V. MEDIDAS DE RESPONSABILIZAÇÃO
174. No Relatório do Secretário-Geral ao Conselho de Segurança de Agosto de 2004 sobre o primado da lei e a justiça transitória nas sociedades em situação de conflito e de pós-conflito, ficou notado que “justiça, paz e democracia não constituem objectivos que se excluem mutuamente, mas sim imperativos que se reforçam mutuamente”4
Torna-se claro a partir de inúmeras declarações feitas à Comissão no decurso do seu trabalho que o povo de Timor-Leste acredita que a chave para o progresso da paz e da democracia no seu país passa pelo fim da cultura da impunidade e que a justiça seja vista como estando efectivamente a ser feita. Se se pretende que este imperativo seja alcançado em Timor-Leste, será necessário um esforço sustentado e substancial de longo prazo da parte do Governo e dos seus parceiros internacionais.
175. Em conformidade com o seu mandato, a Comissão deve recomendar medidas com vista a assegurar a responsabilização pelos crimes e graves violações de direitos humanos cometidos durante o período de Abril e Maio de 2006, levando em consideração que o Governo de Timor-Leste considera que o sistema interno de justiça deveria constituir-se na primeira via de responsabilização. Nesta ordem de ideias, a Comissão dedicou particular atenção à capacidade do sistema judicial de Timor-Leste para apoiar as investigações e o accionamento de processos judiciais em torno dos casos de conduta criminal identificados no presente relatório.
A. Mecanismos Judiciais Existentes
176. Embora o Governo tenha mostrado um forte empenhamento no sector da justiça, inclusivamente ao promulgar quadros legislativos pormenorizados, na realidade Timor-Leste possui o que pode ser descrito como um sistema judicial minimamente funcional.
177. Os Tribunais e as estruturas previstas na Constituição que foram criados encontram-se ainda num processo de desenvolvimento e os sistemas continuam a depender grandemente do pessoal internacional a desempenhar funções executivas. O sistema de justiça foi objecto de críticas numa série de relatórios que realçaram os factores que estão na origem de tal debilidade.
Summary.
incluem o vazio verificado após a saída da Indonésia em 1999; um certo nível de planificação e distribuição de recursos numa base ad hoc durante a fase inicial da sua criação; falta de actores da lei Timorenses com experiência; dificuldades associadas ao recrutamento e utilização de pessoal internacional; dificuldades em matéria de línguas; e, à semelhança de outros sectores, recursos limitados.
178. Não obstante as fraquezas acima referidas, a Comissão reconhece que o sector da justiça até certo ponto continuou a funcionar no rescaldo dos recentes acontecimentos. Quando as forças internacionais começaram a prender pessoas, o pessoal de piquete do sector judicial levou a cabo audiências de pré-julgamento e de detenção. O processo de investigação teve início relativamente a alguns acontecimentos fundamentais. Foram tomados passos iniciais em termos de processamento judicial a respeito de algumas pessoas, incluindo o ex-Ministro do Interior. Tudo isto constitui indicativo de um forte empenhamento no seio do sector judicial para contribuir para o contínuo desenvolvimento do primado da lei em Timor-Leste.
179. À luz dos seus termos de referência, a Comissão examinou cuidadosamente os pontos de vista do Governo segundo os quais se deveria dar primazia ao sistema interno de justiça, assim como os pontos fortes e os pontos fracos daquele sistema e a natureza dos crimes cometidos.
Com vista a garantir responsabilização pelos crimes cometidos durante a recente crise, é de importância vital que as investigações, processamentos judiciais e julgamentos decorram e sejam vistos como estando a decorrer de forma imparcial e isentos de qualquer interferência política.
Um tribunal internacional não é considerado apropriado tendo em conta que os crimes sob consideração constituem transgressões ao direito interno.
A Comissão concluiu que os casos de crime devem ser tratados no quadro do sector judicial interno. Todavia, há necessidade de medidas para reforçar a capacidade do sistema judicial interno de lidar com os casos de alto nível envolvendo actores políticos de uma maneira que venha a ser considerada credível pela população.
