quinta-feira, julho 13, 2006

Sem romantismos

Sendo certo que as dinâmicas políticas, as formas de governar e agregar politicamente uma comunidade são plurais e diversas;

Sendo certo que a democracia do tipo liberal e ocidental apresenta hoje gravíssimas crises pelo que deixou de funcionar como modelo credível;

Sendo certo que em Timor Leste as realidades e as meta-realidades se regem por outras lógicas, outras formas de conceber as rivalidades, os compromissos e a política;

Sendo certo que aqueles que se nos apresentam hoje como antogonistas políticos partilham relações familiares fortíssimas assim como passados de luta e resistência nacionalista inquestionáveis;

Sendo certo que é necessário ler e reler o presente de TL com uma atenção crescente e cuidadosa e saber manter-se tão longe e tão perto quanto todas e todos as/os timorenses o quiserem,

Há suspeitas que permanece no meu espírito:

- Será que Timor Leste e os seus dirigentes estão assim tão imunes a ambições pessoais que a última lógica que rege as suas acções seja o compromisso para com Timor Leste?
- Será que, em última instância, estar em cima de um dos estreitos marítimos mais geoestratégicos - no panorama político/militar contemporâneo - não perturba essa maneira tão 'própria' (?) de se ser Timor?

- Será que a possibilidade ou a impossibilidade de chegar, de alguma maneira, aos rendimentos que as jazidas do petróleo e gás não traz para as relações políticas em Timor Leste novos elementos de compreensão e avaliação do valor das coisas, das relações familiares e do poder?
- Será que os traumas provocados por séculos de colonialismo português e 24 anos de guerra de ocupação indonésia deixaram assim tão intactos os equilíbrios, as forças e as intenções?
-Será que o discurso de tomada de posse do Primeiro Ministro José Ramos Horta é assim tão isento de ideologia (tão ocidental!) que determina numa exacta medida quem são os amigos e os inimigos?

A mim parece-me que teria que ser uma Terra e um Povo tão excepcionais que de algum modo podem sobreviver neste planeta.

Aceitando a diversidade, a intangibilidade, a incomensurabilidade de uma sociedade tão ancestral e tão singular, parece-me um pouco demagógico dizer-se que de uma maneira ou de outra eles, os timorenses, sairão da crise como nela entraram: fazendo justiça a Timor Leste ao fim de uma tarde à volta de uma conversa. Parece-me fácil demais e uma tremenda injustiça para quem nos últimos meses teve as suas casas queimadas, pilhadas, parentes mortos ou fugidos, famílias separadas, vidas interrompidas, esperanças destroçadas e todo o rol de sofrimentos impostos pelos acontecimentos que conhecemos.

Para mim a tolerância à ambiguidade tem como limite qualquer acto deliberado de indignidade humana.

Albertina Soares

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13 comentários:

Anónimo disse...

ACHO QUE INCOMENSURABILIDADE E UMA PALAVRA DE DEZ TONELADAS QUE MUITA BOA GENTE NAO PERCEBE.

ISTO E AREIA DEMAIS PARA MUITA CAMIONETA.

EM INDONESIO DEVE SER "OAN ROKO"

Anónimo disse...

Este parágrafo da Albertina Dias é inacreditável: "Sendo certo que a democracia do tipo liberal e ocidental apresenta hoje gravíssimas crises pelo que deixou de funcionar como modelo credível".

Gostava de saber qual é a alternativa "credível" que sugere.

Democracia popular tipo ditadura do proletariado?
Sim senhora, isso é que é imaginação e criatividade.

E para isso funcionar, os Gulags seriam onde? Ataúro?

Anónimo disse...

Albertina Soares: faço minhas as suas tão lúcidas palavras: “Para mim a tolerância à ambiguidade tem como limite qualquer acto deliberado de indignidade humana.”

Porque de facto foi - no mínimo! - uma indignidade deliberada o que fizeram à Fretilin e aos seus legítimos dirigentes. Além de que foi criminoso o queimar de casas lojas e sedes da Fretilin, a pilhagem e as destruições de casas, lojas e edifícios públicos, as perseguições a homens, mulheres e crianças só porque eram originárias do leste ou por suspeitas de apoiarem o governo e a Fretilim, como foi também criminosa a desestabilização persistente e deliberada das FDTL e da PNTL.

