segunda-feira, janeiro 15, 2007

Asean rejects GMA call for reforms in Myanmar

Manila Standard Today
By Joyce Pangco Pañares

Monday, Jan. 15, 2007

CEBU—The Association of Southeast Asian Nations appeared divided once again over military rule in Myanmar, but summit host President Gloria Macapagal Arroyo insisted that the organization might lose credibility if it failed to act on human rights violations in that country.

“We agreed on the need to preserve Asean’s credibility as an effective regional organization by demonstrating a capacity to manage important issues within the region. In this regard, we called for the release of those placed under detention [in Myanmar] and for effective dialog with all parties, concerned,” Mrs. Arroyo said.

But President Arroyo’s call for a strongly worded pitch for Burma’s adoption of an Asean-sponsored roadmap to democracy and the release of opposition leader and Nobel Peace Prize winner Aung San Suu Kyi did not materialize.

According to a source in the Department of Foreign Affairs, leaders who attended the 12th Asean Summit here expressed differing opinions on the issue of continued military rule in Myanmar.

“They could not really achieve a consensus, so the words for the chairman’s statement had to be crafted carefully to reflect the common sentiment that there is a need to free those who are detained. But as to what to do about it, there was no consensus,” the source said.

Mrs. Arroyo only used the term “encourage” in prodding the head of the Myanmar junta, Gen. Soe Win, to “make greater progress toward national reconciliation.”

Days before the summit, the United States suffered a double-veto from both China and Russia after it tried to seek approval of a United Nations resolution criticizing Myanmar before the UN Security Council.

China, a permanent member of the council, said the US had overstepped its power in attempting to resolve Burma’s human rights problems before the council.

“The situation in Myanmar does not constitute a threat to a regional and international peace and security. If the Security Council passed a resolution on the Myanmar issue, that would have exceeded the duties of the council laid out in the United Nations Charter,” Chinese Foreign Ministry spokesman Liu Jianchao said.

Malaysian Prime Minister Abdullah Badawi echoed China’s view in a separate interview here at the Cebu International Convention Center.

“Myanmar is not a security issue in the region but we had a lot of discussions on Myanmar,” Abdullah said. He refused to elaborate on the exchanges among the 10 heads of government who discussed the human rights issue in Myanmar.

But Indonesian President Susilo Bambang Yudhoyono, apparently embarrassed that the issue was almost elevated to the UN, told his counterpart from Myanmar that the military junta must do its part in restoring democracy instead of hiding behind Asean’s policy of non-intervention.

“How are we going to help you if you are not making progress?” Yudhoyono said.

Prime Minister Jose Ramos Horta of East Timor, the most recent country to sign Asean’s Treaty of Amity, insisted that Suu Kyi should be released immediately after spending more than 15 years in detention.

“It’s a question of humanity and a question of fairness. Aung San Suu Kyi committed no crime whatsoever against her country or her people. Quite the contrary. So, it’s quite unfair and unwise that she remains in prison,” Horta said in a television interview.

Washington has already imposed investment and trade restrictions on Myanmar, where the ruling junta is accused of massive human rights violations, suppression of political dissent and refusal to carry out democratic reforms.

The roadmap being pushed by the Asean leaders include the release of Suu Kyi and the immediate holding of an election where her National League for Democracy party will be allowed to participate.
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2 comentários:

Anónimo disse...

TIMOR-LESTE,
AS CRISES
E OS PROTAGONISTAS





Relatório do Projecto
POCTI/CPO/44915/2000 - The Transition Process in East Timor: 1998-2005





A. Barbedo de Magalhães
2006.09.12



Í N D I C E

1. AS CRISES 7
1.1. Dezembro de 2002: A casa do Primeiro-Ministro é reduzida a cinzas 7
1.2. Abril / Maio de 2005: A Manifestação da Igreja 9
1.3. 2006: A Crise das Forças Armadas e Polícia, e do próprio Estado 12
1.3.1. A segregação no seio das Forças Armadas e a divisão entre “lorosaes” e “loromonos” 12
1.3.2. Historial da crise nas Forças Armadas, feito pelo Presidente Xanana Gusmão em 23 de Março de 2006 13
1.3.3. A manifestação dos militares peticionários e o início dos conflitos entre elementos das F-FDTL e da Polícia 18
1.3.4. A formação de grupos armados fora do enquadramento do Estado e a agudização dos conflitos 20
1.3.5. O Congresso da FRETILIN e a mudança de regras de candidatura e de eleição da liderança 21
1.3.6. O Major Reinado recusa a via do diálogo e, em fins de Maio, os combates entre polícias, peticionários e outros militares e grupos de civis armados, por um lado, e forças das F-FDTL, por outro, provocam mortes e grande insegurança e instabilidade 23
1.3.7. A chegada a Timor-Leste de militares australianos, a pedido dos Órgãos de Soberania timorenses e a demissão dos Ministros da Defesa e do Interior, primeiro, e do Primeiro-Ministro, depois 25
1.3.8. A detenção e a fuga de Alfredo Reinado da prisão de Becora, em Dili 28
2. OS PROTAGONISTAS INTERNOS 31
2.1. Rogério Lobato 31
2.2. Alfredo Reinado 33
2.3. Mari Alkatiri 34
2.4. Ramos Horta 35
2.5. Xanana Gusmão 36
2.5.1. A “Mensagem ao povo amado e sofredor e aos líderes e membros da FRETILIN”, de 22 de Junho de 2006 37
2.5.2. A mensagem de Xanana Gusmão de 7 de Dezembro de 1987 e a sua visão de um futuro Timor-Leste livre e democrático 40
2.5.3. O discurso do Presidente feito em 28 de Novembro de 2002 e a sua crítica à dominação do estado pela FRETILIN 44
3. O CONTEXTO TIMORENSE DA CRISE 47
3.1. Xanana Gusmão e Mari Alkatiri: o conflito, desde a década de oitenta, entre duas maneiras diferentes de ser nacionalista, entre revolucionarismo utópico e realismo, entre partido líder e democracia 47
3.2. O reduzido papel do Presidente na Constituição da República Democrática de Timor-Leste, e a falta de confiança mútua entre Xanana Gusmão e Mari Alkatiri 51
3.3. A asfixia financeira do Presidente e dos partidos políticos, e o receio da Igreja de se tornar o parente pobre, colocada à margem dos proventos resultantes do petróleo 53
3.4. A criação de sucessivos ramos da Polícia, mais bem armados do que o Exército, e o crescente mal-estar nas Forças Armadas 55
3.5. O conflito entre os principais líderes, desde a ruptura no Congresso do CNRT de Agosto de 2000, e a crise do Estado 56
3.6. O atraso do desenvolvimento e a crise social 59
3.7. O papel da Igreja: críticas ao Governo e apoio às populações 62
4. OS FACTORES INTERNACIONAIS DAS CRISES 65
4.1. Os Estados Unidos e a competição energética e geoestratégica com a China 65
4.1.1. O fulgurante crescimento económico da China, e as suas necessidades petrolíferas rapidamente crescentes, tornam a China no mais importante competidor energético dos EUA 65
4.1.2. O súbito interesse da China pelos Países de Língua Oficial Portuguesa e pelos seus recursos naturais, e o seu relacionamento com Timor-Leste 67
4.2. A Austrália, os seus interesses e preocupações 68
4.2.1. A preocupação Australiana de evitar que Timor-Leste se transforme numa plataforma avançada de poderes estrangeiros 68
4.2.2. Os interesses australianos sobre o petróleo e o gás do Mar de Timor-Leste e a persistência numa política contrária ao Direito Internacional 70
4.2.3. A política australiana relativamente aos países à sua volta, desde os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001 73
4.3. As Nações Unidas e a pressa em ter um caso de sucesso 76
5. UMA LEITURA GLOBAL DAS CRISES 79
5.1. As dificuldades da leitura do real: a ocultação e o equívoco também fazem parte da vida política 79
5.2. As leituras das crises feitas por Maryaan Keady e por outros jornalistas australianos 80
5.3. Uma leitura global das crises 87
5.3.1. Uma política de exclusão, centrada na FRETILIN, levou a um progressivo isolamento do Governo, com a alienação de sectores cada vez mais amplos da sociedade timorense 87
5.3.2. A insuficiente confiança nas relações com a Austrália, suscitou a sua apetência para intervir 92
6. QUESTÕES QUE AS CRISES LEVANTAM E QUE DEVERÃO SER CONSIDERADAS NO FUTURO 95
6.1. A viabilidade de Timor-Leste, como estado independente, depende do estabelecimento e manutenção de relações de confiança com os seus vizinhos 95
6.1.1. A história de Timor-Leste, como a de quase todas as nações, é uma história de dependências 95
6.1.2. Para continuar a manter a preciosa relação de confiança que tem tido com a Indonésia é fundamental que Timor-Leste não exija reparações 95
6.1.3. Estabelecer relações de confiança com a Austrália é fulcral para o futuro de Timor-Leste 97
6.2. A construção de um novo estado, a partir de uma situação de grande fragilidade, exige a participação de todos, de forma tão inclusiva quanto possível 99
6.3. Os veteranos, a heróica história da resistência e as forças de defesa e segurança devem tornar-se pilares da construção da unidade nacional 101
6.3.1. Os veteranos merecem o reconhecimento da nação, e a história da sua heróica resistência deve ser registada e divulgada, como exemplo e factor de unidade nacional 101
6.3.2. A constituição de forças de defesa e de segurança é uma questão muito delicada, que exige enorme bom senso e profissionalismo 102
7. TIMOR-LESTE PRECISA DE TER UM NOVO RECOMEÇO 105
8. BIBLIOGRAFIA 109
9. APOIOS E AGRADECIMENTOS 127
AS CRISES

Desde que, em 20 de Maio de 2002, a Comunidade Internacional reconheceu a independência de Timor-Leste, este país viveu já três grandes crises.


1.1. Dezembro de 2002: A casa do Primeiro-Ministro é reduzida a cinzas

A primeira crise, em Novembro / Dezembro de 2002, foi precedida por incidentes com a polícia timorense recém-criada, cuja falta de profissionalismo gerou muito descontentamento.

Um desses incidentes ocorreu em Wailili, em 18 de Novembro, quando um grupo de populares instalou uma barreira ilegal na estrada, perto de Baucau, para extorquir uma taxa arbitrária a quem quisesse passar. Ao tentar desbloquear a estrada a polícia envolveu-se em confrontos com os populares, ficando ferido um oficial do TLPS (Timor-Leste Police Service) e o popular que o atacou. Uma semana depois, em 25 de Novembro, uma pequena multidão, incluindo ex-membros das FALINTIL, atacou e saqueou o quartel da polícia de Baucau. Da troca de tiros havida resultou a morte de um timorense (Calisto Belo) e vários feridos. Nalgumas outras localidades ocorreram também incidentes, embora não tão graves como o de Baucau.

Enquanto internamente o Governo se encontrava sob pressão devido a estes incidentes, na imprensa Australiana apareciam notícias que lançavam dúvidas sobre a ratificação ou não (ou quando) do Tratado sobre o Mar de Timor que, em 20 de Maio, os Primeiros-Ministros da Austrália e de Timor-Leste tinham assinado. Essas dúvidas deixavam no ar a hipótese de a jovem nação ficar, por tempo indeterminado, sem acesso a quaisquer benefícios provenientes dos seus recursos petrolíferos (apesar da Austrália os continuar a receber), e, portanto, numa situação de pobreza e de dependência extremas.

Em 27 de Novembro de 2002 chegou a Dili uma delegação Australiana para negociações com o Governo Timorense sobre a exploração dos recursos do Mar de Timor. Nessas negociações, o Ministro Australiano dos Negócios Estrangeiros, Alexander Downer, furioso com a firmeza do Primeiro-Ministro Timorense, Mari Alkatiri, ameaçou por várias vezes, pôr termo às negociações. Por fim, depois de ter dado um murro na mesa afirmou:

“Nós somos muito duros. Nós não nos importamos se derem informação à comunicação social. Eu vou-lhe dar uma lição de política e não uma chance.”

Em 28 de Novembro Xanana Gusmão, em cerimónia comemorativa dos 27 anos da declaração (unilateral) da independência (28 de Novembro de 1975), fez um discurso, por muitos considerado explosivo, em que afirmou:

“Infelizmente, nota-se que, criando problemas, pode-se levar algumas pessoas a Ministro, e que essas pessoas, depois de serem Ministros, só sabem aumentar os problemas.”

(Xanana referia-se aos problemas que criou Rogério Lobato, juntamente com alguns ex-guerrilheiros que desertaram com armas, que ameaçaram perturbar as cerimónias da independência, e que levaram o Primeiro-Ministro a convidá-lo para o Governo, para evitar a perturbação das cerimónias, que tiveram lugar em 20 de Maio de 2002, e para ser melhor controlado, como explicaria Mari Alkatiri a diversas pessoas). E Xanana continuou:

“Há poucas semanas atrás, dei posse a mais um Vice-Ministro do Interior, fazendo o apelo para que aquele Ministério comece a resolver com vigor os problemas que afectam a estabilidade e a segurança do país. O facto é que os problemas têm vindo a acumular-se.”

“Se a independência é só da FRETILIN, eu não tenho nada a comentar. Se a independência é para todos nós, todos os timorenses, eu aproveito esta oportunidade para exigir ao Governo a demissão do Ministro da Administração Interna, o Sr. Rogério Lobato, por incompetência e desleixo.”

Dias depois, a polícia foi a uma escola deter um aluno que na véspera tinha esfaqueado outro jovem. A forma como a polícia forçou o aluno a sair da sala, onde estava a fazer uma prova de exame, foi pretexto para nova manifestação, primeiro contra a polícia, mas logo a seguir, dirigida contra Mari Alkatiri, e não envolvendo apenas jovens estudantes, mas também outras pessoas, aparentemente dirigidas para objectivos específicos sem qualquer relação com a detenção do jovem estudante.

As manifestações duraram alguns dias, durante os quais as forças da polícia das Nações Unidas praticamente desapareceram das ruas de Díli, por motivos que nunca foram explicados.

Quando o Primeiro-Ministro foi exigir, ao Representante Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas, o Sr. Kamalesh Sharma, que mandasse a polícia pôr ordem nas ruas, em vez de se preocupar com a estabilidade e segurança na cidade, manifestou a sua preocupação com a segurança de Mari Alkatiri, ao qual ofereceu protecção. Mari Alkatiri ripostou que não fora isso o que o levara lá, mas sim a segurança na cidade, que competia às forças das Nações Unidas assegurar. Quanto a ele próprio, Alkatiri afirmou que, se tivesse que morrer, morreria no seu posto.

No decurso das manifestações, um grupo de populares chegou a entrar no Palácio do Governo, sendo travado pela segurança pessoal do Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro Português, José Luís Arnaut, que se encontrava de visita a Timor-Leste e que, nesse momento, se encontrava no Palácio em conversações com Mari Alkatiri.

Se havia a intenção de criar embaraços e pôr em risco a integridade pessoal do Primeiro-Ministro Timorense, apenas, ou deste e do governante português, também, é assunto que continua a aguardar completo esclarecimento, que o representante das Nações Unidas também nunca deu.

Perante a inércia das forças da UNMISET, que demoraram cerca de três horas a reagir, quem acabaria por impor a ordem na cidade foram as forças portuguesas, respondendo a ordens directas do Ministro português, e que se substituíram, assim, às forças das Nações Unidas.

Felizmente bastou a presença das forças portuguesas nas ruas, para restabelecer a ordem na cidade. Se estas tivessem de usar a força e acontecesse haver feridos ou mortos, a posição de Portugal tornar-se-ia muito delicada, pois a ordem do Ministro português tinha sido dada à revelia das Nações Unidas.

Curiosamente, as Nações Unidas não fizeram qualquer protesto público contra a actuação das forças portuguesas, feita à revelia do Representante Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas. Talvez o Sr. Kamalesh Sharma receasse que qualquer protesto seu viesse levantar a questão de saber porque é que não tinha posto em acção as forças sob seu comando, facilitando, assim, a acção dos mentores das manifestações.

Entretanto, em Díli, uma timorense que ajudara Xanana Gusmão a instalar-se uns dias em Darwin, aquando do seu regresso da prisão domiciliária, em Jakarta, antes deste voltar para Díli, divulgava a “notícia” de que Mari Alkatiri teria fugido, e, depois, que teria sido morto. Alguma comunicação social australiana ter-se-á feito eco destes boatos, rapidamente desmentidos por uma aparição pública do Primeiro-Ministro Timorense. Essa aparição pública, pondo fim aos boatos, evitou que a imagem de um Primeiro-Ministro cobarde (em fuga) e odiado pelo seu povo (que o teria morto) continuasse a ser divulgada por alguma comunicação social australiana, interessada em estragar a imagem de Mari Alkatiri.

Neste quadro de desordem pública, em 4 de Dezembro, a casa de Mari Alkatiri foi reduzida a cinzas. Antes do incêndio, provocado por manifestantes, um “jornalista” australiano entrou abusivamente na residência do Primeiro-Ministro onde terá vasculhado gavetas e armários à procura de documentos que o pudessem comprometer, e que não terá encontrado. Esse “jornalista” foi mais tarde expulso de Timor-Leste devido à forma como realizava o seu trabalho como espião.

Alguns dias depois a Australian Financial Review criticava a governação de Mari Alkatiri e afirmava que Xanana tinha que assumir o controlo da situação em Timor-Leste.

Mais tarde, pessoas próximas do Governo Australiano disseram que, já nessa altura, este desejava e esperava que Mari Alkatiri caísse.

Há quem admita, sem no entanto apresentar provas, que alguns altos funcionários, ou até membros do Governo de Timor-Leste poderiam estar também envolvidos. Alguns timorenses relacionam com esta crise de 2002 a saída do Governo, na primeira remodelação deste, feita em 2005, do então Secretário de Estado das Obras Públicas, César Moreira, e a saída de Director da Academia da Função Pública de Vítor Costa. Vítor Costa manteve-se no Comité Central da FRETILIN até ao Congresso do partido realizado entre 17 e 20 de Maio de 2006. Foi ele que criou o Grupo Renovador da FRETILIN, que pretendia mudar os seus estatutos e a liderança. Ambos apoiaram a pré-candidatura de José Luís Guterres à liderança da FRETILIN, em Maio de 2006.


1.2. Abril / Maio de 2005: A Manifestação da Igreja

A segunda crise teve lugar de 19 de Abril a 8 de Maio de 2005, estendendo-se ao longo de 19 longos e perigosos dias de uma manifestação comandada pela hierarquia e parte do Clero Católico Timorense.

A justificação apresentada para esta manifestação foi o anúncio, feito pelo Governo, em Novembro de 2004, de que iria fazer uma experiência pedagógica de ensino facultativo da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica, em trinta e duas escolas. Nessas escolas haveria ensino religioso apenas para as crianças cujos pais o requeressem, sendo os professores pagos não pelo estado mas pelas respectivas organizações religiosas. O Governo invocava a laicidade do estado para a experiência que tinha decidido fazer.

Poder-se-á perguntar porque é que o Governo se meteu numa guerra desnecessária com a Igreja Católica, quando tinha tantas outras coisas a fazer, nomeadamente realizar obras públicas tão necessárias e criar empregos para uma juventude sem perspectivas. Ainda por cima sabendo que foi sempre, e continua a ser, no campo educativo que a Igreja tem dado o seu melhor contributo, desde há mais de um século, para o desenvolvimento de Timor-Leste e do seu povo.

Mas também se pode perguntar se a manifestação foi por causa do ensino da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica. De facto, esse tema depressa desapareceu, quase por completo, das reivindicações dos manifestantes, que se concentraram na exigência da demissão do (então) Primeiro-Ministro Mari Alkatiri. Alguns meios de comunicação social de Díli puseram na boca de um importante membro do Clero Timorense a referência à pretensão da Igreja de Timor-Leste de ter garantidos 2% das receitas do petróleo. Estas verbas deveriam servir para financiar as suas múltiplas obras e actividades, incluindo a criação de uma Universidade Católica de qualidade, não só para servir Timor-Leste mas também a região. Curiosamente, este projecto foi muito acarinhado pelo Primeiro-Ministro, desde o início, apesar de ser muçulmano e tão criticado pela Igreja. Mas ficou bloqueado por falta de verbas, inicialmente, por indecisão da hierarquia católica timorense, aparentemente com dúvidas sobre a sua oportunidade, depois, e, por fim, como consequência da própria crise desencadeada pela manifestação da Igreja, que provocou um arrefecimento das relações entre o Primeiro-Ministro e o principal impulsionador do projecto, do lado da Igreja, o Padre Filomeno Jacob, S. J.. Com efeito, este homem de excepcional inteligência, fluente em mais de dez línguas, com estudos feitos em universidades de vários estados europeus e doutorado pela Universidade de Oxford, ter-se-á envolvido na organização da manifestação da Igreja, e Mari Alkatiri não gostou.

No fim-de-semana de 19 e 20 de Março de 2005, um mês antes do começo da manifestação da Igreja, o Núncio Apostólico acreditado na Indonésia e em Timor-Leste, Monsenhor Malcolm Raamjiph, deslocou-se a Díli.

Nas suas homilias, quer na catedral de Díli, onde celebrou pouco depois de ter chegado, quer na que proferiu na Igreja de Atabae, no Domingo de Ramos, afirmou que Timor-Leste não pertencia aos moçambicanos (referia-se naturalmente ao Primeiro-Ministro, Mari Alkatiri, à Ministra de Estado e Administração Estatal, Ana Pessoa, à Ministra do Plano e Finanças, Madalena Boavida, e a outros membros do governo), nem aos europeus. Não disse se pertenceria aos australianos ou não. E encorajou os católicos timorenses “a confrontarem os que tentam destruir a Igreja”.

O Ministro dos Negócios Estrangeiros timorense, José Ramos Horta, que enquanto a manifestação estava a ter lugar, disse, em entrevista ao jornal Público, que se tivesse que entregar o poder em Timor-Leste a alguém o entregaria à Igreja, sentiu-se na obrigação de criticar duramente as afirmações “belicosas” do Núncio Apostólico, aparentemente destinadas a “aumentar as tensões, em vez de ajudar a alcançar consensos”.

Durante a manifestação da Igreja o Embaixador dos EUA, Grover Joseph Rees, passou "acidentalmente" pela manifestação e cumprimentou o Padre Domingos Soares que a coordenava. Uma fotografia desse cumprimento foi publicada no jornal Diário e usada como sinal do apoio americano à mesma. O Embaixador insistiu, publicamente, que tinha sido um encontro fruto do acaso. Mas teve o cuidado de não ir visitar o Primeiro-Ministro, não dando assim qualquer hipótese de ser publicada uma fotografia dele a cumprimentar o Dr. Mari Alkatiri e a explicar-lhe que tinha sido mera coincidência a sua passagem pela manifestação…

Foi também no decurso desta manifestação que aconteceu um incidente que muitos consideram caricato: dois cidadãos portugueses, depois de uma noitada bem regada, enfiaram-se com o carro na zona da manifestação. A segurança própria desta pegou neles e levou-os ao Paço Episcopal da Diocese de Díli. Aí foram interrogados. Para uns, tratou-se, apenas, de um interrogatório para averiguar se teria sido acidental, ou não, a sua entrada intempestiva no recinto da manifestação; isto é, uma mera medida de precaução para despistar eventuais provocadores que pudessem alterar a natureza pacífica da manifestação. Mas outros viram nisso uma espécie de “julgamento popular”, desta feita num quadro eclesiástico, e criticaram a Igreja por admitir tais práticas no próprio Paço Episcopal.

O Presidente Xanana Gusmão, durante as três semanas que durou o conflito, procurou manter portas abertas para o diálogo com um lado e o outro. Ao fim de muitos dias de manifestação, Xanana foi ao local, onde fez apelos à calma e ao regresso a casa. No entanto, enquanto se retirava, muitos manifestantes gritaram “Xanana está connosco”. O equívoco sobre a posição de Xanana Gusmão ficou, pois, a pairar em muitas cabeças.

Porque é que o Núncio Apostólico foi a Díli naquela altura, e disse o que disse na Catedral de Díli, primeiro, e na homilia de Domingo de Ramos na Igreja de Atabae, depois? Foi enviado por potências ou interesses estrangeiros, terá sido convidado por elementos proeminentes da Igreja Timorense à procura de apoio e de um detonador para a manifestação que já se prepararia, ou foi a Díli movido pela convergência de interesses estrangeiros e timorenses, da Igreja e não só?

E porque é que o Presidente não esclareceu o equívoco, que deixou a pairar no ar, sobre a sua posição relativamente à manifestação da Igreja?

Esta manifestação contou com a participação de um elevado número de párocos e paroquianos de praticamente todo o território, que, de forma organizada e ordeira se deslocaram a Díli, aí passando alguns dias, sendo depois substituídos por outros, até ao final da mesma. Mas também houve párocos, padres e madres dirigentes de colégios, que se recusaram a promover a participação dos seus paroquianos ou alunos na manifestação, mesmo quando foram pressionados nesse sentido pelas autoridades eclesiásticas.

O Padre Juvito de Araújo, que pertenceu à CAVR (Comissão de Acolhimento, Verdade e Reconciliação), durante a manifestação da Igreja manteve o silêncio, “para salvaguardar valores mais altos como a unidade da Igreja”, mas, em 16 de Julho de 2005 dizia, no Diário de Notícias, de Díli, que “há que admitir que este episódio foi uma falha dos bispos. Não custa reconhecer que falhamos, enquanto Igreja”.

Para o Padre Juvito, a crise entre a Igreja e o Estado foi “um momento de purificação” que acabou por resultar numa “perda de liderança, tanto dos bispos como do Presidente Xanana Gusmão”.

O Bispo Ximenes Belo, ex-Administrador Apostólico de Díli e Prémio Nobel da Paz em 1996, também se demarcou da manifestação, tendo feito sucessivos apelos ao diálogo entre a Igreja e o Governo. Afirmando desconhecer as motivações dos bispos, “sempre defendi que deveriam ter congelado o decreto-lei para dar lugar ao diálogo”. (…) “o sonho que tenho é que a Igreja invista na cultura, no estudo das línguas e dos costumes. Só assim poderá reconstruir a identidade timorense”, disse o Bispo Belo, que também acrescentou que a Igreja deveria “respeitar as leis e a ordem constitucional” e tinha que abrir as suas portas a outras religiões e culturas para “conviver em harmonia com a diversidade do país”.

O Vaticano acompanhou a manifestação com preocupação, e terá criticado algumas tomadas de posição de importantes figuras da Igreja. O próprio Núncio Apostólico, Monsenhor Malcolm Raamjiph, foi removido do lugar pouco tempo depois.

Mais tarde, o Bispo de Díli, D. Alberto Ricardo da Silva declarou que a Igreja tinha organizado a manifestação porque queria dar voz ao povo.

“A princípio, havia muitas expectativas. Estávamos livres, íamos começar uma nova vida, e o Governo prometia ao povo que ia melhorar o nível de vida e ia reduzir a pobreza. Temos muito petróleo e por isso o povo poderia ter o suficiente para as suas vidas (…), mas isso não aconteceu.”

Além disso, o bispo afirmou que a corrupção aumentou muito, sobretudo no último ano. Rejeitou a acusação de que a Igreja se tivesse comportado como um partido político, mas afirmou que a Igreja não voltaria a actuar da mesma maneira no futuro.


1.3. 2006: A Crise das Forças Armadas e Polícia, e do próprio Estado


1.3.1. A segregação no seio das Forças Armadas e a divisão entre “lorosaes” e “loromonos”

Os problemas no seio das forças de segurança de Timor-Leste são tão antigos como a própria constituição destas. Trata-se de forças ainda sem tradição como instituição no quadro democrático do Estado de Direito, num país saído das cinzas e de um passado recente extremamente traumático, e, ainda por cima, rico em recursos naturais e, por isso, objecto da cobiça de poderosos interesses.

Já atrás referimos, a propósito da crise de Novembro / Dezembro de 2002, os problemas resultantes da falta de profissionalismo da Polícia e do Ministro que então a tutelava.

Em 2004 verificaram-se graves incidentes em Lospalos, envolvendo militares e polícias. Uma das conclusões de uma Comissão de Investigação então criada foi a de que alguns oficiais veteranos (ex-FALINTIL) utilizavam uma linguagem depreciativa para com os novos soldados, sobretudo os da região oeste de Timor-Leste.

Em 2005 foram expulsos 44 elementos das Forças Armadas, todos eles das regiões ocidentais, que estavam colocados em Lospalos, na ponta Leste. O motivo das expulsões foi o excesso de faltas, que terão resultado, em grande parte, das dificuldades de transporte para irem, nos fins-de-semana, às suas terras distantes, na região ocidental do país.

Em 11 de Janeiro de 2006, Xanana Gusmão recebeu uma petição assinada por militares do 1º Batalhão (Lospalos) que se queixavam da discriminação nas promoções entre “lorosaes” e “loromonos” (os timorenses da região leste e os da região ocidental de Timor-Leste, respectivamente). Imediatamente reenviou essa petição ao Ministro da Defesa, Dr. Roque Rodrigues, e ao Comandante das “FALINTIL - Forças de Defesa de Timor-Leste” (F-FDTL ou FDTL), Brigadeiro General Taur Matan Ruak, sem, no entanto, ter reunido com qualquer deles para tratar do assunto.

Em 17 de Janeiro O Brigadeiro-General Taur Matan Ruak respondeu que, estando ocupado com a mudança do Primeiro Batalhão, comandado pelo Tenente-Coronel Falur, de Lospalos para novas instalações, em Baucau, trataria do assunto logo que os problemas resultantes da mudança estivessem resolvidos.

Feita a mudança, o Comandante das F-FDTL, no entanto, embora tenha reunido com os soldados, não resolveu o assunto. Mais tarde justificaria essa irresolução com o facto de os seus homens lhe terem dito que só Xanana Gusmão poderia resolver o problema. Aparentemente, faltou-lhe a sensibilidade necessária para perceber a gravidade da questão e, sobretudo, o aproveitamento que terceiros poderiam tirar das divisões no seio do Exército para fragilizar as Forças Armadas, o Governo e o Estado, ou até mesmo para transformar Timor-Leste num estado falhado. Faltou-lhe, também, a autoridade para ultrapassar os obstáculos colocados pelos soldados para tratar o assunto.

Em 6 de Fevereiro de 2006 um grande número de militares abandonou os quartéis. Um grupo desses militares, liderado pelo Tenente Gastão Salsinha, apresentou-se, logo a seguir, ao Presidente Xanana Gusmão, ao qual terá exigido a demissão do Chefe do Estado-Maior, Coronel Lere, e do Comandante do 1º Batalhão, Tenente-Coronel Falur. No dia seguinte, em número superior a 400, formaram para o Presidente, diante do Ministro da Defesa, do Chefe do Estado-Maior e de dois Deputados, membros do Conselho de Defesa do Parlamento Nacional. O Comandante das F-FDTL, Brigadeiro-General Taur Matan Ruak, embora tivesse sido convidado, não assistiu a essa formatura.

Em 16 de Março os 591 militares que abandonaram os quartéis, a maior parte dos quais eram recrutas que tinham terminado a sua formação, ficaram a saber, por uma declaração feita na televisão pelo Brigadeiro-General Ruak, que já não faziam parte das fileiras do Exército.

No dia seguinte ao seu regresso a Timor, depois de assistir à tomada de posse do Presidente da República Portuguesa, o Presidente timorense dirigiu uma Mensagem à Nação. Nessa mensagem, datada de 23 de Março de 2006, Xanana fez o historial da crise, deixando o cuidado de a resolver àqueles que tinham a competência formal para o fazerem, apesar do Ministro da Defesa ter expressado a sua falta de à-vontade para lidar com os veteranos, por nunca ter combatido nas montanhas como eles.

Nessa mensagem o Presidente afirmava que considerava incorrecta e injusta a decisão de demitir os militares (tecnicamente poderiam considerar-se desertores), mas que se curvava perante a decisão, já que tinha sido tomada por quem tinha os poderes para tal (já que o Presidente não tinha competência para reverter a decisão).

Aliás o problema dos poderes (ou melhor, da falta de poderes) do Presidente é a primeira questão que Xanana Gusmão levanta, ao lembrar que os seus poderes, em tempos de paz e enquanto não houver uma grave situação de desordem pública que ameace o Estado de Direito, se limitam à possibilidade de passar revista às forças de defesa e aos bombeiros formados em parada, nos dias das festas nacionais.

Ao dizê-lo, com um certo cinismo, Xanana Gusmão põe a nu uma questão fulcral da estruturação do Estado, tal como a configurou a Constituição aprovada pela Assembleia Constituinte, maioritariamente composta por deputados da FRETILIN.

É possível que, como Roque Rodrigues afirmou, conselheiros estrangeiros (cuja nacionalidade na altura não mencionou) tenham tido influência no despoletar do problema. Os novos recrutas tinham recebido formação de quadros portugueses, primeiro, e australianos, depois. Mas o certo é que os responsáveis formais, Coronel Lere, Brigadeiro-General Taur Matan Ruak e o próprio Ministro da Defesa, não o atalharam a tempo, não o tratando com a celeridade e o cuidado que merecia.

Xanana Gusmão também não se mostrou capaz, ou não quis usar toda a sua autoridade, informal mas real, para o fazer. Talvez por considerar que era mais importante corrigir o que considerava ser uma Constituição feita para a FRETILIN e não para um estado democrático para todos os timorenses, do que atalhar um problema que resultaria, em larga medida, desse.

Nestas circunstâncias o problema foi aumentando de proporções, com manifesto aproveitamento por parte da Austrália, que desde 2002 desejava que o Primeiro-Ministro de Timor-Leste fosse substituído.

1.3.2. Historial da crise nas Forças Armadas, feito pelo Presidente Xanana Gusmão em 23 de Março de 2006

Pela sua importância, transcrevemos, de seguida, grande parte do discurso feito em 23 de Março de 2006 pelo Presidente Xanana Gusmão, no Palácio das Cinzas. O discurso foi feito em Tétum, pelo que fizemos uma tradução livre da tradução em Inglês do mesmo.

“Caros compatriotas:”

“Eu sei que toda a gente espera que eu diga alguma coisa sobre a crise das F-FDTL (…). Algumas pessoas dizem que o Supremo Comandante só tem poder em tempo de ameaça ou de guerra. Essas pessoas estão correctas, e um pouco incorrectas também, porque em tempos de paz e de ordem, o Supremo Comandante ainda tem o poder de passar revista às forças armadas nos dias das festas nacionais tais como o 20 de Maio e 28 de Novembro, nas cerimónias realizadas no Estádio Municipal de Díli, onde os Bombeiros também alinham com as forças de segurança.”

“Por isso eu não vou usar o poder de que não sou titular, como Supremo Comandante. Por isso vou falar, apenas, como Presidente da República de Timor-Leste. De acordo com o Artigo 74º da nossa Constituição, ‘O Presidente é o símbolo e garante da unidade do Estado e do regular funcionamento das instituições democráticas.’”

“É tendo em conta este papel do Presidente da República que vou fazer algumas observações sobre o problema existente no seio das F-FDTL (…).”

“Antes de mais, eu gostaria de explicar que a decisão tomada pelo Brigadeiro-General Taur Matan Ruak ao considerar 591 soldados como civis é uma competência real sua, e não é o Presidente da República que a vai mudar. Isto é efectivamente verdade, e apelo a todos para não ficarem aborrecidos por o Presidente não ser alguém que tenta remover a competência de terceiros e que, como Supremo Comandante, se curva até ao chão perante esta decisão.”

