xanana foi o primeiro a pronunciar-se sobre a expulsão dos quase 600 peticionários das forças armadas quando estes se recusaram a voltar aos quartéis?
E quantos saberão que no auge da crise ninguém conseguia falar com o Presidente pela simples razão que ele não saía de casa, nem tem telemóvel, deixando, por isso, pendurados todos os que pretendiam falar-lhe. Como sucedeu, numa primeira fase, com o ex-presidente Jorge Sampaio ou até com o então secretário-geral da ONU, Kofi Annan.
Xanana é assim: desprendido, mas também impulsivo e, por vezes, errático, dizendo num dia o contrário do que afirmou na véspera ou fingindo assumir responsabilidades quando ataca os outros. O que poderá ser muito perigoso, tendo em conta que Xanana se tornou cada vez mais fechado às influências do mundo que o rodeia.
Com quem fala Xanana nos momentos de crise? Com quem se aconselha? Desde logo, com a mulher, Kristy Sword. E depois com o seu chefe de gabinete, Agio Pereira.
Quem mais? Ramos-Horta? Os bispos? Mário Carrascalão? Ao que o DN apurou, só com os dois primeiros. Não espanta, por isso, que muitos dos seus antigos companheiros, nomeadamente os que ainda estão na Fretilin, digam hoje que a crise dos peticionários foi o que fez mudar Xanana definitivamente.
Porquê? Porque, nessa altura, o Presidente quis afastar Taur Matan Ruak da chefia das forças armadas, tentando ajustar contas antigas, e percebeu que já não conseguia impor a sua vontade e que as F-FDTL já não lhe obedeciam. A partir daí, Xanana adoptou uma nova postura. Demitiu Alkatiri, invocando uma acusação que se provou ser falsa, e publicou quatros textos de opinião que representam uma ruptura com o seu próprio passado, antes de se revelar disponível para ser primeiro-ministro.
Será que consegue? Parte desta resposta começará amanhã a ser dada, quando os timorenses forem votar para eleger o seu sucessor.
segunda-feira, abril 09, 2007
Os cinco anos que levaram Xanana a deixar de ser o Mandela timorense
Por Malai Azul 2 à(s) 06:31
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Traduções
Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006
"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
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