quarta-feira, maio 09, 2007

Entrevista a Lu-Olo: “Xanana tem um ódio obsessivo contra a Fretilin”

Publico.pt
Eleições presidenciais em Timor-Leste

01.05.2007 - 22h16 Adelino Gomes

Lu-Olo revela que Horta foi a terceira escolha da Fretilin para a chefia do actual Governo, anuncia que, se for eleito, manterá a presidência da Fretilin e acusa Xanana de encobrir corrupções no seu próprio gabinete.

PÚBLICO: Dos seis candidatos eliminados na 1ª volta, apenas um lhe dá o seu apoio público. Que significado atribui ao apoio generalizado dos outros cinco a Ramos-Horta?

Francisco Guterres “Lu-Olo”: O que nós temos visto é a expressão pública das lideranças dos partidos e dos candidatos desses partidos. Eu respeito e estou confiante de que cada timorense irá votar de acordo com a sua consciência. Eu não acredito que os votos sejam propriedade dos candidatos ou partidos, e por isso não podem ser trocados ou transferidos. Eu estou também confiante que as mensagens que passei ao povo, através do meu compromisso eleitoral, durante a campanha, e durante o debate televisivo, representam as visões da maioria dos Timorenses. Algumas pessoas dão grande importância a esses líderes, em Díli, que apresentam publicamente o seu apoio à Ramos-Horta. Como disse anteriormente, as pessoas no topo podem apoiar uns aos outros mas as pessoas na base podem apoiar de forma diferente. Eles irão votar em quem confiam. Agradeço todo o apoio que tenho recebido por parte do Presidente da KOTA, Dr Manuel Tilman, e pelo Presidente do PPT, Jacob Xavier. Eles têm muito apoio entre a população rural, que é a população de quem tenho falado mais, os Mauberes e Buiberes. Isto irá ajudar-me a atrair o seu apoio para estas eleições.

P: No último comício desta campanha, em Díli, o secretário-geral da Fretilin e ex-primeiro-ministro, Mari Alkatiri, disse que "Ramos Horta é uma pessoa que não tem ideias próprias ", e que "hoje diz uma coisa, amanhã fala outra". E acrescentou: "Se o presidente for Ramos Horta e o primeiro-ministro Xanana Gusmão, o país vai, sem dúvida, enveredar por um caminho de desenvolvimento que será insustentável". Têm também acusado o seu adversário de preconizar uma política petrolífera que favorece interesses estrangeiros. Por que razão, sendo assim, foi José Ramos-Horta convidado há menos de um ano para PM? Ou o que ele é hoje revelou-se uma má surpresa para a Fretilin?

R: A nação encontrava-se em crise e uma guerra civil encontrava-se iminente se a FRETILIN não concordasse com a exigência do Presidente Xanana em escolher Ramos-Horta para Primeiro-Ministro. Ele não foi a nossa primeira escolha – Estanislau da Silva foi a nossa primeira escolha e Rui Araújo foi a segunda. Contudo, nós estávamos conscientes de que o Presdiente não iria permitir que qualquer um deles se tornasse PM, embora fosse nosso direito constitucional, sendo o partido com maioria parlamentar, escolher o chefe do governo. Ramos-Horta era então o candidato acordado para tentar sair da confrontação e crise com o Presidente. Ao mesmo tempo, algumas pessoas afirmavam ser a melhor forma de resolver a crise. Podemos ver agora que esse não era o caso. Indicar Ramos-Horta não resolveu nada, o país continua em crise, com muitos problemas por resolver. Tais inclui o problema de segurança, lei e ordem, os peticionários, o caso de Reinado, e os deslocados que não regressam às suas casas devido à falta de segurança.

P: Se a Fretilin ganhar, isso significa que o povo quer ver Timor-Leste controlado por apenas uma família (os uniformes da polícia, as armas das F-FDTL, a construção das estradas, a gasolina, o arroz), disse o actual Presidente, numa entrevista ao Tempo, indonésio. Quer comentar?