“No entanto, como Presidente da República, eu considero que a decisão tomada pelo Brigadeiro-General foi incorrecta e, de facto, não foi justa! Como Presidente da República eu devo dizer que a minha opinião poderá ser mais objectiva do que a opinião de um Conselheiro estrangeiro para as questões legais, a trabalhar para o Conselho de Ministros, um estrangeiro a quem o Brigadeiro-General deu mais ouvidos ao tomar as suas decisões.”

“Mesmo assim, desejo informar os quinhentos e noventa e um soldados que agora se tornaram civis, de que essa foi uma decisão que foi tomada, e que significa que já não são militares, porque eu tenho que respeitar as decisões tomadas pelos vossos Chefes.”

“Caros compatriotas:”

“A todo o Povo eu quero informar que a decisão foi incorrecta, uma vez que focou mais na disciplina militar, em vez de considerar o pano de fundo e as raízes do problema existente no seio das F-FDTL.”

“Em 11 de Janeiro recebi uma petição assinada por alguns militares do 1º Batalhão, de Lospalos, apresentando a questão da discriminação ’loromonu-lorosae’ (pessoas da parte ocidental e da parte oriental de Timor-Leste) no seio das F-FDTL. Na petição afirmavam que alguns Veteranos geralmente diziam que ‘Só as pessoas da parte oriental de Timor-Leste é que foram combatentes da independência e não os da parte ocidental’ e ’se eles, os veteranos da parte oriental de Timor-Leste não tivessem lutado pela independência, os da parte ocidental nunca teriam sido recrutados para as F-FDTL’. Devido a esta descriminação, as promoções eram só para os soldados da parte oriental, e a disciplina era apenas para os soldados da parte ocidental (de Timor-Leste).”

“Eu imediatamente enviei uma cópia ao Ministro da Defesa e ao Comandante das FALINTIL-FDTL solicitando que resolvessem o assunto. Em 17 de Janeiro recebi uma resposta do Comandante das F-FDTL, Brigadeiro Taur Matan Ruak a dizer que, uma vez que o 1º Batalhão estava, nessa altura, a mudar-se de Lospalos para Baucau, estava ocupado, mas uma vez terminada a mudança, iria olhar para a questão.”

“No dia 6 de Fevereiro seguinte ouvi dizer que um elevado número de soldados tinham abandonado o quartel e se espalhavam por Díli. Em 7 de Fevereiro recebi alguns deles e pedi que no dia oito de Fevereiro todos eles se apresentassem ao Comando a fim de evitar que fossem utilizados por grupos indesejáveis na criação de problemas pelos quais pudessem ser depois responsabilizados. Todos eles vieram formar em linha, em Caicoli, e eram mais de quatrocentos. Requeri ao Ministro da Defesa para estar presente, e ele veio, mas o Brigadeiro-General recusou-se a vir e, por isso pedi ao Coronel Lere para vir na sua vez. Também requeri a dois membros do Parlamento, Paulo Assis e Gregório Saldanha, como membros do Conselho Superior de Defesa e Segurança, para estarem presentes.”

“Eu pedi ao Ministro da Defesa para olhar com atenção para o problema, mencionando que a questão de ‘Loromonu-Lorosae’ era uma questão política, e era um problema que existia, há muito, no seio das F-FDTL, e que, por isso, era preciso resolver com cuidado. Eu também lhe disse que a Comissão de Investigação criada em 2004, também se tinha apercebido dessa questão, e tinha tomado conhecimento, nomeadamente, das palavras que geralmente eram usadas pelos Oficiais Veteranos, quando se dirigiam aos novos soldados, em particular aos que eram da parte ocidental de Timor-Leste. O Ministro da Defesa [Dr. Roque Rodrigues] disse-me que não tinha coragem para chamar a atenção para os Veteranos porque tinha um complexo relacionado com o facto de nunca ter tomado parte na guerra, e por isso respeitava muito aqueles Veteranos. No entanto o Ministro até disse que, por vezes, os Conselheiros estrangeiros a trabalhar com as F-FDTL eram eles próprios quem provocava a questão.

“O Coronel [Lere] disse não acreditar que os Veteranos dissessem tais palavras, e suspeitava que os partidos políticos estariam por trás disso, em particular o Partido Democrático (PD) porque Deker, (antigo Veterano das F-FDTL da parte ocidental de TL) se tinha junto ao PD. Eu disse-lhe para não responsabilizar ninguém sem razões fundamentadas, e também lhe disse que se mais de quatrocentos soldados tinham abandonado os quartéis, isso poderia significar que alguma coisa estava errada no seio da própria instituição.”

(…)

“Pedi aos dois para considerarem com cuidado a possibilidade de readmitir os mais de quatrocentos soldados, de modo a resolver o assunto em conformidade (…) e evitar que o problema extravasasse.”

“Pedi ao Ministro da Defesa para ver que não houvesse Veteranos ou Combatentes dentro das F-FDTL, porque, como instituição do Estado, não podem ter Veteranos ou não Veteranos. Os combatentes têm que ter em mente que foram Combatentes da Liberdade ou heróis apenas até Agosto de 1999, e agora são apenas militares como quaisquer outros.”

Depois Xanana chama a atenção para a necessidade de mudar a mentalidade de modo a que as F-FDTL se tornem um corpo profissional sem ter que esperar que os Veteranos se reformem. E continuou:

“Eu também disse aos dois líderes para olharem para o problema da discriminação, primeiro, como problema político, para o qual o Estado deveria prestar atenção, e depois para o outro problema, relacionado com as promoções e a disciplina aplicada dentro da instituição, embora este também tenha que ver com a discriminação.”

“Eu também requeri aos dois MP [Membros do Parlamento] Paulo Assis e Gregório Saldanha, que fizessem parte da Comissão [de Investigação], mas o Ministro da Defesa disse que era melhor não porque podia minar a competência do Chefe do Estado-Maior. Por isso eu concordei que os dois MPs acompanhassem, como observadores, a investigação que o Chefe do Estado-Maior iria levar a cabo. Por isso não fui eu quem formou a Comissão; apenas pedi a autorização para que dois MPs acompanhassem, como observadores, a investigação que estava a ser feita.”

“Falei, durante todo o dia com as mais de 400 pessoas, pedindo-lhes para voltarem para o quartel. E, por fim, todos voltaram a fim de tomarem parte na investigação. Uma semana depois, eu ouvi dizer que tinham saído outra vez. Em 22 de Janeiro recebi outra petição, com a queixa de que, em vez de olhar para a substância da sua petição, a Comissão formada pelo Chefe do Estado-Maior das F-FDTL, perguntou quem os organizou para fazerem a petição e abandonarem os quartéis. Também mencionava que se sentiam ameaçados.”

“Recebi informação dos peticionários que dizia que queriam, novamente, ser militares, uma vez que ainda respeitavam os seus comandantes, mas que os Comandantes Veteranos tinham que se corrigir a si próprios, deixando de fazer discriminação entre ‘Loromonu-Lorosae’, entre combatentes e não-combatentes.”

“Caros compatriotas:”

“Pedi ao meu Conselheiro Militar para levar a petição ao Ministro da Defesa e ao Brigadeiro-General, que estavam de partida para a China. O Brigadeiro-General disse, zangado, ‘se eles quiserem guerra, vamos à guerra’. Também ouvi expressões tais como, ‘se mil pessoas se forem embora, outras mil virão substitui-las’. O problema é considerado muito simples, na cabeça dos líderes.”

“Caros compatriotas:”

“Por causa dos problemas de Lospalos, em 2004 formei uma Comissão e as F-FDTL também estabeleceram uma. As duas Comissões trabalharam separadamente, mas a maior parte das suas conclusões eram semelhantes:”

“Faltam muitas leis e regulamentos; a Secretaria de Estado da Defesa foi promovida a Ministério da Defesa, mas sem que se verificassem grandes melhorias, já que continua a não existir qualquer Código de Disciplina Militar, nem Lei do Serviço Militar, nem outras.”

“De facto a indisciplina começou pelos Comandantes.”

“A outra questão tem que ver com as promoções e o tratamento dos comandantes para com os novos recrutas da parte ocidental de Timor.”

“Ao fim e ao cabo, estes problemas não foram resolvidos com boa vontade, e, por isso, continuaram a existir até 2006. Portanto, o pano de fundo e as raízes do problema não teve que ver com a indisciplina mas com o mau tratamento, por parte de alguns Comandantes Veteranos, para com novos soldados e timorenses da parte ocidental.”

“Eu também disse aos dois líderes que demitir aqueles 400 soldados era uma coisa fácil de fazer. Mas a minha preocupação é: se não resolvermos correctamente o problema, sem ser pela simples demissão destas pessoas, então os jovens de ‘Loromonu’ não se candidatarão a integrar as F-FDTL, num novo processo de recrutamento. (…) E assim se criará o ambiente para as forças das F-FDTL serem só de ‘lorosaes’ (…), já que em novos recrutamentos só serão recrutadas pessoas das suas relações, ou, pior ainda, membros dos grupos de artes marciais que se juntaram a alguns partidos políticos.”

(…)

“Em muitos países, no passado, os Militares apenas sabiam como se treinarem e organizarem para lutar, na guerra. Hoje, os militares não se devem imiscuir na política, mas devem saber de política e têm que ter sensibilidade política.”

(…)

“Por fim, eu apelo aos peticionários para compreenderem que, como Comandante Supremo das F-FDTL, o meu mandato é, apenas, para passar revista aos soldados em 20 de Maio e 28 de Novembro. Por isso, se o Brigadeiro-General, seguindo a opinião do conselheiro legal do Conselho de Ministros, declarou que agora são civis, de facto vocês já são civis. O Primeiro-Ministro já disse que haveria um novo recrutamento, por isso fiquem descansados e procurem outros empregos. Para que as F-FDTL se tornem profissionais, ainda vai demorar muito tempo, porque o nosso estado só agora começou, com várias doenças e atitudes.”

O discurso é suficientemente claro para carecer de explicações.

Basta acrescentar que o Conselheiro do Governo a que o Presidente se refere é, provavelmente, o Dr. Domingos Tristão, um cidadão português a quem o Brigadeiro-General Taur Matan Ruak terá perguntado o que fariam em Portugal a militares que abandonassem os quartéis. Sem medir as diferenças de contexto e sem ponderar as consequências políticas da sua resposta, o Dr. Domingos Tristão terá dito que em Portugal seriam considerados desertores.

E, quando fala de grupos marciais que aderiram a partidos, provavelmente Xanana Gusmão estará a pensar nos milhares de elementos (cerca de cinco mil) do grupo Kork, espalhados por quase todo o país, que em 2005 passaram a integrar a FRETILIN.

Segundo os jornalistas australianos David O’Shea e John Martinkus, poucas horas depois deste discurso do Presidents Xanana Gusmão jovens timorenses começaram a atear fogo a várias casas em Dili.


1.3.3. A manifestação dos militares peticionários e o início dos conflitos entre elementos das F-FDTL e da Polícia

Em 24 de Abril de 2006 começou, em Dili, uma manifestação dos peticionários, a que se juntaram cerca de cinco mil pessoas, muitas provenientes dos distritos ocidentais de Timor-Leste, solidárias com os peticionários. Nos dias seguintes a manifestação continuou, com menor número de participantes.

Em 27 de Abril, finalmente, o Presidente e o Primeiro-Ministro reúnem e falam na possibilidade de criar uma Comissão de Inquérito, ou melhor, de uma Comissão de Notáveis, de âmbito muito lato, envolvendo elementos das Forças Armadas, do Governo, da sociedade civil (um membro indicado pela hierarquia católica e outro de uma ONG timorense), para analisar o problema e sugerir soluções. Os peticionários começaram por declarar que aceitariam as recomendações da Comissão de Notáveis, tendo aceitado a liderança da mesma pela Ministra Ana Pessoa. Mas a decisão só foi comunicada ao Tenente Salsinha a 28 de Abril, a partir das 11 horas.

Mas a 28 de Abril, quando o Tenente Salsinha chegou ao local da manifestação, depois do Presidente o ter informado da criação da Comissão de Notáveis, já esta tinha saído do controlo dos peticionários. A polícia tinha desaparecido, quase completamente, da cidade. Com um telemóvel em punho, um manifestante, não peticionário, estudante de Relações Internacionais da Universidade da Paz de Dili, tinha assumido a liderança da manifestação. Ia contando os minutos que faltavam, para expirar o prazo limite fixado pelos peticionários (?) para a resolução do problema, e, pouco antes do Tenente Salsinha ter chegado ao local com notícias sobre a criação da referida Comissão, esse estudante começou a incentivar, em inglês, outros jovens, para incendiarem carros, atirarem pedras para partirem as janelas do Palácio do Governo e provocarem outros incidentes. Alguns peticionários tentaram conter os jovens manifestantes e garantir que a manifestação continuasse a ser pacífica, mas não o conseguiram. Esta tinha saído, completamente, do seu controlo. Desconhecemos se a língua inglesa usada pelo novo líder da manifestação seria, também, a língua utilizada nas chamadas telefónicas que o mesmo, aparentemente, ia recebendo.

Alguns dizem que os peticionários e os seus apoiantes estavam desarmados, enquanto se manifestaram em frente ao Palácio do Governo. Mas quando chegaram a Taci Tolu já teriam armas, incluindo metralhadoras. Há quem diga que um grupo terá sido armado por Rogério Lobato, Ministro do Interior, e outros alegam que terá sido o Chefe da Polícia que distribuiu armas. Alguns sugerem que foi o Presidente, e outros, que foi a Austrália quem manobrou por trás, factos não provados, até à data, e à espera de esclarecimento.

Nesse mesmo dia o Presidente da República, o Primeiro-Ministro e mais alguns membros do Governo encontravam-se num hotel perto do Palácio do Governo, para um almoço com que encerrava uma reunião com homens de negócios. Ouviram-se tiros. Um carro da polícia passou pelo local e anunciou que os manifestantes tinham atacado o Palácio do Governo, e rapidamente Xanana Gusmão e Mari Alkatiri foram removidos do local.

Segundo o Inspector Lino Saldanha, número três na hierarquia da Polícia, natural da zona Leste, que depois se juntará às F-FDTL, havia já um mês que se encontravam em Dili cerca de oitenta homens da Polícia da Fronteira. Eram eles que controlavam as entradas e saídas da zona de Taci Tolu onde se situa um Quartel do Exército e onde acabaria por haver violentos recontros entre militares das FDTL, de um lado, e polícias, militares peticionários e outros, e ainda apoiantes civis, do outro, com intenso tiroteio.

A razão pela qual a polícia timorense deixou de vigiar a manifestação também não é clara.

Para alguns terá sido o próprio Ministro do Interior a dar ordens para não actuar. Rogério Lobato, no entanto, acusará, em entrevista posterior ao “Expresso”, o Presidente Xanana Gusmão que, segundo ele, teria, desde longa data, uma relação directa com o Comandante da Polícia Nacional, Paulo Martins, interferindo, assim, com as ordens que o Ministro lhe transmitia. Rogério disse também, a órgãos de comunicação social timorenses, que os serviços de informações tiraram fotografias de alguns estrangeiros que suportavam as manifestações dos peticionários.

Era sabido que a relação entre Paulo Martins e Rogério Lobato nunca tinha sido boa. Mas ter-se-á tornado ainda pior, segundo diz o Chefe da Polícia, desde o momento em que o Ministro do Interior lhe terá, alegadamente, dado ordens para disparar sobre a manifestação da Igreja, em Abril de 2005, coisa que o Chefe da Polícia se recusou a fazer sem primeiro receber uma ordem escrita nesse sentido.

Mas, em 28 de Abril, quem estava a coordenar as operações da Polícia em Dili era o número dois da hierarquia, o Subcomissário Ismael Babo. Tendo 500 polícias disponíveis, apenas destacou 85 para a manifestação. Babo, que é de Ermera, na região ocidental, diz ter recebido ordens directas de Rogério Lobato não para reforçar a segurança do Palácio do Governo, mas sim para levar todos os membros do Governo e do Parlamento para o Quartel-General da Polícia (Expresso de 17 de Junho de 2006), “por razões de segurança”.

No entanto, há quem ponha em dúvida que essa ordem tenha vindo do Ministro do Interior, sugerindo que poderia ter vindo do Presidente. Para aqueles que consideram esta última hipótese, a retenção (para não dizer, a detenção) dos governantes e parlamentares na sede da Polícia deixaria ao Presidente as mãos livres para qualquer actuação, quer ao nível das forças de segurança, quer ao nível do próprio Governo.

Perante a inoperância da polícia, o Primeiro-Ministro ordenou às F-FDTL que interviessem. Estas cercaram e revistaram toda a área de Taci Tolu, zona oeste de Dili, e não deixaram aí entrar, sequer, o Presidente da República, quando ele o pretendeu fazer, no dia seguinte, e os seus seguranças se viram ameaçados de ser recebidos a tiro.

Dos confrontos entretanto havidos, e que se prolongaram até ao dia seguinte, resultaram cinco mortos confirmados. A tensão em Dili tornou-se enorme. E a suspeição e conflituosidade entre polícias (aparentemente do lado dos peticionários, das regiões ocidentais) e os militares que se mantiveram nas fileiras do Exército (a maior parte, mas não todos, da Ponta Leste) também se tornaram extremamente perigosas.

A hierarquia do Exército consideraria, depois, que ao ser chamada para intervir, teria caído numa armadilha montada para diabolizar as Forças Armadas perante a população. Sabendo do desejo de Rogério Lobato, desde sempre, de ser o Comandante das Forças de Defesa de Timor-Leste, e toda a política por ele seguida, no sentido de formar sucessivas polícias, com melhores salários, fardamentos e, sobretudo, armamentos, do que o Exército, não era difícil supor que pudesse ser ele o principal arquitecto de tal armadilha.

No entanto, quem põe a hipótese de ter sido o Presidente quem deu instruções para os governantes e parlamentares serem levados para a sede da Polícia, também admite que, se as FDTL não tivessem actuado nesse dia, o Governo teria cessado funções nessa mesma ocasião.

Qual terá sido, de facto, o papel da Chefia da Polícia, do Ministro do Interior, do Primeiro-Ministro, do Presidente ou da Austrália, no desenrolar dos acontecimentos, neste dia crucial, e na perigosíssima deriva que estes tiveram, é coisa que, neste momento, não sabemos clarificar.


1.3.4. A formação de grupos armados fora do enquadramento do Estado e a agudização dos conflitos

A partir daí, a tensão entre “lorosaes” e “loromonos” toma enormes proporções, quer na cidade quer nos quartéis, e em 3 de Maio o Comandante da Polícia Militar, Major Alfredo Reinado, um homem formado pela Academia de Defesa da Austrália, em Camberra, em 2005, e que tinha vivido na Austrália durante nove anos, sai do quartel com cerca de vinte dos seus 33 homens e também 7 polícias da UIR (Unidade de Intervenção Rápida), com as respectivas armas e veículos, em direcção a Aileu. Três destes polícias voltam para o seu quartel, três dias depois, com as respectivas armas, sendo, por isso, muito elogiados por Rogério Lobato, que diz que não os castigará sem inquérito prévio (ao contrário do que aconteceu nas F-FDTL). Ao afirmá-lo está a fazer uma crítica velada à chefia do Exército.

Movidos pelo clima de insegurança e intimidação entretanto criado no Quartel-General das F-FDTL de Metinaro, junto de Dili, os majores Marcos Tilman (de Ermera) e Alves Tara (de Ainaro), ambos “loromonos”, abandonam o quartel, com homens e armamento, também em 3 de Maio, e juntam-se ao Tenente Salsinha, em 5 de Maio, em Gleno, junto de Ermera, onde está instalada uma unidade militar australiana. Nesse mesmo dia o Tenente Salsinha apela ao Presidente para demitir o Primeiro-Ministro.

Com a situação de insegurança e medo generalizada, Rogério Lobato terá, alegadamente, tomada uma medida extrema: criar grupos secretos armados para a defesa da FRETILIN e dos seus membros, nomeadamente tendo em vista a realização do Congresso da FRETILIN. Este estava previsto para os dias de 17 a 19 de Maio, e parecia que havia alguém interessado em impedir que se realizasse...

Segundo Rogério Lobato, em 8 de Maio o Primeiro-Ministro, Mari Alkatiri, recebeu-o, conjuntamente com o Comandante Rai Lós e dois dos seus homens. O comandante Rai Lós, por sua vez, afirmará mais tarde que foi recebido por Mari Alkatiri em 7 de Maio, juntamente com os seus adjuntos, Mateus dos Santos Pereira, empresário, e Leandro “Grey Arana” Lobato, Chefe de Aldeia.

Segundo Rogério Lobato tratar-se-ia de constituir uma equipa de “pisteiros”, isto é, de antigos combatentes, que, conhecendo bem o terreno, pudessem ajudar a Unidade de Reserva da Polícia, a descobrir eventuais milícias infiltradas e a combater eventuais situações de guerrilha. Mais tarde virá a falar-se da existência de mais dois grupos também alegadamente armados pelo então Ministro do Interior, Rogério Lobato, um em Ermera, e outro em Maliana.

Segundo o que o próprio comandante Rai Lós diria mais tarde ao canal da televisão australiano ABC, o seu grupo teria sido formado e armado para eliminar opositores ao Governo e peticionários.

Mari Alkatiri, que nunca negou ter-se encontrado com Rai Lós em princípios de Maio, sempre negou que se tratasse de criar grupos armados para eliminar opositores, mas sim de criar grupos que garantissem a segurança do Congresso da FRETILIN, alguns dias depois.

Quando, alegadamente, se terá apercebido de que o seu Ministro do Interior teria entregue armas de fogo a grupos de civis, terá ordenado a Rogério Lobato que os desarmasse. Mas terá constatado, nessa altura, que o seu ministro já não controlaria a situação.

De notar que a criação de grupos civis de segurança para proteger a realização de congressos e manifestações políticas, mesmo de manifestações da Igreja, é habitual, na região. Na Indonésia, e por influência indonésia em Timor-Leste também, é frequente os bairros terem seguranças civis dos próprios bairros. O normal, no entanto, é que essas estruturas civis de segurança não utilizem armas de fogo.

O Ministro Ramos Horta, entretanto, foi estabelecendo contactos com as várias partes envolvidas na crise, procurando manter portas abertas ao diálogo e diminuir tensões.

Em 12 de Maio o Primeiro-Ministro australiano, John Howard, anuncia que, embora não tenha havido qualquer pedido nesse sentido, tem já forças preparadas para intervir em Timor-Leste, caso venham a ser solicitadas. Apesar de Ramos Horta continuar a dizer que não são necessárias forças estrangeiras, a Austrália envia dois navios de guerra para junto das águas territoriais de Timor-Leste, com pessoal pronto a desembarcar.

Em 13 de Maio Ramos Horta leva o Major Reinado a casa de Xanana Gusmão. Reinado afirmara publicamente, pouco antes, que não abandonara a cadeia de comando, apenas se afastara para evitar problemas, dado que não havia condições de segurança, nem para ele nem para o povo, já que as FDTL estavam a matar o povo. O Presidente elogia a sua atitude e pede-lhe para se dirigir a Bobonaro para ajudar a acalmar a população. Para alguns analistas, a partir deste momento as forças armadas passam a ter, claramente, duas cadeias de comando, uma com sede no Governo, e outra com sede na Presidência da República.

Entretanto a casa de uma cunhada do Ministro do Interior, Rogério Lobato, é queimada, morrendo carbonizados, ela e os filhos, num total de seis pessoas.


1.3.5. O Congresso da FRETILIN e a mudança de regras de candidatura e de eleição da liderança

Apesar das dificuldades postas à sua preparação e da insegurança reinante em Dili e noutras localidades, a FRETILIN decidiu não adiar o seu Congresso.

Em 16 de Maio José Luís Guterres, Embaixador de Timor-Leste nos EUA e na ONU, e Egídio de Jesus, ex-Secretário de Estado para a Região III, declararam a sua intenção de se candidatarem aos cargos de Secretário-Geral e Presidente da FRETILIN, respectivamente. O ex-Ministro para o Desenvolvimento, Abel Ximenes, e o ex-Embaixador na Austrália, Jorge Teme, manifestaram o seu apoio à mudança na liderança da FRETILIN.

De 17 a 19 de Maio realiza-se o Congresso da FRETILIN. Nele, os delegados presentes decidem mudar as regras para a aceitação de candidaturas à liderança. Em vez da assinatura de 10% dos delegados ao Congresso, passa a ser exigida a assinatura de 20%. Além disso a eleição dos dirigentes, antes feita por voto secreto, foi mudada para eleição por braço-no-ar.

Esta última mudança foi feita por proposta de delegados com a justificação de que era a única maneira de os militantes de cada região ficarem a saber se as pessoas que elegeram como delegados votaram ou não conforme as indicações que receberam dos seus representados.

Ela é contrária à prática anterior da FRETILIN e teve como consequência imediata a desistência da candidatura alternativa de José Luís Guterres, por considerar que esta forma de votação inibia uma expressão, livre de pressões, dos eleitores.

A candidatura única de Lu Olo (como Presidente) e Mari Alkatiri (como Secretário-Geral) recebeu o voto quase unânime dos delegados presentes (97%). No entanto, para muitos, veio mostrar uma imagem pouco democrática da FRETILIN, numa altura em que era importante dar um sinal exactamente de sinal contrário a esse.

Xanana Gusmão afirmaria, depois, que essa forma de votação contrariava a lei aprovada em 2004, que exigiria, segundo a sua interpretação, que esse voto fosse secreto.

Com efeito a alínea c) do Artigo 18º da Lei nº 3/2004, aprovada pelo Parlamento Nacional em 14 de Abril de 2004, no seu artigo 18º, sobre “Regras Democráticas”, na única alínea relativa ao modo de eleição, diz claramente:

“- c) Os titulares dos órgãos de direcção só podem ser eleitos, por voto directo e secreto de todos os filiados ou de assembleia deles representativa;”

Analisada esta expressão em Português, parece ser claro que o voto directo e secreto é exigido quer para o voto directo de todos os filiados, quer para o voto de assembleia deles (filiados) representativa.

Aliás, o normal em qualquer democracia, é que as eleições dentro dos partidos, tal como as eleições para os parlamentos, sejam sempre feitas por voto secreto.

Nessa linha, a Lei dos Partidos Políticos portuguesa (Lei Orgânica nº 2/2003 de 22 de Agosto) especifica, no seu artigo 34º, sobre o Sufrágio, que “As eleições e os referendos partidários realizam-se por sufrágio pessoal e secreto”.

Isto não quer dizer que, nas assembleias dos partidos, não possam ser aprovadas resoluções ou moções por votação de braço no ar. Mas estas não dizem respeito à eleição de pessoas.

Com base nessa interpretação Xanana Gusmão chegou, mesmo, a exigir que a FRETILIN organizasse um novo Congresso para repor a legalidade.

Não foi, no entanto esta a interpretação feita pelo Tribunal de Recurso que, segundo a mesma lei, e na falta de um Supremo Tribunal de Justiça, é a entidade competente “para os efeitos da presente lei”.

Com efeito, em 11 de Agosto foi tornada pública a decisão unânime dos três juízes do Tribunal de Recurso de Timor-Leste, de considerar a votação de braço no ar como legítima.

A argumentação apresentada parece resultar de uma leitura muito pouco consistente, e mesmo distorcida, do texto acima citado.

No entanto, se a lei timorense é interpretada como o foi pelo Tribunal de Recurso, o Parlamento Nacional e, neste, o partido maioritário, deveriam tornar mais explícita a exigência de votação secreta, sempre que se trate de eleições, fora ou dentro dos partidos, sob pena de se considerar que, também nisso, o Estado de Timor-Leste não é democrático.


1.3.6. O Major Reinado recusa a via do diálogo e, em fins de Maio, os combates entre polícias, peticionários e outros militares e grupos de civis armados, por um lado, e forças das F-FDTL, por outro, provocam mortes e grande insegurança e instabilidade

Em 21 de Maio, e a pedido do Ministro dos Negócios Estrangeiros Ramos Horta, pessoal da Embaixada dos Estados Unidos vai a Aileu para conversar com o Major Reinado, que entretanto, e na sequência do Congresso da FRETILIN, tinha endurecido posições, tentando convencê-lo a aceitar a via do diálogo. Mas o Major Reinado continua decidido a enveredar pela via da confrontação, e afirma que vai apelar à população de loromono para abandonar Dili, já que não haverá condições de segurança para aí permanecer. Comunicada esta posição ao MNE Ramos Horta, este mostra-se surpreendido e preocupado. Em telefonema posterior, Horta não consegue convencer Reinado a moderar-se. Aparentemente o Major Reinado estaria a actuar muito mais em função das instruções dos seus conselheiros australianos, do que das do Presidente ou do Ministro dos Negócios Estrangeiros timorense.

Em 22 de Maio o Major Reinado dá uma longa conferência de imprensa à televisão de Timor. Estão presentes, também, os jornais locais, a Lusa e a Agência Europeia de Informação (AEI). Nesta conferência de imprensa Reinado diz que não dialoga com criminosos, e aconselha, como na véspera tinha dito, todos os ‘loromonos’ a saírem de Dili, já que não teriam condições de segurança para permanecerem na cidade, sugerindo, assim, que estaria a planear ataques em Dili. A imprensa escrita de Dili, no dia seguinte transcreve as palavras de Reinado. Mas, a televisão não passa a maior parte da entrevista a fim de evitar o pânico e o aumento da conflituosidade que a sua divulgação poderia provocar. Além disso, uma ‘providencial’ falha da energia eléctrica em Dili torna quase impossível a sua visualização na capital.

Entretanto, em 23 de Maio é tornado público o resultado do concurso internacional para a exploração de seis blocos no Mar de Timor. A empresa italiana ENI SPA é a vencedora em cinco deles, e a India’s Reliance Industries Ltd. ganha o sexto bloco. Nenhuma empresa australiana tinha concorrido a qualquer destes blocos. A Galp, portuguesa, tinha concorrido, associada com a empresa brasileira Petrobrás, mas não foi seleccionada. Poucas semanas depois o Governo de Timor divulga publicamente o relatório completo da comissão que fez a selecção dos concorrentes, ficando assim claras, com uma transparência muito pouco habitual em todo o mundo, as razões da selecção efectuada.

Também em 23 de Maio, um grupo dirigido pelo Major Alfredo Reinado atacou uma patrulha das F-FDTL, em Fatu Ahi, Becora, junto de Dili que se aproximou dele quando estava a dar uma entrevista para o jornalista australiano David O’Shea. Do combate havido, iniciado pelo Major Reinado e testemunhado pelo referido jornalista, resultou a morte de um polícia que acompanhava a força das FDTL e de um dos homens sob o comando do Major Reinado, abatido quando as FDTL reagiram ao ataque.

Nesse mesmo dia, de manhã, funcionários da Embaixada dos EUA vão a Gleno falar com o Tenente Salsinha e com os Majores Tara e Tilman que concordam em seguir a via do diálogo. Surpreendentemente estavam também presentes dois polícias do grupo do Major Reinado, eventualmente para comunicarem com ele e lhe darem notícias do encontro com elementos da Embaixada dos EUA. No fim desse encontro o telefone toca e recebem a notícia de que o Major Reinado tinha sido atacado (ou melhor, tinha desencadeado um ataque) em Fatu Ahi. Parecia tudo bem organizado para falhar…

Em 23 de Maio o Primeiro-Ministro Australiano termina, apressadamente, na Irlanda, um périplo que o levou, também, aos Estados Unidos e Canadá. É possível que a já previsível intervenção da Austrália em Timor-Leste tenha sido abordada nas conversações com governantes desses países.

Na madrugada de 24 de Maio, o Quartel das F-FDTL, em Taci Tolu, foi atacado. Algumas fontes timorenses dizem que este ataque terá sido feito por alguns peticionários e apoiantes, incluindo ex-comandantes das FALINTIL: Cmdte. Samba Sembilan (de Liquiçá) e Cmdte Chaves (de Ermera). O Tenente Gastão Salsinha também terá participado no ataque a este quartel do Exército, juntamente com alguns civis armados. Em consequência da reacção vinda do interior do Quartel-General, o Comandante Chaves foi morto. (Nos tempos da Resistência Chaves foi o Comandante da Região III, e terá comandado o Major Gastão Salsinha).

Pouco depois, um grupo até então desconhecido, liderado pelo Comandante Rai Lós, alegadamente mandado por Rogério Lobato para Tibar (não muito longe de Taci Tolu), aparentemente com instruções para interceptar peticionários que tentassem aproximar-se de Dili, vê-se envolvido, segundo uma fonte timorense, num duro combate com uma força do Exército que tinha saído do quartel em perseguição de atacantes. Esta, ao ver o grupo fardado e armado como se fosse da Unidade Rápida da Polícia, dado o clima de desconfiança mútua entre a polícia e as F-FDTL entretanto gerado, atacou a matar, tendo abatido quatro homens de Rai Lós. Da intensa troca de tiros havida nessa altura terão resultado mais algumas vítimas, que ficaram caídas na estrada.

Segundo as mesmas fontes, uma das consequências deste grave confronto teria sido convencer Rai Lós de que teria caído numa armadilha montada pelo próprio Ministro do Interior. A partir daí teria deixado de obedecer às ordens de Rogério Lobato e, pelo contrário, terá estabelecido contactos com o Presidente Xanana Gusmão, a quem terá denunciado a criação do seu grupo armado, acusando não apenas Rogério Lobato mas também Mari Alkatiri de terem armado o grupo para eliminar peticionários e opositores.

Em entrevista a um repórter da agência australiana Dateline, o Procurador Longuinhos Monteiro confirma, no entanto, uma versão diferente, segundo a qual teria sido o próprio grupo de Rai Lós quem teria comandado o ataque às F-FDTL em Taci Tolu e iniciado o tiroteio. (David O’Shea, John Martinkus; East Timor, Downfall of a Prime Minister, 2006).

A seguir a este ataque seguem-se diversas escaramuças em vários pontos da cidade e arredores. Aliás, como que a forçar uma intervenção australiana, entre 22 e 25 de Maio tiveram lugar uma série de ataques, aparentemente coordenados, a alvos do Exército. Até a casa do General Taur Matan Ruak, Comandante das FDTL, também foi atacada a tiro, no dia 24 de Maio, quando a sua filha, de três anos e o filho, de 8 meses, se encontravam em casa com a ama. Tratou-se de mais uma clara tentativa, bem sucedida, de criar o pânico e um conflito generalizado e fora de controlo. O ambiente torna-se de tal modo tenso, e os incidentes sucedem-se a um ritmo tal que a presença de forças internacionais se torna, de facto, uma necessidade imperiosa e premente.

Em 24 de Maio o Ministro dos Negócios Estrangeiros de Timor-Leste, na sequência de um acordo estabelecido entre o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República e o Primeiro-Ministro, pede ao Secretário-Geral da ONU a aprovação de uma força internacional de emergência, e pede, depois, aos governos da Austrália, da Nova Zelândia, da Malásia e de Portugal, o envio de forças para pôr cobro aos conflitos e restabelecer a paz e a segurança no país.

Em 25 de Maio o capitão Kaikeri foi morto a tiro. Era um dos homens de maior confiança do Comandante das forças timorenses. Quando Taur Matam Ruak era o Chefe das Falintil e lutava contra a ocupação indonésia, Kaikeri construiu-lhe um abrigo, por baixo da sua casa. Taur refugiou-se nesse abrigo muitas vezes, sem nunca ser denunciado, mesmo quando Kaikeri foi horrivelmente torturado para revelar o paradeiro do Comandante da Resistência Armada.