180. A Comissão está consciente das complexidades envolvidas. Ela deu uma grande prioridade às recomendações destinadas a garantir que o processo seja imparcial e independente e que todos vejam que o mesmo é efectivamente imparcial e independente. Em vista das debilidades actualmente existentes conforme atrás descrito, muitas das recomendações prevêem um papel fundamental a ser desempenhado por actores internacionais. Foram igualmente feitas recomendações relativamente ao envolvimento de actores nacionais para garantir um conhecimento suficiente dos antecedentes sociais, políticos e culturais de relevância para os casos e para reforçar o desenvolvimento do sector nacional de justiça. A Comissão sublinha a necessidade de se considerar esses julgamentos num sentido holístico, prestando-se a devida atenção à operação dos diferentes elementos do processo judicial, ou seja, os tribunais, o ministério público, o gabinete da defensoria pública, e o sistema prisional.
Os Tribunais
181. Existem dois níveis de Tribunais presentemente em Timor-Leste: os tribunais distritais e o Tribunal de Recurso. É o Tribunal Distrital de Dili que tem jurisdição sobre os crimes cometidos durante os acontecimentos em análise no presente relatório. A Constituição proíbe a criação de “tribunais de excepção” ou de “tribunais especiais para o julgamento de determinadas categorias de crime”.
182. Os principais juizes que examinam casos actualmente são juizes internacionais. Esses juizes foram nomeados pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial ao abrigo do Estatuto dos Magistrados Judiciais partindo do pressuposto “ser necessário e conveniente”. Exige-se que esses juizes possuam pelo menos cinco anos de experiência e que provenham de um sistema civilista ou tenham uma especialização em direito comparado. Na altura em que a Comissão levou a cabo as suas actividades havia 4 juizes internacionais nomeados para trabalharem nos tribunais distritais e 2 no Tribunal de Recurso. Onze juizes nacionais em regime de estágio que haviam concluído recentemente a sua formação teórica em Junho de 2006, reintegraram-se no sistema de justiça e encontram-se disponíveis para decidir casos. Os juizes em regime de estágio expressaram o desejo de decidir casos mais simples. O Presidente do Tribunal de Recurso disse à Comissão que a intenção era de os juizes em regime de estágio decidirem casos de menor gravidade e trabalharem ao lado dos juizes de nomeação internacional.
183. Os julgamentos de casos que envolvam crimes puníveis com penas de prisão superiores a cinco anos são presididos por um colectivo de juizes. Os julgamentos dos outros casos são presididos por um único juiz. O Presidente do Tribunal de Recurso, na sua qualidade de Presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial, tem o poder de preparar “ordens executivas permanentes” e de realizar os actos administrativos que se afigurem necessários ao normal funcionamento dos Tribunais. O Presidente do Tribunal de Recurso informou à Comissão que a composição dos colectivos para examinar casos decorrentes do presente relatório poderá ser determinada por uma ordem a ser por ele emitida.
184. A Comissão considera que tendo em conta o estado frágil do sector judicial, a natureza dos casos, e a necessidade de um processo que seja visto como estando a ser tratado de maneira imparcial, seria irrealístico colocar o peso de tais julgamentos sobre juizes nacionais estagiários.
Nesta conformidade, a Comissão recomenda que os juizes internacionais desempenhem um papel central nos processos. Os juizes nacionais estagiários deveriam participar no processo em ordem a proporcionar ao tribunal conhecimentos sobre o contexto Timorense, assim como garantir que o processo sirva para reforçar o futuro sistema judicial do país.
185. A Comissão recomenda que os casos relacionados com os acontecimentos de Abril e Maio de 2006 sejam examinados no âmbito do sistema dos tribunais distritais de Timor-Leste.
Recomenda também que nos casos em que, nos termos do Código de Processo Penal, os julgamentos envolvam um colectivo de juizes, que o colectivo seja composto por 2 juizes internacionais e 1 juiz nacional, e nos casos em que o julgamento envolva um único juiz, que esse juiz seja um juiz internacional.
Procuradoria-Geral da República
186. A Procuradoria-Geral da República está estabelecida na Constituição como um órgão independente com a tarefa de investigar e exercer processamento judicial penal e a defesa do Estado em litígios civis. O Procurador-Geral, que dirige este órgão, é nomeado pelo Presidente da República para um mandato de quatro anos. Nos termos da Constituição, os adjuntos do Procurador-Geral da República podem igualmente ser nomeados pelo Presidente da República. Os critérios para tais nomeações estão estabelecidos no Estatuto do Ministério Público. O órgão de supervisão, o Conselho Superior do Ministério Público, ainda não foi criado.
