quinta-feira, junho 08, 2006

GNR confinada a quartel, em causa permanência ...

Paulo Rego e António Sampaio, da Agência Lusa Díli, 07 Jun (Lusa) - O contingente da GNR em Timor- Leste está confinado ao quartel improvisado em Díli, com ordens do governo português para não sair devido a um bloqueio diplomático nas negociações com a Austrália sobre as cadeias de comando, disse à Lusa fonte governamental.

A decisão foi tomada depois de um incidente a meio da tarde de quarta-feira (hora local), quando a GNR transportava dois detidos para o novo centro de detenção temporária instalado no antigo comando distrital de Díli da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) e guardado pelas tropas australianas.

Os militares australianos negaram-se a receber os detidos e ameaçaram desarmar os efectivos portugueses, questionando a legitimidade da GNR para proceder às detenções.

De acordo com a fonte, o governo português decidiu suspender todas as negociações técnicas no terreno sobre a actuação da GNR e as formas de coordenação com outras polícias e os militares australianos.

Neste momento decorrem negociações urgentes em Nova Iorque, disse ainda a fonte à Lusa, confirmando estar actualmente em causa a permanência da GNR em Díli, a não ser que o presidente Xanana Gusmão e o governo timorense clarifiquem a actuação da força portuguesa no quadro do acordo bilateral assinado entre Lisboa e Díli, que garante à GNR autonomia operacional.

Durante o dia responsáveis técnicos tentaram, em Díli, encontrar uma solução para o problema, que posteriormente assumiu contornos políticos.

Fonte ligada às negociações que devem ser retomadas às primeiras horas de quinta-feira, em Díli, admitiu que "a situação é difícil e a decisão de Portugal coloca o governo timorense na difícil posição de ter que rejeitar frontalmente as pretensões da maior força de intervenção no terreno".

Actualmente estão mais de 2.600 efectivos de defesa australianos envolvidos na operação, incluindo o apoio logístico em Darwin, a que se somam 106 polícias, que aumentarão para 200 em breve.

Na noite de quarta-feira (hora local), e apesar de várias tentativas, não foi possível à agência Lusa contactar com o gabinete do primeiro-ministro timorense, Mari Alkatiri, para solicitar um comentário.

A tensão entre o contingente da GNR e o contingente militar australiano é a mais recente num ambiente de constante e evidente falta de coordenação entre as forças internacionais no terreno, evidenciada na segunda-feira no Parlamento Nacional.

Soldados australianos tentaram impedir a escolta malaia do presidente do parlamento, Francisco Lu'Olo, de entrar no local, o que, segundo uma fonte do gabinete do responsável parlamentar, demonstra "uma descoordenação total".

Uma situação idêntica tinha já ocorrido no domingo quando efectivos da Malásia tentaram ir ao complexo parlamentar recolher uma viatura da presidência do parlamento.

Paralelamente, continuam por definir os critérios e métodos de actuação das forças no terreno, uma tema que tem suscitado intensos contactos técnicos, políticos e diplomáticos, com Camberra a insistir que quer comandar todas as forças no terreno e a GNR a exigir a autonomia operacional.

Já hoje se tinha evidenciado uma elevada tensão entre Díli e Camberra, em torno dos métodos de detenção de suspeitos pela violência em Díli, com o governo australiano a defender que Timor-Leste deve mudar a sua lei de prisões, opção já liminarmente rejeitada pelo governo timorense.

A posição australiana foi hoje ecoada pelo chefe da diplomacia australiana, Alexander Downer, que afirmou que o Parlamento de Timor-Leste tem que mudar a lei para permitir que efectivos internacionais detenham suspeitos de violência.

"Enviar mais polícias para Timor-Leste não vai, automaticamente, resolver o problema. Para que o trabalho diário da polícia possa ser feito, terá certamente que haver uma mudança na lei de Timor-Leste e isso terá que se fazer no Parlamento", afirmou.

A ideia foi hoje rejeitada pelo ministra de Estado e da Administração Estatal, Ana Pessoa, que em declarações à Lusa acusou Downer de "não conhecer a lei de Timor- Leste".

"Ele não conhece a lei em Timor-Leste nem sabe que a lei não se muda assim. Não sei se no país dele é assim que se faz, mas quero acreditar que não", afirmou.

Fontes do governo australiano explicaram à Lusa que Camberra insiste em assumir o controlo dos "elementos associados ao processamento de detidos" visto que grande parte dos 106 agentes policiais já em Timor-Leste trabalha na área de investigação criminal.

No entanto, o governo e as autoridades judiciais timorenses insistem que a lei em vigor em Timor-Leste já prevê todo o sistema para a detenção e tratamento de detidos, vincando que a opção é de firmar protocolos "técnicos" com as forças internacionais no terreno.

"Não é cordial chegarem a que país for e dizerem:

'vamos lá agora fazer a investigação criminal à nossa maneira'. Isto não é feito à revelia do governo de Timor- Leste", vincou Ana Pessoa.

Segundo fontes judiciais, cerca de uma dezena de pessoas foram já detidas, tendo três deles sido apresentados ao juiz que decretou prisão preventiva.