Nesse mesmo dia 25 de Maio, depois de o Comandante da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL), Paulo Martins, ter abandonado o seu posto, devido ao clima generalizado de insegurança e de conflituosidade entre polícias e militares, oficiais da Polícia das Nações Unidas são chamados a mediar uma trégua a fim de que cerca de oitenta polícias, que se encontravam cercados na sede da PNTL, alguns dos quais feridos, pudessem sair em segurança.

Tendo sido obtido um acordo com o General Taur Matan Ruak, segundo o qual poderiam sair em paz, desde que desarmados, o Coronel Fernando José Reis, oficial superior português responsável pela componente militar da UNOTIL, dirigiu-se à sede da Polícia timorense desarmado. É ele próprio que relata que, quando os polícias saíram, visivelmente desarmados, e seguiam, em formatura apeada em direcção às instalações da UNOTIL, passaram em frente de um grupo de três a quatro militares das F-FDTL. Apesar da trégua acordada com o chefe máximo do Exército, um dos militares começou a disparar sobre os polícias desarmados, e outros dois seguiram-lhe o exemplo.

Foram, assim, imediatamente assassinados sete polícias timorenses, ficando feridos mais dezasseis, três dos quais viriam a morrer, pouco depois, na sede da UNOTIL. Ficaram também feridos dois polícias da ONU, um filipino e um paquistanês.

Soube-se, entretanto, que o primeiro militar a disparar, de facto não era membro do Exército, embora estivesse fardado e armado como se o fosse. Segundo os jornalistas australianos O’Shea e Martinkus o grupo que atacou os polícias timorenses era muito mais numeroso e incluiria numerosos civis. Estes jornalistas levantam a hipótese de este ataque ter sido feito para descredibilizar as F-FDTL, ao envolvê-las no assassinado de polícias desarmados, depois de um cessar fogo acordado com o Chefe das FDTL.

Mas também há quem admita que os sucessivos ataques sofridos pelos militares, por parte de diversas unidades da Polícia e peticionários, e o pânico generalizado, terão levado o Comando das F-FDTL a armar e fardar ex-combatentes, para fazer face à crise e combater unidades da polícia que pareciam apostadas em destruir o Exército de Timor-Leste, e que a partir daí, tenha perdido o controlo que antes tinha sobre os seus homens.

Depois deste gravíssimo incidente, o General Taur Matan Ruak prometeu castigar os militares nele envolvidos.


1.3.7. A chegada a Timor-Leste de militares australianos, a pedido dos Órgãos de Soberania timorenses e a demissão dos Ministros da Defesa e do Interior, primeiro, e do Primeiro-Ministro, depois

Em 25 de Maio chegam a Dili os primeiros 150 militares australianos. Xanana Gusmão assume, de facto, a coordenação das forças internacionais e reúne com o General Ken Gillespie, comandante das forças australianas. O Major Reinado afirma, acerca das forças australianas: - “Estou convosco. Estou com a Austrália.”

Se, por um lado, as forças australianas inspiram alguma confiança à população e terão posto um travão à onda de mortes que se arriscava a engrossar, por outro lado, não evitam os incêndios e pilhagens de casas, e parecem contemporizar, e mesmo pactuar, para não dizer mais do que isso, com a destruição de alvos selectivos, ligados ao poder judicial e à administração, de modo a destruir quase todos os pilares do Estado. Aliás o Primeiro-Ministro australiano apressa-se a dizer que o estado de Timor-Leste já não existe, no que é contrariado por Ian Martin, o Enviado Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas a Timor.

Em 29 e 30 de Maio reuniu o Conselho de Estado, que adoptou medidas de emergência por trinta dias (mais tarde essas medidas de emergência seriam prorrogadas por mais 30 dias) para ultrapassar a crise político-militar. No entanto, o Estado de Sítio não foi declarado. Para que o Presidente o pudesse declarar seria necessária uma autorização prévia do Parlamento Nacional. Na reunião do Conselho de Estado, na qual Xanana Gusmão exigiu que Rogério Lobato e Roque Rodrigues não participassem, o Presidente sugeriu ao Primeiro-Ministro que demitisse os Ministros do Interio e da Defesa. Este último não levantou qualquer objecção à demissão. Rogério Lobato, no entanto, afirmou que só aceitaria demitir-se se Mari Alkatiri também se demitisse. Mas, em 1 de Junho os dois ministros acabaram por pedir as suas demissões. Ramos Horta passou a assumir, também, a pasta da Defesa, além da de Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

Em 5 de Junho chega a Baucau o contingente português, constituído por 120 elementos da Guarda Nacional Republicana (GNR).

Em 8 de Junho mais de 1 000 manifestantes convergem para Dili e exigem que o Parlamento demita o Primeiro-Ministro no prazo de 48 horas. Nesse mesmo dia o Ministro dos Negócios Estrangeiros timorense pede às Nações Unidas que criem uma Comissão de Inquérito aos graves incidentes ocorridos em 28 e 29 de Abril e em 25 de Maio.

Em 19 de Junho, depois de regressar de uma rápida deslocação a Nova Iorque, onde explicou a situação em Timor-Leste (em 2006.06.13), Ramos Horta encontra-se com o Comandante Rai Lós em Leoleta, Liquiçá. Nesse mesmo dia o canal televisivo australiano ABC põe no ar um programa (Four Corners) com graves acusações de Rai Lós ao ex-Ministro do Interior, Rogério Lobato, e ao Primeiro-Ministro, Mari Alkatiri, sobre as armas que lhe foram dadas e as instruções que terá recebido para eliminar peticionários e opositores. Esse programa voltou a passar no dia 21.

Em 20 de Junho o Presidente da República envia uma carta ao Primeiro-Ministro, cujo assunto é - “Envio de um documentário do Programa «Four Corners»”. Nessa carta o Presidente Xanana Gusmão faz referência a esse programa, do qual envia cópia em cassete vídeo, salientando que aí são feitas “graves denúncias sobre o seu envolvimento na distribuição de armas a civis”. Nessa mesma carta o Presidente da República Democrática de Timor-Leste diz ao Primeiro-Ministro: “Ou resigna ou, depois de ouvido o Conselho de Estado, o demitirei, porque deixou de merecer a minha confiança, enquanto Presidente da República”. Nesse mesmo dia o Procurador-Geral emite um mandato de captura contra Rogério Lobato.

Em 21 de Junho reuniu o Conselho de Estado, que se mostrou muito dividido quanto à demissão de Mari Alkatiri. Xanana ameaçou demitir-se se Mari Alkatiri não se retirasse da chefia do Governo. Mari Alkatiri começou contactos com a liderança da FRETILIN, que lhe manifestou apoio à sua continuação no Governo, e o braço de ferro entre o Presidente, de um lado, e o Primeiro-Ministro e a FRETILIN, do outro, agudizou-se.

Em 22 de Junho o Presidente dirige uma “Mensagem ao Povo Amado e Sofredor e aos Líderes e Membros da FRETILIN” em que acusa a FRETILIN de querer fazer um golpe e matar a democracia e em que anuncia a sua intenção de se demitir se o Primeiro-Ministro Mari Alkatiri não se demitir. Nessa mensagem afirma que a Direcção da FRETILIN, recentemente eleita por braço no ar, “é ilegítima porque viola a Lei e a Constituição”, dando o prazo de uma semana para esta reunir em Congresso Extraordinário para proceder a uma nova eleição por voto directo e secreto, como determina a legislação feita pela própria FRETILIN.

Nesse mesmo dia Rogério Lobato é colocado em prisão domiciliária. Interrogado por um juiz, não nega a entrega de armas ao grupo de Rai Lós, e procura responsabilizar também Mari Alkatiri pela constituição e armamento desse grupo, embora negando que a esse grupo tivesse sido dada qualquer ordem para eliminar opositores.

Em 22 de Junho também reuniu a Comissão Política Nacional da FRETILIN, que reforçou o seu apoio ao seu Secretário-Geral e Chefe do Governo, lançando um apelo ao Presidente da República para fazer o possível para encontrar “uma solução que salvaguarde as instituições democráticas”.

Em 23 de Junho apoiantes de Xanana manifestam-se em Dili e pedem-lhe para não se demitir da Presidência. O Bispo de Dili faz, também, um apelo no mesmo sentido.

A reunião do Comité Central da FRETILIN, realizada em 24 e 25 de Junho continua a defender a continuação de Mari Alkatiri no cargo de Primeiro-Ministro. Mas, perante a determinação do Presidente da República, o Primeiro-Ministro acaba por apresentar a sua demissão em 26 de Junho de 2006. Nessa altura Mari Alkatiri declara-se “pronto a resignar do cargo de Primeiro-Ministro (...) para evitar a eventual resignação do Senhor Presidente da República”. Além disso mostra-se “pronto a manter com o Senhor Presidente da República diálogo no sentido de contribuir, se necessário, para a formação de um governo interino” e para “contribuir para a apresentação de um Orçamento do Estado no Parlamento Nacional”.

As manifestações de apoio a Xanana Gusmão e contra Mari Alkatiri continuam em Dili, acompanhadas pelo incêndio de instalações da FRETILIN e de casas de alguns dos seus apoiantes, nomeadamente de membros do seu Comité Central (de acordo com artigo de Loro Horta publicado no UNOTIL, Daily Media Review, em 44 de Agosto de 2006), sem que as forças internacionais, predominantemente da Austrália, as evitem.

De 29 de Junho a 1 de Julho, cerca de 15 000 membros e simpatizantes da FRETILIN manifestam o seu apoio ao partido e a Mari Alkatiri, nos arredores de Dili. Esse número depois diminui para cerca de 5 000, em Dili. Essa diminuição dever-se-á à falta de transportes, segundo o próprio Mari Alkatiri, ou ao facto de muitos apoiantes da FRETILIN quererem manifestar o seu apoio ao partido mas não à direcção da FRETILIN, segundo dizem alguns observadores locais.

Em 30 de Junho, Lu Olo, Presidente da FRETILIN, fala na necessidade dos líderes timorenses deixarem de se magoar uns aos outros: - “já todos temos demasiadas feridas”, disse.

Em 3 de Julho o Presidente Xanana Gusmão e o novo Ministro da Defesa, Ramos Horta, visitam o quartel das F-FDTL em Metinaro, reunindo com o General Taur Matan Ruak.

Em 7 de Julho o Presidente recebeu uma delegação da FRETILIN, que lhe entregou uma lista de nomes que o partido maioritário aceitaria para Primeiro-Ministro. Em 8 de Julho Xanana Gusmão nomeia Ramos Horta para Primeiro-Ministro, e dois Vice-Primeiros-Ministros, Estanislau da Silva (ex Ministro da Agricultura) e Rui Araújo (ex-Ministro da Saúde). Em 10 de Julho esta troica toma posse. Em 14 de Julho tomam posse os ministros do 2º Governo Constitucional. Todos os ministros do anterior Governo que não se demitiram continuaram a fazer parte do Governo. José Luís Guterres, ex-Embaixador nas Nações Unidas e nos Estados Unidos, que tinha manifestado a intenção de se candidatar à liderança da FRETILIN tornou-se no novo Ministro dos Negócios Estrangeiros, tomando posse em 21 de Julho, depois do seu regresso de Nova Iorque.


1.3.8. A detenção e a fuga de Alfredo Reinado da prisão de Becora, em Dili

Em 25 de Julho, um dia depois da data limite para a entrega voluntária de armas, um casal australiano informou a GNR de que o Major Alfredo Reinado e os seus homens estavam a ocupar, abusivamente, uma casa que, segundo eles, seria de um Português que estaria em Lisboa de férias. Desconhece-se quem seria esse português, ou, até, se a informação dada pelo casal australiano seria verdadeira.

Perante essa denúncia, a GNR foi à referida residência, onde encontrou muitas munições, algum equipamento militar, e algumas pistolas, mas não armas de guerra.

Na altura o Major Reinado informou que fora o Presidente quem lhe dera instruções para se instalar numa das casas que estava a ocupar, que se situava em frente ao Quartel General das forças australianas em Dili, embora ele e os seus homens tenham decidido ocupar duas outras casas junto dessa.

Dada a natureza do equipamento encontrado, terão surgido dúvidas sobre se haveria, ou não, razões para deter Reinado e os seus homens. Foram precisas cerca de sete horas de conversações, nem sempre fáceis, envolvendo membros da GNR, militares australianos, o Procurador-Geral da República, o Procurador-Geral Adjunto e o Vice-Ministro do Interior (que, entretanto, se deslocaram à Presidência da República), e outras personalidades, para finalmente ser efectuada a detenção, por militares australianos.

O Major Alfredo Reinado, em entrevista posterior, queixar-se-ia de ter sido injustamente detido, uma vez que tinha entregue as armas de guerra em seu poder, ficando, apenas com equipamento militar, cuja entrega não tinha sido exigida.

Aparentemente, Xanana Gusmão também discordaria da detenção.

Em 30 de Agosto de 2006, data do sétimo aniversário do Referendo de Autodeterminação, Alfredo Reinado e mais 56 detidos, escaparam da prisão de Becora, em Dili, pela porta principal, na hora da visita. A prisão tinha a guardá-la um reduzidíssimo número de guardas prisionais, desarmados. Ao que parece, numa rua próxima algumas viaturas esperariam Alfredo Reinado e os seus homens, para os levarem para fora do local.

O Ministro da Justiça, Domingos Sarmento, disse à estação australiana ABC que, até alguns dias antes, tinham estado forças Neo-Zelandesas a guardar a prisão. Em 26 de Agosto, abandonaram o local. Mas, segundo o Ministro, iriam ser chamadas novamente para voltar a desempenhar essas funções.

O Ministro da Defesa da Nova Zelândia, por sua vez, disse que a responsabilidade pelas prisões nunca tinha sido nem era das forças internacionais. Mas não esclareceu se a responsabilidade pela segurança junto e em torno das prisões seria ou não das forças internacionais.

Ramos Horta, acusou as forças australianas de terem responsabilidades no sucedido. À Lusa, disse que “a prisão e outros pontos críticos da cidade de Dili são da responsabilidade das forças internacionais”. À rádio australiana da ABC o Primeiro-Ministro timorense disse:

“Estou perplexo porque é que, apesar dos nossos insistentes pedidos para que houvesse forças estacionadas do lado de fora da prisão, isso não foi feito. Se houvesse uma forte segurança do lado de fora, isto poderia ter sido evitado.”

O Brigadeiro Mick Slater, comandante das forças australianas e principal responsável pela coordenação das forças internacionais, esclareceu que as suas tropas nunca tinham sido responsáveis pela gestão da prisão, e apenas providenciavam segurança externa para que não ocorresse violência externa contra os guardas da prisão.

O Ministro dos Negócios Estrangeiros, Alexander Downer, lamentou profundamente o sucedido. Acrescentou que iria visitar Timor-Leste em 3 e 4 de Setembro. “Será uma importante visita, e, tendo em conta a fuga desses 56 prisioneiros, que é uma grande preocupação para nós, será uma oportunidade para reforçarmos o nosso apoio aos leste-timorenses.”

O Primeiro-Ministro Howard, por sua vez, disse que a Australian Defense Force (ADF) estava “furiosamente à caça desse homem (Alfredo Reinado), até porque foi grandemente através do terrível trabalho da ADF que ele foi capturado.”

Alfredo Reinado, entretanto, fez circular uma carta em que incita o povo a perder o medo de ir para as ruas manifestar-se, porque “temos o direito de remover o Governo e o Parlamento.”

Numa videocassete enviada à Lusa, depois da fuga, Reinado esclarece que não saiu para fazer uma revolta, mas porque o sistema judicial timorense é tendencioso e pretender ser julgado com justiça.

Por sua vez o Padre Martinho Gusmão, da Comissão Justiça e Paz da Diocese de Baucau, sugere que alguns dos que agora se escaparam da cadeia se considerariam injustamente punidos pelo seu papel na recente violência, na qual se teriam visto envolvidos acidentalmente. E contrapõe ao facto de que Rogério Lobato e Mari Alkatiri, “que deveriam ser considerados responsáveis, …ainda estão em liberdade.”
2. OS PROTAGONISTAS INTERNOS


2.1. Rogério Lobato

De todos os 14 irmãos do histórico líder da Resistência Timorense, Nicolau Lobato, morto em combate em 31 de Dezembro de 1978, Rogério Lobato é o único que sobreviveu à ocupação. Praticamente toda a sua família foi eliminada pelos ocupantes. Tem um sobrinho, filho de Nicolau Lobato e da sua mulher, Isabel, que foi morta no próprio dia da invasão, no cais de Dili, que foi recolhido e educado, durante alguns anos, por um oficial indonésio.

Rogério Lobato é elemento do Comité Central da FRETILIN, desde 1974. Era, então, um dos raros oficiais timorenses do Exército Português (alferes). Foi ele que liderou as forças da FRETILIN quando estas, em resposta ao golpe da UDT, da noits de 10 para 11 de Agosto de 1975, e perante a impotência da Administração Portuguesa de controlar a situação, lançaram o contra golpe, dando origem, em 20 de Agosto de 1975, a uma curta ‘guerra civil’, que terminou cerca de um mês depois quando as forças da UDT se refugiaram do lado indonésio da fronteira.

Esta rápida vitória sobre as forças manobradas a partir da Indonésia, por parte de umas FALINTIL recém-criadas, sob o seu comando, granjeou-lhe um grande prestígio, nomeadamente entre os combatentes. Por esse motivo foi recebido como um herói, nomeadamente por muitos veteranos, quando, 24 anos depois de ter saído do território, regressou a Timor-Leste. Essa será uma das razões para o peso que tem na FRETILIN, ainda que possa haver outros motivos também.

Tornou-se Ministro da Defesa da RDTL, quando, em 28 de Novembro de 1975 a FRETILIN declarou, unilateralmente, a independência.

Poucos dias antes da invasão indonésia, foi enviado para o exterior, juntamente com outros quatro membros do Comité Central da FRETILIN, a fim de tentar obter apoio internacional. Com esse objectivo visitou a China, a Coreia do Norte, o Cambodja, Cuba e outros países, acabando por se instalar em Maputo, em 1978.

Depois de conflitos com outros membros da FRETILIN, foi para Angola, em 1979, onde Roque Rodrigues se tinha entretanto instalado como Embaixador da República Democrática de Timor-Leste (RDTL), já que o estado angolano, recentemente independente, reconheceu a declaração unilateral da independência proclamada em Dili em 28 de Novembro de 1975.

Em 1983 foi detido em Angola e acusado de fazer contrabando de diamantes. Acabou por cumprir alguns anos de prisão nesse país.

Em 1992 aparece em Londres, juntamente com o ex-líder da FRETILIN e ex-Presidente da RDT-L, Abílio Araújo, quando este começou os seus contactos e negócios com a filha do Presidente Suharto, Tutut. Em Dezembro de 1993 participa no primeiro encontro de reconciliação entre timorenses pró-integração e pró-independência, patrocinado pelas autoridades indonésias.

Em Novembro de 2000 regressou a Timor-Leste e percorreu o país para estabelecer contactos com veteranos, incluindo alguns dos raros sobreviventes das FALINTIL que, sob a sua liderança, derrotaram a UDT e contiveram as forças indonésias, quando estas fizeram as suas primeiras tentativas de invasão, a partir da fronteira com Timor Ocidental.

Em 1 de Agosto de 2001, num comício da FRETILIN de campanha para as eleições da Assembleia Constituinte, Rogério Lobato anunciou que, com a FRETILIN no poder, haveria uma mudança de política relativamente à constituição das Forças de Defesa de Timor-Leste (FDTL) que, ao contrário do que a UNTAET estava a fazer, com a colaboração de Xanana Gusmão e Taur Matan Ruak, deveriam passar a incluir mais veteranos das FALINTIL e menos colaboracionistas dos ocupantes. Nesse mês de Agosto de 2001 alguns elementos do grupo da Sagrada Família, dirigido pelo ex-Comandante L7, das FALINTIL, passaram a integrar o Comité Central da FRETILIN.

Rogério Lobato não fez parte do Segundo Governo Transitório da UNTAET, o primeiro com grande participação timorense e com Mari Alkatiri no cargo de Ministro-Chefe. Esta Governo foi formado pela UNTAET, sob a liderança do Representante Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas, Sérgio Vieira de Mello, em Outubro de 2001, depois das eleições para a Assembleia Constituinte realizadas em 30 de Agosto. Isso terá irritado o que fora, em 1975, o vitorioso líder das FALINTIL e Ministro da Defesa da RDTL.

Entre Agosto de 2001 e Maio de 2002 Rogério Lobato apoiou, publicamente, a contestação de veteranos e de outros grupos dissidentes, relativamente à forma como estavam a ser constituídas as FDT-L, e mobilizou um elevado número de ex-combatentes para marchas e manifestações que foram sentidas como uma ameaça às celebrações da independência, em 20 de Maio de 2002.

Imediatamente a seguir a essas cerimónias, quando o Primeiro Governo Constitucional, dirigido por Mari Alkatiri como Primeiro-Ministro, tomou posse, Rogério Lobato era o Ministro da Administração Interna, mas não o Ministro da Defesa, como ele gostaria e se achava no direito de ser. À frente da Defesa, no cargo de Secretário de Estado, foi colocado Roque Rodrigues (que, na altura, se recusou a ser ministro), um homem leal a Xanana Gusmão e também a Mari Alkatiri.

Não lhe tendo sido dada a oportunidade de reconstruir, à sua maneira, as FDT-L, Rogério Lobato terá procurado refazer a Polícia Nacional de Timor-Leste (PNT-L) que, por decisão da UNTAET, com o acordo de Xanana Gusmão, tinha muitos elementos da ex-POLRI, Polícia da República da Indonésia, dos tempos da ocupação, contra o desejo do novo Ministro. Há quem afirme que o Próprio Ministro da Administração Interna terá fomentado manifestações e ataques contra a polícia, e que esta terá demonstrado uma grande ineficiência, a fim de justificar a sua remodelação.

Como Xanana Gusmão lembrou, no seu discurso de 28 de Novembro de 2002, Rogério Lobato foi convidado a integrar o Governo depois de ter, em conjunto com alguns ex-Veteranos, ameaçado, primeiro, e desistido, depois de afectar as cerimónias da independência de 20 de Maio de 2002.

Muitas pessoas em Timor alegam que Rogério Lobato e alguns dos seus colaboradores terão estados envolvidos em tráfico ilegal de sândalo, entre Julho e Setembro de 2002. Como Ministro do Interior foi acusado de incompetência e corrupção, por parte do Presidente.

Como Ministro da Administração Interna arranjou maneira de colocar, como chefes de posto, homens conhecidos pela sua ligação à FRETILIN. O Ministro Lobato chegou mesmo a dizer, antes das eleições das autoridades comunitárias, quando ainda tinha sob sua responsabilidade a administração regional e local, que só podiam ser eleitos candidatos da FRETILIN, afirmação imprópria de um governante de um estado democrático

Em Janeiro de 2003, aquando de um reajustamento no Governo, as responsabilidades de Administração Interna passaram para a Ministra da Administração do Estado, Ana Pessoa, ficando Lobato apenas como Ministro do Interior.

Como Ministro do Interior, com a tutela da Polícia, Rogério Lobato foi criando diversos corpos de polícia. Aproveitando as críticas feitas às FDT-L, pela dureza com que estas fizeram operações de limpeza na área de Atsabe, em Janeiro e Fevereiro de 2003, na sequência de infiltrações e ataques de milícias perto da fronteira, Rogério Lobato conseguiu a cobertura do Primeiro-Ministro e das Nações Unidas para a criação de uma Unidade de Reserva da Polícia, uma força paramilitar, que viria a ser mais bem equipada do que as FDT-L, com armas próprias de uma unidade do exército e não da polícia. A partir de meados de 2003 tornaram-se públicas as críticas de elementos das FDT-L à criação e armamento desta unidade da polícia, de mais a mais com elementos seleccionados pela sua fidelização pessoal e não pelo seu profissionalismo.

Eram conhecidas frequentes queixas de elementos da Igreja e da oposição, devido às ameaças feitas por Rogério Lobato ou pelos seus homens, quer a padres que se referiam criticamente à FRETILIN, quer a deputados da oposição ou qualquer outra pessoa que se mostrasse crítica relativamente ao Governo, à FRETILIN ou à sua liderança.

Com tudo isso gerou um clima de suspeição e medo, que levou um bispo timorense a confessar, a pessoa das suas relações que, enquanto Rogério Lobato fosse Ministro, não haveria paz e segurança em Timor-Leste.


2.2. Alfredo Reinado

Alfredo Reinado terá nascido cerca de 1967. Pouco depois da invasão, foi capturado e utilizado com ajudante de carga pelas TNI, forças armadas indonésias, não apenas em Timor-Leste mas também nas ilhas de Sulawesi e de Kalimantan. Por volta de 1990 fugiu para a Austrália e trabalhou num estaleiro naval na Western Austrália.

Em 1997 Ramos Horta conheceu-o, em Perth, ficando impressionado com a sua dedicação à causa da independência de Timor-Leste. Ficaram amigos e, a partir daí, mantiveram-se em contacto.

Tendo regressado a Timor em 1999, depois do Referendo, entrou para as F-FDTL, sendo, pouco depois, nomeado Comandante da Marinha, cargo em que não revelou grande disciplina, já que os dois barcos de patrulha de costa (oferecidos por Portugal) se encontravam, por vezes, abandonados, sem qualquer segurança. Por esse motivo foi colocado no Quartel-General das F-FDTL.

O seu pai e a sua irmã continuam a viver na Austrália, onde Alfredo Reinado frequentou dois cursos, na Australian Defense Force Academy, tais como: - Gestão da Defesa, em Outubro de 2003, Gestão de Emergências, em Agosto de 2004.

Em 2005 recebeu formação de topo no Australian Command and Staff College, em Camberra.

Recebeu, também formação militar de quadros portugueses e brasileiros.

Entretanto foi nomeado Comandante da Polícia Militar, uma unidade constituída por um pelotão de 33 homens. Tinha este cargo quando, em 4 de Maio, desertou, com 20 dos homens desta unidade, com as respectivas viaturas e equipamentos. Mais tarde viria a esclarecer que não fora uma deserção, mas uma decisão tomada na sequência das ordens dadas pelo Primeiro-Ministro às FDTL, em 28 de Abril, das quais terão resultado, segundo Reinado, várias mortes. Essa decisão seria por ele justificada com a necessidade de evitar mais mortes. Posteriormente Reinado viria a colocar-se à disposição do Presidente, Comandante-em-Chefe de todas as Forças de Defesa e Segurança de Timor-Leste, tendo mantido o diálogo com Xanana Gusmão e com Ramos Horta, e a disponibilidade para dialogar com o Governo, até 22 de Maio de 2006.

A partir dessa altura assumiu uma posição de força, sendo um dos principais responsáveis por diversos ataques a forças das FDT-L, nomeadamente entre 23 e 25 de Maio. O seu ataque a uma patrulha das F-FDTL, em Fatu Ahi, nos arredores de Dili, em que matou outro militar (ele próprio admite, na altura, que provavelmente terá morto um membro das FDTL), serviu de detonador a três dias de violentos confrontos que levaram as autoridades timorenses a pedir a intervenção de forças estrangeiras.

Foi o primeiro militar dissidente a saudar a chegada das forças australianas a Timor, em 25 de Maio de 2006.

Detido, em 25 de Julho de 2006, escapou-se da prisão de Dili em 30 de Agosto.


2.3. Mari Alkatiri

Mari Bin Amude Alkatiri, é descendente de uma família de importantes negociantes de origem iemanita que se fixaram em Timor nos finais do século XIX. Nasceu em Dili em 26 de Novembro de 1949. O seu pai foi um importante líder religioso da comunidade muçulmana residente no Timor Português (Maria Ângela Carrascalão, 2002).

Depois de terminar os seus estudos no liceu Dr. Francisco Machado, em Dili, onde foi muito bom aluno, fez um curso de Topografia e Cadastro em Luanda. Regressado a Timor, trabalhou nos Serviços Geográficos e Cadastrais, o que o levou a conhecer bem o território.

Foi um dos fundadores da FRETILIN, tendo sido o primeiro Vice-Coordenador Geral do Conselho Presidencial. Em Outubro de 1975 foi eleito Comissário político da FRETILIN.

Tendo saído do país em 4 de Dezembro de 1975, pouco antes da invasão, fixou-se em Maputo, Moçambique, onde estabeleceu excelentes relações com a liderança da FRELIMO, a ponto de se tornar o titular do primeiro passaporte concedido pela República Popular de Moçambique. Em 1977 tornou-se Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo da RDT-L no exílio. Entretanto formou-se em Direito na Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo, onde, depois, leccionou.

Em 1994 integrou a Comissão Coordenadora da Frente Diplomática.

Ainda antes do referendo, foi encarregue pela Resistência Timorense, de tratar do dossier ‘Petróleo’.

Foi Ministro da Economia do 1º Governo de Transição de Timor-Leste, e Ministro-Chefe e Ministro da Economia e Desenvolvimento do 2º Governo de Transição, tutelados pela UNTAET. A partir de 20 de Maio de 2002, tornou-se o Primeiro-Ministro do 1º Governo Constitucional da República Democrática de Timor-Leste.

Mari Alkatiri é o principal (para não dizer o único) responsável pela excelente legislação sobre o Fundo Petrolífero, que garante, no mais alto grau possível, a transparência no uso dos fundos resultantes da exploração dos recursos energéticos de Timor-Leste, e assegura que esses recursos beneficiarão não apenas as gerações actuais mas também as futuras, a médio e longo prazo.

Isso é absolutamente essencial para a estruturação de um estado de direito e será também, no futuro, um factor de desenvolvimento e viabilidade interna, se entretanto não for completamente subvertido.

Mari Alkatiri foi também o politico timorense capaz de resistir à forma "agressiva" com que o Governo Australiano negociou os acordos relativos ao mar de Timor, tendo conseguido uma acordo muitíssimo mais favorável para Timor-Leste do que o que em 1989 a Indonésia tinha conseguido. Apesar disso, o próprio Professor James Cotton, da Academia de Defesa de Camberra (muito ligada à política australiana), considerou que a divisão dos lucros da exploração petrolífera entre a Austrália e Timor-Leste tinha sido justa atendendo ao pagamento, já nela incluída, da protecção militar que a Austrália deverá proporcionar para o Campo de Gás do Greater Sunrise.

Mesmo que não tivesse feito mais nada, a importância da legislação e dos acordos estabelecidos, factores essenciais à estruturação do futuro de Timor em bases sólidas para as próximas gerações, é um enorme contributo dado à sua Pátria.

Ainda recentemente Xanana Gusmão elogiou, publicamente, o seu carácter.

Não foi um Primeiro-Ministro simpático. Antes pelo contrário, a forma sobranceira como afirmava a sua convicção de que a FRETILIN se manteria no poder durante 50 anos, ou como se referia aos que fizeram estudos na Indonésia, ou aos que correndo tantos riscos, e com tantos sacrifícios, participaram na resistência clandestina, tornaram-no pouco simpático aos olhos de muitos timorenses.

A sua imagem foi afectada pela sua ligação ao seu Ministro do Interior. Ao mantê-lo no seu Governo, Mari Alkatiri acabou por se tornar igualmente alvo das críticas dirigidas ao seu ministro.

A forma como a direcção da FRETILIN foi eleita no último Congresso, em 19 de Maio de 2006, de braço no ar, e a recusa da candidatura de José Luís Guterres à liderança por não ter conseguido 20% de delegados a subscrevê-la, regras que foram mudadas no próprio Congresso, afectaram muito a imagem do Primeiro-Ministro e da própria FRETILIN.


2.4. Ramos Horta

Nasceu em Dili em 26 de Dezembro de 1949. De espírito rebelde e liberal, é forçado pela PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado, polícia política da ditadura portuguesa) a sair de Timor, antes de concluir os seus estudos. Vive, por isso, em Moçambique de 1970 a 1972.

De regresso a Dili tornou-se amigo do Governador Alves Aldeia, tendo ocupado o lugar de Director do jornal «A Voz de Timor».

Foi um dos fundadores da ASDT (Associação Social Democrata Timorense), em 20 de Maio de 1974, que em 11 de Setembro se transformaria, por influência de intelectuais timorenses entretanto regressados de Lisboa, na FRETILIN (Frente Revolucionária de Timor-Leste Independente).

Em finais de Novembro de 1975 foi nomeado Ministro das Relações Externas e Informação do Governo da RDTL. Tendo saído de Timor alguns dias antes da invasão indonésia de 7 de Dezembro de 1975, tornou-se o representante da FRETILIN junto das Nações Unidas, de 1976 até 1990, onde desempenhou um importantíssimo papel, para manter Timor-Leste na Agenda da ONU.

Tendo, entretanto, saído da FRETILIN, tal como Xanana Gusmão, tornou-se o Representante Especial do líder máximo da Resistência, de 1991 a 1998.

Em 1996 recebeu o Prémio Nobel da Paz, juntamente com o Bispo Ximenes Belo. A partir daí, conseguiu granjear muito mais apoio, quer nos Estados Unidos quer no resto do mundo, conseguindo transformar muitos anteriores opositores em apoiantes da causa do seu Povo.

Em Abril de 1998 foi eleito Vice-Presidente do Conselho Nacional da Resistência Timorense, CNRT, no Congresso Timorense da Diáspora realizado em Peniche. Foi reeleito para o mesmo cargo no Congresso do CNRT realizado em Dili em Agosto de 2000.

Foi Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação do Segundo Governo de Transição e do 1º Governo Constitucional, de 20 de Maio de 2002 até Julho de 2006, altura em que se tornou Primeiro-Ministro do 2º Governo Constitucional de Timor-Leste.

Estudou nos EUA e leccionou nas universidades australianas de New South Wales, de Victoria e outras.

Ramos Horta conseguiu, na frente diplomática, durante a ocupação, um apoio internacional crescente com uma habilidade absolutamente inexcedível. Para o fazer, sentiu necessidade de se libertar das peias da FRETILIN, da qual se desligou na década de 80. Habituou-se, ainda mais, nessa altura, a trabalhar muito só, ainda que em estreita ligação com o Comandante Xanana Gusmão.

Habituado a fazer cedências e a estabelecer compromissos com os seus interlocutores, para conseguir solidariedades e apoios necessários, dá por vezes uma imagem de pouca firmeza e constância politicas. Foi no entanto com essas características que conseguiu transformar muitos inimigos em amigos em todo o mundo, trazê-los para a causa do seu povo, conquistar o Prémio Nobel da Paz para o Bispo Ximenes Belo e para ele próprio e, a partir daí, abrir portas para a fase final da luta pela autodeterminação de Timor-Leste.

Na última crise foi o elemento de ligação a pessoas e grupos de um lado e do outro, no conflito. E como sempre acontece a quem negoceia com grupos em conflito, embora tenha evitado problemas maiores, suscitou desconfianças. Muitos o acusam de ser um agente da Austrália. Mas, tal como Xanana Gusmão, ele sabe que a paz, a estabilidade e o progresso de Timor-Leste dependem muito da Austrália, quer se queira quer não, e sabe que tudo, na política e na diplomacia, tem o seu preço.


2.5. Xanana Gusmão

Xanana Gusmão nasceu em 20 de Junho de 1946 em Manatuto, onde foi baptizado com o nome de José Alexandre Gusmão. Estudou no Seminário de Dare, e depois, no Liceu de Dili, ao mesmo tempo que trabalhava.

Foi poeta, premiado em 1975 pelos Serviços de Turismo de Timor.

