sábado, outubro 21, 2006

O colapso da intervenção da Austrália no Pacífico

Tradução da Margarida.

onlineopinion.com
Por Tim Anderson – postado Sexta-feira, 20 Outubro 2006

O forte voto de confiança parlamentar no Primeiro-Ministro das Ilhas Salomão Manasseh Sogavare é um sinal de que a estratégica de intervenção no Pacífico do Governo Howard está a enfrentar o colapso.

O voto nas Salomão veio depois do Governo Sogavare ter expulso o Alto Comissário Australiano por interferência política, ter enfrentado o Governo Howard sobre o caso Moti, e parece estar à beira do fim o projecto RAMSI Australiano “polícia e finanças”.. O parlamento apoiou o desafio de Sogavare à Austrália, com uma votação de 28 para 17.

Logo quando a presença da polícia e das tropas Australianas tinham atingido o seu ponto mais alto na região, a rejeição política da “assistência regional” de Howard está a aumentar nas Ilhas Salomão, Timor-Leste e Papua Nova Guiné. Os líderes do Pacifico estão a re-avaliar os custos do patrocínio Australiano.

No tecto deste patrocínio, e por detrás da conversa da “boa governação”, está o bastante colonial padrão de exigência para acesso previlegiado aos recursos naturais, o enfraquecimento de instrituições públicas e a construção de recursos humanos através da doutrina de “mercados abertos”, e “negação estratégica” de competidores potenciais.

Sendo um projecto neo-colonial, isso requer regimes colaborantes. Contudo as Salomão viraram-se contra, a Papua Nova Guiné sob Michael Somare está a tornar-se crescentemente assertiva e, depois duma intervenção partidária na crise de Timor-Leste, a Austrália enfrenta a provável re-eleição em 2007 de um governo da Fretilin liderado por Alkatiri.

Segundo as afirmações Australianas, todos os três países vizinhos tomaram iniciativas para extrair mais valor dos seus recursos naturais (petróleo, gás, extracções mineiras, florestas), para desenvolver algumas políticas de áreas a que a Austrália falhou o apoio (produção do arroz, programas de saúde pública), e para diversificar os seus parceiros de assistência ao desenvolvimento (China, Malásia, Japão, Cuba, Taiwan).

Elementos mais específicos do plano de “assistência regional” Australiana procuraram introduzir burocratas financeiros Australianos, marginalizar as forças armadas do Pacífico e construir forças de polícia patrocinadas pelos Australianos. Contudo esses programas de polícia têm explodido antes do tempo na Papua Nova Guiné e nas Salomão.

O Programa Reforçado de Cooperação (ECP) foi forçado a um Governo relutante da Papua Nova Guiné em 2004, somente para serem arrombadas por um desafio legal. Os burocratas de Canberra falharam, não leram a Constituição da Papua Nova Guiné, que não permite imunidades ao estilo dos USA. O Ministro dos Estrangeiros Australianos, Alexander Downer, pareceu surpreendido com a “recusa” dos Papuanovaguineenses a reverem a sua Constituição para sua conveniência.

Muito foi dito da proposta “contribuição” de A$800 milhões do ECP para a Papua Nova Guiné. De facto, como a Aid/Watch realçou, destes, A$734 milhões são destinados a salários e à logística da Polícia Federal Australiana. A Papua Nova Guiné está farta de tal “ajuda boomerang”. O Presidente da Associação da Polícia da Papua Nova Guiné, Robert Ali, disse que a maioria dos seus 300 oficiais numa reunião em Port Moresby querem que a polícia ECP Australiana parta. É improvável que acrescente muito duzentos polícias Australianos sobrepagos que servem principalmente como um gesto de garantia para os investidores Australianos na Papua Nova Guiné.

Depois do colapso do ECP, Michael Somare fez este argumento: “Gostaríamos de remover o cordão umbilical de depender [da] Austrália e de diversificar as nossas relações com a região e o mundo”. Não está claro que Canberra compreenda o que está por detrás desta mensagem.

Conflitos recentes com as Salomão centraram-se à volta duma proposta de inquérito aos distúrbios de 2006. O Governo Howard pareceu determinado em evitar qualquer apontar de culpa na força RAMSI. Contudo como escreveu o Bispo Terry Roberts de Honiara, “a faísca’ que levou os manifestantes para o centro de Honiara foi o uso de gás lacrimogéneo pelo contingente Australiano do RAMSI”. A polícia Australiana ignorou um pedido do Presidente do Parlamento, Peter Kenilorea, para não usar o gás lacrimogéneo sobre as pessoas. O Bispo Roberts observa “As pessoas de Honiara nunca gostaram do contingente Australiano do RAMSI [que são] mal-humorados e hostis … ‘Ajudar os Amigos’ transformou-se em ‘Estragar os amigos’.”