R: Eu acredito que o povo irá votar na FRETILIN porque somos um partido que promove a autoridade da lei, respeito pela constituição e desenvolvimento sustentável para o nosso país e para o nosso povo. Os primeiros cinco anos de governação foram difíceis porque a maior parte do dinheiro para o orçamento vinha dos parceiros de desenvolvimento. Eles tiveram grande influência no tipo de investimento que foi feito e as quantias não permitiram que gastássemos em muito, com excepção de algumas prioridades chave tais como saúde e educação. Só para comparar, o nosso primeiro orçamento era de cerca de USD$85,000,000. Contudo, agora o país tem dinheiro devido ao dinheiro do petróleo que está a entrar o Fundo do Petróleo, criado pelo governo da FRETILIN liderado pelo Dr Mari Alkatiri. O nosso orçamento de USD327,000,000 permite que possamos trabalhar em muito mais áreas. Por exemplo, o fundo de desenvolvimento comunitário, que foi recentemente lançado pelo Primeiro Vice-Primeiro Ministro e Ministro da Agricultura, Estanislau da Silva. Neste programa cada Suco irá receber USD$10,000 para projectos comunitários. O dinheiro do petróleo permitiu também a implementação de um programa de alimentação nas escolas primárias, oferecendo às crianças uma refeição quente por dia, oferecer bolsas aos estudantes que precisam, ter disponível fundos para estabelecer bancos de desenvolvimento rural para providenciar créditos para as populações rurais. Temos também feito grandes progressos nas áreas de saúde e agricultura. O país não tem qualquer dívida, o que tem sido elogiado por instituições internacionais multi-laterais, como o Fundo Monetário Internacional. O desenvolvimento da nossa nação tem sido forte e estável, tendo em consideração que enfrentamos muitos desafios durante os últimos cinco anos de construção do país, partindo do zero. O Governo da FRETILIN tem hoje uma experiência de cinco anos, de onde pode aprender para governar melhor o país e continuar a fazer melhoramentos.

Em relação aos comentários do Presidente Xanana no Tempo: não é verdade. O comentário sobre “uma família” é um jogo para a audiência indonésia, que teve “uma família”, ao contrário de nós. A família que os indonésios tiveram é a mesma que Xanana uma vez aplaudiu como sendo boa para o desenvolvimento económico de Timor-Leste, durante o tempo de ocupação indonésia. Todos nós sabemos que o actual Presidente tem um ódio obsessivo pela FRETILIN e que os seus discursos inflamatórios foram uma das principais causas da crise do ano passado. Xanana sabe que existem mecanismos de controle que pode utilizar para investigar corrupções. Temos o Inspector-Geral, o Provedor. Porque nao os usa? Prefere entrar pela mais irresponsável que e difamar. Quem encobre corrupção no seu proprio no seu próprio gabinete como pode acusar outros? Desafio Xanana a pedir uma investigação seria.

P: Quais as três medidas concretas mais importantes que se propõe aplicar se for Presidente da República?

R: Primeiro, como Presidente, irei trabalhar para unificar as forças para esta nação. Isto irá envolver a facilitar a resolução de diferenças, com foco na unidade nacional e na solidariedade institucional. Trabalharei com o Parlamento Nacional e o Governo, e darei meu apoio total ao sistema judicial, para que estas instituições possam resolver a crise. Esta é a única forma para garantir paz e estabilidade para a nação. Este é o meu objectivo principal. Segundo, como Presidente, irei trabalhar para alcançar o consenso através de diálogos frequentes sobre os problemas de importância nacional. Isto incluirá mediar diálogos entre as instituições de estado, sociedade civil e partidos políticos. Darei ênfase especial à juventude e às mulheres para estabelecerem Gabinetes para eles. Usarei também os corpos consultivos estabelecidos para assessorar o Presidente, tais como o Conselho de Estado e o Conselho Superior para Defesa e Segurança. Como Presidente, estarei sempre disponível para o diálogo. Terceiro, ao fazer tudo o que acabei de dizer, poderemos assegurar que o desenvolvimento social e económico da nossa nação continuará sem problemas. Para tal, a minha prioridade será descer às bases para ver e ouvir directamente do povo se o Plano de Desenvolvimento Nacional e o orçamento do governo estão a ser aplicados correctamente.

P: Nem Xanana Gusmão, nem Alkatiri nem Ramos-Horta resolveram a crise de há um ano. Que medidas concretas tomará que eles não tomaram para conseguir alcançar uma solução que restaure a paz entre os timorenses?