Pouco depois da Revolução de 25 de Abril de 1974 foi para a Austrália, onde trabalhou durante alguns meses. Tendo regressado a Timor com a intenção de ir buscar a (primeira) esposa, Emília, acabou por ficar, passando a integrar o Comité Central da FRETILIN.

Em Janeiro de 1981, dois anos depois da morte em combate do segundo Presidente da FRETILIN, Nicolau Lobato (em 31 de Dezembro de 1978), tornou-se o Comandante das FALINTIL e líder máximo da Resistência.

Depois de uma curta deriva marxista-leninista, fez uma aproximação à Igreja, à UDT e a todos os timorenses sem partido, criando uma resistência verdadeiramente nacional, que lutou não apenas pela independência mas também por uma sociedade democrática multipartidária.

Preso em 20 de Novembro de 1992, e condenado a prisão perpétua, acabou por cumprir menos de sete anos de prisão, na cadeia de Cipinang, em Jakarta, onde aprendeu a língua indonésia.Aí fez muitos amigos, sobretudo entre os presos políticos, tornando-se um símbolo para a juventude indonésia e um estímulo para a sua luta pela democracia. Foi também na prisão que conheceu Kirsty Sword, com quem viria a casar em segundas núpcias.

Em 14 de Abril de 2002 foi eleito Presidente com 82,7% dos votos (Francisco Xavier do Amaral, primeiro Presidente da FRETILIN, recebeu 17,3% dos votos).


2.5.1. A “Mensagem ao povo amado e sofredor e aos líderes e membros da FRETILIN”, de 22 de Junho de 2006

O título da Mensagem que o Presidente faz, em 22 de Junho de 2006, no auge da terceira crise, expressa, logo à partida, uma clara separação entre o “povo amado e sofredor”, por um lado, e a FRETILIN, por outro.

Nela Xanana Gusmão começa por “criticar duramente o Congresso que decorreu nos dias 17 a 19 de Maio passado. Este Congresso viola a alínea c) do artigo 18º, Lei nº 3/2004, acerca dos Partidos Políticos, que diz o seguinte: (...) todos têm de ser eleitos por voto directo e secreto pelos militantes para que sejam representativos dos militantes.”

Depois de fazer uma breve referência ao passado da FRETILIN, e nomeadamente da sua deriva marxista-leninista, desde 1977, com a sua própria participação, diz:

“Hoje, um pequeno grupo, vindo do exterior, quer repetir os mesmos comportamentos que nós tivemos de 1975 até 1978. (...) Em 2006, a FRETILIN quer fazer um golpe para matar a democracia (...). O problema da distribuição das armas (...) já estava nos seus planos, distribuírem para as eleições de 2007. Por isso é que estamos sempre a ouvir eles dizerem: só a FRETILIN pode criar a estabilidade ou a instabilidade.”

(...)

“Em Moçambique, Rogério tentou adquirir pengalaman [experiência] para se matarem uns aos outros e Ramos Horta ficou preso. Naquele tempo, o Presidente Chissano, ainda como Ministro dos Negócios Estrangeiros, é que foi libertá-lo”

Xanana, continuando a lembrar o passado da FRETILIN, fala do “grande protesto vindo do exterior, dizendo que eu estava a matar a FRETILIN (...)” quando deixou a FRETILIN “para libertar a nossa terra e todo o nosso povo. Porque eu não matei a FRETILIN e continuo a respeitar a FRETILIN (...).”

Lembra depois Ramos Horta, que se ofereceu “para ser o meu Representante Especial lá fora (...) dizendo que também saiu da FRETILIN para servir a luta”.

Mais adiante lembra os pedidos que em 2000 fez à FRETILIN, “para reavaliar o caso de Xavier do Amaral, porque ele não é um traidor (...), para limparem o nome de todos os que a FRETILIN assassinou porque os considerava traidores, mas que não eram traidores, apenas não aceitavam a ideologia marxista-leninista (...) (e) que a FRETILIN pedisse desculpa ao Povo, sobretudo aos familiares das vítimas”, pedidos esses que terão levado a FRETILIN a criar “uma comissão para tratar desses assuntos” mas que ainda não chegou a resultados visíveis.

Depois lamenta a saida da FRETILIN do CNRT, em Agosto de 2000, e os motivos invocados por Mari Alkatiri para isso, e o facto da FRETILIN ter assinado, com os outros partidos concorrentes às eleições, o compromisso de ”constituir um Governo de Unidade Nacional. Quando a FRETILIN ganhou, afastou-se do compromisso político que aceitara.”

Mais adiante Xanana confessa:

“No passado dia 2 de Junho, antes da reunião do Conselho Superior de Defesa e Segurança, o Brigadeiro Taur falou comigo e disse: «Presidente, eu disse ao Dr. Roque Rodrigues, o vosso maior erro foi tentarem submeter as F-FDTL à FRETILIN». Naquele momento fiquei muito contente porque reencontrei-me com o meu irmão que eu tinha perdido.”

E mais adiante, acrescenta:

“No dia 11 de Maio, Mari disse-me que desconfiava que o Rogério estivesse por detrás do 28 de Abril, porque não cumpriu a ordem do Mari para enviar a UIR de imediato para impedir os manifestantes.

“Duas semanas depois, Rogério foi a Caicoli falar comigo. Eu disse-lhe: «Rogério, para citar o nome de Nicolau Lobato, devo dizer-te que eu estive juntamente com Nicolau nalguns dos momentos mais difíceis da guerra. As pessoas acusam-te de distribuir armas. Acredita ao menos em mim. Pensa bem, porque na guerra eu não perdi nenhum membro da minha família, tu perdeste a tua família toda. Nicolau, com todos os teus irmãos, estão a olhar para nós, estão a chorar por causa das coisas que estão a acontecer. Eu sei que eles não querem isto».”

Ainda acerca de Rogério Lobato, Xanana lembra:

“No dia 28 de Novembro de 2002, pedi para que ele fosse demitido, porque todas as informações diziam que, em vez de fazer o seu trabalho, organizava o povo para cortar lenha, para ele vender, plantar mandioca, para ele vender, (...). Eu falei com o Mari, como Primeiro-Ministro e com o Ministro Horta, na minha casa, antes de 28 de Novembro de 2002, sobre o Rogério. Mais tarde, porque pedi para ele ser demitido, eu é que errei e quando aconteceu o 4 de Dezembro, apontaram-me o dedo.”

Depois Xanana fala da corrupção reinante no Governo e nos serviços do Estado, questão que sabemos preocupar Mari Alkatiri, que tinha previsto combatê-la depois de terminado o Congresso da FRETILIN. A propósito dessa corrupção lembra novamente Rogério que terá comprado dois carros para o grupo de Rai Lós.

Depois de lembrar os princípios do estado de direito o Presidente salienta:

“O Povo enfrenta um problema muito sério: há armas nas mãos de civis, há disparos de armas em muitos lugares. E também quero informar que as Forças de Intervenção apreenderam já muitas armas que não são da PNTL nem das F-FDTL.

“O Estado não pode consentir isto, este sofrimento para o Povo. Algumas pessoas reclamam que «estamos a perder a nossa soberania». Não é porque as Forças Internacionais tenham entrado na nossa terra, mas perdemos a nossa soberania porque nós é que fizemos o pedido e sobretudo porque nós é que demonstramos não ter capacidade para resolver os problemas surgidos, criando problemas ainda maiores.”

E, Mais adiante, Xanana Gusmão faz um apelo:

“Por isso, APELO a todos que hoje ainda empunham armas, que as entreguem às Forças Internacionais e informem quem as distribuiu”.

Ainda sobre a distribuição das armas o Presidente conta, na sua Mensagem de 22 de Junho de 2006:

“Pergunto ao Primeiro-Ministro se ele tem conhecimento sobre a distribuição de armas a alguns delegados da FRETILIN, e ele responde que não sabe. Mas, mais tarde, ele soube, e mandou o Rogério para desarmar. E o Rogério enviou um ‘sms’ para Rai Lós, para barrar o caminho dos manifestantes que estavam contra o Governo, para queimarem os carros à noite, fazerem as ‘operações comando’ e esconderem-se durante o dia.

“Nas reuniões que tive com ele, o Primeiro-Ministro falou sobre os grupos armados, dizendo que têm de ser desarmados e nunca me foi dito que, pelo menos, o grupo de Rai Lós fora armado pelo Rogério.

“O Primeiro-Ministro informou-me que, depois do tiroteio em Tasi Tolo (ou Taci Tolu), no dia 24 de Maio, no qual a FDTL capturou 4 armas da polícia, Rogério fez-lhe saber que as armas e as pessoas que morreram eram do grupo Rai Lós, lá colocado pelo próprio Rogério.

“Na verdade o Primeiro-Ministro informou o Brigadeiro Taur Matan Ruak acerca disto, que as armas da polícia não foram distribuídas pelo comando da polícia mas sim pelo Rogério (...).”

Depois o Presidente afirma:

“Como os governantes, nos órgãos de soberania sentem e mostram que os problemas que surgiram não são da sua responsabilidade, eu digo a todo o Povo e à FRETILIN:

“1. Todos temem que, se Mari sair, a guerra regressa e há derramamento de sangue novamente.

“2. Muitos estão preocupados que, se Mari cair, o Governo não funcione, as pessoas não recebam dinheiro e outras coisas. Também, se Mari cair, toda a bancada da maioria demite-se e o parlamento deixa de funcionar.

“3. Alguns dizem-me que temos de mostrar à Comunidade Internacional que existe uma normalidade institucional ou constitucional, senão é uma vergonha, se o trabalho das instituições for interrompido.

“O Povo é que me escolheu. Como fui eleito, tenho de prestar contas ao Povo. Antes de procurar satisfazer a comunidade internacional, eu tenho de curvar-me perante o Povo, sofredor, que me escolheu. O Povo pergunta-me, enquanto Presidente da República, onde está a minha responsabilidade quanto ao ‘garante da Unidade Nacional’ que se fragmentou, ‘garante da estabilidade’ que se desintegrou e ‘garante do funcionamento normal das instituições democráticas’ que paralisaram.

“Como Presidente da República eleito pelo Povo, não pelo braço no ar mas por voto directo e secreto, eu tenho mesmo vergonha, porque eu não agarrei bem a minha responsabilidade. Por isso, estou pronto para assumir esta responsabilidade.”

A terminar, Xanana Gusmão, diz à FRETILIN:

“Ou pedem responsabilidade ao vosso camarada Mari Alkatiri sobre esta grande crise, sobre a sobrevivência do Estado de direito democrático ou, amanhã, eu próprio envio uma carta ao Parlamento Nacional a informar que me demito de Presidente da República porque tenho vergonha pelo que o Estado está a fazer ao Povo e eu não tenho coragem para enfrentar o Povo.

“Finalmente, apelo à calma de todos porque neste momento difícil temos de reflectir profundamente para que esta violência e destruição se não repita no nosso país!”

Muitos criticam esta "Mensagem ao povo amado e sofredor e aos líderes e e membros da FRETILIN" dirigida pelo Presidente Xanana Gusmão, em 22 de Junho de 2006. Consideram que as insinuações a coisas não provadas e a linguagem utilizada são impróprias de um chefe de estado.

No entanto, se se comparar esse discurso com o proferido em 28 de Novembro de 2002 e com a mensagem de 7 de Dezembro de 1987 dirigida, a partir das montanhas de Timor, "Aos patriotas e nacionalistas, e ao povo de Timor-Leste", verificamos que há nesses três documentos uma preocupação essencial comum: a necessidade de ser realista, de ter em conta o contexto internacional e de abandonar o utopismo revolucionário que caracterizou a FRETILIN, que, como o Xanana sabe melhor do que ninguém, quase conduziu ao fracasso total da luta pela autodeterminação do povo timorense.

Com efeito, Xanana Gusmão, perspectivando, já nessa altura, o que iria acontecer depois da independência, afirma, em 1987, que irá combater com todas as suas forças o irrealismo e a prepotência, para o bem da liberdade, da democracia e do desenvolvimento do seu povo.


2.5.2. A mensagem de Xanana Gusmão de 7 de Dezembro de 1987 e a sua visão de um futuro Timor-Leste livre e democrático

Em 1987 Xanana Gusmão, então líder da Resistência, nas Montanhas de Timor, e ainda membro do Comité Central da FRETILIN, escreveu uma importantíssima mensagem ao seu povo, de que transcrevemos algumas passagens:

"O dia 7 de Dezembro de 1975 não apareceu por acaso. As causas próximas foram o contra-golpe levado a cabo pela FRETILIN com o posterior total controle da situação; todavia, os motivos remontavam-se a uma base política que seria, ela mesma, o ponto nodal da história destes doze anos de guerra. Desde que a FRETILIN assumira uma ideologia de esquerda” (…) tornou-se “positivamente numa ameaça potencial aos interesses estratégicos dos poderosos."

(...)

"O dia de hoje deve poder marcar, nesta denodada resistência de doze anos, um novo e significativo sinal de mudança de posturas. Se bem que quaisquer mudanças podem ser tomadas como expressão da nossa própria debilidade, desejamos apenas aclarar que elas podem ou devem sobretudo revelar a percepção que detemos agora sobre a realidade, isto é, devem poder afirmar que nos tornámos, enfim, mais realistas!"

(...)

"Logo desde o início, a Direcção da FRETILIN padeceu de um estrondoso infantilismo político que procurou desafiar o mundo, obcecada das nossas «capacidades» não existentes. Em nenhuma altura, foram consideradas as relações conjunturais, tanto da área como com o resto do mundo, e nos presumíamos, desde então, «heróis» de uma revolução sangrenta, de uma revolução popular que levaria de avalanche todas as forças contrárias."

"Os nossos antecessores viam no marxismo a «solução imediata» para os problemas de um povo incrivelmente subdesenvolvido"

(...)

"Estávamos, na verdade, embalados com um fantasioso processo revolucionário já apelidado de «mauberismo». Esse infantilismo político e impensado aventureirismo, que guiaram o Movimento desde 1974, não permitiram margem alguma para desprezarmos, já na altura, todo o extremismo político que seria, dali em diante, a nossa própria sentença."

(...)

"Só esse insensato radicalismo que, não atendendo às nossas próprias condições concretas e às circundantes, nos tornou intoleravelmente prepotentes, levou-nos a tomar muitos compatriotas no mesmo pé de igualdade com o criminoso agressor da pátria! Cometemos crimes contra os nossos próprios irmãos e, perante uma guerra difícil, perdemos mais tempo a prender e assassinar compatriotas do que a pensar efectivamente numa defesa capaz da Pátria, cujos resultados se tornaram, por si só, evidentes em 1978!"

(...)

"Nós próprios, que só viemos a aprender o marxismo nas montanhas de Timor-Leste, fomos influenciados por um frenesim revolucionário que nos levaria a materializar o sonho dos antecessores: criar um partido marxista-leninista na RDTL!"

"Com o desenvolvimento da própria situação e com a gradual compreensão de que o verdadeiro problema de fundo era o problema político interno (...) a nova Direcção da Luta considerou que era uma obrigação política proceder a uma mudança de comportamento (...) cedendo de novo a capacidade de conduzir o processo de libertação da Pátria à FRETILIN, como movimento nacionalista não necessariamente comunista!"

(...)

“No ano passado, numa mensagem dirigida á Comissão da UDT, em Lisboa, procurámos fazer ver a todos que as gloriosíssimas FALINTIL estariam fora do jogo político-partidário, afirmando por isso que as Forças Armadas de Libertação Nacional de Timor Leste no futuro não permitirão a qualquer partido político subverter a ordem estabelecida e instaurar um regime à sua conta pela via de supressão de outros. Quisemos fazer entender também que as FALINTIL só terão uma sublime missão a cumprir: a defesa da Pátria de todos nós e a manutenção da ordem interna, instaurada por uma constituição que proclame a defesa pelas liberdades individuais e colectivas e o respeito pelos interesses de todos os cidadãos e camadas sociais de Timor-Leste. Para que as gloriosas FALINTIL possam vir a cumprir plenamente a sua missão dentro da estrutura do governo, seja qual for a tendência política do executivo, necessário se tornava afirmar desde já a neutralidade das Forças Armadas de Libertação Nacional de Timor-Leste!"

(...)

"Não negamos que, na difícil situação que se seguiu à perda das "Bases de Apoio", nas montanhas, foram os princípios e métodos de organização assumidos pela FRETILIN que permitiram as necessárias condições políticas básicas para reavivarmos a chama da resistência, quase a desaparecer no plano da oposição armada."

(...)

"Desde os princípios de 1976, na onda de depurações com massacres a muitos nacionalistas (depurações que se estenderam até 1978), também a muitos se colocou o dilema de ou ser contestatário para ser preso e assassinado como reaccionário e traidor da Pátria ou optar pela política de seguidismo, já que o espírito de combate na defesa da pátria era a motivação política e moral para não aceitarmos morrer como outros tão horrorosamente!"

"A supressão de toda e qualquer outra opção política acabou por criar, no nosso seio, divisionismo fatal e um receio notório, em todos os níveis da estrutura organizacional, de se exprimirem mais livremente acerca dos pontos de vista errados dos membros do Comité Central, que se remetiam a esclarecimentos extenuantes sobre preceitos marxistas enquanto a prática de fazer a guerra estava entregue ao espírito de iniciativa, mais ou menos descontrolado e inconsequente, de comandantes de pelotões e de companhias - tendo sido este o tom negativamente geral do período das Bases de Apoio. Fazer revolução, que era a nossa própria condenação, numa guerra que não podíamos suportar, era a demonstração clara da cegueira política."

"O Ocidente coloca-se ao lado da Indonésia enquanto os países do Leste não mexeriam um dedo, chamando-nos, com toda a certeza, de desmedidos aventureiros!"

"Doze anos depois, temos que reconhecer com amargura os efeitos que uma estratégia política mal traçada proporcionou ao Povo Maubere e o levou à desastrosa situação a que ainda ninguém conseguiu pôr fim!"

"Nós viemos reconhecendo, ao longo destes anos, que o que move o povo de Timor-Leste à Luta não é fazer uma Revolução, nem em grandes nem pequenas proporções; o objectivo do Povo Maubere é libertar a Pátria da ocupação estrangeira para poder viver livre e independente. O Povo Maubere só aspira a liberdade, só aspira à sua independência como condição básica para exercer os seus direitos, para viver ele mesmo como ele é, como ele pensa e como ele age. Por isto tudo quanto disse:

"Eu declaro publicamente a minha total e convicta rejeição a teorias que promovam supressão das liberdades democráticas em Timor-Leste!"

"Eu declaro publicamente que as FALINTIL ASWAIN não permitirão que se instaure em Timor-Leste um regime de esquerda que não só venha a provocar mutilações internas como desestabilize toda a área em que Timor-Leste está inserido."

"Sempre viemos lutando sob a bandeira de FRETILIN e, ainda sob ela, lutaremos até ao fim! O que eu pretendo realçar é que, como membro do Comité Central da FRETiLIN, estou ao abrigo dos requisitos do próprio Movimento que engloba indiscriminadamente diversas opções políticas. Porém, a Constituição preceituará a total neutralidade das Forças Armadas."

"Hoje em dia, pensarmos em fazer revolução é suicidarmo-nos insensatamente; hoje em dia, pensarmos em termos de erguer o comunismo como a fogueira que se ateia a pradaria é iludirmo-nos não só com o falhado ostracismo chinês como elevarmo-nos em bicos de pés para nos equipararmos aos países do Leste. Já vimos assim que no estertor da nossa própria agonia, continuávamos cegos arranjando mais inimigos, enquanto os ditos «aliados naturais» se quedavam ao silêncio das suas revoluções."

"O objectivo último que perseguimos é a Libertação da nossa Pátria e a independência para o nosso Povo! Nada mais desejamos quando aceitamos todos estes sacrifícios que a guerra colocou perante nós. Nós não ambicionamos nem glórias nem poderes, porque estamos plenamente conscientes das nossas extremas limitações; a única ambição que possuímos é a de garantir ao Povo Maubere, pela Libertação da Pátria, o exercício dos seus direitos fundamentais, como Povo e como ser humano, dentro da Comunidade do Mundo Livre!"

(...)

"Apelamos aos governos da Austrália e da Nova Zelândia para reconsiderarem a sua posição e beneficiarem o Povo de Timor Leste de uma atitude mais compreensiva e justa, na mesma medida em que o caso da Nova Caledónia mereceu uma especial atenção destes dois governos."

"Apelamos ao governo dos EUA assim como aos governos da Europa Ocidental no sentido de não mais considerarem Timor-Leste uma potencial ameaça à estabilidade da área, pois que nos comprometemos desde já a impedir que tal aconteça, pelo que pedimos para favorecerem o Povo maubere com uma postura que o leve a encontrar a paz e a sua independência."

(…)

Esta mensagem, dirigida “Aos patriotas e nacionalistas e ao povo de Timor-Leste, foi assinada em 7 de Dezembro de 1987 por Kay Rala Xanana Gusmão, Comandante-em-Chefe das FALINTIL no Quartel-General do Conselho Revolucionário da Resistência Nacional em Timor-Leste.


2.5.3. O discurso do Presidente feito em 28 de Novembro de 2002 e a sua crítica à dominação do estado pela FRETILIN

No seu discurso de 28 de Novembro de 2002, além das referências ao Ministro do Interior já acima citadas, Xanana Gusmão diz:

"Esta é mais uma data para se celebrar a independência de Timor-Leste! A independência não deveria ser celebrada, a independência deveria ser vivida nos seus benefícios. E é este o nosso problema maior."

(...)

"28 de Novembro é uma data da FRETILIN! 20 de Maio é também dia da FRETILIN! A maioria no Parlamento é da FRETILIN! O Governo é essencialmente da FRETILIN!"

"A independência serviu para se atender aos quadros da FRETILIN! A independência é para atender também os Antigos Combatentes da FRETILIN!"

(...)

"O que se nota é que as pessoas se deixam levar, muitas vezes, a assumir que os quadros do Partido é que merecem ser nomeados para este ou para aquele lugar!"

"Perdeu-se a noção dos «interesses nacionais», perdeu-se a noção dos «superiores interesses do povo e do país», perdeu-se a noção da nova conjuntura do processo, que exige a capacidade para cumprir e dedicação para servir."

"As pessoas ficam deslumbradas com o «poder», as pessoas ficam obcecadas por, como quadros do Partido, serem ou terem que ser os que mandam. As pessoas só sabem exigir que os quadros do Partido, não importa se são bons técnicos ou não, não importa se fizeram alguma coisa à luta ou não fizeram nada, mas porque são quadros do Partido têm que ser eles os «grandes»".

(...)

"Hoje, o Povo vive as maiores dificuldades no seu dia-a-dia, mas o Partido vive o problema de não poder acomodar todos os seus quadros, com o perigo ainda de virmos a ter incompetentes administrando distritos e sub-distritos."

“Disto tudo, se nota que muitas pessoas se servem dos partidos e não servem os seus partidos, e se servem os seus partidos não servem o país”.

"Hoje, celebra-se o 28 de Novembro e convido a todos a pensar nos deveres de cada um como cidadão e, sobretudo para alguns, nos deveres como governantes."

"Muita gente ainda não sabe o quanto somos vulneráveis, depois da independência. Os Partidos políticos vivem a ilusão da independência, quando estamos, mais do que nunca, tão dependentes! Dependentes dos favores de outros, dependentes da grandeza e capacidade de outros, dependentes da nossa própria fraqueza... de sermos um país pobre, pequeno e inexperiente."

(...)

"Repito: muita gente desconhece o quanto somos vulneráveis, depois de 20 de Maio. E se não corrigirmos as atitudes, se não corrigirmos as irresponsabilidades, mais vulneráveis nos tornaremos, em cada ano que passa."

"Muitos não têm a noção de que vivemos de esmolas, outros não têm a noção de que não podemos continuar a viver de esmolas. Alguns pregam o sentido de realismo, que eu diria de pactuação porque as leis do jogo não são nem podem ser nossas, são dos que podem para não dizer dos que mandam. Nós os timorenses, entretemo-nos nas nossas politiquices, nos preocupando em saber do nosso papel, como país independente, e das nossas obrigações, porque só temos obrigações, como país pobre e subdesenvolvido."

3. O CONTEXTO TIMORENSE DA CRISE


3.1. Xanana Gusmão e Mari Alkatiri: o conflito, desde a década de oitenta, entre duas maneiras diferentes de ser nacionalista, entre revolucionarismo utópico e realismo, entre partido líder e democracia

Em 1983 Xanana Gusmão teve alguns encontros com o Administrador Apostólico da Diocese de Dili, Monsenhor Martinho da Costa Lopes, e com o Governador da Província de Timor Timur, Engº Mário Carrascalão. Foram encontros absolutamente fundamentais para o futuro da Resistência e do Povo Timorense.

Monsenhor Martinho da Costa Lopes perguntou a Xanana Gusmão se as armas que a Resistência usava eram provenientes de qualquer país comunista. O líder da Resistência esclareceu o ‘bispo’ de que não recebia nem armas nem qualquer outro apoio de qualquer país comunista. As armas e munições eram capturadas ao exército do católico General Benny Murdani. Depois insistiu com Xanana Gusmão para que abandonasse o comunismo, e terá prometido o apoio da Igreja Católica timorense à Resistência se o seu líder o fizesse. Xanana Gusmão ter-se à comprometido a fazê-lo e o certo é que o apoio da Igreja, que já tinha começado antes, se reforçou significativamente, continuando mesmo quando, alguns meses depois, D. Martinho da Costa Lopes foi afastado do seu cargo, pelo Vaticano, a pedido do Governo Indonésio, e substituído, na direcção da diocese, pelo jovem salesiano D. Carlos Filipe Ximenes Belo.

Nas conversas com o Governador Mário Carrascalão, Xanana Gusmão ter-lhe-á pedido que conseguisse, dos generais indonésios, um cessar-fogo de três meses para reestruturar a Resistência e, nomeadamente, criar uma rede clandestina nas cidades, vilas e aldeias controladas pelos ocupantes.

Em 20 de Março de 1983 o líder da Resistência Timorense, Kay Rala Xanana Gusmão encontra-se, pela primeira vez, com o Comandante das Forças Armadas Indonésias em Timor Timur, Coronel Puruanto, e iniciam conversações de Paz. Em 23 de Março, em novo encontro entre os dois chefes militares, é assinado um cessar-fogo. Ao mesmo tempo, a FRETILIN propõe um Plano de Paz, que prevê a realização de consultas livres e democráticas ao Povo Maubere.

As conversas com os dois líderes timorenses, por um lado, e as possibilidades de movimento e de contacto com as populações, membros da Igreja, líderes e jovens timorenses, que o cessar-fogo facilitava, por outro lado, permitiram a Xanana reformular a sua visão do contexto da luta e reequacioná-la, em novos moldes.

A partir daí adquiriu uma nova autoconfiança, e começou a pôr de lado as teorias, modelos e práticas de líderes anteriores. Concluiu que a sua visão simples, de timorense que nunca frequentou qualquer universidade, afinal era mais realista e, por isso, mais útil para o seu povo do que o sofisticado discurso esquerdista dos intelectuais timorenses que tinham regressado a Timor depois de frequentarem os bancos das universidades em Lisboa, os quais, antes, o próprio Xanana tanto admirava pelos seus discursos e aparente saber.

Apesar da Potência Administrante, Portugal, não ter sabido aproveitar a ocasião para mobilizar a comunidade internacional para uma solução do problema, no âmbito das Nações Unidas, e mediante uma consulta sob a supervisão destas, estes encontros e cessar-fogo foram vitais. A Resistência reestruturou-se, de facto, tornando-se muito mais abrangente, verdadeiramente nacional. As relações entre as FALINTIL e as populações nas aldeias e cidades estreitaram-se e estenderam-se a muito mais pessoas.

O apoio da Igreja e a camuflada cumplicidade do Governador Mário Carrascalão, deram à Resistência, que tinha sido quase completamente eliminada em finais dos anos setenta, uma nova capacidade de actuação e credibilidade. Tratou-se, de facto, de um renascimento da Resistência.

Em 1984 tornou-se claro que Xanana Gusmão estava a desembaraçar-se da carga ideológica marxista-leninista da FRETILIN, por considerar que essa carga ideológica, a que ele próprio, Xanana, tinha dado a mais plena expressão, ao criar o Partido Marxista-Leninista FRETILIN, se tinha tornado num fardo, que abafava o movimento nacionalista, pelo seu irrealismo e inadequação ao contexto timorense e internacional.

Em 1986, isto é, vinte anos antes desta terceira grande crise, Xanana começou a afastar-se da FRETILIN, não só para prosseguir a sua aproximação estratégica à Igreja, à UDT e aos jovens timorenses sem filiação partidária, mas também para adquirir maior independência e flexibilidade na condução da luta, sem ter que depender de qualquer estrutura. Em 7 de Dezembro de 1987 redigiu a mensagem de que acima citamos alguns extractos, e em 31 de Dezembro de 1988 anunciou a sua saída da FRETILIN.

Embora a Igreja Católica e a juventude timorense, dum modo geral, e a RENETIL, em particular, apoiassem a desvinculação de Xanana relativamente à FRETILIN, a generalidade dos líderes da FRETILIN no exterior (e também muitos, no interior), não compreenderam o alcance da decisão de Xanana Gusmão, que na altura sentiram como uma espécie de traição.

Perante as múltiplas reacções de crítica que recebeu, Xanana debatia-se com um problema de consciência: - se o seu gesto não fosse compreendido e aceite, a sua eficácia seria diminuta ou nula. Foi nessa altura que o autor escreveu, pela primeira e única vez, ao líder da Resistência nas montanhas, para lhe manifestar a sua compreensão e apoio à tão inteligente decisão que Xanana tinha tomado. Com efeito, considerava-a a única susceptível de unir todos os nacionalistas timorenses, facilitar a colaboração da Igreja e abrir as portas ao apoio da solidariedade ocidental, imprescindíveis para se poder alcançar a autodeterminação.

Mari Alkatiri, como a generalidade dos líderes da FRETILIN no exterior, pelo seu lado, consideraria, com base não apenas nas teorias marxistas-leninistas, mas sobretudo nas experiências das ex-colónias portuguesas, que a existência de uma liderança forte e unificada, sobre um partido que fosse a expressão das necessidades e da vontade populares e umas forças armadas que viabilizassem a sua concretização, seriam fundamentais para defender o Povo e o país dos interesses e domínio estrangeiros e dos seus agentes locais.

Esta diferença de visões, ambas nacionalistas, mas uma centrada na Frente Revolucionária, que foi a força motora e líder da revolução e do início da luta de libertação, por um lado, outra centrada na construção futura de um estado e de uma sociedade democrática, pluripartidária, sem frente ou partido líder, e com forças armadas nacionais e não do partido líder, dificultou as relações entre a liderança interna da luta, mais especificamente Xanana Gusmão, e a então Frente Externa da FRETILIN, nomeadamente Abílio Araújo e Mari Alkatiri.

Foi muito dura a luta que na altura se travou, e que não opôs, apenas, a liderança de Xanana à direcção da FRETILIN no exterior, mas que foi travada, por vezes em circunstâncias e com consequências dramáticas, entre alguns heróicos e históricos comandantes que discordavam de Xanana (que nem sequer tinha experiência de comando militar) e fortemente se opuseram à nova estratégia, que lhes parecia ser uma cedência ao inimigo, para não dizer uma traição à luta e à memória dos heróis que tinham dado a vida para derrotar as forças ocupantes.

De facto, o que estava em causa não era, basicamente a ideologia, mas sim a crucial diferença entre o pragmático realismo de um visionário Chefe, e as ilusões de ideólogos e de combatentes que lutavam para vencer o inimigo.

Xanana Gusmão não atraiçoou a luta, nem sequer atraiçoou a FRETILIN ao afastar-se desta. Muito pelo contrário, foi o seu realismo, a sua profunda e extraordinária compreensão global do contexto da luta, quer no plano internacional quer no plano interno, e a sua visão de enorme alcance, no espaço e no tempo, própria de um sensitivo visionário, que deu sentido às históricas decisões que a FRETILIN antes tinha tomado, de lutar pela independência e se opor à ocupação, dando também sentido à morte de tantos heróis combatentes, ao tornar viável uma luta que estava perdida e condenada ao fracasso.

De salientar, no entanto, que apesar das divergências, Mari Alkatiri e os líderes da FRETILIN que se encontravam em Moçambique ou em Angola, acabaram, sempre, por aceitar a liderança interna da luta, assumida por Xanana Gusmão, mantendo um apoio e solidariedade leal e efectiva a Xanana e à Resistência por este liderada, que se manteve, sempre, unificada.

Xanana Gusmão, no seu realismo de quem todos os dias vê morrer companheiros, tinha concluído, entretanto, que só encarando, sem ilusões utópicas e com pragmatismo, a realidade interna e externa, é que se poderia alcançar o êxito necessário para justificar tanto sacrifício, tantas dores e tantas mortes. No plano interno, as outras forças e movimentos políticos nacionalistas e a Igreja, eram imprescindíveis para continuar a luta. E só deixando de assustar o Ocidente, e especialmente a Austrália e os Estados Unidos e os seus aliados, isto é, só abandonando a linguagem e organização marxistas-leninistas, é que seria possível aplacar os medos, diminuir as resistências e acabar por conquistar cumplicidades e apoios.

Xanana trabalhara e vivera já na Austrália, durante alguns meses, pouco depois da Revolução portuguesa de 1974. Os motivos por que o fez, confessa-os ele próprio na sua autobiografia, publicada em 1994 pelas Edições Colibri (p. 11 e 12):

“Veio o 25 de Abril. Paradoxalmente, fiquei assustado. Independência? Como? Aquela elite timorense não era elite (...) Aquela liberdade de escolher tolhia-me os pensamentos. Escolhi o mais fácil. Fugir dali, não queria imaginar aquela gente governando Timor. Fui para a Austrália procurar emprego para juntar dinheiro e talvez regressar algum dia.”

De facto regressou, uns meses depois, mas por influência de amigos não voltou para a Austrália. Em vez disso, ficou em Timor e passou a integrar o Comité Central da FRETILIN. A experiência de viver nesse país, no entanto, fê-la, e é natural que tivesse achado a democracia australiana muito mais interessante e desejável do que o retrógrado colonialismo imposto aos timorenses pela ditadura portuguesa, no quadro do qual viveu os seus primeiros vinte anos e contra o qual manifestou, por diversas vezes, a sua rebeldia.

É natural, também, que a incerteza do futuro ou até de uma eventual independência sem elites devidamente preparadas o perturbasse e assustasse.

Do marxismo-leninismo fez a experiência, mais tarde, nas montanhas de Timor, e não gostou dos processos contra os ‘traidores’ que se desviavam da linha ‘correcta’ definida pelos líderes, responsável por muitos assassinatos de opositores, e pelo medo que tolhia as mentes, bloqueando a criatividade necessária para continuar a combater o ocupante.

A sua opção foi, pois, desde 1983, e mais claramente, ainda, desde 1987, pela democracia pluripartidária de modelo ocidental (o mesmo modelo que inspirou o autor e alguns da sua geração que lutaram contra a ditadura e contra o colonialismo português, não em nome de princípios revolucionários de inspiração marxista-leninista, mas sim em nome de princípios cristãos de respeito pela pessoa humana e pelos seus direitos fundamentais, expressos no “Testemunho de Alguns Católicos”, subscrito em 1965 por 101 católicos portugueses, entre os quais o autor, e publicado nos principais jornais portugueses em Novembro de 1965).