No caso da GNR, que actua com base na legislação em vigor em Timor-Leste, os efectivos portugueses detiveram já três pessoas, das quais pelo menos uma foi apresentada ao juiz que também decretou a prisão preventiva.

Fontes judiciais explicaram à Lusa que a tensão se deve ao facto de o acordo que gere a entrada em Timor-Leste das forças internacionais "ser vago" em alguns destes aspectos e ainda porque o sistema legislativo anglo- saxónico é diferente do sistema continental que se aplica em Timor-Leste.

Lusa/Fim

5 comentários:

Anónimo disse...

A arrogância do governo australiano é primitiva!
Os aborigenes devem sofrer muito mais do que auilo que já foi denunciado ao mundo.

Anónimo disse...

A histeria deles leva a que finalmente o mundo entenda o que se está a passar em Timor.

Anónimo disse...

A explicação para as declarações prestadas pelo Governo Australiano está num relatório publicado pela Amnistia Internacional.
Ora leiam:

Factos e Estatísticas: o trabalho da Amnistia International
de Janeiro a Dezembro de 2002

Pessoas detidas e presas arbitrariamente, ou em prisão sem acusação ou julgamento, em 54 países:

Afeganistão, Argélia, Angola, Austrália, Bangladesh, Bósnia-Herzegovina, Burundi, Camarões, República Centro-Africana, China, Costa do Marfim, Cuba, Equador, Egipto, Eritreia, Etiópia, Jugoslávia, Gâmbia, Índia, Indonésia, Irão, Israel e Territórios Ocupados, Jamaica, Jordânia, Coreia do Sul, Kuwait, Laos, Líbano, Libéria, Malásia, México, Namíbia, Nepal, Nigéria, Paquistão, Autoridade Palestiniana, Papua Nova Guiné, Filipinas, Federação Russa, Ruanda, Arábia Saudita, Senegal, Serra Leoa, Singapura, Somália, Sudão, Síria, Togo, Trindade e Tobago, Emirados Árabes Unidos, Reino Unido, estados Unidos, Venezuela e Iémen.

Como vêm o "sistema de detenções" da Austrália foi posto em causa pela Amnistia Internacional.

É este o sistema judicial que a Austrália quer para Timor?!

Anónimo disse...

Por falar em sistema judicial australiano vejam mais um ralatório da:

Amnistia Internacional
Acusações país a país


Austrália

Um número alarmante de mortes sob custódia policial, especialmente aborígenes, fez surgir receios acerca de possíveis maus tratos.

As pessoas que chegam á austrália sem a devida documentação, incluindo os requerentes de asilo, continuaram a enfrentar a detenção obrigatória enquanto o seu pedido é avaliado, em clara violação das normas internacionais dos direitos Humanos. Apesar da opinião generalizada, alimentada por políticos, de que milhares de refugiados tentavam entrar na Austrália ilegalmente, apenas 346 “boat people” (balseiros) chegaram à Austrália durante o ano, dos quais 267 foram repatriados, a maior parte após algumas semanas.

A Comissão para os Direitos Humanos e Igualdade de Oportunidades considerou que certas políticas tinham sido “genocídios” e referiu os contínuos efeitos das violações dos Direitos Humanos sofridos pelas vítimas, incluindo maus tratos e restrições à liberdade de movimentos, O relatório salientou a ligação entre os efeitos das políticas e as actuais altas taxas de criminalidade aborígene e morte sob custódia. Em Dezembro, o
governo anunciou medidas sociais e de reagrupamento familiar, mas não comentou as conclusões da Comissão de que estas políticas tinham permitido o genocídio, discriminação racial sistemática e abuso físico e sexual de crianças.

Anónimo disse...

Um PM exemplar...

A recusa ao arvorar de bandeiras
por John Pilger

Outro dia foi encerrado um dos meus cinemas favoritos. Os andaimes levantaram-se em torno da art-deco do Valhalla, em Sydney, um dos melhores do mundo quanto à apresentação de poderosos documentários políticos. A ausência de alvoroço quanto a isso poderia parecer surpreendente numa cidade cuja simbólica Opera House pretende encarnar o orgulho da Austrália moderna quanto às artes. Mas o encerramento, ao contrário, reflectiu um abandono generalizado.

O Vallhalla certamente era uma anomalia numa Austrália tão envolvida no culto do "marketing" que um executivo do Sydney Morning Herald chegou a declarar: "a resposta não está em pessoas mais inteligentes e capazes" e sim em "pessoas que possam executar a sua estratégia". Em 9 de Fevereiro, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico, em Paris, proclamou a Austrália como a economia menos regulamentada e mais privatizada do mundo ocidental. Isto é um país possuído e dirigido por homens de negócios.

O exemplo mais vivo é a imprensa. Rupert Murdoch controla quase 70 por cento da circulação dos principais jornais. Com a excepção do multi-étnico Special Broadcasting Service e da rede de rádio da Australian Broadcasting Corporation, o resto dos media reflecte o murdoquismo e uma ideologia de mercado importada maciçamente dos Estados Unidos. As notáveis guerras de cultura do primeiro-ministro neoconservador, John Howard, exemplificam isto.