187. O quadro de pessoal da Procuradoria-Geral da República conta actualmente com o Procurador-Geral da República (que foi recentemente renomeado para um mandato de quatro anos), juntamente com 5 procuradores internacionais e 9 procuradores nacionais em regime de estágio. Devido à rotatividade de pessoal e às limitações em termos de recursos, a Procuradoria-Geral da República enfrenta um volume considerável de processos acumulados. Até Abril de 2005, tal volume era de cerca de 2500 casos.5 O Secretário-Geral das Nações Unidas informou ao Conselho de Segurança em Abril de 2006 que se haviam introduzido melhores sistemas de gestão de casos na Procuradoria-Geral da República, mas fez notar que a “capacidade institucional desta instituição continuava frágil”.6 Das suas discussões com a Procuradoria-Geral, torna-se aparente para a Comissão que os casos decorrentes da actual crise iriam merecer uma prioridade particular. Todavia, para que esta situação não tenha um impacto negativo sobre o sistema existente, seriam necessários recursos adicionais.
188. A capacidade da Procuradoria-Geral da República de levar a cabo investigações e instaurar processos de uma maneira imparcial e isenta de interferência política é de fundamental importância. A Comissão teve o benefício do Relatório de Maio de 2005 da Comissão de Peritos para Revisão das Acusações de Violações Graves dos Direitos Humanos Cometidas em Timor-Leste em 1999 (Vide S/2005/48). Aquela avaliação notou com preocupação a interpretação do Procurador-Geral de que, porque nos termos da Constituição, responde perante o Presidente da República, isso exige que observasse as directivas do Presidente da República em relação a processos judiciais.
A Comissão de Peritos concluiu que a Procuradoria-Geral “não funcionava actualmente de forma independente do Estado de Timor-Leste” (ibid., Anexo II, parágrafo 78). A Comissão é de opinião que aquela situação mantém-se inalterada.
189. A Comissão recebeu relatórios segundo os quais o actual tratamento das investigações e da instauração de processos relacionados com os acontecimentos de Abril e Maio de 2006 está a ser influenciado por considerações de natureza política. Foi alegado particularmente que existe selectividade na abordagem dos casos como resultado de pressões políticas. A corrente de críticas no domínio público indicia uma falta de confiança pública na imparcialidade do processo de investigação e de instauração de processos. A Comissão recebeu pedidos apelando a que haja um procurador internacional de nível sénior para supervisionar o processo de investigação e de instauração de processos com vista a gerar confiança pública nesse processo. O Procurador-Geral expressou à Comissão o seu ponto de vista segundo o qual os procuradores Timorenses em regime de estágio foram e continuam sendo cautelosos em processar judicialmente os casos de alto perfil envolvendo actores políticos.
5 Relatório do Secretário-Geral do fim do mandato da UNOTIL (S/2006/251), para 15.
6 Ibid, para 15.
190. Por todas as razões acima referidas, a Comissão é de opinião que os actores internacionais devem desempenhar o papel fundamental na condução das investigações e da instauração de processos conforme recomendado na Secção IV, devendo esses actores internacionais ser apoiados por actores nacionais. Isto requereria a nomeação de um procurador internacional de nível sénior para proporcionar uma liderança independente no processamento judicial desses casos. Esse procurador de nível sénior trabalharia no âmbito do sistema existente, mas deverá ter um mandato claro que lhe permita processar judicialmente de maneira imparcial e sem qualquer interferência política. A via preferível seria a de o Presidente da República nomear um Adjunto do Procurador-Geral. A alternativa seria a nomeação de um procurador de nível sénior no seio da Procuradoria-Geral da República.
191. A Comissão recomenda a nomeação de um procurador internacional de nível sénior como Adjunto do Procurador-Geral da República com um mandato claro de investigar e instaurar processos judiciais relativamente aos casos decorrentes dos acontecimentos de Abril e Maio de 2006 de uma maneira imparcial e sem interferência política.
192. A Comissão recomenda que os actores legais internacionais desempenhem o papel principal nas investigações e processamentos judiciais com apoio de procuradores nacionais.
193. Há necessidade de se disponibilizar recursos adicionais e suficientes para apoiar os trabalhos de investigação e de processamento judicial.