É evidente que, com todos os seus excessos e erros, foi a Frente Revolucionária de Timor-Leste Independente, FRETILIN, que mobilizou multidões de timorenses, incutindo neles a esperança de que valia a pena lutar pela liberdade e independência como o tinham feito os movimentos de libertação de outras colónias portuguesas, nomeadamente de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau. E se a ideologia marxista-leninista tinha resultado nessas ex-colónias, entretanto tornadas independentes sob a liderança dos respectivos movimentos revolucionários de libertação, natural era supor que, utilizando a mesma via, também o Povo Maubere poderia alcançar a sua liberdade e independência, sob a liderança da FRETILIN.

De facto, nas décadas de sessenta ou de setenta, a conservadora Igreja Católica de Timor Português estava muito mais ligada ao colonialismo e à ditadura do Estado Novo, do que à Teologia da Libertação. Seria impossível, sequer, encontrar em Timor 101 católicos capazes de criticar o regime colonial português e defender o direito à autodeterminação dos timorenses, com base em princípios cristãos e na encíclica Pacem in Terris do Papa João XXIII, como aconteceu em Portugal continental em 1965.

Em 1975 o Bispo de Dili, D. José Joaquim Ribeiro, desempenhou um papel favorável à invasão. Um missionário português diria, mais tarde, que quando os paraquedistas indonésios começaram a ser lançados sobre Dili, em 7 de Dezembro de 1975, esse bispo terá dito que eram anjos a cair do céu para salvar Timor do comunismo. Alguns dias depois apercebeu-se de que esses ‘anjos’ afinal se comportavam como demónios, e protestou contra algumas atrocidades por estes cometidas, mas já era tarde de mais. Grande parte da Igreja de Timor teve uma atitude parecida, embora menos radical. Mas a observação de massacres, e os testemunhos de violações, torturas e assassinatos levou-a a mudar, passando a denunciar as violações dos direitos humanos e a defender os oprimidos timorenses.

Foi, de facto, a FRETILIN que resistiu e organizou o Povo Timorense desde a primeira hora. E foi sob a sua bandeira, e mobilizados pela esperança que a FRETILIN corporizava, que muitas dezenas ou mesmo centenas de milhares de timorenses deram a sua vida a lutar pela libertação da sua Pátria e do seu Povo. A Igreja tornou-se, depois, sobretudo a partir de D. Martinho da Costa Lopes, Administrador Apostólico da Diocese de Dili, colaboradora e cúmplice da Resistência Timorense, conquistando, assim, o coração dos timorenses. Talvez por isso a percentagem de católicos timorenses passou de cerca de 30%, para mais de 90% da população, entre o início e o fim da ocupação, isto é, de 1975 para 1999.

Foi com essa Igreja, e também com a UDT, parte da APODETI e a juventude timorense sem filiação partidária, que Xanana, enquanto líder da Resistência Timorense, estreitou os laços, forjando uma resistência verdadeiramente nacional, sem direcção partidária, com forças armadas nacionais e não de um partido líder.

Foi graças a esse carácter supra-partidário da Resistência e à defesa de valores democráticos e não revolucionários, e com a promessa de respeitar os interesses legítimos dos vizinhos de Timor-Leste, que Xanana conseguiu obter os apoios internos e externos necessários para fazer renascer das cinzas uma Resistência quase completamente desbaratada e tornar possível o que parecia ser completamente impossível. Foi o seu realismo e a sua enorme lucidez política, na altura tão mal compreendida pela generalidade dos líderes da FRETILIN, sobretudo no exterior da Pátria, que tornou possível alcançar a autodeterminação e independência de Timor-Leste. Com a sua aguda inteligência política, Xanana deu sentido a uma luta iniciada pela FRETILIN que, sem isso, teria fracassado completamente.

Se uma nova estratégia, baseada no realismo político e não na ideologia do partido ou na revolucionária e pouco flexível liderança da Frente, não tivesse sido imaginada e concretizada por Xanana Gusmão, em ligação directa com o seu Povo, com o qual ele se soube tão bem identificar, a luta pela autodeterminação de Timor-Leste teria acabado sem atingir os seus objectivos. Mas, sem a decisão da liderança da FRETILIN, e a mobilização que esta fez do Povo Timorense e a esperança que nele incutiu, muitas vezes com fundamentação ideológica, a luta não teria, sequer, começado.

Sem a mudança da estratégia, inicialmente revolucionária, de «vencer (e não dialogar com) o inimigo» para a estratégia realista de Xanana, de «conviver com o inimigo», de continuar a combater mas abrir as portas ao diálogo, tendo como objectivo não apenas a independência mas também a libertação do Povo, mediante a instauração de um regime e de uma vivência democrática, a luta do Povo Timorense pela sua autodeterminação teria soçobrado.


3.2. O reduzido papel do Presidente na Constituição da República Democrática de Timor-Leste, e a falta de confiança mútua entre Xanana Gusmão e Mari Alkatiri

De acordo com a Constituição da República Popular de Timor-Leste o Presidente da República, praticamente não tem poderes para demitir o Governo e para dissolver o Parlamento Nacional.

Com efeito, no seu artigo 86º a Constituição da República Democrática de Timor-Leste estipula:

“Compete ao Presidente da República relativamente aos outros órgãos:

(...)

“f) Dissolver o Parlamento Nacional, em caso de grave crise institucional que não permita a formação de governo ou a aprovação do Orçamento Geral do Estado por um período superior a sessenta dias, com audição prévia dos partidos políticos que nele tenham assento e ouvido o Conselho de Estado, sob pena de inexistência jurídica do acto de dissolução, tendo em conta o disposto no artigo 100º;
“g) Demitir o Governo e exonerar o Primeiro-Ministro, quando o seu programa tenha sido rejeitado pela segunda vez consecutiva pelo Parlamento Nacional.”

Por sua vez o Artigo 100º (Dissolução) especifica que

“1. O Parlamento Nacional não pode ser dissolvido nos seis meses posteriores à sua eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou do estado de emergência, sob pena de inexistência jurídica do acto de dissolução.

“2. A dissolução do Parlamento Nacional não prejudica a subsistência do mandato dos Deputados até à primeira reunião do Parlamento após as subsequentes eleições.”

Isto é, uma vez aprovado o Orçamento do Estado – o que uma maioria parlamentar geralmente assegura -, a Constituição garante ao Governo condições de estabilidade, ao abrigo de qualquer demissão do Governo ou dissolução do Parlamento por parte do Presidente. A maioria da FRETILIN, no Parlamento, dava ao Governo a possibilidade de ignorar o Presidente, já que este ficava sem poderes efectivos para o condicionar ou demitir.

Numa altura em que a frágil democracia timorense tanto precisava dos seus líderes, o maior e mais importante deles todos está constitucionalmente ‘manietado’ e quase impossibilitado de fazer o que quer que seja.

Só isso pode explicar que Xanana Gusmão tenha deixado a situação política apodrecer tão completamente, sem nada fazer, a não ser um bombástico discurso em que manifestava a sua discordância com as decisões tomadas relativamente aos militares que abandonaram os quartéis, no qual dizia que se curvava perante quem as tomou, por serem essas entidades e não ele quem detinha a competência formal (não necessariamente a capacidade real) para as tomar. Depois da situação se deteriorar a um tal ponto que até foram pedidas forças estrangeiras para travar os conflitos entretanto gerados, a situação ultrapassou de tal maneira o previsto na Constituição que a intervenção presidencial ficou, constitucionalmente, dependente de interpretações que, embora de acordo com o Direito Constitucional, já não estavam tão liminarmente limitadas.

Estamos convencidos de que a limitação constitucional dos poderes do Presidente foi um importante factor determinante da crise e do grau de gravidade que esta atingiu. Este factor resultou, integralmente, das decisões da Assembleia Constituinte da RDT-L, maioritariamente constituída por deputados da FRETILIN. Segundo figuras proeminentes da FRETILIN, as propostas apresentadas por especialistas portugueses em Direito Constitucional foram recusadas, pelo que não terão tido grande influência na formulação do articulado correspondente. Também não é provável que tenha havido qualquer outra interferência estrangeira nas opções tomadas pela Assembleia Constituinte.

Só na rapidez com que a Constituição foi feita (menos de um ano) é que as Nações Unidas poderão ter tido alguma responsabilidade.

Com efeito, a Assembleia Constituinte foi eleita em 30 de Agosto de 2001 e a Constituição foi redigida em seis meses e ficou aprovada em 22 de Março de 2002. Deste modo tornou-se possível a eleição presidencial a 14 de Abril de 2002, para o Presidente tomar posse no dia que, para a comunidade internacional, foi o da independência, em 20 de Maio de 2002.

O espaço temporal atribuído para a elaboração da Constituição terá resultado da pressa com que a ONU quis ver criado, formalmente, o estado timorense. Mas não era só a ONU que estava com pressa. A maior parte dos timorenses também desejava assumir a sua independência, face às Nações Unidas, o mais depressa possível.

Entre os principais líderes timorenses parece ter havido um relativo consenso quanto à vantagem de estabelecer um regime semi-presidencialista. Mas talvez alguns só tenham reparado tarde de mais que o semi-presidencialismo que a constituição consagra de facto é mais aparente do que real. O regime instaurado pela Constituição é parlamentar e não semi-presidencialista.

Quem mais influenciou o formato adoptado terão sido, naturalmente, os elementos da FRETILIN com maiores conhecimentos de Direito. É evidente que Mari Alkatiri é o principal responsável pela formulação adoptada. Mas, infelizmente, na altura em que a Constituição estava a ser discutida, nem Xanana Gusmão nem outros líderes timorenses chamaram suficientemente a atenção para as consequências que poderia ter a formulação escolhida pela Assembleia Constituinte.

Para Mari Alkatiri uma Constituição em que o Presidente da República tivesse poderes semelhantes aos do Presidente de Portugal teria como consequência uma enorme instabilidade governativa. Se tivesse sido esse o modelo adoptado, provavelmente em Dezembro de 2002, sete meses depois da sua tomada de posse, já o Governo teria caído, pensará a liderança da FRETILIN. E talvez isso acontecesse se o Governo se recusasse, como na prática se recusou, a ouvir o Presidente.

Mas, com uma constituição diferente, que obrigasse a um verdadeiro diálogo e à efectiva colaboração entre o Presidente, o Governo, o partido maioritário e o próprio Parlamento, talvez a unidade nacional se tivesse consolidado melhor e se tivesse evitado a enorme crise em que Timor-Leste mergulhou em 2006.

Estas considerações sobre a estabilidade de um futuro Governo, que já se sabia que seria da FRETILIN, levaram a esquecer quaisquer considerações sobre a eventual inadequação da Constituição à cultura do Povo Timorense, que tem natural dificuldade em compreender e aceitar que o Presidente não seja o que manda mais, sobretudo quando o Presidente é o grande líder que conduziu a luta do seu Povo até à vitória, isto é, até à autodeterminação.

A marginalização do Presidente, a falta de diálogo construtivo, de confiança mútua e de uma boa e franca cooperação, aprofundou a descoesão política e social, e conduziu a graves rupturas, com risco, mesmo, de se poder chegar à guerra civil.


3.3. A asfixia financeira do Presidente e dos partidos políticos, e o receio da Igreja de se tornar o parente pobre, colocada à margem dos proventos resultantes do petróleo

Além da Constituição deixar o Presidente manietado, quase sem possibilidade de intervenção política, como já vimos, o Governo liderado por Mari Alkatiri teve o cuidado de obrigar a autorização ministerial as aquisições da Presidência de valor superior a US$500 (cerca de quatrocentos euros). Acresce que a concessão de autorizações governamentais para despesas do Presidente não era fácil nem expedita. Por vezes, ao fim de seis meses de espera tais autorizações ainda não tinham sido concedidas.

Nestas circunstâncias, o Presidente estava e ainda está, financeiramente estrangulado. Na prática, a sua única alternativa era, e é, arranjar dinheiro por imaginosas vias de legalidade duvidosa, tal como nos tempos da Resistência.

Enquanto em Portugal, pela Lei 19/2003 de 20 de Junho, os partidos políticos não podem receber donativos «de natureza pecuniária ou em espécie de pessoas colectivas nacionais ou estrangeiras», nomeadamente de empresas, portanto, (Artigo 8º, nº1), mas recebem «subvenções públicas, nos termos da lei» (alínea c) do Artigo 3º), sendo a subvenção anual de cada partido uma «quantia em dinheiro equivalente à fracção 1/135 do salário mínimo mensal por cada voto obtido na mais recente eleição de deputados à Assembleia da República», os partidos políticos timorenses não receberam, nem recebem, até à data, qualquer financiamento do Estado.

Com efeito, a Lei nº 3/2004, de 14 de Abril, sobre partidos políticos timorenses, estabelece o seguinte (e citamos):

“Artigo 21.
Fontes de financiamento

1. As fontes de financiamento dos partidos políticos compreendem receitas próprias, receitas provenientes de financiamento privado.
2. Constituem receitas próprias:
a) As quotas e outras contribuições dos membros do partido;
b) O produto de actividades de angariação de fundos desenvolvidas pelo partido;
c) Os rendimentos provenientes do património do partido;
d) O produto de empréstimos.
3. Constituem receitas de financiamento privado:
a) Os donativos de pessoas singulares;
b) O produto de herança ou legados.

“Artigo 22.
Financiamentos proibidos

É proibido aos partidos aceitar donativos em numerário de:
A Empresas públicas;
b) Sociedades com capital exclusivo ou maioritariamente do Estado;
c) Empresas concessionárias de serviços públicos;
d) Pessoas colectivas de utilidade pública ou dedicadas a actividades de beneficiência ou de fim religioso;
e) Associações profissionais, sindicais ou patronais;
f) Fundações;
g) Governos ou pessoas colectivas estrangeiras”

Em contrapartida, e também ao contrário do que acontece em Portugal, não está explicitamente excluída a possibilidade das empresas privadas timorenses com fins lucrativos financiarem os partidos.

Não havendo, em Timor-Leste, financiamento por parte do estado, e sobretudo enquanto não houver uma classe média numerosa e com meios financeiros acima do limiar de subsistência, na prática o financiamento legal só pode provir de pessoas singulares ou de empresas privadas.

Dificilmente uma empresa privada concederá financiamentos a partidos que não estejam no governo. Como o lucro é o ou um dos principais objectivos das empresas, estas tenderão a financiar o partido (ou os partidos) do poder, e esperarão, quase ‘naturalmente’, que esse ‘investimento’ compense, isto é, que contribua para ganharem, mais facilmente, concursos públicos relativos a obras públicas, fornecimentos, etc., ou para obter quaisquer outras vantagens ou facilidades.

A legislação timorense sobre o financiamento dos partidos é, pois, um instrumento duplamente perverso.

Por um lado conduz ao estrangulamento financeiro dos partidos da oposição (ou à sua ilegalização, se se provar que receberam fundos de fundações, ou de pessoas colectivas estrangeiras).

Por outro lado aumenta o risco de corrupção, já que é muito tentador, para os governantes e para os servidores do estado, aceitar ofertas de empresas privadas, destinadas ao partido no governo, tão úteis para as campanhas eleitorais e para a manutenção do partido no poder, mesmo que isso tenha como preço um certo favorecimento dos ‘amigos’ do partido.

Por estes motivos, a lei nº 3/2004, aprovada pela maioria da FRETILIN no Parlamento, contra as fortes críticas da oposição, é, objectivamente, uma lei contra a vivência democrática, é uma lei contra a democracia.

Quanto à experiência que o Governo se propôs fazer, em cerca de trinta escolas, de tornar facultativo o ensino religioso, deixando ao encargo das respectivas entidades religiosas o pagamento dos professores dessas religiões, a Igreja sentiu que se tratava de um primeiro passo, não apenas para a laicização do estado, mas também, e sobretudo, para o afastamento da Igreja dos benefícios resultantes dos recursos petrolíferos.

A Igreja vislumbrou, nessa ‘experiência pedagógica’, o início de uma política de esvaziamento das escolas católicas e a sua substituição pelas escolas públicas, mais subsidiadas pelo estado. Estas tenderiam a ser, não apenas gratuitas, mas, até, a oferecer, gratuitamente, uma ou mais refeições diárias às crianças – o que em si mesmo seria excelente – sem que a Igreja tivesse meios para fazer o mesmo. Deste modo a Igreja perderia alunos, perderia meios de influência sobre as crianças e sobre os jovens e as suas famílias, e, consequentemente, perderia poder.


3.4. A criação de sucessivos ramos da Polícia, mais bem armados do que o Exército, e o crescente mal-estar nas Forças Armadas

Quando a UNTAET seleccionou os elementos que deveriam constituir a Polícia de Timor-Leste, a maior parte dos escolhidos tinham já sido polícias nos tempos da ocupação Indonésia.

Segundo Loro Horta (Expresso de 2006.06.10) tal resultou de pressões de Xanana Gusmão que pretenderia ter na Polícia inimigos da FRETILIN. Admitimos que a razão não tenha sido essa, mas sim o desejo de Xanana Gusmão de integrar ex-colaboracionistas, num intuito de reconciliação que evitasse a sua perigosa marginalização. Mas, fossem quais fossem as intenções de Xanana, o simples facto de um timorense bem informado expressar esta opinião é, já de si, significativo.

Com Rogério Lobato como Ministro do Interior, foram criados outros corpos de Polícia, nomeadamente a Unidade de Intervenção Rápida (UIR), a Unidade de Patrulha da Fronteira (UPF) e a Unidade de Reserva da Polícia, URP. Todas elas foram dotadas de novos fardamentos e, sobretudo, de muito melhor equipamento (armas, meios de transporte, etc.) do que as F-FDT-L. Os novos polícias seleccionados terão sido escolhidos em função de critérios de confiança pessoal e política, pelo Ministro do Interior, com maior ou menor intervenção do Primeiro-Ministro.

Enquanto os militares continuaram a vestir fardas de variadas proveniências, diferentes umas das outras, a comer mal e a dispor de armamento desactualizado, a Polícia, sobretudo as suas novas unidades entretanto criadas, além de melhor armadas, também comiam melhor e eram mais bem pagas. Todos estes factores criaram mal-estar no Exército, sendo o melhor armamento da Polícia motivo de grande preocupação entre os militares. O armamento e o treino dos corpos especiais da Polícia tinham sido ou estavam a ser feitos pela Malásia. E talvez não seja por acaso que, no decurso da última crise, quer o Ministro do Interior, Rogério Lobato, por um lado, quer o Ministro da Defesa, Dr. Roque Rodrigues, e o Comandante das Forças Armadas, Brigadeiro-General Taur Matan Ruak, por outro, foram à Malásia.

Acresce que a maior parte dos polícias eram das regiões ocidentais de Timor-Leste, e a maior parte dos militares, sobretudo os da primeira incorporação e os oficiais e oficiais superiores do Exército, antigos guerrilheiros, eram, na sua grande maioria, da ponta Leste.

Como já dissemos atrás, é mais do que provável que alguns oficiais, velhos guerrilheiros da ponta Leste (‘lorosaes’), lançassem ditos menos lisonjeiros aos recrutas das regiões ocidentais (‘loromonos’). Também não é de excluir a possibilidade de alguns instrutores ou outros agentes estrangeiros (australianos?), ou até, num caso ou noutro, ligados a algum partido da oposição, como diria a certa altura o Coronel Lere, (atendendo a que um ex-militar, loromono, que tinha sido expulso das F-FDTL em 2005 por ter atacado uma esquadra da polícia com alguns dos seus homens, depois se ligou ao Partido Democrático, PD), tenham atiçado pequenos conflitos, promovendo a divisão para dela tirar dividendos políticos, ajudando a criar uma grande e conflituosa clivagem entre ‘lorosaes’ e ‘loromonos’.

Como atrás dissemos, já em 2005 tinham sido expulsos 44 elementos das Forças Armadas, todos eles das regiões ocidentais e colocados na ponta Leste, longe das suas casas, por excesso de faltas.

Nessa altura foram feitos dois relatórios e chamada a atenção das chefias e Governo para a necessidade de olhar para os problemas existentes no seio das Forças Armadas com cuidado e celeridade. Mas o Ministro da Defesa, não se sentiu à-vontade para chamar a atenção a velhos guerrilheiros, dado o enorme respeito e admiração que tinha por eles e por ele próprio se sentir menos importante do que esses heróis da Resistência, por nunca ter sido guerrilheiro. O General e os oficiais superiores não tiveram sensibilidade suficiente para tratar devida e atempadamente os problemas. E Xanana Gusmão, sentindo que os seus poderes constitucionais eram muito reduzidos, também não actuou de forma efectiva, ficando-se pelas chamadas de atenção e críticas mais ou menos inconsequentes. Terá avisado que, se as expulsões das fileiras do Exército continuassem e tomassem grandes proporções (acima da centena), acabaria por intervir, pessoalmente, como Chefe máximo das forças timorenses. Mas, entretanto, não tomou medidas necessárias e suficientes para impedir que a crise se acentuasse.

Com tudo isto a crise no seio das forças armadas foi crescendo cada vez mais. E com isso a sua vulnerabilidade a se deixar utilizar por interesses económicos ou políticos, nacionais ou estrangeiros, cresceu também, enormemente.


3.5. O conflito entre os principais líderes, desde a ruptura no Congresso do CNRT de Agosto de 2000, e a crise do Estado

Já atrás vimos que vêm de muito longe, no tempo, as divergências entre Xanana Gusmão e a então liderança da FRETILIN no Exterior. E já falamos do efeito que isso terá tido na formulação do texto constitucional, na limitação dos poderes do Presidente e no estrangulamento da sua capacidade financeira.

Mas as suas consequências para a construção do Estado, em 2001/2002 e para a permanente crise em que este viveu até agora, são bem maiores, ainda que, à boa maneira oriental, não fossem muito visíveis durante bastante tempo.

No Congresso do Conselho Nacional da Resistência Timorense (CNRT) realizado em Dili, em Agosto de 2000, estiveram presentes, por sugestão ou convite de Xanana Gusmão, familiares de vítimas da FRETILIN, dos anos setenta. Embora a ideia de Xanana fosse promover, logo aí, um pedido de desculpas e uma reconciliação, que permitisse à FRETILIN libertar-se desse peso moral, esses convites terão sido sentidos, por alguns líders da FRETILIN, como uma desconsideração. Não houve, nem pedido de desculpas, nem reconciliação.

Aí foram discutidos os estatutos do CNRT. Mari Alkatiri e Ana Pessoa participaram na discussão dos mesmos, tendo proposto alterações. A versão aprovada, no entanto, foi muito próxima da que Xanana Gusmão defendeu, e não a que a FRETILIN propôs.

Neste Congresso chegou a ser assinado um «Pacto de Unidade Nacional» entre as diversas forças políticas que ainda integravam o CNRT, incluindo a FRETILIN.

No entanto a organização do Congresso propôs, para a Direcção do CNRT, uma lista de três pessoas, sem incluir qualquer nome da FRETILIN. Esperava a organização que esta força política propusesse alterações à lista. Mas a Direcção da FRETILIN sentiu-se de tal maneira marginalizada, que decidiu nem sequer reclamar qualquer alteração. Os cerca de setecentos delegados presentes acabaram por eleger a única lista proposta, com Xanana Gusmão a Presidente e dois Vice-Presidentes, José Ramos Horta e Mário Carrascalão.

Na sequência dessa eleição, com o Congresso praticamente terminado (só faltava a missa de encerramento) a liderança da FRETILIN, que de facto se tinha sentido desprezada e insultada com a sua marginalização da Direcção e com a preferência dada a um ex-governador dos tempos da ocupação, em detrimento da força política em nome da qual tantos timorenses tinham lutado e morrido pela libertação do seu povo das garras dessa mesma ocupação, declarou publicamente a sua saída do CNRT. Pouco depois a direcção da UDT fez o mesmo, e o CNRT ficou esvaziado de conteúdo e de significado. Em 7 de Junho de 2001 o CNRT acabaria por se dissolver.

Assim morreu, à nascença, o «Pacto de Unidade Nacional», que seria tão importante para dar consistência a uma unidade nacional tão frágil e tão necessária para Timor dar os primeiros passos na construção de um estado a nascer das cinzas, com todas as suas fragilidades, divisões e traumas internos, e com todos os riscos resultantes de cobiças alheias tão fortes que não se incomodaram com o preço de duzentos mil mortos para assinarem o Tratado do Timor Gap.

Poder-se-á acusar a FRETILIN, como tem sido muitas vezes feito, de ter inviabilizado o Pacto de Unidade Nacional (que previa a constituição de um governo de unidade nacional) e a própria continuação do CNRT, ao retirar-se da organização, em Agosto de 2000. Mas talvez se pudesse acusar, com não menos razão, quem propôs e aceitou uma lista para a Direcção do CNRT sem qualquer membro da FRETILIN. Julgamos que era sensato que a unidade nacional incluísse quem colaborou com os ocupantes, jogando, tantas vezes, um papel duplo imprescindível para a sobrevivência do Povo e da própria Resistência Timorense. Mas julgamos que foi completamente insensato marginalizar a FRETILIN da Direcção da organização que deveria consubstanciar e operacionalizar essa unidade nacional.

Será uma Direcção da FRETILIN magoada com a Direcção do CNRT, e muito especialmente com Xanana Gusmão, que irá dar forma à Constituição da República Democrática de Timor-Leste.

Será um líder ferido por uma certa incompreensão da liderança da FRETILIN, desde 1987, que irá ser eleito Presidente da República. Presidente de uma República de cujo nome e data oficial da independência, consagradas na Constituição, ele próprio não gosta, pois preferia que não se chamasse “democrática”, designação usada por países com «democracias populares» de modelo Marxista-Leninista, e que a data da independência fosse 20 de Maio de 2002, quando a comunidade internacional a reconheceu, em vez de 28 de Novembro de 1975, quando a FRETILIN, unilateralmente, a declarou.

Uma vez redigida e aprovada a Constituição, pela Assembleia Constituinte, Mari Alkatiri propôs a Xanana Gusmão que ele fosse o candidato da FRETILIN. Mas Xanana Gusmão não quis ficar a dever esse favor, nem à FRETILIN nem ao seu Secretário-Geral, e ter-lhe-á mesmo dito que estavam os dois em margens opostas. Xanana acabaria por ser proposto por cidadãos de vários partidos e, com a sua habilidade política, conseguiu mesmo levar Mari Alkatiri a dizer, publicamente, que não votaria em Xanana Gusmão. Deste modo a independência do Presidente timorense face ao Secretário-Geral da FRETILIN tornou-se pública e notória.

Foi com os seus dois principais líderes, o Presidente e o Primeiro-Ministro, situados ‘em margens opostas’, em confronto permanente mesmo quando parecia que tudo corria em boa harmonia, como tantas vezes nos dizia Mari Alkatiri perante as nossas dúvidas a esse respeito, que Timor-Leste viveu nos primeiros anos da construção do estado.

Apesar das sucessivas crises foram-se produzindo leis e construindo importantes estruturas do Estado. A reconstrução física e das infra-estruturas timorenses também se foi fazendo, na medida do possível. Foram-se criando e posto a funcionar serviços importantes, alguns, como o de saúde, com apreciável qualidade.

Em 10 de Abril de 2006, o Presidente do Banco Mundial, o conservador Paul Wolfowitz, elogiava «os consideráveis progressos que o Povo Timorense fez nos últimos seis anos e meio». E acrescentava : - «os mercados cheios de azáfama, as escolas reconstruídas, o funcionamento do Governo – e, acima de tudo, a paz e a estabilidade - atestam a sensibilidade da liderança e a solidez das decisões».

Pouco antes, Elisabeth Huybens, que em 2006 terminou um contrato de cinco anos como ‘World Bank country manager’, dizia que gostava de trabalhar em Timor-Leste porque o Governo estava genuinamente a tentar a fazer as coisas certas ao contrário do que era a sua experiência em países africanos flagrantemente corruptos onde os governos não se preocupavam nada em fazê-lo. (UNOTIL Daily Media Review, 13 July 2006).

Apesar desses elogios, vindos de pessoas insuspeitas, no fundo o Estado de Timor-Leste viveu sempre em situação de crise, desde a assunção plena da sua independência, em Maio de 2002.

Podemos mesmo dizer que a situação de crise começou, de facto, mais cedo, no Congresso do CNRT, de Agosto de 2000, que foi, de facto, o congresso da ruptura.

Tomou forma, explícita e clara, em Março de 2002, quando foi aprovada a Constituição da República Democrática de Timor-Leste e quando a Austrália se retirou dos tribunais internacionais que poderiam dirimir eventuais conflitos relacionados com direitos sobre os recursos no mar e se colocou, assim, à margem da lei e do direito internacional.

Esta crise tornou-se mais visível quando, no dia seguinte ao abandono dos quartéis por mais de quinhentos militares, que apresentaram uma petição ao Presidente da República pedindo o fim da descriminação entre ‘lorosaes’ e ‘loromonos’ nas Forças Armadas, este, sem ter havido o imprescindível diálogo com o Chefe das FDTL, decidiu passar revista aos ‘peticionários’ formados.

Tornou-se mais grave quando, em 16 de Março o Brigadeiro General Taur Matan Ruak anunciou na televisão, sem previamente os ter avisado e falado com eles, que os peticionários que tinham abandonado os quartéis estavam fora das fileiras do Exército (como se fossem considerados desertores).

Tornou-se gravíssima quando, alegadamente, o Ministro do Interior, por um lado, e o Chefe da Polícia, por outro, terão começado a armar grupos de civis, à margem da legalidade e das estruturas do Estado.

Tornou-se mais clara quando o Presidente recebeu e elogiou o Major Reinado, que entretanto também tinha abandonado o quartel, e lhe pediu para se dirigir com os seus homens armados para uma região perto da fronteira, para ajudar a acalmar a população e a resolver problemas de insegurança que aí se estavam a viver.

Os confrontos entre ‘‘lorosaes’’ e ‘‘loromonos’’, e sobretudo entre polícias e militares, a partir de 28 de Abril de 2006, e mais tarde entre polícias, militares ou ex-militares e grupos de civis armados, por um lado, e outros militares, por outro, entre 23 e 25 de Maio de 2006, são o culminar de um conflito entre líderes e de uma gravíssima crise do Estado de Timor-Leste.

Felizmente os principais líderes políticos timorenses, representantes dos Órgãos de Soberania do Estado, tiveram o bom senso de abdicar de uma parcela importante da soberania, e pedir a presença de forças internacionais, australianas, neozelandesas, malaias e portuguesas, para restabelecer a ordem e a segurança perdidas. Deste modo terão evitado uma guerra civil iminente

É evidente que, ao fazê-lo, pagaram um elevadíssimo preço, consubstanciado numa grande perda da frágil soberania nacional.


3.6. O atraso do desenvolvimento e a crise social

Com cerca de 970 mil habitantes, em meados de 2006, Timor-Leste é um dos países do mundo com maior taxa anual de crescimento populacional, cerca de 3,2% ao ano. A dimensão média das famílias (incluindo pessoas que vivem sozinhas) é de 4,7. Tem, por isso, uma grande percentagem de população jovem. 49% dos timorenses têm menos de 15 anos, segundo dados do Info Timor publicado pelo CEsA/ISEG em 15 de Julho de 2006.

A densidade populacional (considerando que a superfície do país são 15 000 Km2) é de 64,7 habitantes/Km2 (um pouco mais de metade da densidade populacional de Portugal).

Em 2004 cerca de 26% da população vivia em áreas urbanas. Nestas zonas a taxa de desemprego tem permanecido, de 1999 até 2006, extremamente elevada. Alguns autores falam em números da ordem dos 60% a 80%, embora não conheçamos estatísticas seguras sobre isso. Nas zonas rurais a situação é completamente diferente, já que a maior parte da população trabalha numa agricultura em grande parte (mas não totalmente), de subsistência. Apesar disso, em 2001 (quando as Nações Unidas estavam em peso no território e empregavam um número não desprezável de timorenses) só 7,8% da mão-de-obra procurava emprego (CEsA/ISEG). Nesse ano de 2001 a estrutura de emprego era a seguinte: - agricultura: 73%; manufactura: 5%; e serviços: 22%. O número de funcionários públicos, que em 1999 (sob ocupação indonésia) era de 34 270, tinha sido reduzido para cerca de 13 000 em 2002.

Ainda de acordo com o Info Timor do CEsA/ISEG de 15 de Julho de 2006, os indicadores de natureza macroeconómica (1995-2005) são os seguintes:

1995 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005p
PIB (milhões de US$ correntes) 315 390 270 321 385 378 338
PIB, excepto petróleo - estimativas recentes do BIDE (Out/2004) 316 368 343 336 331 326
PIB per capita (US$) (2004: com o PIB estimado e a população segundo o Censo) 374 424 337 396 478 352 350
Taxa de variação do PIB real (%) 9 -2 -35 15 17 3 -2
Idem, com as estimativas mais recentes para o PIB 15 17 -6,7 -6,2 0,4 2,3
Taxa de inflação; Dili; variação homóloga Dez.-Dez. (Dir. Nac. Estatística) 9.5 4.1 1.8 0.9

Estrutura do PIB (% do PIB total)
Agricultura 27.5 24.9 21.3
Indústria manufactureira 3.0 3.5 3.5
Construção 23.2 21.7 23.2
Comércio, hotéis e restaurantes 11.0 10.3 8.1
Transportes e comunicações 8.7 10.3 8.1
Administração Pública e Defesa 21.4 22.1 27.8


Fonte: Autoridades nacionais (DNE) + FMI

A percentagem da população com acesso a água potável e com saneamento através de condutas enterradas, ainda é, em 2006, diminuta, o que contribui para a prevalência de diarreias, malária e outras doenças transmitidas por mosquitos.

A taxa de escolarização tem vindo a aumentar, com mais de 90% das crianças entre os 6 e os 11 anos (perto de 200 000 alunos) a frequentar o ensino primário, em 2005/2006.

A necessidade de elaborar e aprovar a legislação sobre o fundo petrolífero e a própria dificuldade das negociações sobre a repartição dos lucros da exploração dos recursos petrolíferos do Mar de Timor, com o Governo australiano a ameaçar, constantemente, bloqueá-las e deixar o Povo Timorense na miséria, fizeram com que só a partir de Setembro de 2005 o Governo timorense estivesse em condições de dispor de verbas significativas e de injectar dinheiro resultante do petróleo no Orçamento do Estado. A sua parte no Orçamento de 2005 / 2006 foi de 75,3 milhões de US dólares, num total de 132 milhões, representando, por isso, mais de metade do Orçamento.

Muitos criticam Mari Alkatiri por não ter contraído empréstimos do Banco Mundial ou de outras entidades financeiras de apoio ao desenvolvimento, e de contribuir, assim, para uma elevadíssima taxa de desemprego e de frustração, durante um demasiado longo período de expectativa. Essa frustração contribuiu fortemente para uma situação social explosiva, colocando muitos milhares de jovens (e adultos também) grandemente disponíveis para alimentar quaisquer movimentos de revolta e tornando-os muito susceptíveis a serem utilizados para manifestações, pilhagens, incêndios e actos de violência com fins políticos ou outros, completamente alheios aos seus reais interesses.

Acresce que as muitas universidades timorenses existentes (perto de vinte) têm, de um modo geral, um nível de qualidade muito baixo, quando comparadas com outras, no plano internacional, e não preparam, em muitos casos, profissionais competentes e, ainda menos, empreendedores.

À formação em Gestão, tão necessária para delinear, orçamentar, concretizar, apresentar relatórios e contas, avaliar e acompanhar a utilização e manutenção de projectos e obras, não terá sido dada, até hoje, a importância devida.