Também eu acho “um pouco demagógico dizer-se que de uma maneira ou de outra eles, os timorenses, sairão da crise como nela entraram”.

Porque há timorenses que no fim da crise não têm pais, mães, irmãos, irmãs, maridos e mulheres, porque foram mortos. E outros há que saem desta crise com profundas marcas no seu corpo e muitos, na casa das dezenas de milhares, com traumatismos, quem sabe se para o resto das suas vidas. E umas centenas de membros das forças de segurança, hoje aquartelados, impotentes, nos seus quartéis, sentirão particularmente durante muito tempo a vergonha de a segurança no seu país depender de estrangeiros.

Anónimo disse...

E quem quer a margarida culpar pelos mortos. Quem e que causou essas mortes? Quanto as forcas de seguranca estarem envergonhados mais pelos massacres cometidos e nao por estarem aquarteladas.

Anónimo disse...

Concordo com o PM Ramos Horta de que as forcas de seguranca foram tambem vitimas de decisoes politicas mal pensadas que usaram essas forcas como intrumentos de repressao e levaram-nos a cometer crimes sem que a culpa fosse deles mas porque seguiram ordens de politicos.

Anónimo disse...

Está mais que evidente que por trás das armas HÁ PESSOAS! Foi seguramente a vergonha que fez com que mais militares não tivessem descambado a atirar em massa. Esperemos que tenham sido sim muito poucos aqueles que dispararam. Sentir-se-ão sim enganados e ainda se vai ver por quem.

O que aconteceu é uma vergonha.

O legalidade dos representantes máximos da Fretilin é uma farsa! Na Fretilin aqueles que dizem isso não têm vergonha alguma pois em plena crise deram-se ao luxo de fazerem o que fizeram. Porque quiseram? Pois e os resultados também - porque os quiseram assim!

Um Congresso em plena crise e espanto total, não falam sequer sobre ela. Preferem enveredar pelo Poder que dizem ter e mostrar que estavam de pedra e cal! Fizeram bem, assim percebe-se a importãncia que têm as pessoas para os mandantes deste partido. Desculpem mas é repulsa e acreditem que não posso ver americanos, australianos ou outros com idênticos propósitos. Até os acho bastante parecidos, SEDE DE PODER, borrifando-se completamente para as condições de vida dos seus povos...

E se Timor-Leste é algo que está numa zona nevrálgica para estratégias, meus caros, os interessados certamente que andam no terreno à muito. Então, afinal que negociação tão positiva foi aquela que deu confusão? Então agora estavan à espera que encostando-se à China o pessoal da zona fique quieto? Ganda negócio o sr. Alkatiri fez.

Anónimo disse...

Anónimo das 1:19:38 AM: ainda não percebeu que quem “culpa” são os tribunais? Tenha calma. Deixe que actuem. E deixe que também a tão falada comissão internacional, que afinal nem aí ainda chegou, diga o que apurou. Mas que morreram militares, polícias e civis – entre os quais uma mãe e cinco filhos, familiares do Rogério Lobato, disso não restam dúvidas nenhumas.

Anónimo disse...