Aparte o policiamento inepto, a intervenção da RAMSI é vista como tendo sido partidária, para apoiar o antigo Governo Kemekza-Rini, por ter apoiado grandes expatriados. Os interesses comerciais Chineses (tal como o Pacific Casino Hotel) e de nada ter feito sobre cortes de árvores ilegais. O magazine regional cão de guarda Masalai I tokaut realça que, depois da missão RAMSI ter chegado, o abate de árvores triplicou mas “os rendimentos do governo permaneceram estáticos na sua maioria”.

Depois do Procurador-Geral das Salomão Julian Moti ter fugido da Papua Nova Guiné para as Salomão, Downer suspendeu as conversas ministeriais com o Governo da Papua Nova Guiné e foi relatado ter dito que a Austrália “não continuaria a apoiar governos corruptos” na região e que “não se limitaria apenas a depositar ajuda em países vizinhos”. Contudo por detrás deste insulto está o facto de muito pouca ajuda Australiana chegar aos povos do Pacifico.

A Papua Nova Guiné é o melhor exemplo disto. Os $10 biliões de “ajuda” Australiana durante os 30 anos desde a independência podem ter garantido os direitos das companhias Australianas de exploração de minas e de gás na Papua Nova Guiné, mas não ajudou a educação das massas, nem ajudou a construir um serviço de saúde decente. As taxas de analfabetismo nos adultos e da mortalidade infantil na Papua Nova Guiné estão bastante abaixo da média dos países em desenvolvimento. A retirada da ajuda à Papua Nova Guiné teria um impacto muito maior na mão cheia de companhias Australianas que detém a maioria dos contratos da AusAID. Somente uma mão cheia de companhias da Papua Nova Guiné apanham as “sobras”; a maioria das pessoas na Papua Nova Guiné não apanha nada.

A mais completa intervenção política na região tem sido a campanha apoiada pelos Australianos para derrubar o Primeiro-Ministro de Timor Leste Mari Alkatiri. O primeiro eleito primeiro-ministro da nova nação tinha conduzido a política mais independente na região - garantindo um melhor acordo sobre as royalties do gás e do petróleo e trazendo novos parceiros do desenvolvimento. O Japão ajudou a produção de arroz Timorense, quando a Austrália não o fez. A China começou conversas sobre ajuda na refinação do gás, enquanto o Governo de Howard roubava os recursos de petróleo e de gás do país. E Cuba ajudou Timor-Leste a construir um serviço de saúde decente. Alkatiri tentou NÃO alienar os grandes poderes, mas a intervenção partidária Australiana mudou tudo isso.

Apesar das ligações anteriores entre os ex-militares golpistas e o Governo Howard, as forças Australianas alinharam rapidamente com a coligação solta de elementos anti-Fretilin que se agrupavam à volta do Presidente Xanana Gusmão. Os media Australianos, em particular o Australian de Murdoch mas também o Four Corners da ABC, jogaram um papel chave na deposição de Alkatiri (ainda o Secretário-Geral da Fretilin) e instalaram José Ramos Horta como Primeiro-Ministro interino.

Contudo as eleições gerais e municipais mostram que a Fretilin mantém-se de forma preponderante o partido mais popular do país. Não tem um rival próximo. Ramos Horta, sem base partidária, é ancorado pela presença Australiana continuada. Contudo a presença Australiana, hostil à Fretilin, mantém-se um ponto de encontro para grupos desafectos, incluindo os que estão a aterrorizar os muitos milhares que ainda estão nos campos de deslocados. Esta situação tensa é perigosa, mina a política “normal” e alimenta uma nova milícia, quanto mais tempo persistir.

É pobre na Austrália o entendimento da fragilidade e das consequências sérias das intervenções da Austrália no Pacifico, com os media das corporações (e uma media pública intimidada) a promoveram na grande maioria a linha do Governo Howard. Para além de a Polícia Federal Australiana (AFP) e as Forças de Defesa Australianas terem sido puxadas para este projecto imperial.

O Chefe da AFP, Mick Keelty juntou-se ao coro do Gabinete Howard (dizendo) que o caso Moti não era nada “político”. (Com certeza, se “não político” é medido pelos números de intervenções do Gabinete de Ministros, o caso Moti foi muito apolítico.) Keelty não explicou porque é que escolheu o meio duma crise política para dar caça ao Procurador-Geral das Salomão, sobre acusações de sexo que tinham sido abandonadas há alguns anos atrás em Vanuatu. Mas podemos lembrar-nos que as intervenções nas Salomão e Na Papua Nova Guiné significaram milhões de dólares para a AFP de Keelty.

A retórica política pode ser transitória em todos os lados. Contudo seremos capazes de medir o colapso da estratégia de intervenção no Pacífico do Governo de Howard por derrotas significativos nos seus elementos centrais. Isto é, estão os nossos vizinhos efectivamente a reclamar o controlo dos seus recursos naturais? Estão eles a desenvolver políticas independentes que lhes permitam construir instituições públicas e desenvolver os seus recursos humanos? E estão eles efectivamente a diversificarem os seus parceiros de desenvolvimento? Será para o bem dos seus povos se o fizerem.

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Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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