A componente experimental, de projecto e execução também não têm merecido, no sistema de ensino, a atenção necessária, a não ser em casos particulares ainda relativamente raros. Salvo um número muito reduzido de escolas profissionais de qualidade, quer de algumas missões (nomeadamente Salesianas), quer do Estado, na sua generalidade o sistema de ensino timorense não prepara para a vida activa, o que é contrário às necessidades de Timor-Leste e dos timorenses.

O resultado é criar-se todo um enorme grupo de jovens, eventualmente com qualificações académicas mas sem o necessário conhecimento e capacidade de gestão e de iniciativa suficientes para criar empresas rentáveis e que, não tendo a sorte de arranjar um emprego, espera que o Estado lho proporcione.

O facto de muitos jovens terem um fraco ou quase nulo domínio de uma das línguas oficiais, o Português, ou mesmo das duas, o Tetum e o Português, também contribui para o seu sentimento de marginalização. Possivelmente o problema seria semelhante, se a Língua Inglesa fosse escolhida como língua oficial, ainda que a Austrália, mais próxima, pudesse ter, eventualmente, dado maior apoio ao ensino da sua língua do que Portugal o tem feito em relação ao Português.

Terá sido um erro, com graves consequências psicológicas e sociais, não pedir empréstimos para arrancar, logo a seguir às cerimónias da independência, com obras públicas absolutamente necessárias, que dessem emprego a muitos timorenses e que pudessem ser o ponto de partida para um desenvolvimento relativamente acelerado e que fizesse sentir aos timorenses que a independência trazia consigo reais oportunidades de construção do país e de realização pessoal. Mari Alkatiri conhecia muitos exemplos de países africanos que, ao entrarem pela via da contracção de empréstimos, tinham entrado numa espiral imparável de endividamento. Além disso tinha a ameaça constante da Austrália de que seria muito dura com Timor-Leste e poderia deixar o jovem país morrer à fome sem acesso aos resultados da exploração petrolífera. Compreende-se, assim, que nessa insegurança tenha optado pela prudência que o deixava menos dependente de terceiros e, sobretudo, das pressões e chantagens australianas.

Não é de excluir a hipótese de o Governo Australiano ter usado as suas ameaças como instrumento para deixar inseguro o Primeiro-Ministro e o levar a optar por uma política demasiado restritiva. Deste modo o número de timorenses frustrados, e o seu elevado grau de frustração, permitiria à Austrália, ou a qualquer outro poder, dispor de uma larga massa popular susceptível de ser usada em função dos seus interesses egoístas próprios.

Quaisquer que tenham sido os motivos por trás de uma política tão frustrante, o certo é que isso também contribuiu para a crise político-social, e continua a alimentar a conflituosidade interna em Timor-Leste.

A frustração resultou, também, da experiência anterior, durante a ocupação indonésia.

Com o objectivo, em grande parte, de tentar “conquistar os corações” e enfraquecer as resistências, nos finais da década de noventa a Indonésia injectou cerca de mil milhões de US dólares por ano na “sua província” de Timor Timur. Parte destinou-se a obras públicas de utilidade geral (estradas, escolas, hospitais, etc.) e parte para oferecer aos timorenses dezenas de milhares de empregos como funcionários, para quase nada fazerem.

Sob administração indonésia os timorenses não pagavam nem a água nem a energia eléctrica. Eram generosas ofertas do paternalista (e opressivo) Governo Indonésio, à sua mais jovem “Província”.

Além disso o Governador e outras autoridades tinham uns grandes “sacos azuis”, com dinheiro de uso livre, fora de qualquer contabilidade, para acorrer a dificuldades, criar uma mentalidade de dependência e “comprar amizades” ou, no mínimo, cumplicidades, com os timorenses necessitados.

O Governo Timorense de Mari Alkatiri tentou contrariar esta cultura de dependência.

Por um lado, teve a coragem de começar a cobrar os consumos de água e de electricidade, suscitando um grande descontentamento e até alguma revolta.

Mas faltou-lhe pôr em prática o principal instrumento para a mudança, que seria o de planear e executar obras públicas e lançar outras iniciativas que respondessem a necessidades reais, que são muitíssimas, e proporcionassem empregos e fizessem com que a generalidade dos timorenses sentissem os benefícios da independência, não apenas na liberdade alcançada, mas também no progresso da sua terra e na realização pessoal, profissional e social de cada um.


3.7. O papel da Igreja: críticas ao Governo e apoio às populações

Durante a crise de 2006 a Igreja manteve-se relativamente silenciosa, embora não tenha deixado de fazer algumas críticas ao Governo.

Em 16 de Maio de 2006, véspera do início do Congresso da FRETILIN, o Bispo de Baucau declarou que “o Povo Timorense requer ser tido em consideração, e é isso que tem faltado. As mensagens passam de um lado para o outro e diz-se às pessoas que elas têm simplesmente de obedecer”. (…) “Mas o Governo é apenas a ponta do iceberg e é o reflexo de uma mentalidade que perpassa a sociedade timorense, de tentar fazer mudanças muito depressa, sem explicações e sem ter em conta a vontade do povo.” E Dom Basílio do Nascimento acrescenta “O que eu me interrogo é como é que um problema institucional, militar, restrito foi empolado até se transformar num problema nacional”.

No entanto, apesar dessas e outras críticas, a Igreja dispôs-se a integrar, com um representante seu, a Comissão de Notáveis, liderada pela Ministra de Estado Ana Pessoa, que deveria ouvir os peticionários e demais partes envolvidas, e propor soluções para a crise no seio das forças armadas.

O seu papel, no acolhimento e apoio às populações que fugiam das lutas nos bairros em que habitavam, dos ataques, assaltos, saques e incêndios às suas casas, foi de uma extrema importância. O Irmão Adriano de Jesus, responsável pela Escola Técnica de D. Bosco, em Comoro, foi dos primeiros a ver a sua escola invadida por pessoas que fugiam à violência, no dia 28 de Abril de 2006. Pelas 13:45 começaram a entrar os primeiros. Cerca de uma hora depois, já eram mais de mil. E ao anoitecer desse mesmo dia, em que a manifestação dos peticionários saiu do controlo destes, eram mais de cinco mil. Alguns dias depois, ultrapassou, mesmo, os quinze mil. Noutros colégios e instituições da Igreja muitas dezenas de milhares de timorenses procuraram protecção, que a Igreja lhes proporcionou, assim como alimentação, conseguida através de instituições de solidariedade e do próprio Governo. Nos momentos mais críticos terão estado em campos de refugiados improvisados, quase todos da Igreja, cerca de 150 000 pessoas.

Um exemplo da coragem e determinação com que padres e madres assumiram o seu serviço aos que dele precisavam, deu-o a Irmã Guilhermina Marçal. Tendo-se dirigido a casa do Brigadeiro-General Taur Matan Ruak, na tarde de 24 de Maio de 2006, para salvar os filhos deste, de 3 anos e de 8 meses, respectivamente, e tendo-se deparado, como descreve Paul Cleary (ex-Consultor do Governo Timorense), com um cenário de guerra, com soldados da zona ocidental a atacar a casa do Comandante do Exército, e outros, da zona oriental a tentar defendê-la, perante os tiros cruzados que começaram a atingir o carro em que seguia, decidiu sair da viatura e ordenar aos soldados que baixassem as armas. Estes obedeceram e a Irmã Guilhermina Marçal pode retirar do local os filhos do General, a sua baby-sitter e ainda três mulheres que se encontravam encurraladas na residência. No fim os soldados ainda ajudaram a empurrar o carro, para ele arrancar e levar as mulheres e crianças para lugar mais seguro. Mais tarde a casa do Chefe das FDTL, onde também residia o Ministro da Defesa, foi saqueada e, depois, incendiada.

Também foi um seminarista, Aníbal Lemos, quem em 8 de Maio evitou que um grave incidente, em Ermera, em que foi morto um polícia e ficou gravemente ferido um segundo, se tornasse ainda mais grave e morressem muito mais pessoas. A sua deslocação lá destinava-se a arranjar alimentos e outros bens essenciais para cerca de cinco mil refugiados que se encontravam nessa região. Mas enquanto se encontrava no gabinete do Administrador, uma multidão enfurecida contra o Governo e contra os “lorosaes”, tendo visto que estavam presentes seis polícias que eram da zona oriental, quis matá-los. A coragem com que o pároco local enfrentou a multidão, que só parcialmente conseguiu conter, e com que o seminarista Aníbal Lemos também a enfrentou, retirando do local a maior parte dos polícias que eram objecto da ira da turba, evitou que o número de mortos fosse muito maior.

Em muitos outros casos outras freiras e padres católicos deram provas de uma enorme coragem entrepondo-se, com o risco das próprias vidas, entre grupos armados e enfurecidos, de um lado, e refugiados ou outros grupos vítimas da violência, do outro, para impedirem ataques aos locais de acolhimento e linchamentos.

4. OS FACTORES INTERNACIONAIS DAS CRISES


4.1. Os Estados Unidos e a competição energética e geoestratégica com a China


4.1.1. O fulgurante crescimento económico da China, e as suas necessidades petrolíferas rapidamente crescentes, tornam a China no mais importante competidor energético dos EUA

Desde que, na sequência da morte de Mao Tsé-Tung, em 1978, Deng Xiaoping assumiu o poder e deu início à Política de Abertura da China ao Exterior, mais exactamente no quarto de século que vai de 1980 a 2005, a economia chinesa teve um crescimento médio absolutamente espantoso, de 9,6% ao ano.

Segundo Rui Pereira (“A Nova Política da China em África”, R:I, Jun 2006), em 2005 a China, com um PIB de 2,26 biliões de dólares, tornou-se a 4ª economia mundial, ultrapassando a França e o Reino Unido. Prevê-se que dentro de dois anos ultrapasse a Alemanha, e, até 2020, o Japão, tornando-se então (se entretanto não houver sobressaltos), na segunda economia do planeta, logo a seguir à dos EUA.

O rápido desenvolvimento da China fez com que esta se tornasse no maior importador de aço, carvão, alumínio e cobre, e no segundo maior consumidor de petróleo, do mundo.

Energeticamente auto-suficiente, até 1993, a partir daí a produção interna de petróleo deixou de ser suficiente, e a China teve que procurar fora do seu território o petróleo em falta, em crescimento galopante. O seu consumo actual, de 6,5 milhões de barris por dia, deverá mais do que duplicar até 2025.

A “Segurança Energética”, imprescindível para a continuação do crescimento económico, é, pois, uma preocupação fundamental da política chinesa.

As necessidades energéticas e de contenção do terrorismo, por um lado, e o desejo de afirmação como potência regional asiática (enquanto não pode competir com os Estados Unidos a nível mundial), por outro, estarão na origem da primeira instituição multilateral criada pela China: a Organização de Cooperação de Xangai, criada em 15 de Junho de 2001, e que reúne a China, a Rússia e as quatro antigas repúblicas soviéticas da Ásia Central: Casaquistão, Quirguistão, Tadjiquistão e Usbequistão. Em 2004, a Mongólia, e em 2005, a Índia, o Paquistão e o Irão, tornaram-se estados observadores. A pressão americana terá evitado que em 2006 estes observadores se tornassem membros de pleno direito da Organização. A cooperação económica, nomeadamente em torno da gestão de recursos energéticos (petróleo e gás), e a luta contra o terrorismo, são objectivos fundamentais desta organização.

Apesar de os riscos resultantes do terrorismo internacional, tornados tão claros desde os ataques de 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque e Washington, obrigarem a uma cooperação entre a China e os EUA, que poderá ter evitado, uma segunda Guerra-Fria, desta vez entre a América e a China (Carlos Gaspar, “A China, os Estados Unidos e o 11 de Setembro”, R:I, Jun. 2006), a Organização de Cooperação de Xangai recusou aos EUA o estatuto de observador que em 2005 estes pretenderam obter. (America's Geopolitical Nightmare and Eurasian Strategic Energy Arrangements, F. William Engdahl)

Como é natural, a China tem procurado tirar partido das más relações dos Estados Unidos com países ricos em petróleo, tais como o Sudão, a Venezuela e o Irão, o que já começou a gerar graves tensões entre os dois países.

Em Abril de 2006 o Embaixador Chinês em Teerão anunciou que estava pronto a ser assinado um contrato entre a China e o Irão de valor superior a 100 biliões de dólares para o desenvolvimento de um grande campo petrolífero e o fornecimento de 250 milhões de toneladas de gás natural à China nos próximos 25 anos. (America's Geopolitical Nightmare and Eurasian Strategic Energy Arrangements, F. William Engdahl)

A Venezuela tornou-se, entretanto, um dos grandes fornecedores de petróleo à China. E a decisão do recentemente eleito Presidente, Evo Morales, de passar o controlo dos recursos petrolíferos da Bolívia para o estado, depois de se ter encontrado com Hugo Chavez e Fidel Castro, ao pôr a nu o declínio do poder americano sobre os recursos de países que já foram coutadas suas, põe também em evidência a importância da luta pelos recursos naturais a nível planetário.

No Sudão a presença Chinesa começou a notar-se desde 1995, ano em que a China National Petroleum Corporation (CNPC) adquiriu 40% do capital do maior consórcio petrolífero do Sudão, a Greater Nile Petroleum Operating Company, responsável não apenas pela exploração de campos petrolíferos no Sudeste do país, mas também pela construção de um oleoduto de 1 500 km, até ao Mar Vermelho. A China é o principal cliente do Sudão, adquirindo mais de 50% da sua produção. O Sudão é um dos maiores fornecedores da China, de onde esta recebe mais de 250 mil barris por dia.

Foi recentemente que as necessidades energéticas e de outros recursos naturais levaram a China a interessar-se pelo continente africano onde, anteriormente, europeus e americanos pontificavam.

A fim de dinamizar e enquadrar as relações entre a África e a China, este país criou o Fórum para a Cooperação China-África, que reuniu pela primeira vez a sua Conferência Ministerial, com representantes de 45 países africanos, em Outubro de 2000, em Pequim. A partir daí foram-se incrementando as relações mútuas, que a partir de 2004 tiveram um aumento espectacular.

Com efeito, no espaço de pouco mais de dois anos (desde o início de 2004), a presença económica chinesa cresceu enormemente, em diversos países africanos (incluindo Moçambique) e, sobretudo em dois, particularmente ricos em petróleo: a Nigéria e Angola.

Com a Nigéria, o maior exportador de petróleo da África Subsariana, e o sétimo a nível mundial (Rui Pereira, Jun. 2006), em Julho de 2005 a China estabeleceu um acordo que lhe garantiu a compra de trinta mil barris por dia por um período de cinco anos. Em 9 de Janeiro de 2006 a China National Offshore Oil Corporation (CNOOC) adquiriu, por 2,27 mil milhões de dólares, 45% da petrolífera nigeriana South Atlantic Petroleum.

Relativamente a Angola, as importações chinesas de petróleo passaram de 11,1% das importações chinesas totais de crude, em 2003, para 15%, (456 mil barris por dia) nos primeiros meses de 2006. Nesse período Angola tornou-se o principal fornecedor de petróleo à China, ultrapassando a Arábia Saudita e o Irão. Em Fevereiro de 2006 foi anunciada a construção de uma refinaria no porto angolano do Lobito, por um consórcio entre a Sonangol e a China Petrochemical Corporation (Sinopec). A abertura, em Março de 2004, de uma linha de crédito de dois mil milhões de US dólares, com a baixíssima taxa de 1,5%, por um período de 17 anos, abriu as portas à participação chinesa em projectos de reconstrução de infra-estruturas em Angola. Com efeito a concessão do crédito está condicionado à adjudicação a empresas chinesas de 70% dos contratos respectivos.

Dramaticamente, quer o Sudão, país de grandes dimensões e com elevado interesse económico e estratégico, quer a Nigéria, quer Angola, todos eles muito ricos em recursos naturais, têm sido massacrados pela guerra e pela fome. São exemplos típicos de casos em que os recursos naturais, em vez de uma bênção, se tornaram numa maldição para as respectivas populações, vítimas de cobiças externas, internas ou ambas.


4.1.2. O súbito interesse da China pelos Países de Língua Oficial Portuguesa e pelos seus recursos naturais, e o seu relacionamento com Timor-Leste

Dentro da mesma linha de estabelecimento de laços de cooperação de mútuo interesse entre a China e grupos ou associações de Países, em 2003 a China e a Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP) assinaram um Acordo de Comércio e Cooperação, e concordaram em fazer reuniões trienais entre os Ministros do Comércio da China e dos países de língua portuguesa. De facto só sete dos oito países de língua portuguesa participam no acordo, já que São Tomé e Príncipe estabeleceu relações diplomáticas com Taiwan, o que é totalmente contrário à política chinesa de “uma só China”.

Foi neste contexto que Portugal se tornou, em 10 de Dezembro de 2005, o quinto país europeu com o estatuto de Parceiro Estratégico da China. Os outros quatro são a Grã-Bretanha, a França, a Alemanha e a Espanha. Foi também neste quadro que a China reduziu as dívidas de alguns países da CPLP e que disponibilizou um crédito de US$ 8,2 milhões, sem juros, para os países da CPLP. (Loro Horta, YaleGlobal, 22 June 2006)

Como sinal do interesse da China pelos países de língua portuguesa, esta concedeu um substancial subsídio (cerca de 800 mil dólares) para a reunião da CPLP realizada em Bissau, em 17 de Julho de 2006.

Em dois anos (2004 e 2005) o comércio entre a China e os países da CPLP cresceu 65% (Expresso, 2006.07.15).

Já acima fizemos referência ao rápido incremento das relações entre a China e Angola, tendo em vista o fornecimento de petróleo à China. Mas o interesse da China tem também outras facetas. Em 2005 o Vice-Primeiro-Ministro Zeng Peiyan visitou Angola. Como presentes, levou um empréstimo sem juros de 6,3 milhões de US dólares, e a promessa de investir 400 milhões de dólares no sector de telecomunicações do país, e 100 milhões para melhorar a rede de comunicações militares angolanas. Em 2006 a China tornou-se o maior doador de Angola, ultrapassando Portugal, a Rússia e o Brasil. (Loro Horta, report on “China and Angola Strengthen Bilateral Relationship”, 23 June 2006)

No Brasil a China está a investir perto de cinco biliões de dólares na construção de um “pipeline” para transportar o gás de Macaé (cidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil) para São Salvador. Além disso a China está interessada nas importantes reservas de urânio do Brasil e no convite a empresas brasileiras para participarem na construção de centrais nucleares na China.

Em Moçambique a China está a ajudar o Governo a fazer prospecções de petróleo.

Na década de sessenta a China nunca apoiou qualquer movimento de libertação no “Timor Português”. Muito pelo contrário, dissuadiu os líderes independentistas africanos de língua portuguesa de estenderem a Timor a sua solidariedade anti colonialista.

Na década de setenta forneceu algum apoio financeiro à componente externa da FRETILIN e defendeu, nas Nações Unidas, o direito à autodeterminação de Timor-Leste. Mas o seu envolvimento esteve sempre condicionado pela sua própria posição sobre o Tibete e Taiwan, territórios que a República Popular da China considerava (e considera) pertencerem-lhe, sem qualquer direito à autodeterminação. Rogério Lobato afirma que a China estaria disposta a fornecer armas à FRETILIN, nos primeiros anos da ocupação indonésia, mas tal fornecimento nunca chegou a concretizar-se.

Quando, em 1999, as Nações Unidas decidiram enviar para Timor-Leste uma Força de Paz, para restabelecer a paz e a segurança, pouco depois do referendo, a China contribuiu para esse contingente com uma pequena componente. Era a segunda vez que o fazia. A primeira tinha sido em 1993, no Cambodja. Foi um significativo gesto de solidariedade e apoio para com o Povo Timorense.

Já depois das cerimónias para assinalar a independência de Timor-Leste e o seu reconhecimento internacional, a Petrochina, em conjunto com a Norway’s Global Geo Services, fizeram um estudo gravimétrico e magnético de cerca de 6 000 km2 do território timorense. Além disso terá sido considerada a possibilidade da China vir a fazer uma unidade de tratamento de gás natural a instalar em Timor-Leste, caso o Governo timorense consiga obter acordo com a Austrália nesse sentido.

A China é um dos poucos países onde a RDT-L tem uma embaixada. A Embaixada da China em Timor-Leste é a mais numerosa representação estrangeira na jovem nação.

O Palácio Presidencial e o Ministério dos Negócios Estrangeiros, em Dili, estão a ser construídos pela China.

De 29 de Maio a 3 de Junho de 2006, o Presidente Xanana Gusmão deveria ter visitado a China, a convite do Presidente Hu Jintao. Perante a gravidade da situação que então se vivia em Timor-Leste, essa visita foi cancelada. É provável que o Governa Australiano tenha sentido algum alívio com esse cancelamento, já que Xanana Gusmão tinha saudado, em finais de 2005, o envolvimento chinês na exploração do petróleo e gás timorenses, e que esse assunto estaria, muito provavelmente, na agenda das conversações entre os dois presidentes.

Apesar de todo esse bom relacionamento entre a China e Timor-Leste, quando o Presidente Xanana Gusmão visitou o Japão em 2004, prometeu o apoio de Timor-Leste à candidatura do Japão a um lugar permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, contra o desejo da China, que se tem oposto firmemente a essa candidatura.

Uma outra área de conflito entre os interesses americanos e chineses, em relação a Timor-Leste, são as águas profundas, junto da Ilha de Ataúro, tão cobiçadas, desde os tempos da Guerra-Fria, para a passagem de submarinos nucleares entre o Índico e o Pacífico, sem serem detectados por satélites espiões. O domínio desse estreito por estados amigos do Ocidente é de enorme importância estratégica para os Estados Unidos e para os seus aliados australianos.


4.2. A Austrália, os seus interesses e preocupações


4.2.1. A preocupação Australiana de evitar que Timor-Leste se transforme numa plataforma avançada de poderes estrangeiros

Dez dias depois do ataque Japonês, de 7 de Dezembro de 1941, à esquadra americana, em Pearl Harbour, no Haway, que deu início à Guerra no Pacífico, em 17 de Dezembro uma força mista australo-holandesa invadiu Timor Português. A neutralidade que Portugal manteve na IIª Grande Guerra (1939-45) foi violada e, em consequência disso, em 19 de Fevereiro de 1942 as forças Japonesas invadiram o Timor Português. Muitos Timorenses apoiaram os comandos australianos, que permaneceram no território durante longos meses a criar dificuldades aos inimigos Japoneses, e, em consequência disso, o Timor Português sofreu uma ocupação duríssima. Deste modo a Austrália transferiu a guerra com o Japão para Timor. Apenas quarenta comandos australianos morreram nesse território. Mas o número de Timorenses mortos em resultado da ocupação Japonesa foi superior a sessenta mil, mais do dobro do total de Australianos (beligerantes) mortos em todos os teatros da IIª Grande Guerra.

No fim da Segunda Grande Guerra só uma posição de força do Governo Português é que evitou que a Austrália tomasse conta do território. O seu objectivo principal, na altura, seria tornar, definitivamente, a metade ocidental do território de Timor como a guarda avançada da Austrália, para a proteger de possíveis invasões (que, naturalmente, viriam sempre do Norte). Com efeito Salazar foi muito firme na sua decisão de condicionar o uso, pelos Aliados (Estados Unidos e Grã-Bretanha), de uma base aérea nos Açores, à garantia de que Timor-Leste continuaria a ser Português no fim da guerra, e só autorizou a utilização dessa base, que era vital para a participação americana no teatro europeu da guerra, quando essas garantias lhe foram formalmente dadas.

Em 1974, o Primeiro-Ministro Australiano Gough Whitlam foi ao encontro do Presidente Suharto, da Indonésia, em 7 de Setembro, para o convencer de que “a melhor solução” para o território sob administração portuguesa era ser anexado e integrado na Indonésia.

O General Suharto era, então, “o amigo” do Ocidente, colocado no poder na sequência de um golpe que derrubara o Presidente Sukarno, em 1965. Este golpe tem, ainda hoje, contornos nebulosos, não tendo sido completamente esclarecido, até à data, o papel que alguns serviços secretos ocidentais nele terão tido. Timor-Leste, integrado na Indonésia de Suharto, seria um território “em boas mãos”. E já que não tinha sido possível integrá-lo na Austrália, na altura em que a coligação a que esta pertencia tinha ganho a II Guerra Mundial, e, portanto, se achava no direito de exercer um certo domínio, não só sobre os derrotados, mas também sobre os hesitantes que tinham permanecido neutros, era melhor integrá-lo num país amigo que, pelo seu passado anti colonial, estaria relativamente ao abrigo da crítica internacional.

Evitava-se, assim, o risco de um Timor-Leste independente se poder transformar numa espécie de Cuba do Oriente. A memória da Crise dos Mísseis soviéticos em Cuba, em Outubro de 1962, que quase provocara uma guerra nuclear entre as duas super-potências da altura, ainda estava muito presente. E nem a Austrália, nem os Estados Unidos, nem o Ocidente, em geral, queriam ver Timor-Leste a tornar-se uma plataforma avançada da União Soviética ou da China no Sudeste Asiático.

Acresce que, nessa altura, o receio de expansão do domínio Soviético na região tinha-se tornado quase uma obsessão. Os Estados Unidos estavam a perder a Guerra do Vietname, que terminaria em 30 de Abril de 1975 com a invasão de Saigão pelas forças comunistas do norte, e no Ocidente vivia-se um clima de pânico perante a expansão do bloco soviético, não só na Indochina (Cambodja, Laus e Vietnam), mas também em África (Etiópia, Guiné Bissau, Angola, Moçambique e S. Tomé e Príncipe).

Embora, quando o Primeiro-Ministro australiano foi a Wonosobo, Indonésia, sugerir ao Presidente da Indonésia que anexasse o território português de Timor, a FRETILIN ainda não tivesse sido criada (a Associação Social-Democrata Timorense só alguns dias depois se transformou na Frente Revolucionária de Timor-Leste Independente), e em Portugal o Presidente da República interino (pós 25 de Abril) ainda fosse o conservador General António de Spínola, já se temia que pudesse haver uma deriva comunista, quer em Portugal quer, sobretudo, entre as elites políticas timorenses.

Vinte anos mais tarde, outro factor a preocupar os Governos da Austrália e dos Estados Unidos, terá sido o envolvimento da China na prospecção petrolífera em Timor-Leste, e as tão boas relações existentes entre os dois estados e também entre o PCC e a FRETILIN, eventualmente expresso em alegado apoio material que, segundo alguns timorenses, a FRETILIN terá recebido, quando o seu Vice-Secretário-Geral visitou a China, integrado numa delegação do Parlamento Nacional de Timor-Leste.

Neste caso, a aproximação política entre Timor-Leste e a China preocupará mais os governos australiano e americano, do que a própria competição chinesa pelos recursos petrolíferos de Timor-Leste.


4.2.2. Os interesses australianos sobre o petróleo e o gás do Mar de Timor-Leste e a persistência numa política contrária ao Direito Internacional

Mas outro factor também muito importante, que tem fortemente condicionado as relações da Austrália com os seus vizinhos do Norte, Indonésia, Portugal e República Democrática de Timor-Leste, desde meados da década de sessenta, é o petróleo e gás natural do Mar de Timor-Leste que o Governo Australiano achava mais fácil negociar com a Indonésia do que com Portugal ou com Timor-Leste independente.

O Governo Australiano tem clara consciência, desde meados da década de sessenta, que a tendência do Direito Internacional é considerar a linha equidistante, ou mediana, como a fronteira marítima normal entre dois estados vizinhos. Aliás, foi nessa base que a Austrália definiu a fronteira marítima com a Papua Ocidental e com as ilhas Aru, e, mais recentemente, com a Nova Zelândia também. De facto, em Julho de 2004, ao mesmo tempo que o Governo Australiano continuava a reivindicar direitos sobre os recursos petrolíferos do Mar de Timor muito para além da mediana, aceitava a linha mediana como critério para estabelecer a fronteira marítima com a Nova Zelândia. (Faisal Chaudry, Minding the Timor Gap, The La’o Hamutuk Bulletin, Vol. 6, nº 4 (11/5) e Vol. 7, nº 1 (4/06), citados por ETAN, em 2006.08.02)

Tendo isso em conta, em Novembro de 1965 o Ministro para o Desenvolvimento Nacional, da Austrália, David Fairbairn, tentou convencer o seu Governo a fixar as fronteiras da Austrália com a Indonésia e com o Timor Português também segundo a linha mediana (King, 2003).

Mas, em 30 de Setembro desse mesmo ano, isto é, cerca de um mês antes, um golpe de estado, com apoio ocidental, tinha derrubado o Presidente Sukarno, grande lutador anti-colonialista e promotor da criação do Movimento dos Não Alinhados, em Bandung, em 1956. Com um “amigo” do Ocidente, o General Suharto, a dirigir, desde 30 de Setembro, os destinos da Indonésia, o Governo Australiano decidiu apostar numa fronteira que lhe era mais favorável, apesar dos riscos para as futuras relações com os seus vizinhos que vaticinava o Ministro Fairbairn. Sabendo que o General Suharto precisava do apoio ocidental, em geral, e australiano, em particular, para se consolidar no poder e adquirir prestígio internacional (apesar dos massacres que se seguiram ao golpe e que terão vitimado mais de meio milhão de indonésios, comunistas e outros, nos meses e anos que se seguiram), o Governo Australiano estava disposto a ajudá-lo. Mas considerava-se com o direito de exigir, como preço desse apoio, uma fronteira marítima particularmente favorável (ainda que de legitimidade mais do que duvidosa).

Já se sabia, nessa altura, que o mar de Timor-Leste tinha petróleo. O Governo Australiano sabia-o melhor do que ninguém. Em 1962 um consórcio envolvendo a Arco Austrália Ltd., a Australian Aquitaine Pty. Ltd. e a Esso Austrália Ltd., tinham começado um estudo geofísico do Mar de Timor-Leste e do Golfo Bonaparte. No ano seguinte, um segundo consórcio, incluindo a Woodside Petroleum, a Burmah Oil Company e a Anglo-Dutch Shell Oil Company fizeram estudos aeromagnéticos e, de 1964 a 1968 foram feitos ensaios sísmicos que confirmaram a existência de petróleo e gás em várias regiões marítimas entre a ilha de Timor e a Austrália.

Por isso é que a Austrália se apressou a negociar a fronteira marítima com a Indonésia, tendo chegado a um acordo com o Governo de Suharto, em 9 de Outubro de 1972, relativamente a uma linha muito mais próxima da Indonésia do que a mediana.

Até assinar o acordo com a Indonésia, o Governo Australiano recusou-se a negociar com o Governo Português, que sabia ser menos permeável do que o indonésio aos interesses australianos. Uma vez assinado o acordo com a Indonésia, de acordo com uma justificação sem paralelo, em todo o mundo, e baseada apenas na momentânea relação de forças, o Governo Australiano propôs a Portugal que a fronteira marítima se estabelecesse por uma linha que ligasse os extremos da fronteira acordada com a Indonésia, dum lado e doutro de Timor Português, fechando, assim, o ”gap” existente nessa linha.

Em 11 de Outubro de 1972, um dos mais influentes jornais australianos, The Age, num seu editorial, fazendo-se eco dos desejos australianos e não da realidade, vaticinava que o Governo Português iria concordar com uma fronteira na continuação da acordada, dois dias antes, com a Indonésia. Mas Portugal, que desde 1956 reivindicava, internacionalmente, uma fronteira pela linha mediana, como já comunicara, reiteradamente, à Austrália, manteve essa reivindicação. (King, 2003)

O Governo Australiano não só não aceitou, como começou a atribuir licenças na zona reivindicada por Portugal. Pelo seu lado, Portugal concedeu uma licença a uma companhia maioritariamente americana, a Petrotimor, do lado timorense (norte) da mediana, que Portugal considerava, com base na prática mais corrente e com as tendências cada vez maiores do direito internacional, que deveria estar sob a sua jurisdição.

Foi, basicamente, por causa dos recursos do Mar de Timor-Leste que a Austrália se tornou o único país a reconhecer formalmente a anexação de Timor-Leste pela Indonésia. Para isso silenciou os cerca de duzentos mil timorenses mortos, em resultado da ocupação, e também a autoria, indonésia, do assassinato de cinco jornalistas, em Balibó, em 16 de Outubro de 1975, quando forças indonésias fizeram uma tentativa de invasão terrestre a partir da fronteira.

Mas, graças à sua conivência na ocupação e nos crimes então perpetrados em Timor-Leste, conseguiu, finalmente, assinar, com a Indonésia, o chamado Acordo do Mar de Timor, em 11 de Dezembro de 1989.

A escolha da data de assinatura desse acordo não foi inocente. Em 11 de Dezembro de 1974, isto é, exactamente 15 anos antes, o Boletim Oficial de Timor, confirmava e tornava definitiva a decisão do Governo Português de conceder direitos de exploração petrolífera à empresa Petrotimor - um consórcio liderado pela companhia americana Oceanic Exploration e envolvendo, também, alguns interesses portugueses -, numa área do Mar de Timor que ficava do lado timorense da mediana, mas que a Austrália, apesar disso, reivindicava.

Esta decisão do Governo português, tomada inicialmente pelo Governo de Lisboa (ainda dirigido por Marcelo Caetano), em Janeiro de 1974, provocara, já, veementes protestos do Governo Australiano, dirigido pelo trabalhista Gough Whitlam. Numa entrevista à Televisão dada em Perth, em 25 de Março de 1974, o Primeiro-Ministro Australiano demonstrara uma enorme irritação com a decisão portuguesa. O desagrado de Gough Whitlam era tanto maior quanto era certo a Austrália ter conseguido, do amigo Suharto, uma negociação da fronteira marítima inabitual, particularmente benéfica para a Austrália, com base numa teoria da plataforma continental cada vez mais contestada, até ser completamente abandonada pelo direito internacional. Custava, ao Governo Australiano, que tinha dobrado a grande, populosa e poderosa Indonésia, não ter conseguido dobrar o pequeno Portugal. A assinatura do Tratado do Timor Gap, pelo qual a Austrália conseguia, finalmente, da Indonésia, o que não conseguira de Portugal, apresentava-se, nesse dia 11 de Dezembro de 1989, como uma vingança daquilo que, sendo uma reivindicação natural portuguesa, de acordo com o direito internacional, o Governo Australiano considerara uma derrota na luta pelos seus interesses.

O facto do Primeiro-Ministro Mari Alkatiri ter ousado pôr em causa o que estabelecia o Tratado feito pela Austrália com a Indonésia sobre o Timor Gap foi muito mal aceite pelo Governo Australiano, que nunca lhe perdoou esse atrevimento. Daí o comportamento pouco diplomático e ameaçador do Ministro dos Negócios Estrangeiros Australiano, nomeadamente na reunião realizada em Dili, em 27 de Novembro de 2002, como já atrás referimos.

Tendo optado, em 1965, por lutar por uma fronteira marítima ilegítima e contrária às tendências do direito internacional, já nessa altura, tendo apoiado a ocupação de Timor-Leste e reconhecido a sua integração na Indonésia, apesar das suas catastróficas consequências para o Povo Timorense, em grande parte para se apropriar do petróleo e gás natural do Mar de Timor, o Governo Australiano teima em prosseguir uma política ilegal e ilegítima, baseada, apenas, na força que ainda tem, em conjunto com o seu principal aliado, os EUA.

Em 26 de Fevereiro de 2002, o Ministro indonésio dos Negócios Estrangeiros, Hassan Wirajuda considerava, a propósito do início das discussões para definir as fronteiras marítimas com Timor-Leste, que a Indonésia teria o direito de tomar parte em negociações a três, envolvendo também a Austrália, sobre o Mar de Timor.