A democracia liberal, ou não, ainda é o melhor que temos em que pese os sinais de esgotamento, ou melhor, de desmoralização. Fora deste frágil sistema representativo ficamos com a ditadura do proletariado (se é que em algum momento existiu) ou ditaduras de fundo empresarial-militar. Isto não quer dizer que não tenhamos experiências que venham clarear os horizontes. Na A.L. o caso da Bolívia, com Evo Moráles, na Venezuela, com o Hugo Chaves e a campanha de Obrador no México vem possibilitando sonhar novamente. Mas o que esses dois governos vem apresentando de diferente? Profundo compromisso com a população, particularmente com os mais pobres.
Ficam fora do conceito de democracia participativa os EUA, Cuba e Brasil.
O primeiro possui uma cultura imperialista (destino manifesto)e uma arrogância que só se cristaliza pelo imbatível aparato militar; todo o resto, inclusive sua campanha pela democracia é uma grosseira perfumaria. Cuba, por sua vez, mais me parece gerida por um "déspota esclarecido" que a partir da militarização do P.C.C. se perpetua no poder. Isto, por outro lado, não justifica o bloqueio econômico dos EUA à ilha de Fidel.
O Brasil é, possivelmente, a maior frustação para os movimentos sociais. Saido de uma ditadura de mais de 20 anos teve a oportunidade histórica de eleger o operário Lula presidente da República. Qual foi a sua atitude e do seu partido, o Partido dos trabalhadores? Aliaram-se sem o menor escrúpulos aos banqueiros internacionais, garantindo-lhes o pagamento de uma dívida externa impagável. Para tanto nomearam para o Banco Central, ou orgão similar, um dos seus representantes no Brasil que é, por exemplo, acusado por evasão de divisas. Como reação a esta traição surgiu o Partido do Socialismo e da Liberdade, PSOL, que pretende ser fiel aos interesses da população.
Vejamos o que nos poderá oferecer.
Diferentemente de Albertina, acredito, sim, que é pelo diálogo que TL sairá desta crise. A não ser que os timorenses sejam estúpidos, o que não creio; não é o que vejo nesse blog. Evidentemente não será em uma tarde de conversa amena que as questões ai vividas serão resovidas. Uma das saídas deverá ser pelo absoluto respeito ao Estado de Direito, sem o qual não se colocam de pé. Isto tanto serve para a Fretilin quanto para os militares, para a oposição, para o PR e PM e as instituições que representam o Estado.
Pelo que conheço da história do povo de TL, acredito que não haja força bruta que os faça calar.
Saudações,
Alfredo
Brasil

Anónimo disse...

CARO ALFREDO, CONCORDO COM O TEU PONTO DE VISTA. FORCINHA RAPAZ!

Anónimo disse...

Gostaria de Perguntar onde estavam estes senhoras e senhoras incluindo a Margarida quando durante a I primeira governacao houve tantas monobras nas leis? Porque so fazem criticas agora? Estao a puxar a brasa para as vossas sardinhas?

Parem de Criticar, vamos trabalhar ao povinho.

Anónimo disse...

Alfredo:

Não tenho dúvidas que a arrogência da Administração Bush está a empurrar muitos Latino americanos na direcção do nacionalismo de cariz populista.
Se isso está a trazer benefícios às populações é que já duvido muito.
Quanto a Cuba, bem, só quem não foi lá ainda. Quem tem acesso às divisas dos turistas ainda se safa, o resto vive na mais profunda miséria e fome. Exceptua-se como é evidente a Nomenklatura.
Fidel e seus sequazes ainda pensam que a fome e as aspirações de bem estar se satisfazem com discursos de 6 horas. O mais grave é que a teimosia de Fidel em não preparar uma transição controlada e progressiva vai resultar numa convulsão interna desastrosa assim que ele expirar o último suspiro. Secou tudo à sua volta, como faz qualquer ditador que não quer sombra e o resultado vai ser um saco de gatos. Tal como na Russia, cada dirigente do partido vai formar uma máfia privada para transitar a actual corrupção em extorsão mafiosa.
O único exemplo de sucesso a Sul dos Estados Unidos parece ser o Chile.
Porque será?
Porque o povo inculto continua a ser manobrado por ditadores de todas as cores.
Um amigo sul americano disse-me um dia que os estados sul americanos deviam ser chamados de LP.
Long Play, 33 revoluciones por minuto.

Anónimo disse...

Alfredo: estávamos a discutir as tristes consequências que esta golpada trouxe para a população timorense em geral (repare a os australianos mantém mais de 2000 tropas em TL), para a de Dili em particular (com as dezenas de milhares de deslocados), para as pessoas do leste do país e simpatizantes da Fretilin ou do governo que só por o serem são perseguidos e para os familiares dos mortos e feridos desta golpaça.
Você agora introduz a questão da “democracia liberal” que acha que é o “melhor que temos”, aproveita para desancar no regime Cubano e no governo de Lula e vender o peixe do seu PSOL .
Desculpe-me a franqueza, mas aproveitar-se da desgraça dos Timorenses para nos querer impingir as tretas da IV Internacional parece-me pelo menos oportunismo, por isso mesmo foi logo apoiado pelos anónimos oportunistas que se seguiram. Que tal como o Boaventura Sousa Santos falam doutros, na esperança de que a malta deixe de reparar que as botas dos soldados que patrulham as ruas de Dili são calçadas por pés australianos...