Howard acredita que "negócios e esporte" são as motivações principais da sociedade. Os outrora respeitados laboratórios de investigação científica do país, os CSIRO, foram instruídos a adoptarem patrocinadores de negócios. Quase isolada entre as nações, no ano passado a Austrália até se absteve de votar uma modesta proposta da Nações Unidas de que os seus membros deveriam defender a "diversidade" nas suas próprias culturas — contra a opressão das grandes potências. Quando o principal dramaturgo da Austrália, David Williamson, comparou a Austrália privatizada dos sonhos de Howard com um navio de cruzeiro a navegar para o "destino soberano" de um desastre ambiental, o seu discurso foi criticado pelo gabinete do primeiro-ministro e na imprensa de Murdoch foi orquestrada uma campanha odiosa contra ele.

Sem qualquer oposição política a falar dele, as conquistas de Howard tem sido nos media, com a historiografia a bajular. Apoiando-se numa imutável clique de comentaristas da extrema-direita, ele efectivamente asfixiou o debate acerca do sangrento passado colonial da Austrália enquanto ridiculariza a "teoria do luto da história": ou seja, a verdade de um racismo genocida que continua a devastar o povo aborígene. A sua campanha patrioteira do "mostre mais bandeiras" é puro George W. Bush. Foi ordenado às escolas que instalassem mastros de bandeiras e, no "Dia da Austrália", 26 de Janeiro, que "celebra" a "colonização" do país de um outro povo, são distribuídas bandeiras e muitas vezes elas são apresentadas com agressões imbecis.

Isto nunca fez parte da vida australiana. Os americanos embrulham-se nas suas bandeiras, mas não nós os australianos. Nós encaramos isto como uma recordação respeitosa daqueles que marcharam para combater e morrer nas mais catastróficas guerras imperiais da Austrália, aqueles que "fizeram o seu melhor". O regime Howard mudou tudo isto. O pequeno líder usa uma bandeira de plástico na lapela, tal como Bush, e põe a mão sobre o coração, tal como Bush, e reforça uma sociedade baseada na raça, tal como Bush. Enquanto a negligência de Nova Orleans é o símbolo de Bush, o desprezo mostrado em relação aos primeiros australianos é o de Howard.

No "Dia da Austrália", andei através das bandeiras até Redfern, uma área aborígene no centro da cidade, e celebrei o que os australianos negros chamam o Dia da Sobrevivência. O seu primeiro "Dia de Luto e Protesto" foi realizado em 1938, no 150º aniversário da invasão branca. Mais de um milhar de homens e mulheres aborígenes compareceram àquela primeira reunião dos direitos civis, depois de lhes ter sido recusada a utilização do edifício da municipalidade de Sydney. Uma longa e penosa campanha pela liberdade e justiça começou, e perdura, como uma presença invisível.

No Parque Redfern, no Dia da Sobrevivência, as bandeiras eram negras, vermelhas e douradas: as cores da pele indígena, da terra e do sol. O único relato que pude encontrar de Redfern nos jornais do dia seguinte foi uma pequena notícia que sem dúvida foi enviada aos jornais pela polícia. Se a palavra "aborígene" entrasse na arena pública ela deveria ser associada a "sem esperança".

Na Austrália de Howard, o derradeiro "sem esperança" é um jovem doente, aterrorizado, profundamente perturbado e maltratado chamado David Hicks. Hicks era um vagabundo, de um tipo australiano outrora chamado de "andarilho" ("swagman") e "indisciplinado" ("larrikin") e enaltecido pelos nossos poetas pastoris e cantores de baladas. Na década de 1990 Hicks tornou-se muçulmano e vagabundeou pelo Kosovo, e a seguir no Afeganistão, onde foi sequestrado pelos americanos e enviado para o seu campo de concentração da Baía de Guantanamo. Não existe nem uma partícula de prova de que Hicks tenha combatido pela al-Qaeda, ou de que seja um terrorista. Ele é um andarilho errante. Mas teve de enfrentar uma das "comissões militares" de Bush, em que é utilizada tortura para extrair confissões, e não há direito ao cruzamento de testemunhos, nem presunção de inocência e nem qualquer padrão de prova "para além de uma dúvida razoável". Até três dos seleccionados promotores militares americanos retiraram-se, argumentando que a comissão não dispõe de convicções seguras. Muitos dos principais juristas da Austrália concordam.

Mas o governo de Howard disse, exactamente com estas palavras, que David Hicks pode apodrecer. Ele é um sem esperança, não americano, sem aspirações. Ponha mais bandeiras lá para fora.


27/Fevereiro/2006
O original encontra-se em http://www.newstatesman.com/200602270012

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
This is my blogchalk: Timor, Timor-Leste, East Timor, Dili, Portuguese, English, Malai Azul, politica, situação, Xanana, Ramos-Horta, Alkatiri, Conflito, Crise, ISF, GNR, UNPOL, UNMIT, ONU, UN.