Em 23 e 24 de Março de 2002, realizou-se, em Dili, um seminário, sob os auspícios da Petrotimor, em que dois grandes especialistas internacionais, o Professor Vaughan Lowe, da Universidade de Oxford, e o advogado Christopher Ward, de Sydney, defenderam que a aplicação do direito internacional deveria, não apenas, colocar a fronteira marítima segundo a mediana, mas também deveria afastar as linhas laterais do Timor Gap, passando a incluir oitenta a cem por cento dos campos do Greater Sunrise na área pertencente a Timor-Leste. No dia seguinte, em 25 de Março de 2002, exactamente 28 anos depois da irritada intervenção televisiva do então Primeiro-Ministro Australiano Gough Whitlam, acima referida, o Ministro dos Negócios Estrangeiros Alexander Downer e o Procurador-Geral da República (Attorney-General) Daryl Williams, anunciaram a retirada da Austrália da alçada do Tribunal Internacional de Justiça, de Haia, e do Tribunal da ONU para a Lei do Mar, para assuntos relacionadas com as fronteiras marítimas.

Em 25 de Maio de 2002 o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Austrália dizia:

“Como já expliquei aos timorenses, algum tempo atrás, temos muito gosto em ouvir o que têm para dizer, mas não queremos começar a renegociar todas as nossas fronteiras, não apenas com Timor-Leste mas também com a Indonésia. Isso teria implicações enormes. Como lhes expliquei, as nossas fronteiras marítimas com a Indonésia cobrem vários milhares de quilómetros. Isso é uma questão muito, muito grande, e não estamos dispostos a renegociá-la.” (King, 2003, p. 50)

Pelo seu lado, Mari Alkatiri, em 26 de Maio de 2003, dizia no Parlamento Nacional de Timor-Leste:

“Nós podemos ser pequenos, mas temos firmes princípios. Temos o direito do nosso lado e temos muitos amigos.”

Quanto à primeira destas assunções, o então Primeiro-Ministro timorense tinha toda a razão. Quanto à segunda, nesse momento, talvez valesse a pena ser mais prudente. Os tempos em que as vítimas de massacres mobilizavam a opinião pública mundial, já passaram. E, para ter bons amigos é preciso não deixar dúvidas quanto ao empenho na construção de uma vida democrática e respeitar os carismáticos líderes históricos, que o Mundo, por bons motivos, fez seus heróis.

4.2.3. A política australiana relativamente aos países à sua volta, desde os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001

Os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001, às Torres Gémeas de Nova Iorque e ao Pentágono, nos EUA, vieram mostrar que, mesmo as nações mais bem armadas e defendidas, eram extremamente vulneráveis a um novo tipo de ameaças: - o terrorismo internacional. Este deixou de actuar apenas em territórios bem definidos, como antes acontecia, mas tornou-se global. Além disso deixou de se tratar da violência de uns estados contra outros, passando a ser liderada e executada por grupos privados, à margem das estruturas de qualquer estado, ainda que possa haver estados cujos governos, voluntariamente ou por fraqueza da sua estruturação, possam facilitar a actuação de tais grupos a partir do seu território.

Perante esta realidade, para a qual as Nações Unidas não estão preparadas, os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a Austrália subscreveram a teoria da Administração Bush que admite a intervenção preventiva em estados suspeitos de apoiarem ou de poderem vir a apoiar o terrorismo internacional.

Foi nesse contexto que tiveram origem as intervenções no Afeganistão, com o acordo das Nações Unidas, a segunda invasão do Iraque, em 2002, desta vez sem a cobertura da ONU, e a intervenção australiana e regional nas Ilhas Salomão, em 2003, na sequência de insistentes pedidos do Governo deste país.

Muitos têm questionado se estas intervenções, sobretudo a invasão do Iraque por uma coligação de forças lideradas pelos Estados Unidos, terão tido as motivações apresentadas pelos seus autores, e se a ausência dos desejados resultados não estará relacionada com a falta de convicção e de seriedade com que os principais actores a lançaram e concretizaram.

No caso das Ilhas Salomão a violência e o caos instalaram-se a partir de 1998, quando grupos de gwales, originários da ilha de Guadalcanal, reunidos no IFM (Isatu Freedom Movement), começaram a atacar malaitanos, originários da vizinha ilha de Malaita, e outros migrantes internos, provenientes de outras ilhas do país, que se tinham instalado, ao longo do século XX, na periferia da capital, Honiara, para onde migraram na expectativa de arranjarem empregos, nomeadamente nas plantações.

Os casamentos de malaitanos com mulheres de Guadalcanal, onde a transmissão das heranças se faz, predominantemente, por linha matrilinear, deixaram muitos homens gwales deserdados, enquanto as famílias de malaitanos acabavam por ficar na posse de terras que tinham pertencido a famílias locais. Esse terá sido um dos factores que terão estado na base das reacções violentas dos autóctones. O uso de terras para fins diferentes dos tradicionais e as diferenças linguísticas e culturais, entre os gwales locais e os migrantes, que dificultaram muito a integração social, terão contribuído, também, para a conflituosidade.

Na sequência da violência, de que resultaram mais de 50 mortos em 1999, e dos ataques de que foram vítimas, mais de 20 000 malaitanos abandonaram a ilha de Guadalcanal. Gwales tomaram conta dos arredores de Honiara. Mas em 2000, um grupo de malaitanos criou o MEF (Malaita Eagle Force), para sua defesa perante os ataques de grupos de gwales e para lutar pelos direitos e interesses dos malaitanos deslocados. A partir daí a luta entre estes grupos rivais reacendeu-se. Vários acordos foram firmados, entre malaitanos, gwales e as autoridades, para restabelecer a paz e a segurança. Mas, quase todos duraram pouco, sendo desrespeitados quase logo de seguida.

Em 5 de Junho de 2000, militantes malaitanos do MEF, juntamente com alguns polícias descontentes, cujos vencimentos não estavam a ser pagos atempadamente, levando já alguns meses de atraso, assumiram o controlo de instalações-chave, na capital, e tomaram o Primeiro-Ministro como refém, exigindo a sua demissão. O Governo caiu. Sucederam-se os conflitos, até que, em 5 de Dezembro de 2001, se realizaram eleições, que foram consideradas honestas, pela maior parte dos observadores internacionais. Cerca de dois terços dos membros do parlamento, incluindo a maior parte dos membros do Governo anterior, perderam os seus lugares. Um novo Primeiro-Ministro foi eleito. Mas a violência continuou, forçando muitos políticos a alinhar com gangs vários, a fim de obter a sua protecção. O assassinato do ex-Comissário da Polícia e Conselheiro Nacional para a Paz, em 10 de Fevereiro de 2003, e a morte de mais de uma centena de pessoas ao longo de cinco anos de instabilidade e caos (de 1998 a 2003), dá a dimensão da gravidade da crise em que tinham mergulhado as Ilhas Salomão.

No seu relatório de 2002, o Australian Strategic Policy Institute (ASPI) salienta a necessidade de evitar que os países à sua volta se transformem em bases de onde poderes hostis possam lançar ataques contra a Austrália.

“Estes países também são potenciais paraísos para grupos terroristas (…). Durante muitas décadas procuramos proteger os interesses australianos apoiando o domínio colonial de uma forma ou de outra. Quando a vaga de descolonizações do pós-guerra chegou ao Pacífico Sul, nos anos setenta, reconhecemos que a melhor forma da Austrália continuar a gerir os seus interesses estratégicos era construir relações bilaterais estreitas com os seus vizinhos próximos, como estados independentes, apoiadas em generosos planos de ajuda.”

“Mas, apesar dos nossos esforços, a viabilidade da PNG (Papua Nova Guiné), das Ilhas Salomão e do Vanuato, como estados-nação, é, agora, incerto. Os seus governos são fracos e pouco estáveis, e é difícil lidar com eles. A corrupção é comum, e o controlo sobre o território é duvidoso. As economias estão estagnadas, e a lei e a ordem são fracas. A sua capacidade de resistir à penetração de estrangeiros, - quer estados quer outras entidades não estaduais, - é quase nula.”

“Isto põe um problema urgente à Austrália (…). Nas Ilhas Salomão (…) o colapso de um governo efectivo significa que não faz sentido trabalhar com as autoridades nacionais.”

“A política australiana, desde a descolonização, pôs consistentemente em relevo a necessidade de permitir a estes países gerir os seus próprios problemas (…). Parece que, no que se refere às nossas relações com os vizinhos melanésios, esta abordagem já não funciona.”

As Ilhas Salomão tornaram-se independentes da Grã-Bretanha em 7 de Julho de 1978. O arquipélago, que se estende ao longo de cerca de 1500 km, no Pacífico, perto da Nova Guiné Papua e não muito longe da Austrália, tem uma superfície de 28 450 km2 e cerca de meio milhão de habitantes, que falam mais de 60 diferentes línguas. O Inglês é a língua oficial. Tem uma polícia com cerca de 500 elementos e não tem exército. A maior parte da população é cristã, predominando os protestantes, sobretudo anglicanos (45%), e os católicos (18%). Tradicionalmente exportava madeira, copra e óleo de palma. A maior parte das plantações pertencia à Solomon Islands Plantation Ltd. (SIPL), dominada pela British Commonwealth Development Corporation (CDC), que se tornou quase única proprietária em 1999 quando o Governo de Honiara lhe vendeu mais 30% do capital. Em 1998 a empresa australiana Ross Mining começou a extrair ouro da Gold Ridge, em Guadalcanal. Mas devido à violência étnica reiniciada em Junho de 2000, as exportações de ouro e de óleo de palma foram interrompidas e a exportação de madeira diminuiu.

Perante o cenário de violência étnica (?), de corrupção, de desgoverno e de colapso da economia, o Governo Australiano enviou conselheiros e apoio financeiro para as Ilhas Salomão. Mas recusou-se a enviar tropas ou forças de polícia.

Em Janeiro de 2003, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Alexander Downer, dizia que “enviar tropas australianas para ocupar as Ilhas Salomão seria uma completa loucura.” Mas, seis meses depois, o mesmo Ministro Downer anunciava os planos para enviar uma missão militar, dizendo que a instabilidade nas ilhas Salomão forçara a Austrália a desenhar uma nova política para o Pacífico, envolvendo a ”reconstrução nacional” e “intervenção cooperativa”. Essa intervenção era justificada pela percepção de que a instabilidade interna nas Ilhas Salomão poderia tornar-se uma ameaça para a Austrália.

Esta mudança de política de Camberra enquadra-se na agenda da Administração Americana de George W. Bush, de que o Governo de John Howard se tornou “o representante” na região. Aliás o Presidente americano saudou a determinação da Austrália de realizar intervenções preventivas, nas quais viu um apoio da Austrália à política americana relativa à segurança global.

A colagem do Governo da Austrália ao dos Estados Unidos compreende-se facilmente. Apesar da sua enorme extensão territorial, a Austrália é, geograficamente, um enorme deserto, com franjas cultiváveis e habitadas perto do mar. Em termos populacionais, não passa de um pequeno país, com pouco mais de vinte milhões de habitantes. Por mais desenvolvida e avançada que esteja, não poderá enfrentar, sozinha, qualquer conflito com os gigantes asiáticos, como a China ou a Índia, com populações cinquenta vezes superiores à sua, ou mesmo a Indonésia, dez vezes mais populosa. As suas diferenças históricas e culturais relativamente à Ásia, por um lado, e as suas afinidades com os Estados Unidos, único país com força suficiente para enfrentar qualquer dos gigantes asiáticos, por outro lado, tornam esta ligação, quase simbiótica, de Camberra a Washington, perfeitamente natural.

Foi neste quadro que em Junho de 2003 o Governo Australiano decidiu liderar uma intervenção regional, a Regional Assistance Mission to the Salomon Islands (RAMSI), com cerca de 300 polícias e 2 000 militares da Austrália, Nova Zelândia, Fiji, Papua Nova Guiné e doutros estados do South Pacific Forum. Respondia, assim, a um pedido do Governador-Geral (representante oficial da Coroa de Inglaterra, já que as Ilhas Salomão pertencem à Commonwealth), subscrito também pelo voto unânime do Parlamento de Honiara.

Segundo uma revista britânica especializada em intervenções militares (International Peacekeeping), esta Missão (RAMSI) teve um carácter inovador, ao reduzir os limiares justificativos de intervenção nos assuntos internos de um estado soberano para níveis nunca antes vistos em operações internacionais de manutenção da paz. A partir dela, deixou de ser necessária uma grande crise humanitária para justificar uma operação de manutenção da paz, que passou a poder ser justificada por insidiosos níveis de crime, corrupção ou má governação.

É evidente que a globalização tem vindo a reduzir a soberania efectiva dos estados, dum modo geral, com todas as vantagens e inconvenientes que isso possa acarretar. É um sinal dos tempos, com que se pode e deve contar, hoje em dia. E se a inovação introduzida com a RAMSI tiver sido a forma encontrada para responder a um apelo unânime do parlamento das Ilhas Salomão, e tiver como resultado a viabilização do estado, em bases democráticas estáveis, e da sua economia, deverá ser saudada.

Diversas organizações não-governamentais (ONG’s) têm criticado o facto de, através desta intervenção, que inclui também numerosos conselheiros colocados em sectores chave da administração, a Austrália ter passado a ter o controlo efectivo da segurança, da justiça, da economia e, afinal, da governação das Ilhas Salomão. Poderá argumentar-se que essas eram exactamente as áreas em que os autóctones tinham falhado.

Há uma outra crítica mais funda, que é a de que a RAMSI não tem servido para promover o desenvolvimento de capacidades locais de auto governo e de “empowerment”.

De facto os níveis de pobreza e de iliteracia continuam a ser extremamente elevados. Em Abril de 2006 as alegações de que o Primeiro-Ministro recentemente eleito, Snyder Rini, tinha aceite subornos de homens de negócios chineses para comprar votos de membros do Parlamento, desencadeou tumultos e a destruição de grande parte da Chinatown de Honiara. A Formosa (as Ilhas Salomão reconhecem a China Nacionalista e não a República Popular da China) enviou aviões para evacuar centenas de chineses fugidos das manifestações e ataques contra eles dirigidos, e a Austrália e a Nova Zelândia enviaram reforços militares para controlar a situação, ao mesmo tempo que o Primeiro-Ministro se demitia e o Parlamento elegia um novo Chefe do Governo.

Mas, uma questão, talvez ainda mais importante, que se pode pôr é, porque motivo o Governo das Ilhas Salomão cedeu 30% do capital das plantações a uma entidade estrangeira, em 1999, e, sobretudo, porque é que as minas de ouro, operadas por uma empresa australiana, só pagavam de royalties, em 1998, como de novo, em 2005, quando reabriram, apenas 3% dos rendimentos da exploração?

É caso para perguntar se um país em que a economia monetarizada está nas mãos de estrangeiros, e o estado lhes cobra impostos tão baixos, pode ser um estado viável. E, naturalmente, pode-se perguntar, também, se por detrás dessas realidades económicas e fiscais não estará a corrupção, promovida por entidades estrangeiras, que leva governos estrangeiros a queixar-se da corrupção reinante, da incapacidade de auto governo dos autóctones, e da necessidade de intervenções humanitárias e de paz, no meio das quais os impostos continuam a ser irrisórios, criando um ciclo infernal de eterna insolvência e de inevitável dependência.


4.3. As Nações Unidas e a pressa em ter um caso de sucesso

A participação das Nações Unidas na organização do Referendo de 30 de Agosto de 1999, primeiro, na pacificação de Timor-Leste, depois (a seguir ao Setembro Negro em que cerca de um terço da população foi deportada e grande parte das estruturas de Timor-Leste foi reduzida a cinzas), e na construção do Estado timorense, por fim, foram um factor fundamental para a autodeterminação e consolidação da independência do novo país.

A ONU não tinha experiência na ajuda à construção de novos estados e, como era natural, cometeu erros. De entre estes destacaram-se, na altura, o reduzido envolvimento de timorenses no processo (sobretudo numa fase inicial do mesmo, depois parcialmente corrigido quando foi criado o primeiro Governo de Transição), o vergonhoso tratamento a que foram sujeitas as ex-FALINTIL, a pouca atenção dada à formação de quadros timorenses, nomeadamente nas áreas de gestão, e as pressões a que sujeitaram muitos timorenses para que o Inglês fosse escolhido como língua oficial do novo país.

A INTERFET, forças internacionais de imposição da Paz, e o seu Comandante, o General Australiano Peter Cosgrove, fizeram uma intervenção tão rápida quanto possível, com a prudência necessária e suficiente para evitar confrontos com as forças indonésias que, a acontecerem, teriam graves e perigosas consequências não apenas para as relações entre a Indonésia e a Austrália, mas também entre a Indonésia e Timor-Leste.

A intervenção da INTERFET, além de ter sido absolutamente vital, na altura, para a sobrevivência de muitos milhares de timorenses, para a paz e para se criarem condições de segurança para se dar início à reconstrução nacional, foi uma intervenção feita com muito bom senso, inteligência e eficácia. A Austrália, que a liderou, e as restantes nações que nela participaram, merecem, por isso, não apenas o reconhecimento dos timorenses mas também o de toda a comunidade internacional.

A Administração Transitória das Nações Unidas que se lhe seguiu, isto é, a UNTAET, e o Representante Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas que a chefiou, o diplomata brasileiro Sérgio Vieira de Mello, tiveram um papel de enorme relevo, na fase seguinte. Este, desempenhou o seu cargo com espírito altamente construtivo e fraterno, que mereceu a admiração e gratidão dos timorenses. Pagou com a vida, em Bagdad, o seu envolvimento dedicado e eficaz na ajuda à construção de Timor-Leste como estado independente (roubado, segundo Bin Laden, pelos cristãos ao mundo muçulmano).

Mas a principal falha das Nações Unidas, que agora mais claramente se reconhece, foi a saída do país, cedo de mais, das suas forças. Os timorenses sabiam que isso envolvia riscos, e pediram às Nações Unidas que mantivessem um pequeno contingente no País. Portugal apoiou a sua reivindicação. A Austrália e os Estados Unidos discordaram, e o Conselho de Segurança decidiu de acordo com a vontade destes países anglo-saxónicos.

Hoje, e perante as consequências evidentes dessa retirada prematura, fáceis de antecipar, é caso para perguntar se foi ingenuidade ou atitude deliberada para deixar Timor-Leste num estado de fragilidade suficientemente perigosa para facilitar alguma intervenção uni(ou bi)lateral externa que permitisse às potências dominantes na região (EUA e Austrália) a imposição da sua vontade e o domínio sobre os recursos estratégicos e energéticos do País.

5. UMA LEITURA GLOBAL DAS CRISES


5.1. As dificuldades da leitura do real: a ocultação e o equívoco também fazem parte da vida política

Em qualquer parte do mundo e em qualquer época, a ocultação e a mentira são partes inevitáveis da vida política. As guerras e os conflitos são factos recorrentes, para não dizer permanentes, da vida humana. A própria natureza, com as suas catástrofes, intempéries, feras e doenças, é, muitas vezes, violenta e cruel. A astúcia é imprescindível à sobrevivência. Na guerra, como em muitos outros conflitos, o segredo, a camuflagem, a mentira e a surpresa, são condições determinantes para o êxito.

Como toda a gente sabe, os agentes dos serviços secretos, quando eficientes, não deixam marcas do seu trabalho. Em vez de usarem bandeiras a assinalar a sua presença, ou crachás na lapela para a sua identificação, disfarçam-se de diplomatas, jornalistas, activistas de organizações humanitárias ou religiosas, antropólogos, turistas, técnicos desportivos, potenciais investidores, empregados de mesa, prostitutas, artistas ou qualquer outra coisa que pareça razoável, em função do meio onde os serviços secretos pretendam realizar as suas acções e os objectivos visados.

Os guerrilheiros, quando executam as suas operações, fazem-no de maneira a que os inimigos se apercebam de que eles estavam lá só depois de terem caído na emboscada.

Os corruptores não declaram às finanças nem confessam publicamente que “compraram” os políticos, árbitros, juízes ou examinadores, quanto deram para eles e o que conseguiram com isso. Quando muito, utilizam uma pequena parte dos proventos assim conseguidos para fazer caridade e criarem uma imagem acima de qualquer suspeita.

Os corruptos, no entanto, têm mais dificuldade em ocultar os proventos conseguidos ilegitimamente, porque se manifestam nos bens que adquirem e na sua vida confortável, ou até faustosa, que, graças à corrupção que aceitaram, passaram a ter. Às vezes usam parte dos proventos assim conseguidos para “fazer amigos”, pagar seguranças, forjar justificações e criar uma boa imagem. Mas, mesmo assim, é mais difícil passarem desapercebidos do que os corruptores. Daí ser mais fácil identificar chefes de estado ou de governo, políticos ou juízes corruptos, do que governos, empresas, instituições ou pessoas corruptoras.

No entanto, não há corruptos sem corruptores, e quando alguém acusa outrem de ser corrupto, vale a pena perguntar quem será o corruptor, e não excluir a hipótese de ser o próprio acusador ou alguém próximo deste.

De facto às vezes quando os corruptores falham as suas tentativas de corromper algum governante, acusam-no de corrupção para lhe destruírem a imagem. Aos que se deixaram corromper, pelo contrário, os corruptores elogiam-nos, e ajudam a construir uma imagem favorável, por mais falsa que esta seja. A história está cheia de casos destes, apesar das tentativas de encobrimento que corruptores e corruptos fazem, e das enormes dificuldades de comprovar a maior parte dos casos, que geralmente existem.

Em 2004, várias empresas petrolíferas, como a Exxon Móbil Corp., a Amerada Hess Corp., a Marathon Oil Corp., e Chevron Texaco Corp. e outras, e o Riggs Bank, de Washington, foram acusadas, pela Global Witness, de corrupção, envolvendo o Presidente da Guiné Equarorial e a sua apropriação da maior parte dos lucros do petróleo do país. Apesar das campanhas de algumas empresas, nos EUA, para limpar a imagem do ditador, ao contrário do que é habitual, não evitaram um inquérito, feito pelo Senado dos Estados Unidos.

Os partidos políticos do governo, quando legislam em função deles próprios, justificam-no com o bem comum. O mesmo fazem os governantes, pois essa é a condição de poderem justificar a sua permanência no poder.

Os partidos na oposição quando falam dos governos em que não participam, geralmente é para criticar, mesmo que para isso precisem de ser parciais, omissos, exagerados ou, até, mentirosos.

A mentira, o boato, tanto como os falsos sorrisos e elogios, são parte do teatro que cada um representa, tímido e inseguro, ou movido por secretos objectivos. Às vezes os sorrisos significam, apenas, que a hora da verdade ou do acerto de contas ainda não chegou.

Os estados, quando conseguem acordos que lhes são favoráveis, falam de boas relações, e se esses acordos são injustos e opressivos, para outros estados, até tentam encobri-lo por detrás de uma linguagem de generosidade.

Raramente um estado admite que ataca ou possa atacar outro. Todos se defendem, apenas, apesar disso ser desnecessário se ninguém atacar. E se for preciso inventar um ataque fictício, um iminente perigo de ataque maciço, ou uma situação de instabilidade e insegurança, também isso se fabrica, para justificar um ataque, uma ocupação ou, até, uma invasão.

Assim sendo, a leitura política da história, sobretudo da história contemporânea, tem que ser feita não apenas com base no que se diz e mostra, mas também com base no que não se diz e não se mostra, tentando desmontar embustes e lendo nas entrelinhas.


5.2. As leituras das crises feitas por Maryaan Keady e por outros jornalistas australianos

Maryaan Keady é uma jornalista independente que cobriu Timor-Leste para a rádio da ABC (Australian Broadcasting Corporation) e da SBS (Special Broadcasting Service). Desde 2002, trabalha como “professional associate” no Columbia University’s Weatherhead Institute. Esteve, mais uma vez, em Timor-Leste, em Abril e Maio de 2006, fazendo reportagens nem sempre bem aceites pelos media australianos dominantes. Num artigo escrito por ela em 31 de Maio, algumas semanas antes de Mari Alkatiri apresentar a sua demissão, e publicado em 7 de Junho de 2006, no Semanário do Partido Comunista Australiano, The Guardian, lembra que já em 2003 escrevera uma peça em que falava das tentativas para remover o Primeiro-Ministro Mari Alkatiri do Governo de Timor-Leste.

“(…) Eu escrevi que acreditava que os EUA e a Austrália estavam apostados em desalojar o líder timorense, devido à sua postura firme nas questões do petróleo e do gás e a sua determinação em não pedir empréstimos internacionais, e que desejavam ver a assumir o poder o Presidente Xanana Gusmão, mais amistoso da Austrália.”

“Três anos depois, eu lamento dizer que aquilo que eu tinha previsto está agora a acontecer. (…)”

“Cheguei a Dili exactamente quando estalaram as primeiras manifestações, em 28 de Abril deste ano. Como testemunha visual à frente da agitação, parecia que os jovens soldados tinham ajuda externa, supostamente de políticos locais e de ‘outsiders’. A maior parte dos observadores citaram a capacidade dos soldados dissidentes de irem de um grupo vocal desarmado até centenas de manifestantes brandindo paus e armas, suscitando, entre os habitantes locais, a desconfiança de que não se tratasse de uma manifestação orgânica. Eu entrevistei muitas pessoas, desde membros da FRETILIN a políticos da oposição e jornalistas locais, e nem um único contestou o facto de as manifestações estarem a ser desviadas para ‘outros’ objectivos. O próprio Primeiro-Ministro também o afirmou. Num discurso em 7 de Maio, chamou-lhe um golpe de estado, e disse que estrangeiros e ‘outsiders’ estavam a tentar, mais uma vez, dividir a nação. Reportei isto para a ABC Rádio e perguntaram-me se a minha tradução não estaria errada. Eu expliquei, pacientemente, que não, que tínhamos visto com cuidado o texto do discurso, palavra por palavra, e que qualquer pessoa com um mínimo de conhecimentos sobre Timor perceberia que era exactamente isso o que o Primeiro-Ministro queria dizer. Mais nenhum outro órgão de comunicação social (australiano) se deu ao trabalho de assistir ao evento (em que falou Mari Alkatiri), preferindo encontrar-se com os soldados rebeldes ou com os diplomatas australianos que queriam, todos eles, que Alkatiri ‘se fosse embora’.”

“Desde a sua eleição, Alkatiri secundarizou sempre a mais importante figura da política timorense, o Presidente Xanana Gusmão, e a tensão entre os dois rapidamente se tornou visível. Alkatiri tinha uma visão diferente da de Gusmão sobre a maneira como o desenvolvimento do país devia ter lugar: lentamente, sem ‘ricos a regalar-se, atrás das portas’, foi a maneira como descreveu para mim uma segura estrutura de desenvolvimento para desenvolver uma nação verdadeiramente independente. A sua capacidade para defender os interesses timorenses sobre o petróleo e gás, contra uma Austrália agressiva e poderosos interesses empresariais, e a criação de um Fundo Petrolífero, para proteger o dinheiro do petróleo timorense de futura corrupção, nunca teve qualquer semelhança com a caricatura de um ‘ditador corrupto’ criada pelos seus detractores australianos e americanos.”

“A campanha para remover Alkatiri começou, pelo menos, quatro anos atrás. Eu registei a data em que um funcionário americano me começou a passar histórias sobre a corrupção de Alkatiri, quando eu era jornalista independente a trabalhar para a ABC Rádio. Eu investiguei as acusações e cheguei a nada, mas fiquei preocupada com o teor do criticismo dos funcionários americanos e australianos, que sugeria, claramente, que estavam a querer ver-se livres deste ‘incómodo’ Primeiro-Ministro. (…) ele não estava a fazer as coisas ao jeito deles. Depois de entrevistar a maior parte dos líderes políticos (timorenses), tornou-se claro que muitos iriam (também) até onde fosse preciso para se verem livres do primeiro Primeiro-Ministro timorense. O Presidente Xanana Gusmão, três anos atrás, não excluía a hipótese de dissolver o parlamento e formar um ‘governo de unidade nacional’.”

“Gusmão e os seus apoiantes (incluindo José Ramos Horta), privadamente designaram Alkatiri como um ‘comunista angolano’, com as suas ideias de desenvolvimento a passo lento, algo com que Xanana Gusmão e os seus apoiantes australianos não concordam. Aparte isso, é difícil perceber porque é que o Presidente Xanana Gusmão haveria de permitir forças para remover, inconstitucionalmente, o Primeiro-Ministro. Em Timor, muitos consideram Gusmão em falta, nesta matéria, por discordar do Primeiro-Ministro quanto à exoneração dos soldados (isto deveria ter sido tratado em privado), enquanto outros o vêem como o arquitecto de todo o fiasco. A sua frustração com o seu limitado papel político tê-lo-á levado a deixar-se convencer pelos seus conselheiros australianos a embarcar num sangrento e desnecessário golpe.

“Nos últimos dias ouvimos jovens escritores timorenses participantes do Sydney Writer’s Festival. Têm uma visão diferente da que os ‘media’ australianos apresentaram sobre o que se passa em Timor. Um jovem escritor disse, e citamos:”

“… é suspeito e questionável. É difícil analisar porque é que a Austrália quer lá ir. Julgo que é impelida mais por preocupações sobre a segurança económica da Austrália, incluindo o petróleo debaixo do mar, do que com o povo de Timor-Leste. ‘Eu receio que seja menos por causa da segurança dos timorenses do que por causa da segurança e dos interesses australianos’.”

“Gil Guterres, o presidente da associação de jornalistas timorenses TILJA, também disse, no mês passado, que os receios, à moda antiga, do comunismo e os interesses da Austrália estavam a conduzir a campanha anti-Alkatiri, e estavam por detrás da violência. De facto é difícil encontrar uma pessoa em Timor que não perceba que se trata de grande política, ajudada por pessoas que querem controlar o bolo do gás e do petróleo.”

“E, no entanto, a imprensa australiana está cheia de palavras sobre ‘os nossos rapazes’ de que nos orgulhamos. Isto não tem qualquer semelhança com os sentimentos no terreno nem responde à questão de saber de onde receberam os rebeldes apoio para a sua temerária campanha que fez com que tantos timorenses se sentissem ameaçados, angustiados e sem abrigo.

“Ainda esta noite testemunhas falaram de pessoal das Forças Armadas Australianas ficar parado, enquanto milícias pegavam fogo a uma igreja em Balide. Quando a violência começou, nem um único soldado das Nações Unidas interveio para travar o pequeno bando de arruaceiros, e as recentes acções das tropas australianas alimentam a especulação de que eles estão a deixar Timor arder.”

“Alkatiri, pelo seu lado, tem-se recusado a sair, dizendo que só o seu partido, a FRETILIN, lhe pode pedir para resignar. Se sair, os timorenses terão que agradecer aos media australianos pelo inquestionável apoio que deram a este golpe. Talvez eles (a comunicação social australiana) possam explicar aos cidadãos esfomeados (que já foram ignorados pela Austrália durante 25 anos) porque é que agora a Austrália controla o seu bolo do petróleo e gás. Mais importante, ainda, será os políticos timorenses que tomaram partido nesta violência, explicarem ao povo o seu envolvimento neste último capítulo da sua traumática história.”

Num outro texto da mesma jornalista, publicado uns dias antes, em 14 de Junho de 2006, esta citava um relatório de 2002 do Australian Strategic Policy Institute, sobre “New neighbour, New Challenge”, que referia a importância, para a Austrália, da estabilidade no novo país vizinho. Maryann Keady lembrava, então, que as rotas marítimas e as reservas de petróleo e gás à volta de Timor, bem como a entrada em cena de um novo actor regional, a China, eram o que preocupa a Austrália.

Falando sobre a prioridade estratégica atribuída pelo principal aliado da Austrália, os Estados Unidos, à região da Ásia-Pacífico, a jornalista australiana citava, também, um relatório do Pentágono recentemente publicado que considera que o aumento do poder militar da China “já alterou o equilíbrio de forças na Ásia-Pacífico e poderá tornar-se uma ameaça para as forças armadas da região.”. Esta afirmação levou o Ministério dos Negócios Estrangeiros da China a reagir, acusando os Estados Unidos a exagerar o poderio militar da China e dizendo que essa acusação se baseava numa “mentalidade de Guerra-Fria”.

Maryaan Keady acrescentava:

“Timor-Leste é, exactamente, um dos países da região apanhados no fogo cruzado entre dois poderosos competidores estratégicos: a China e os Estados Unidos. Infelizmente, para Timor, acontece-lhe estar junto de algumas das mais importantes passagens marítimas, principalmente o Estreito de Ombei Wetar, uma depressão de águas profundas entre os oceanos Índico e Pacífico, importante para a passagem de submarinos, que será um ponto de estrangulamento marítimo em qualquer futuro conflito.”

“Políticos e comentadores de todos os quadrantes foram cândidos sobre o que julgam ser os dilemas de Timor ao tentar equilibrar os dois gigantes. Desde a rápida mudança de fidelidade da China para Taiwan em Kiribati, até à ameaça sobre cidadãos de etnia chinesa durante os tumultos de Abril em Honiara, o factor China está a provocar o caos na região. Os autóctones temem que os poderes regionais hegemónicos, a China, os Estados Unidos e a Austrália, desempenhem um papel maior na instabilidade do que qualquer instabilidade orgânica civil.”

“A imprensa australiana preferiu ignorar, até muito recentemente, a luta estratégica maior, permitindo ao Governo Australiano envolver-se no Pacífico com muito pouco criticismo ou análise independente.

(…)

“Muito foi dito na imprensa australiana sobre o papel das divisões entre os timorenses de leste e de oeste de Timor-Leste na origem da violência, uma divisão muito conveniente se se desejar usar o caos civil como um pretexto para enviar forças militares e manter o país sob a sua esfera de influência. Mas ouviu-se muito pouco sobre porque é que, pela terceira vez, as forças internacionais não conseguiram evitar que o Povo de Timor-Leste fosse aterrorizado por uma terceira parte. Primeiro foi a fúria indonésia de 1999. Depois foi a instabilidade de 4 de Dezembro de 2002 (que levou a imprensa australiana a pressionar Alkatiri para se demitir, exactamente antes de negociações sobre o petróleo e gás). E agora, o caos civil de 2006.”

“Imediatamente a seguir à instabilidade de 2002, eu entrevistei testemunhas locais e o próprio comandante das forças das Nações Unidas e australianas acerca das queixas de que não tinham feito nada para parar o caos. Depois de muita investigação, disseram-me que um representante da ONU foi ‘particularmente’ ao gabinete do Primeiro-Ministro pedir-lhe para resignar. Foi uma curiosa resposta à perturbação da ordem pública e uma das que faz dos pretensamente apolíticos esforços humanitários da ONU uma macacada”.

Num texto divulgado em 28 de Julho de 2006 Peter Symonds cita um artigo publicado na Australian Financial Review, em 9 de Dezembro de 2002, cinco dias depois de ter sido reduzida a cinzas a casa do Primeiro-Ministro timorense. Nesse artigo, cujo título é: “Xanana Gusmão tem que assumir o controlo”, diz-se:

”Há uma generalizada desilusão com o desempenho de Alkatiri e da sua clique de velhos esquerdistas da FRETILIN, que não aprenderam nada e não esqueceram nada desde os seus tempos no falhado estado socialista de Moçambique, há mais de trinta anos”. Esse mesmo artigo conclui, afirmando que o Presidente Xanana Gusmão, pelo contrário, é “um herói nacional, um homem honesto e decente”, que “deveria ser mais do que uma figura ornamental nas críticas circunstâncias actuais.”