Voltemos a Timor-Leste que é o que aqui nos traz e recordemos o básico: é um pequeno país com cerca de um milhão de habitantes que só há quatro anos se tornou independente, que votou maioritariamente (mais de 57%) na Fretilin que tanto no governo como no Parlamento realizou uma obra notável de que destaco a aprovação da sua Constituição das mais progressistas do mundo como pode constatar pelo seu Artigo 6.º
(Objectivos do Estado)
O Estado tem como objectivos fundamentais:
a) Defender e garantir a soberania do país;
b) Garantir e promover os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o
respeito pelos princípios do Estado de direito democrático;
c) Defender e garantir a democracia política e a participação popular na
resolução dos problemas nacionais;
d) Garantir o desenvolvimento da economia e o progresso da ciência e da
técnica;
e) Promover a edificação de uma sociedade com base na justiça social, criando
o bem-estar material e espiritual dos cidadãos;
f) Proteger o meio ambiente e preservar os recursos naturais;
g) Afirmar e valorizar a personalidade e o património cultural do povo
timorense;
h) Promover o estabelecimento e o desenvolvimento de relações de amizade e
cooperação entre todos os povos e Estados;
i) Promover o desenvolvimento harmonioso e integrado dos sectores e regiões
e a justa repartição do produto nacional;
j) Criar, promover e garantir a efectiva igualdade de oportunidades entre a
mulher e o homem.

Deixemos pois que sejam os Timorenses em geral e a Fretilin em particular, a resolver esta crise, no âmbito da sua Constituição. E esta saída constitucional, agora formalizada com a tomada de posse do novo Governo, conforme a Fretilin indicou ao PR, o prolongamento do funcionamento do Parlamento Nacional (para aprovar o Orçamento e a lei eleitoral) a actuação disciplinada e patriótica das F-FDTL, dá-nos esperança de Timor-Leste poder vir a retomar a normalidade do dia-a-dia e a segurança da população e das instituições democráticas, o regresso a casa e às actividades.

Anónimo disse...

Não concordo que hoje a AL viva uma onda populista. Seria Chaves um governo deste tipo? Não creio. Além do mais a Venezuela tem parceiros econômicos tanto com os EUA quanto Cuba; vá entender as ideologias! É bom lembrar que Chaves é presidente por vontade do povo que é o grande soberano que querem apagar.Mas o que de fato os EUA não admite é a radicalidade do discurso de Chaves onde fica exposta a venal politica externa americana.
Se o comentador acredita que Cuba viva na miséria, certamente não conhece os países do Caribe como Jamaica, Haiti, etc. Cuba está materialmente muito acima das nações da AL; é uma pena que não tenha avançado na política.
Por exemplo: um blog deste tipo jamais existiria em Cuba ou outros menos cotados.
Há mais de dez anos pude ouvir e comprimentar o Sr. Fidel Castro quando esteve no meu país. De fato é uma pessoa de talento incomum, mas hoje não me engana. Também não tenho dúvida que seu apoio popular seja em grande parte movido pelo bem fundado sentimento anti-americano.
O Chili, meu prezado, tem favelas de meter medo. O neo-liberalismo criou um fosso entre ricos e pobres de balançar os Andes!
Não conheço as resoluções da IV Internacional de que Margarida fala. Este rótulo pouco contribui com à crítica. É necessário separar o mito para melhor entender os fatos. Também, prezados amigos, não estou instrumentalizando as dificuldades dos timorenses para vender "verdades".
Terminantemente não tem o meu apoio Golpe de Estado sejam eles dados por Xanana ou pelo Papa. Todo país falido começa por ele.
Democracia é democracia, sem adjetivos!
Acredito que hoje a única experiência de nação que aspira ser social e ambientalmente justa, solidária, tolerante com as minorias éticas ou políticas esteja sendo jogada em Timor-Leste. Os tristes exemplos pelo mundo afora estão aí para reflexão de todos.
O desafio maior está, sem dúvida, nas mãos dos Senhores.
Saudações
Alfredo
Brasil

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
This is my blogchalk: Timor, Timor-Leste, East Timor, Dili, Portuguese, English, Malai Azul, politica, situação, Xanana, Ramos-Horta, Alkatiri, Conflito, Crise, ISF, GNR, UNPOL, UNMIT, ONU, UN.