Expresso – 6 de Abril de 2007
Eleições A campanha eleitoral termina hoje à noite. Segunda-feira escolhe-se um novo líder. Dos sete candidatos dois disputam a vitória: Ramos-Horta e Francisco ‘Lu Olo’ Guterres, o chefe da Fretilin
Tomasi di Lampedusa, que escreveu sobre uma Sicília em convulsão onde nada de fundamental poderia evoluir, teria em Timor-Leste um espelho digno da sua obra-prima sobre o nascimento da Itália: uma insularidade bela e bruta de montanhas e miséria, onde jovens chacais e algumas hienas disputam o poder aos velhos leopardos da política.
Em Timor-Leste, como em ‘O Leopardo’ de Lampedusa - e de Luchino Visconti -, não falta o Catolicismo nos tabuleiros do poder, nem os revolucionários que trazem a arma em punho, que conquistam um Estado para cumprir a maldição: “Para que as coisas continuem iguais, é preciso que tudo mude”.
É este o jogo de promessas entre a utopia, a esperança e a mentira, e outras formas proféticas, que define a campanha para as presidenciais timorenses, onde os candidatos se apresentam aos eleitores com autênticos programas de governo. O período de reflexão eleitoral para as presidenciais de 9 de Abril começa oficialmente hoje é noite. Porém, quase todos os candidatos usaram na quarta-feira, em Díli, a sua melhor pirotecnia.
A Páscoa instalou-se hoje neste país de forte religiosidade católica. A campanha presidencial sai das ruas, que ficam neste fim-de-semana de Paixão para as procissões e outras manifestações alusivas. O futuro de Timor-Leste continua no dia seguinte à Ressurreição do Senhor. “As presidenciais abriram para as legislativas”, comentava, quarta-feira, o ministro dos Negócios Estrangeiros timorense, José Luís Guterres, sentado na tribuna do Estádio Municipal de Díli. O chefe da Diplomacia esperava, de semblante carregado, a chegada do candidato José Ramos-Horta. No estádio estariam 800 pessoas. Menos do que o esperado? “As pessoas vão aos comícios por ser um acontecimento social. Só talvez 20% votam nesse candidato e, por isso, não é seguro avaliar o voto pela assistência nos comício”.
No palco montado a meio do estádio tocava o grupo 5 do Oriente. Da rua chegavam ecos das campanhas rivais. Uma numerosa caravana da Fretilin, com apoiantes do seu candidato Francisco Guterres ‘Lu Olo’, atravessou a cidade, vinda do maior comício do dia: mais de 6 mil pessoas, dizem as forças de segurança, que identificaram 400 viaturas.
Um tsunami de amor
O último grande comício de ‘Lu Olo’ aconteceu num terreno da periferia oeste da capital, junto ao circuito de motocross de Díli. Mari Alkatiri, secretário-geral da Fretilin e ex-primeiro-ministro, defendeu o seu candidato à Presidência e prometeu uma vitória à primeira volta. “A Fretilin é um tsunami de amor para Timor-Leste”, afirmou. Tanto na entrada como na saída da cidade, pela central Estrada de Comoro, a caravana da Fretilin esteve envolvida em incidentes de apedrejamento e de, pelo menos, dois disparos, na área da embaixada da Austrália. Ao fim de um dia nervoso, 13 feridos, um deles em estado grave, deram entrada no hospital Guido Valadares, todos vítimas de apedrejamento.
Eram, na maioria, apoiantes da Fretilin, mas também do CNRT. No Estádio Municipal, o novo partido deu cor política ao comício de Ramos-Horta, único candidato que não é dirigente ou deputado de um partido político. O CNRT, que nasceu em torno de Xanana Gusmão, é por enquanto, também, o partido oficioso de Ramos-Horta, além dos pequenos partidos e cisões (como o Grupo Mudança da Fretilin) visíveis na sua campanha. O Presidente da República chegou logo depois de Ramos-Horta. O comício engordou finalmente para cerca de 1700 pessoas, segundo estimativas de observadores internacionais. Pela cidade, num dia de nervos e incidentes, as caravanas serpentearam durante várias horas, geridas por um aparato policial e militar que tentou evitar maus encontros. Ainda assim, as faíscas aconteceram: a grande caravana da Fretilin encontrou e foi encontrada pela de Ramos-Horta, a de Francisco Xavier do Amaral, a de João Carrascalão e a de Fernando ‘Lasama’ de Araújo.
Díli é uma capital pequena. “O povo timorense gosta de um líder que esteja integrado na vida da comunidade”, explicou Jorge Teme, o responsável da campanha eleitoral da Fretilin em Oecusse em 2001 e hoje apoiante da campanha de Ramos-Horta. “Os timorenses são um povo muito ligado à natureza. É à natureza que rezam pedindo que escolha um bom líder. É uma selecção natural”.
Além do apoio de Xanana Gusmão, Ramos-Horta declarou a sua fé política na Igreja Católica, propondo aliás uma referência mais substancial a Deus na Constituição. ‘Lu Olo’, católico praticante, é o candidato de um partido hegemónico que a hierarquia da Igreja tratou várias vezes como o anticristo.
Nesta Páscoa de reflexão, a contagem do rosário interrompe a contagem de peões, ocupação favorita dos assessores das várias campanhas. A questão, no entanto, não é religiosa ou ideológica. Esta ilha é uma fábula e, como em ‘O Leopardo’, a fábula é um detalhe da história: quem vem a seguir a Garibaldi?
sexta-feira, abril 06, 2007
Leopardos e chacais na fábula de Lorosae
Por Malai Azul 2 à(s) 22:12
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Traduções
Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006
"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
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