194. A Comissão recomenda que os procuradores tenham acesso a pessoal autónomo tanto da polícia como da investigação, bem como a um apoio adequado em termos de pessoal administrativo, de tradução e de pesquisa, incluindo apoio de natureza logística.
Gabinete de Defensoria Pública
195. Em termos de pessoal, o Gabinete de Defensoria Pública conta actualmente com 7 defensores públicos nacionais em regime de estágio e 3 defensores públicos internacionais. As suas operações ainda têm lugar na base de legislação da UNTAET que rege o Serviço de Apoio Jurídico, embora a Comissão tivesse sido informada que o Governo está a preparar uma nova lei que irá regular esse Gabinete de Defensoria Pública. À semelhança de outras partes do sector judicial, o Gabinete de Defensoria Pública tem recursos insuficientes quer em termos de pessoal quer em termos de infraestruturas.
196. Para que o Gabinete de Defensoria Pública possa cumprir o seu mandato, há necessidade de a dotar de bastantes recursos adicionais. O Gabinete enfrenta actualmente uma situação de falta de meios de transporte, o que acarreta dificuldades no que diz respeito à recolha de testemunhas para estarem presentes nos tribunais. Colocam-se também questões financiamento para apoiar a presença e permanência de testemunhas em Dili na medida em que os fundos existentes são insuficientes para providenciar alojamento e alimentação às testemunhas. Por outro lado, devido ao número limitado de defensores públicos, têm-se colocado problemas em torno da necessidade de se garantir a sua comunicação regular com os respectivos clientes.
197. A Comissão sublinha que os julgamentos justos requerem o acesso a um sistema robusto de defesa em conformidade com o princípio da “igualdade de armas”. A Comissão recomenda que os recursos à disposição do Gabinete de Defensoria Pública sejam aumentados, particularmente em relação à contratação de mais defensores públicos internacionais, investigadores e tradutores, e em termos de apoio administrativo e logístico adequados.
Tratamento de Questões Adicionais Associadas aos Processos de Julgamento
198. Conforme notado no parágrafo 176 supra, o sistema judicial é débil. Torna-se aparente para a Comissão que existem desafios particulares que devem ser atendidos relativamente à administração de todos os sectores dos tribunais. Os tribunais enfrentam significativos desafios em termos de serviços de tradução, situação agora agravada com o envolvimento de mais actores internacionais com a presença de polícias internacionais. O volume actual de tradutores e intérpretes não será adequado para proporcionar o necessário apoio aos tribunais, à Procuradoria-Geral da República e ao Gabinete da Defensoria Pública, nem para garantir que os arguidos entendam os processos. Debilidades na área de gestão e administração relacionadas com o tratamento de casos requerem uma atenção a nível dos tribunais, da Procuradoria-Geral da República e do Gabinete da Defensoria Pública. Embora o Ministério da Justiça tenha juntamente com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) divisado um plano estratégico para melhorar o sistema dos tribunais, torna-se evidente a necessidade de recursos adicionais para a implementação de tal estratégia.
199. A Comissão recomenda a canalização de recursos adicionais para o reforço da administração e dos serviços de tradução a nível dos tribunais, da Procuradoria-Geral da República e do Gabinete de Defensoria Pública.
200. A segurança a nível dos tribunais é extremamente reduzida, deixando juizes, procuradores, defensores, arguidos, testemunhas e pessoal dos tribunais em risco. Foram manifestadas preocupações por parte de actores judiciais sobre medidas de segurança fora das instalações dos tribunais. Os mecanismos de segurança para a salvaguarda adequada da informação e dos registos são também inadequados.
201. A Comissão recomenda que se proporcione uma segurança adequada aos actores judiciais e às respectivas instalações.
Protecção às Testemunhas
202. Uma questão fundamental relativamente à facilitação dos trabalhos de investigação e de instauração de processos penais consiste em garantir que as pessoas que detenham informação relevante estejam interessadas em se apresentar às autoridades e, sempre que julgado relevante, testemunhem em tribunal. A Comissão foi informada repetidamente (inclusivamente por funcionários do sistema judicial) que esta questão coloca dificuldades particulares em relação aos acontecimentos de Abril e Maio de 2006. Dada a natureza das partes envolvidas e a crise de segurança em curso, as testemunhas estão relutantes em abordar as autoridades e poderão mostrar relutância em testemunhar tendo em conta as potenciais consequências contra elas e os seus respectivos familiares.