R: A crise do ano passado teve início devido a um conflito entre instituições de estado, particularmente entre o governo e a presidência. Eu trabalharei para restabelecer a solidariedade e a cooperação institucionais. O dr. Mari Alkatiri não teve a oportunidade para resolver a crise criada por outros. Os adversários da FRETILIN usaram a crise para retirar Mari Alkatiri da posição de PM. Ramos-Horta e Xanana Gusmão pensavam que ao remover Mari Alkatiri eles poderiam então resolver a crise e elevarem-se aos olhos das pessoas envolvidas no processo. Algumas pessoas eram da opinião de que se Mari Alkatiri deixasse de ser PM, a crise estaria resolvida. Tal não aconteceu porque tanto Ramos-Horta como Xanana Gusmão não foram capazes de resolver a raiz do que causou a crise, que é a lei, ordem e segurança. O conflito entre os órgãos de soberania, e a falta de vontade de Xanana e Ramos-Horta em trabalharem com esses órgãos significou que a lei e a ordem, e a segurança não poderia ser restabelecidas. Por exemplo, o caso de Alfredo Reinado que primeiro dão ordem de captura e depois tentam cancelar a ordem. Veja como eles também não foram capazes de lidar com o problema dos peticionários, até agora. Eu prometo trabalhar para os que problemas sejam resolvidos de forma institucional, de acordo com as leis e a Constituição. Também, é necessário completar uma análise apropriada da crise para que os autores políticos da crise possam ser descobertos. Eu acredito que o relatório das Nações Unidas foi um início, mas teve vários pontos que ainda precisam de mais investigações. Os próprios timorenses devem completar este trabalho. Processos como o Relatório da Comissão de Notáveis, deveriam ser reconhecidos e apresentados publicamente, e debatidos, para que haja uma decisão transparente. A transparência conduzirá à confiança por parte do nosso povo. Pessoas como Reinado e os Peticionários merecem um processo justo, e que as leis sejam aplicadas de forma justa e imparcial, para que eles tenham confiança em relação aos seus direitos.

: O actual presidente queixa-se dos diminutos poderes presidenciais que a Constituição lhe concede. Acha que os actuais poderes bastam, ou defende uma revisão constitucional no sentido de uma maior presidencialização do regime?

R: No dia 20 de Maio de 2002, os 88 membros da Assembleia Constituinte assinaram o documento de aprovação da actual Constituição da República. Isto foi depois de sete meses de discussão, debate e consulta pública, para alcançar um consenso. Uma das áreas de maior discussão e debate foi sobre o equilíbrio de poderes entre o parlamento, o governo, a presidência, o sistema judicial, e o papel de cada um na promoção e protecção da democracia, justiça, unidade nacional, paz e estabilidade no nosso novo país. Eu tenho deixado claro, no meu compromisso eleitoral, que como Presidente tudo farei para trabalhar com os órgãos de soberania para garantir tudo isso. Eu acredito que cada órgão de soberania adere aos poderes concedidos pela constituição e não interfere na esfera de poderes dos outros órgãos de soberania, tais como o governo, o parlamento e o sistema judicial, e assim o bem-estar da nação está protegido. Eu prometo restabelecer os princípios da Democracia e de justiça no nosso país. Eu não acho que a Constituição precisa ser alterada para conceder mais poderes ao Presidente. É importante que cada órgão de soberania saiba reconhecer os seus limites e respeite o papel constitucional de cada um. Eu não quero ter mais poderes como Presidente, mas quero ser um Presidente que sabe as formas e os meios para cooperar e resolver os desafios enfrentados pela nação.

P: Como se relacionará com o Governo e com o Parlamento Nacional, se vencer as eleições mas a Fretilin perder as próximas legislativas para o CNRT, liderado por Xanana Gusmão?

R: Claro que será mais fácil se o Presidente, o Governo e a maioria do Parlamento forem todos do mesmo partido. Mas, como Presidente, eu irei trabalhar com qualquer um que controle o governo e o parlamento, e eu trabalho de forma a promover solidariedade institucional e unidade nacional entre as instituições governamentais. Tenho aprendido, durante o tempo como Presidente do Parlamento, que o diálogo e a gestão de diferenças políticas e outras diferenças são a única forma de avançar. Eu irei aplicar esse método na presidência da república.

P: Se a Fretilin ganhar as legislativas, convidará Mari Alkatiri para formar Governo? Se não: quem convidará?

R: Mari Alkatiri já declarou publicamente que não pretende ser Primeiro Ministro. A FRETILIN tem uma nova geração, uma geração jovem, que tem emergido nos últimos cinco anos, e que está pronta para liderar. Com isto em mente, o Comité Central da FRETILIN decidirá quem será o candidato à Primeiro-Ministro, e não o Presidente que tem o direito constitucional de nomear o Primeiro-Ministro.

P: Se vencer esta eleição, quem gostaria de ver suceder-lhe, como presidente da Fretilin?

R: Continuarei como Presidente da FRETILIN porque já provei saber separar o meu papel como Presidente do Parlamento, e o meu papel como Presidente da FRETILIN. Serei Presidente de todos e para todos.

R: O que vai fazer, em concreto, se perder esta eleição?

R: Continuarei nas minhas funções como Presidente do Parlamento Nacional e como Presidente da FRETILIN. Irei, claro, trabalhar arduamente para que a FRETILIN vença as eleições legislativas, com uma maioria absoluta. Eu resisti à ocupação estrangeira durante 24 anos, mas estou ainda longe de me reformar do serviço ao meu povo e ao meu país.

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Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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