segunda-feira, agosto 20, 2007

Dos Leitores

H. Correia deixou um novo comentário na sua mensagem "The safety valve":

"The traditional safety valve for East Timorese has been the relative ease with which they can obtain Portuguese citizenship. The Portuguese nationality laws are curious in that they not only apply the principle of jus sanguine (ie: who or what your family were) but also jus soli (the territory in which your family lived). This is a throwback to when Portuguese colonies, like East Timor, were considered 'overseas provinces'."

Este parágrafo encerra alguns exemplos de como os anglófonos, nomeadamente britânicos e australianos, têm dificuldade em entender culturas diferentes.

Em primeiro lugar, os timorenses não têm "relativa" (nem absoluta) "facilidade" (nem dificuldade) em "obter" a nacionalidade portuguesa. É um direito seu, aplicável a todos os nascidos até Maio de 2001, quando Timor se tornou Estado independente reconhecido pela comunidade internacional.

Os habitantes das antigas províncias ultramarinas portuguesas, que são habitualmente designadas colónias (e não o contrário), eram portugueses de pleno direito, como acontece ainda hoje com os habitantes dos territórios ultramarinos franceses. Esta doutrina distingue-se da britânica, por exemplo - veja-se o caso de Hong Kong, onde apesar de milhões dos seus habitantes falarem Inglês e pensarem como ingleses, muito poucos conseguiram o privilégio da nacionalidade britânica, por não terem nascido em solo britânico (esta sim, sempre foi assumidamente "colónia").

O mesmo não acontecia com Portugal - compare-se HK com o exemplo de Macau, onde todos os seus naturais nascidos até 1976 eram considerados portugueses à luz da Lei portuguesa, pois as provícias ultramarinas eram parte integrante do território nacional e estavam subordinadas à sua jurisdição.

A chamada lei da nacionalidade portuguesa nada tem de curioso, sendo idêntica à de outros países europeus. Não percebo a opinião do colunista, pois o princípio de jus soli é excepção e não regra, o que é perfeitamente lógico.

O colunista demonstra não estar a par das leis portuguesas. Segundo a lei em vigor, o senegalês nascido em Portugal pode adquirir a nacionalidade portuguesa desde que os seus pais aí residam legalmente há pelo menos 6 anos. A diferença entre este e um timorense (nascido até Maio de 2001) é que o primeiro, sendo estrangeiro de nascimento (filho de pais estrangeiros) tem que adquirir a nacionalidade portuguesa, enquanto o timorense já é português de nascimento, apenas tendo que formalizar o seu desejo de ter e usufruir efectivamente dos direitos e deveres inerentes - o mesmo se passa em relação a um português nascido na França, por exemplo.

Portanto, nunca os direitos dos timorenses serão, nem poderiam ser, afectados por mudanças no estatuto de terceiros.

Da mesma maneira, o (des)conhecimento da língua portuguesa não pode limitar ou impedir o exercício dos direitos de qualquer cidadão nascido português. Este princípio de não discriminação em função da raça, naturalidade, cultura, religião ou língua materna ajuda a entender porque Portugal continua a ser estimado e respeitado em todo o mundo, especialmente pelos timorenses, algo que deve fazer muita confusão a certos habitantes de países de língua inglesa.

2 comentários:

Ken Westmoreland disse...

"pensarem como ingleses"

Poucos chineses em Hong Kong com nacionalidade brit�nica consideram-se brit�nicos, sem falar ingleses.

Se o Senhor Correia conhecesse os timorenses no Reino Unido, conheceria gente que n�o tem nenhum inter�s em aprender portugu�s nem viver em Portugal. � outra m�o, as crian�as de imigrantes em Portugal n�o puderam nacionalidade portuguesa at� agora.

http://ipsnews.net/news.asp?idnews=32189

Por qu� considera o Senhor Correia os que t�m desprezo pela l�ngua e a na�o portuguesa mais portugueses do que os que n�o conhecem nenhuma outra l�ngua ou na�o?

A lei da nacionalidade na Alemanha � ainda mais absurda (e racista) porque um turco que viviu em Colonha 40 anos n�o pode obter cidadania alemanha, mas os "alem�os" de Volga que n�o falam alem�o, apenas r�ssio.

Compreendo muito b�m as raz�es hist�ricas pela natura da lei de nacionalidade portuguesa, mas a situa�o actual � um anacronismo rid�culo, que n�o � nos interesses de Portugal nem Timor Leste.

Anónimo disse...

Caro Blog Na'in:

Depois de ler o seu comentário, que agradeço, verifico que algumas questões permanecem mal entendidas.

O que está aqui em causa é o direito de macaenses, timorenses, caboverdianos, etc, nascidos em solo português e sob a bandeira portuguesa a serem cidadãos portugueses.

O mesmo não acontece com os súbditos de Sua Majestade a Rainha Elizabeth II não nascidos em solo britânico. Se os habitantes de HK querem ou não a nacionalidade britânica, é problema deles. O que é grave, porém, é que estes não têm sequer direito a escolhê-la, pois a própria Grã-Bretanha lhes negou à partida essa possibilidade.

Portugal é um país livre e os cidadãos portugueses têm o direito de escolher a língua que falam ou o local de residência. Também têm o direito de odiar Portugal ou, até, de renunciar à sua nacionalidade.

O que o Estado português não pode, nem nunca poderá, é discriminar esses cidadãos, negando-lhes à partida aquilo que lhes pertence desde o nascimento - a nacionalidade, seja por que motivo for. (Vd. Artº 1º da Lei nº 37/81, com alterações da Lei Orgânica nº2/2006).

Sobre os menores estrangeiros nascidos em Portugal, repito que têm todos direito à aquisição da nacionalidade portuguesa, após 5 anos de residência legal - e não 6, como por lapso escrevi (Vd. Lei citada supra, Artº 6º, nº 2, e preâmbulo do D.L. nº 237-A/2006).

Não vejo como pode Portugal ter uma lei anacrónica, se é idêntica às leis da maioria dos países europeus e até mais avançada do que certos países, especialmente, os EUA - quantos estrangeiros nascidos em solo americano podem adquirir a nacionalidade americana automaticamente?

Entretanto, veja como o colunista de língua inglesa citado no Blog Timor Online está longe da realidade:

"A nova Lei não confere a nacionalidade automaticamente a todos os que nasçam em Portugal, ainda que de pais ilegais – nenhum País europeu o faz. Seria um incentivo à imigração clandestina e uma irresponsabilidade na gestão de uma fronteira que já não é apenas nossa mas é europeia.

O sistema continua a privilegiar o ius sanguini (na aquisição originária por filiação não há, praticamente, outros requisitos, enquanto que para o ius soli há normalmente a regra da legalidade dos pais) mas há um reforço significativo do ius soli, retomando uma tradição legislativa abandonada em 1981."

Esta citação e outras notas, bem como o próprio articulado da lei podem ser lidos em:

http://www.acime.gov.pt/modules.php?name=News&file=article&sid=1253

Toda a legislação aplicável pode ser consultada em:

http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT/Governos/Governos_Constitucionais/GC17/Ministerios/PCM/MP/Comunicacao/Programas_e_Dossiers/20051013_MP_Doss_Lei_Nacionalidade.htm

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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