203. A Comissão recomenda que o Ministério da Justiça tome medidas no sentido de garantir a necessária segurança física das testemunhas.
B. Aumento do apoio internacional
204. Tendo em conta as recomendações da Comissão no sentido de os actores internacionais desempenharem um papel central no tratamento dos casos decorrentes dos acontecimentos de Abril e Maio de 2006, é de importância vital que rapidamente seja disponibilizado e destacado pessoal experimentado e qualificado para levar a cabo tais funções. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) lançou já um apelo para financiamento em apoio a um número adicional de 3 juizes, 3 procuradores, 2 defensores públicos e correspondente pessoal de apoio (em termos de oficiais de justiça e intérpretes) para lidar com os casos previstos. A este respeito a Comissão apoia vivamente a assistência internacional. A Comissão ouviu da parte de inúmeros interlocutores que o processo de recrutamento de pessoal internacional ora em curso é limitado desnecessariamente por requisitos que se prendem com o domínio de línguas e que o mesmo processo de recrutamento padece de flexibilidade e é demorado. Com vista a aumentar a rapidez do processo e garantir a disponibilidade de um número suficiente de pessoal qualificado, a Comissão apoia a exploração de meios que permitam alargar a base de potenciais candidatos. À título de exemplo, poder-se-iam utilizar redes ligadas a profissionais do direito para a disseminação dos anúncios de vagas.
A Comissão nota que o requisito segundo o qual os candidatos devem dominar fluentemente a língua portuguesa constitui um factor de constrangimento. Dever-se-á examinar a possibilidade de se ser flexível em relação a este requisito.
205. A Comissão recomenda que se examine a hipótese do alargamento da base de escolha de candidatos aos postos a serem preenchidos com vista a maximizar a possibilidade de se recrutar as pessoas mais qualificadas. Uma consideração particular deveria ser dada ao alargamento dos anúncios das vagas dirigindo tais anúncios para associações profissionais e modificando os requisitos em termos de língua para o preenchimento das vagas.
206. A Comissão recomenda que os doadores considerem favoravelmente os pedidos no sentido de um apoio acrescido ao sector judicial em Timor-Leste, especificamente os recursos extras necessários ao tratamento dos casos que originaram da crise.
As Prisões
207. Durante o período de investigação da Comissão, 57 pessoas escaparam da Cadeia de Becora. Esta fuga incluiu um número de pessoas detidas em relação aos acontecimentos de Abril e Maio. A Comissão nota a sua preocupação perante a evidente falta de segurança nos centros de detenção.
208. A Comissão recomenda que uma atenção imediata seja dada ao aumento da segurança dos centros de detenção de Timor-Leste.
Monitorização do andamento dos processos
209. A Comissão sublinha a importância da monitorização do andamento dos casos relacionados com os acontecimentos de Abril e Maio de 2006. Este aspecto é de importância fundamental para se garantir a transparência e para aumentar a confiança pública no sistema. A Comissão está consciente dos esforços de monitorização actualmente envidados por ONGs (Organizações Não-Governamentais) nacionais de direitos humanos e pelas Nações Unidas. Todavia, a Comissão recomendaria a adopção de mais iniciativas neste domínio.
210. A Comissão recomenda que parte do Relatório Anual do Procurador-Geral a ser submetido ao Parlamento Nacional lide especificamente com o estado de andamento dos casos ligados aos acontecimentos de Abril e Maio de 2006. A Comissão recomenda também que a Procuradoria-Geral da República divulgue regularmente informação sobre o estado de andamento dos casos em análise através de um programa de informação pública.
211. A Comissão encoraja o Gabinete do Provedor de Direitos Humanos e Justiça, a UNMIT e as ONGs a continuarem a monitorizar o estado de andamento dos casos relacionados com os acontecimentos de Abril e Maio de 2006.
C. Uso de processos tradicionais de justiça/reconciliação
212. Durante a sua investigação a Comissão tomou conhecimento da importância do sistema de justiça tradicional em Timor-Leste, assim como do exemplo da forma modificada de justiça tradicional proporcionada através do processo de reconciliação comunitária da Comissão de Acolhimento, Verdade e Reconciliação para os casos de crime de “menor gravidade”. Colocou-se a questão de saber se se poderia fazer uso de um sistema similar em relação a alguns dos casos decorrentes dos acontecimentos de Abril e Maio de 2006.
213. A Comissão concluiu que os casos identificados no presente relatório necessitam de ser tratados através do sistema formal de justiça. Esta posição está em estreita concordância com as expectativas da comunidade de “justiça” em termos de “justiça formal”, para se evitar uma cultura de impunidade.
D. Outras medidas de responsabilização
214. Grande parte do presente relatório tem centrado até aqui a sua atenção na identificação das pessoas e das instituições responsáveis pelos acontecimentos. A Comissão reconhece também a necessidade de se dar atenção à disponibilização de medidas de reparação para as pessoas que sofreram em consequência dos acontecimentos de Abril e Maio de 2006.
215. A principal instituição governamental de direitos humanos em Timor-Leste é o Gabinete do Provedor de Direitos Humanos e Justiça. Criado ao abrigo da Constituição, a este órgão foram conferidos poderes de, entre outros, apreciar as queixas apresentadas pelos cidadãos contra os poderes públicos (incluindo a PNTL e a F-FDTL), bem como as violações de direitos humanos. Todavia, o Gabinete do Provedor de Direitos Humanos e Justiça não tem poderes para modificar decisões nem para conceder indemnizações. Ao invés disso, ela limita-se a fazer recomendações para a reparação das injustiças ou a recomendar medidas correctivas e/ou e a mediar na resolução das reclamações.
216. Outros mecanismos são limitados. As queixas de má conduta por parte da PNTL podem ser examinadas pelo Gabinete de Ética Profissional ou pelo Gabinete de Inspecção. As audiências sobre casos de disciplina interna podem ser realizadas pela F-FDTL. Todavia, o enfoque destes órgãos centra-se sobre a disciplina interna e não sobre as reparações orientadas para as vítimas.
Conforme delineado nesta Secção, a capacidade de os tribunais tratarem de casos de natureza civil é limitada e é improvável que os tribunais sejam capazes de conceder uma reparação efectiva em termos de executar qualquer ordem de indemnização na sequência de uma condenação por crime. Nos casos em que a conduta delituosa constitua uma conduta de natureza criminal, a acção pelo Estado de uma pronta investigação e a apresentação de tais casos para processamento judicial ajudará como uma forma de proporcionar reparação. Todavia, dever-se-á dar examinar também outras medidas que poderão atender a alguns dos outros métodos de reparação recomendados.
217. A Comissão encorajaria, por exemplo, a criação de um programa nacional de reparações. Tal programa não significaria simplesmente uma compensação monetária. Em vez disso, dever-se-ia examinar a gama de medidas necessárias, incluindo o reconhecimento do acto ilícito, a indemnização pelo dano economicamente avaliável, a total revelação pública dos acontecimentos em questão (inclusivamente através da divulgação do presente relatório), a criação de programas de reabilitação, bem como sanções administrativas contra as pessoas em instituições com responsabilidade nos acontecimentos. Medidas para assistir as pessoas cujos familiares foram mortos, reconhecimento por parte de autoridades governamentais da sua responsabilidade, e explicações sobre os passos que devem ser tomados para se evitar a repetição de violações parecem ser de importância fundamental para a comunidade.
218. A Comissão recomenda que o Governo proporcione reparações às pessoas que sofreram em consequência dos acontecimentos de Abril e Maio de 2006, com particular atenção às pessoas que sofreram a morte de um membro da família, ferimentos significativos, e destruição das suas residências.
219. A Comissão recomenda que as instituições com responsabilidade nos acontecimentos em análise reconheçam publicamente a sua responsabilidade por contribuírem para a ocorrência dos acontecimentos.
220. A Comissão recomenda que sejam tomadas medidas especiais para garantir a dignidade das vítimas e evitar a sua retraumatização tanto no quadro de um qualquer processo judicial como no de um processo não judicial.
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quarta-feira, outubro 18, 2006
Relatório da CI - V. MEDIDAS DE RESPONSABILIZAÇÃO
Por Malai Azul 2 à(s) 00:21
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Traduções
Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
Obrigado pela solidariedade, Margarida!
Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006
"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
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