Na semana anterior às cerimónias da independência, o Governo Australiano enviou um jacto VIP para levar Alkatiri a Camberra, com vista a obter a sua concordância relativamente à finalização das negociações de um acordo que concedesse à Austrália a maior parte das receitas do Greater Sunrise, o maior depósito de gás do Mar de Timor. Mas Mari Alkatiri não aceitou colaborar nesse negócio que defraudaria, enormemente, os direitos e interesses de Timor-Leste.

Desconhecemos se estariam previstas vantagens pessoais para Mari Alkatiri se colaborasse com os representantes do poderoso vizinho. Sabemos que a sua atitude foi de uma grande honestidade e patriotismo, e marcou a diferença, para Timor-Leste, entre tornar-se, nesse momento, e mesmo antes de nascer oficialmente para a comunidade internacional, num estado falhado dirigido por um líder fraco e influenciável (para não dizer corruptível), ou nascer digno e com possibilidades de ser diferente de tantos outros jovens estados, cujos líderes cederam às pressões de estados ou empresas corruptoras, tornando-os estados falhados, meros joguetes de interesses estranhos aos dos seus povos.

Aparentemente foi essa atitude patriótica e honesta, juntamente com a firmeza com que continuou as negociações sobre os recursos do Mar de Timor, o principal factor determinante da inimizade do Governo Australiano para com Alkatiri.

A jornalista Maryaan Keady lembra que Richard Woolcott, que era Embaixador da Austrália em Jakarta aquando da invasão de Timor-Leste, em 1975, disse recentemente, na ABC Rádio, que um membro sénior da Administração Bush lhe tinha dito, em 2000, que “Timor será o vosso Haiti.” E a jornalista australiana continua:

“Muita coisa foi dita sobre o Haiti e a demonisação que os media americanos fizeram do Presidente Jean-Bertrand Aristide em 2004. A Austrália embarcou numa campanha semelhante contra Alkatiri. A imprensa americana chamava a Aristide e ao seu partido irrecuperáveis esquerdistas, cujo modelo era a Revolução Cultural Chinesa. Alkatiri é acusado de ser um ‘Marxista Moçambicano’, e o seu partido, a FRETILIN, ‘Comunista’, apesar do seu modelo ser mais o Primeiro-Ministro da Malásia Mahatir bin Mohamad, do que qualquer outro.”

(…)

“Os comentários de Richard Woolcott’s chegaram por cima dos relatórios sobre o falhanço das tropas australianas em garantir a segurança dos timorenses, e apenas serviram para incendiar as acusações de que a Austrália é um importante actor no caos. Fontes locais dizem que dois aviões com australianos fardados chegaram a Timor antes do pedido de ajuda ser feito à Austrália. Conselheiros australianos foram vistos a encontrar-se com rebeldes e os seus conselheiros locais. Estas acusações requerem uma investigação mais aprofundada se se pretender dissipar as suspeitas sobre o envolvimento australiano.”

O editor de assuntos estrangeiros Greg Sheridan escrevia, no Australian de 3 de Junho de 2006:

“Certamente que, se Mari Alkatiri continuar Primeiro-Ministro de Timor-Leste, isso será um chocante indício da impotência da Austrália. Se não conseguirem transformar a alavancagem de 1300 militares, 50 polícias e centenas de pessoas de apoio, carradas de ajuda e uma crítica missão internacional de socorro, em influência suficiente para se livrarem do desastroso Primeiro-Ministro Marxista, é porque não estão muito capacitados na arte da influência, da tutoria, do patrocínio e, em última instância, da promoção do interesse nacional.”

Este mesmo jornalista também escreveu, em sucessivos editoriais ao longo do mês de Junho, que era vital que a Austrália desempenhasse sozinha a tarefa de formar as forças armadas de Timor-Leste, sem qualquer interferência portuguesa. Para este jornalista Portugal é “o inimigo diplomático da Indonésia, em Timor-Leste” e Mari Alkatiri “é a chave para a sua influência.”

No mesmo sentido escreveu o editorialista Paul Kelly, sobre o plano do Governo de Howard, de acordo com o National Security Committee relativo a um plano militar e civil para o futuro de Timor-Leste:

“O objectivo é a Austrália controlar a segurança militar, a curto prazo, através da coligação que agora existe liderada pela Austrália, e influenciar a estrutura militar de Timor-Leste no longo prazo. O objectivo é minimizar a influência das Nações Unidas e de outras nações, nomeadamente de Portugal, na estrutura militar de Timor-Leste.”

A ONU poderia ficar confinada a um papel civil mais importante, na governação, nos serviços e na polícia.

Em meados de Junho o Embaixador Australiano opôs-se a uma proposta do Secretário-Geral das Nações Unidas para uma operação formal de capacetes azuis para substituir a presente força militar liderada pelos australianos, dando sinais de que a preferência australiana iria para uma intervenção do tipo da RAMSI para as Ilhas Salomão, que é caracterizada pelo controlo militar australiano exclusivo, a liderança de uma polícia multinacional e a colocação de funcionários australianos em postos administrativos chave.

Por sua vez o Embaixador dos Estados Unidos na ONU, John Bolton, em 20 de Junho, também se manifestou a favor do controlo australiano duma futura missão internacional, dizendo que era preciso “apoiar os australianos e neozelandeses que estão lá.” Curiosamente, esqueceu-se de mencionar os portugueses e os malaios que também estão em Timor-Leste em resposta ao mesmo pedido das autoridades timorenses.

Numa vídeo-reportagem da Dateline (ABC), feita pelos jornalistas David O’Shea e John Martinkus, sobre “Timor-Leste, a queda de um Primeiro-Ministro”, divulgada em 30 de Agosto de 2006, estes apresentam o resultado de numerosas entrevistas sobre a crise timorense e as possíveis causas da mesma.

Numa entrevista a Mari Alkatiri este afirma que “O Comandante da Polícia Paulo Martins lhe disse que as armas da polícia não estavam nos seus armazéns, pois tinham sido distribuídas por diferentes unidades da polícia. Ele disse que algumas dessas unidades eram de Aileu, Dili e Liquiçá.”. E o jornalista salienta que essas foram, exactamente, as regiões onde as forças anti-Alkatiri se concentraram.

Paulo Martins, por sua vez, confirma que distribuiu armas pouco antes da violência começar, e que as transferências para Aileu foram feitas para a Unidade de Reserva da Polícia. A reportagem não esclarece os motivos das transferências nem de quem terá vindo a ordem para as mesmas.

Os jornalistas mostram, nessa reportagem, a carta que os dois bispos timorenses escreveram ao “Senhor Francisco Guterres ‘Lu-Olo’, Presidente do Parlamento, Presidente da FRETILIN” em 25 de Abril de 2005.

Nessa carta os bispos escrevem:

“Os cidadãos deste país não se sentem identificados com o modelo de sociedade, cujas bases este governo quer impor à sociedade timorense, modelo completamente exterior e desenraizado das nossas realidades culturais, sociais e históricas.”

Mais adiante os bispos pedem ao Presidente do Parlamento e da FRETILIN (…) “que decida a imediata remoção do actual Primeiro Ministro, Dr. Alkatiri e o seu governo, e indigite um novo Primeiro Ministro, que imediatamente formará governo.”.

Segundo os jornalistas da Dateline, não tendo a Igreja obtido uma resposta favorável a esta carta, dois padres terão procurado altos comandantes das F-FDTL instando-os a removerem Alkatiri. Um dos padres alegadamente envolvido nesses contactos respondeu ao jornalista, quando este procurou saber se isso seria verdade, que não podia dizer nada. O Bispo Dom Ricardo da Silva, também indagado pelo mesmo jornalista, respondeu, obviamente, que tal não era verdade.

Os repórteres afirmam também que, segundo fontes do topo da hierarquia militar, o Chefe das Forças Armadas de Timor-Leste, o Brigadeiro-General Taur Matan Ruak e o Tenente-Coronel Falur Rate Laek, foram abordados, por duas vezes, em finais de 2005, por quatro pessoas, dois líderes timorenses e dois estrangeiros de língua inglesa, que Mari Alkatiri diz não saber se eram americanos ou australianos. O objectivo era, mais uma vez, convencer as F-FDTL a remover Mari Alkatiri do governo. E mais uma vez as chefias militares recusaram envolver-se num tal golpe.

Nemécio de Carvalho, ex-líder de uma milícia pró-Indonésia, também foi entrevistado por O’Shea e Martinkus. Segundo ele, a crise resulta do facto de que Xanana, que foi o chefe da Resistência, não ter agora qualquer poder. “Apenas tem um papel simbólico, de acordo com a nossa Constituição.” E acrescenta: “Tem que haver crise e instabilidade, inclusive guerra. Assim ele pode desempenhar um papel, em tal situação. Sem conflito, sem instabilidade, sem anarquia e guerra, talvez ele nunca pudesse ter mais poder.”

Xanana Gusmão, por sua vez, quando o jornalista lhe diz que algumas pessoas pensam que o que aconteceu foi um primeiro golpe da Austrália, responde: “Não, eu já disse às pessoas que estamos muito conscientes dos nossos erros, das coisas que fizemos bem e das que fizemos mal.”

Por sua vez, Mari Alkatiri, entrevistado pelos mesmos jornalistas, esclarece que “O que a Austrália está a tentar conseguir, é ter o (gás do) Sunrise enviado para Darwin. Esse é o interesse da Austrália. Mas os meus interesses não podem coincidir sempre com os interesses da Austrália, e vice versa, essa é a realidade”.

Noutro ponto da sua entrevista Mari afirma:

“O que eu fiz, durante o meu mandato (como Primeiro-Ministro), foi defender os interesses do meu povo para ter os recursos para desenvolver este país, com independência. Não para ser dependente. Eu tenho plena consciência dos direitos que temos; ainda temos direitos sobre o Mar de Timor e temos que os defender. Não porque eu sou contra os australianos. Eu gosto muito da Austrália como país, como nação e como povo. Eu nunca seria anti-Austrália.”

Quando John Martinkus lhe pergunta:

“Tem alguma prova de que a Austrália está, de algum modo, envolvida nos esforços para conseguir a sua resignação?, Mari Alkatiri responde:

“Provas, não. Mas o único Primeiro-Ministro do mundo que me ‘aconselhou’, e digo isto entre aspas, a demitir-me, foi o Primeiro-Ministro da Austrália, nesses dias, naqueles dias difíceis.”

E o jornalista acrescenta que, poucos dias depois de tomar posse como novo Primeiro-Ministro, um dos primeiros actos de Ramos Horta foi presidir à histórica assinatura do primeiro contrato de partilha, entre os dois países, de resultados da produção de petróleo. A sua justificação foi a de que era preciso ser realista e pragmático, acrescentando: “A Austrália não pode ser sempre filantrópica, em tudo o que faz relativamente a Timor-Leste.”

Por sua vez o Ministro da Energia, José Teixeira, à pergunta do jornalista sobre se ele achava que Timor-Leste estava a conseguir uma negociação justa nos acordos sobre os lucros relativos ao petróleo e ao gás, este afirmou:

“Não é o resultado ideal, mas é o resultado pragmático para obtermos algum lucro.”


5.3. Uma leitura global das crises

Em todas as crises que temos vindo a estudar, coincidem factores internos, com o Presidente, a Igreja ou ambos em conflito com o Governo, por um lado, e factores externos, relacionados com os interesses estratégicos e económicos da Austrália e dos EUA, por outro, e é difícil separá-los porque os factores e actores internos ajudam e potenciam o jogo dos externos, e os externos ajudam e potenciam (ou até provocam) o jogo dos factores e actores internos.

Para maior facilidade de análise iremos, no entanto, esquematizar e simplificar o que é complexo, e separar o que, na realidade, anda junto e entrelaçado.


5.3.1. Uma política de exclusão, centrada na FRETILIN, levou a um progressivo isolamento do Governo, com a alienação de sectores cada vez mais amplos da sociedade timorense

Desde que, em 12 de Dezembro de 1978, Alarico Fernandes, Ministro da Informação, se entregou aos ocupantes e a Rádio Maubere deixou de funcionar, a Resistência Timorense perdeu, quase completamente, o contacto com o exterior. Nicolau Lobato, a grande referência da Resistência e incontestável líder, desde que o Primeiro Presidente fora destituído e também se entregara, continuou a luta, mas foi morto em combate em 31 de Dezembro de 1978, pouco mais do que quinze dias depois da rendição de Alarico Fernandes. A partir daí a Resistência ficou decapitada. As bases da Resistência foram caindo, umas atrás das outras, na posse do inimigo, e as suas forças foram quase completamente arrasadas. Em Fevereiro de 1979 restavam vivos, no interior de Timor-Leste, apenas 3 (três!) dos cerca de cinquenta membros do Comité Central da FRETILIN, e estavam sem contacto entre si.

Foram precisos dois anos para restabelecer contactos e organizar uma reunião, nas montanhas, entre os principais líderes timorenses.

Nessa Conferência Nacional da FRETILIN, que teve lugar de 1 a 8 de Março de 1981, houve a preocupação de tentar seguir as pisadas dos heróicos líderes históricos da FRETILIN. Foi criado o Conselho Revolucionário da Resistência Nacional, e Xanana Gusmão tornou-se o Comandante-em-Chefe das FALINTIL, tendo assumido, com o acordo dos outros dois membros do Comité Central, a liderança da FRETILIN no interior.

Apesar da preocupação inicial de seguir as pisadas dos heróicos líderes nacionalistas anteriores, o radicalismo expresso pelo slogan “conversar, não e nunca”, foi sendo substituído pela procura de uma solução político-diplomática em que o diálogo e a “convivência com o inimigo” passaram a ter pleno lugar.

Já atrás referimos os encontros que, nos finais de 1982 e princípios de 1983, Xanana Gusmão teve com membros da Igreja Timorense, nomeadamente com o Padre Locatelli (Salesiano) e com Dom Martinho da Costa Lopes, Administrador Apostólico da Diocese de Dili (com as funções de bispo), com o Governador Mário Carrascalão, e, depois, com o Comandante Militar Indonésio. Desses encontros, e do cessar-fogo então estabelecido, que durou de finais de Março até princípios de Agosto de 1983, resultou uma Resistência completamente diferente.

A arte de conviver com o inimigo substituiu, progressivamente, e contra a opinião e, até, com a oposição de alguns chefes militares e membros da FRETILIN, a política da confrontação, que tinha conduzido à quase completa extinção da Resistência.

O seu carácter revolucionário, marxista-leninista, foi-se perdendo.

O realismo político e a consciência do efectivo enquadramento regional e geoestratégico, foi substituindo a miragem do apoio dos países comunistas, que nunca chegou a Timor-Leste.

Os líderes que tinham saído para o exterior viviam, predominantemente, em Moçambique ou Angola, países que se tinham tornado independentes graças a um apoio efectivo da União Soviética ou de outros países comunistas. O apoio e a generosidade dos governos comunistas e dos governantes marxistas-leninistas desses países, quer à luta diplomática, quer aos líderes timorenses, muito mais solidários, de facto, do que a hesitante solidariedade e apoio português, durante muitos anos, serviram para confirmar, nesses líderes, a convicção da correcção das suas opções revolucionárias. Por isso continuaram a viver o sonho revolucionário inicial, que deu corpo e alma à FRETILIN, que impulsionou a resistência e animou o Povo Timorense nos seus primeiros anos de luta.

Embora o respeito mútuo e, nomeadamente, a admiração dos líderes no exterior relativamente aos heróis que continuavam a lutar, em tão difíceis condições, no interior, evitasse rupturas formais e definitivas, de facto o afastamento entre a liderança da Resistência, no interior, e a liderança da FRETILIN, no exterior, foi-se acentuando, criando-se um fosso que se tornou quase intransponível.

Aquilo de que Xanana Gusmão sentia precisar, do exterior, não era a retórica marxista-leninista dos seus companheiros. Precisava, naturalmente, das suas campanhas políticas e diplomáticas, mas mesmo essas, só se não alimentassem a imagem revolucionária, que importava apagar para não assustar os vizinhos (australianos e indonésios) e os seus amigos americanos e europeus, Portugal incluído.

Por isso Xanana Gusmão voltou-se para a CDPM (Comissão para os Direitos do Povo Maubere) e para Luísa Teotóneo Pereira, figura de proa da mesma, e para Ramos Horta, que nunca fora marxista-leninista e se tornara um excepcional diplomata, com sentido da realidade mundial e capaz de lidar com políticos de todos os quadrantes políticos e países, nomeadamente os anglo-saxónicos, dominantes na política internacional. Foi no diálogo com estas duas personalidades do exterior que Xanana Gusmão foi afinando a sua percepção da realidade política mundial, e foi com elas, mais do que com a FRETILIN do exterior, que articulou acções, dentro e fora do território, e foi abrindo brechas na fortaleza ocidental que apoiava a ocupação e dava cobertura ao governo e ao exército indonésios.

Xanana também precisava de apoio financeiro, viesse ele de onde viesse, mesmo que fosse dos amigos marxistas-leninistas da causa. O dinheiro não tinha cor política nem ideologia, e servia para comprar muita coisa imprescindível para a continuação da luta. Xanana Gusmão sabia e sabe isso melhor do que ninguém.

Neste quadro, desenvolveram-se, sobretudo desde 1988, quando Xanana Gusmão confirmou a sua saída da FRETILIN, duas realidades e duas concepções, no seio da Resistência, cada vez mais diferentes, até se criar um abismo entre elas.

É de admitir que quando a independência chegou, alguns líderes políticos da FRETILIN que viveram nos PALOP, tenham visto em Xanana Gusmão um excepcional Chefe da guerrilha, mas o tenham considerado relativamente ignorante do que seja um estado, como se estrutura, regulamenta e funciona. Aliás a postura do Presidente Xanana Gusmão em importantes cerimónias do próprio Estado, às vezes mais parecida com a dum fotógrafo ou de um pai de família em passeio com as crianças, seria disso mesmo um sinal.

Por isso, e porque o afastamento de Xanana da FRETILIN foi sentida, no passado, como uma traição, e ainda não foi feita a reconciliação necessária para curar essas feridas, desde o regresso dos líderes a Timor-Leste, Xanana Gusmão depois de sete anos preso em Jakarta, Mari Alkatiri depois de 24 anos de exílio em Moçambique, a falta de confiança de Mari em Xanana manteve-se, e ter-se-á mesmo acentuado no Congresso do CNRT realizado em Dili em Agosto de 2000, pelos motivos já atrás referidos.

É de admitir que Xanana Gusmão, tenha tido dúvidas sobre a melhor forma de estruturar o Estado. Possivelmente até terá sentido a necessidade de ter alguém, em Timor-Leste, com experiência do que é um estado, como se estrutura e funciona, e para isso precisaria de Mari Alkatiri, Ana Pessoa ou alguém com um perfil parecido.

Mas, para Xanana Gusmão, o Congresso do CNRT também terá servido para confirmar, com desgosto, a fixação dos principais líderes da FRETILIN vindos do exterior, nomeadamente de Moçambique, nas imagens e conceitos irrealistas do passado, recusando a reconciliação com as vítimas desse mesmo passado e do radicalismo então prevalecente. A falta de confiança de Xanana em Mari e noutros líderes da FRETILIN, nomeadamente da eis Frente Externa, ter-se-á acentuado.

Tendo saído de cena o inimigo em torno do qual foi forjada a unidade, esta esboroou-se. O Congresso do CNRT realizado em Dili, em Agosto de 2000, não foi apenas o começo do fim do CNRT. Foi o congresso da ruptura entre a liderança timorense.

Pouco depois do Referendo de 30 de Agosto de 1999, Mari Alkatiri regressou a Timor-Leste. Aí pôs todos os seus muitos conhecimentos, excepcional experiência, grande inteligência e enorme determinação, ao serviço do seu Povo e da sua Pátria, na estruturação do Estado Timorense. Fê-lo com enorme dedicação e seriedade. E conseguiu resultados que ninguém mais seria capaz de conseguir, e que marcarão, para sempre, o futuro do seu país, das gerações actuais e futuras. A legislação sobre o Fundo Petrolífero é exemplar e quase única em todo o Mundo, e a Mari se deve.

Mas, como toda a gente, também Mari cometeu erros.

O mais grave de todos foi eliminar, politicamente, o líder histórico da Resistência, ao amarrá-lo, constitucionalmente, a um lugar meramente figurativo, de Presidente sem funções.

Talvez ninguém se tenha apercebido da gravidade da decisão que a Assembleia Constituinte tomou nessa altura. O próprio Xanana Gusmão não foi capaz de dar um sinal de alerta ou manifestar a sua discordância, de forma clara e audível. Os partidos da oposição também não o fizeram. Se manifestaram a sua discordância, não o fizeram com a veemência que a gravidade da decisão exigia. Nessa altura, não houve mortos nem incêndios de casas, mas foram, inconscientemente, criadas as condições para que isso pudesse vir a acontecer.

Seguro, a partir daí, da não interferência de Xanana na governação, Mari Alkatiri não se deu ao trabalho ou não foi capaz de construir, com ele, a relação de confiança que era imprescindível. Não beneficiou, por isso, da sua visão global e prospectiva de visionário. Não aproveitou da sua intermediação para o aproximar do Povo e da sociedade timorense, que Xanana conhecia e ainda conhece, e sentia e ainda sente como ninguém.

Não seguiu o conselho de Xanana Gusmão para criar um governo de unidade nacional. Com isso, à marginalização de Xanana Gusmão acrescentou a marginalização das outras forças políticas, impedindo que o primeiro governo se tornasse numa escola para políticos de vários quadrantes.

Mari Alkatiri considerava que para ter eficácia e não se transformar num segundo Parlamento, o Governo tinha que ser do partido mais votado (que detinha a maioria absoluta no Parlamento Nacional). Poderia ter alguns independentes, mas não membros de outros partidos, sob pena de perder a coerência e coesão.

Para Xanana Gusmão, que sabia quão importante tinha sido a Convergência Nacionalista e a despartidarização das FALINTIL, para conseguir uma unidade nacional suficientemente forte para vencer os enormes obstáculos que se opunham à libertação do seu Povo, a fragilidade do estado e da sociedade timorenses exigia, nos primeiros anos pós autodeterminação e independência, um esforço inicial de consolidação da unidade nacional. Só depois do estado, e da própria sociedade timorense, terem alcançado uma solidez suficiente, se deveria passar a uma fase mais avançada em que a existência de governos partidários já não comportasse tantos riscos de fractura e descoesão. Aparentemente esta seria a lógica do Presidente da República por trás do seu favorecimento de um Governo de Unidade Nacional.

É evidente que uma tal solução daria a Xanana Gusmão a oportunidade de imprimir a sua marca na condução dos assuntos do Estado, nomeadamente na sua governação. Seria necessária uma boa relação de confiança entre o Presidente e o Primeiro-Ministro para esta solução funcionar.

O autor procurou contribuir para esse bom relacionamento quando convidou, simultaneamente, os dois líderes, para uma conferência realizada no Porto, em Outubro de 2001 (foi a conferência inaugural do IASI, a que preside).

A história viria a revelar que uma boa relação de confiança entre o Presidente e o Primeiro-Ministro era necessária não só para se criar um governo de unidade nacional, mas também para o funcionamento, sem sobressaltos, de qualquer outra solução governativa.

Uma postura pouco inclusiva, da FRETILIN e da sua liderança, dificultou a participação política de terceiros, frustrou expectativas e abriu espaço para o descontentamento e a revolta.

Com a sua fria distância e aparenta arrogância, Mari alienou uma parte significativa da sociedade timorense. O seu passado Marxista-Leninista e as aproximações à China e a Cuba, assustaram a hierarquia da Igreja timorense e, também, a Austrália e os Estados Unidos, e serviram de argumento para campanhas para o denegrir.

O conflito aberto com a Igreja Timorense, com a decisão de fazer uma experiência de ensino facultativo de religião nalgumas escolas, contribuiu para que esta, também, se sentisse marginalizada e, sobretudo, ameaçada.

A lentidão do desenvolvimento, em grande parte fruto das circunstâncias e das chantagens australianas, mas não só, alienou muitos jovens desempregados e contribuiu para a crise social.

A sua experiência moçambicana suscitou, em muitos, a dúvida se iria favorecer e fortalecer uma vivência democrática, multipartidária, de modelo ocidental, em Timor-Leste. A forma como amarrou constitucionalmente Xanana Gusmão, como asfixiou financeiramente a Presidência e os partidos políticos, e como lidou com a Igreja, aumentou essas dúvidas.

A forma como as regras de candidatura e de eleição da liderança da FRETILIN foram alteradas, à última hora, no último Congresso deste partido, foram lidas por muitos, quer interna quer internacionalmente, como um sinal claro de que vinculação democrática da liderança saída do Congresso não era a desejável, não podendo, por isso, inspirar confiança.

A incompetência com que o Governo da FRETILIN, liderado por Mari Alkatiri, tratou a crise no seio das Forças Armadas, originou uma situação gravíssima, que pôs em risco o próprio Estado.

O aparecimento de armas nas mãos de civis, foi catastrófica.

Xanana sabe, com o saber e a sabedoria de quem sente e de quem é visionário, que construir um estado forte é muito importante. Mas também sabe que um estado sem uma sociedade estruturada, um estado ‘democrático’ sem uma sociedade democrática, em que a democracia se viva, se sinta e se pratique no dia a dia, nem é forte nem é democrático. Mesmo que seja formalmente democrático (ou aparente sê-lo), oprime, em vez de libertar o Povo e as suas energias e criatividade. E, ao fazê-lo, enfraquece o Estado e torna-o presa fácil de interesses estrangeiros.

Sentindo, como grande parte do seu povo, que não estava a ser implantada uma estrutura verdadeiramente democrática, aberta à efectiva participação de todos, Xanana não se preocupou com as regras formais, mas sim com a criação das condições para uma efectiva vivência democrática, como em 7 de Dezembro de 1987 sonhava e escrevia na mensagem que atrás (no ponto 2.5.2.) citamos.

É neste contexto que se podem ler as atitudes, às vezes desajeitadas, do Presidente timorense, que alguns consideram configurar um golpe anticonstitucional. Parece-nos que, de facto, é a Constituição, por um lado, e o exercício pouco democrático do poder, por outro, que estão em causa, e que Xanana Gusmão presumivelmente afrontará, com o objectivo de realizar a segunda parte do desígnio da independência, que é a libertação do Povo. Fá-lo como líder, com os instrumentos que conhece, contra os formalismos legais de quem conhece o direito e os seus artifícios.

É neste contexto, também, que se poderão perceber as reacções de uma parte significativa do Povo, cuja hostilidade para com o Governo e para com o seu Chefe, Mari Alkatiri, foram crescendo, até à sua demissão.

Apesar de ser um grande patriota e das suas excepcionais qualidades de estadista, Mari Alkatiri não soube, ainda, apesar da maioria da votação na FRETILIN nas únicas eleições parlamentares até agora realizadas, colmatar, devidamente, o fosso que o separa do Povo, do seu líder carismático, da Igreja timorense e da realidade psicológica de quem permaneceu no interior.

Com o Presidente manietado, e por isso mesmo impedido de actuar e desresponsabilizado, e sem a sua ajuda, Mari Alkatiri e o seu Governo, não foram capazes de se aperceber da gravidade dos problemas sociais e políticos crescentes, nem enfrentá-los devidamente.

Sem o Comandante Supremo das Forças Armadas ter poderes e meios adequados ao exercício dessas funções, foi o Governo que ficou com a responsabilidade pela gravíssima crise que quase destroçou a Polícia e o Exército e pôs o país à beira do caos, deixando a soberania do estado em grande parte em mãos estrangeiras.

A ruptura entre as lideranças de Xanana e da FRETILIN, nos anos oitenta, primeiro, mais acentuada no Congresso do CNRT, em 2000, e progressivamente crescente, daí em diante, foi a primeira e mais importante causa das crises que Timor-Leste tem sofrido, desde que viu a sua independência reconhecida, em 20 de Maio de 2002.

Infelizmente, Xanana Gusmão, que foi tão eficaz na convivência com os seus inimigos ocupantes e transformou a relação mútua de sangrento confronto numa relação de convivência com o inimigo, numa primeira fase, até se tornar numa relação de franca cooperação e amizade, após a independência, ainda não conseguiu, com a FRETILIN de que foi membro e líder, ou, pelo menos, com a sua liderança, transformar a relação de pouca confiança e algum confronto, que houve no passado, numa relação de franca cooperação e amizade, sem exclusão, naturalmente, dos outros partidos.


5.3.2. A insuficiente confiança nas relações com a Austrália, suscitou a sua apetência para intervir

Quando um jovem e ainda pouco sólido país tem recursos naturais ou estratégicos importantes, os poderosos, quer sejam estados ou empresas, atiram-se como abutres sobre os mesmos, desde que tenham condições para o efeito. Esquecem, então, todos os princípios, sobretudo os mais apregoados. Se para a rapina ser mais fácil e completa, for preciso fomentar divisões internas e tornar falhados os estados nascentes, não se importam de contribuir para isso.

É isso o que se tem visto, pelo mundo fora. O caso da guerra do Biafra, nos anos sessenta, em que morreu mais de meio milhão de nigerianos, é apenas um exemplo. Nesse conflito, apoiado por uma empresa e interesses britânicos, de um lado, e por uma empresa e interesses franceses, do outro, cabe perguntar se a principal motivação para a guerra eram as diferenças étnicas e religiosas, como na altura tanto se apregoou, ou eram os interesses sobre o petróleo nigeriano desses dois grupos empresariais e dos estados que as apoiavam.

Infelizmente há muitos outros exemplos, alguns deles bem recentes, em que interesses estrangeiros se aproveitaram e alimentaram conflitos internos na tentativa de melhor controlar o acesso (e as condições de acesso) às riquezas naturais de estados frágeis. Para os respectivos povos a consequência prática mais concreta da existência de recursos num país pouco consolidado, é, quase sempre, a guerra e a miséria. É aquilo a que se costuma chamar ‘a maldição dos recursos’.

Havendo recursos importantes, não são apenas as interferências estrangeiras, mas também os conflitos internos que se agudizam, movidos pelo desejo de pessoas ou grupos autóctones de ficarem com uma parte do bolo, tão grande quanto possível.

Neste quadro a actuação de Mari Alkatiri e a legislação sobre os recursos petrolíferos e a sua gestão, são uma exemplar excepção.

Seria desejável que o comportamento do Governo Australiano também fosse de excepção. Mas a sua decisão de se colocar à margem da justiça internacional, deu dele um péssimo sinal. Foi um mau começo para quem dizia pretender ajudar Timor-Leste a tornar-se um estado viável.

Foi uma atitude completamente diferente da tomada pela Austrália, recentemente, quando acordou a fronteira marítima com a Nova Zelândia, pela linha mediana.

Perante esta dualidade de critérios, poder-se-á perguntar porque é que Timor-Leste foi sempre tratado, pelos sucessivos governos australianos, de uma maneira tão diferente da Nova Zelândia.

Talvez a resposta mais verdadeira seja a de que, para a Austrália, a Nova Zelândia é, não apenas, um estado consolidado e estável, mas também um parceiro com o qual existe uma relação de confiança.

Possivelmente a segunda causa das crises por que Timor-Leste tem passado resulta de não ter sido capaz de estabelecer relações de suficiente confiança com a Austrália e com os Estados Unidos.

Conseguiu-as com a Indonésia, o que poderia, à partida, parecer mais difícil, porque apostou e investiu nisso, e também porque encontrou, nos sucessivos governos indonésios resultantes de eleições democráticas, uma enorme compreensão e desejo de reconciliação, de modo a facilitar a construção de um novo futuro. Mas não as conseguiu, ainda, com a Austrália e com os Estados Unidos.

A crispação nas negociações com a Austrália, relativamente aos recursos petrolíferos do Mar de Timor, fruto natural da ilegítima e injustificada rudeza dos seus governantes para com o Governo Timorense, não deixaram grande espaço psicológico para analisar, serenamente, os legítimos interesse dos Estados Unidos e da Austrália em relação a Timor-Leste e aos mares circundantes.

E, por isso, não foram, ainda, dados os passos necessários para se discutirem esses interesses, lado a lado com os legítimos interesses timorenses, para se estabelecerem eventuais acordos e práticas de convivência que dêem garantias suficientes de respeito mútuo e cooperação franca entre todas as partes, as três referidas e a Indonésia também.

6. QUESTÕES QUE AS CRISES LEVANTAM E QUE DEVERÃO SER CONSIDERADAS NO FUTURO


6.1. A viabilidade de Timor-Leste, como estado independente, depende do estabelecimento e manutenção de relações de confiança com os seus vizinhos


6.1.1. A história de Timor-Leste, como a de quase todas as nações, é uma história de dependências

A história de Timor-Leste, tal como a de muitos outros países, mostra, com liminar clareza, que o seu estatuto e viabilidade dependeu, sempre, de interesses estrangeiros, longínquos ou próximos.

O sândalo atraiu os navegadores e comerciantes malaios e chineses, e, depois, os portugueses. Os missionários católicos vieram com eles e, século e meio mais tarde, começou a estabelecer-se uma incipiente administração colonial, que só se afirmaria, de facto, no início do século vinte.

Em 1941, a invasão australo-holandesa justificou a invasão japonesa e implicou o envolvimento dos timorenses na II Grande Guerra, com as terríveis consequências de mais de sessenta mil mortos, além de fomes, violações e todos os outros dramas associados à guerra.

Em 1975 foram os interesses australianos e ocidentais que determinaram a invasão por militares indonésios, também eles mais ao serviço de interesses estrangeiros, no quadro da Guerra-Fria entre a União Soviética e os Estados Unidos, do que de interesses próprios. Daí resultou uma ocupação de 24 anos, com todos os mortos e traumas consequentes.

Os indícios do envolvimento australiano e americano nas três crises, de 2002 a 2006, já atrás os referimos.

Uma conclusão parece óbvia:
Apesar das ilusões que a independência formal possa alimentar, os interesses dominantes, a nível regional e mundial, têm desempenhado um papel determinante sobre a realidade política, económica e social timorense.

Confrontar esses interesses externos e globais ou ignorá-los, tem consequências dramáticas. Ou o Povo Timorense tem motivações suficientemente fortes para isso, dispõe-se a lutar e aceita sofrer durante muitos anos, com fortes probabilidades de perder muito mais do que o que possa, eventualmente, vir a ganhar, ou procura adaptar-se à realidade envolvente e tirar da situação real o máximo proveito possível, e, sobretudo, as condições necessárias para o seu desenvolvimento e para a consolidação do Estado e da vida democrática.

Estabelecer ou consolidar relações de confiança, sobretudo com os vizinhos mais próximos, a Indonésia e a Austrália, é quase uma condição de sobrevivência, e como tal deve ser tratada, mesmo que isso obrigue a relegar para segundo plano questões de justiça susceptíveis de originar problemas ainda maiores e difíceis de sanar do que os que viveu recentemente Timor-Leste.


6.1.2. Para continuar a manter a preciosa relação de confiança que tem tido com a Indonésia é fundamental que Timor-Leste não exija reparações

Relativamente à Indonésia, os líderes timorenses tiveram, até agora, o bom senso de pôr os interesses timorenses, relativamente à construção do seu futuro, acima das exigências da justiça. Por mais naturais que estas sejam, a prática corrente, desde sempre, é que quando uma guerra ou conflito termina por acordo entre as partes e não pela completa derrota de uns e a vitória de outros, as exigências de reparações e de justiça deixam, por esse facto, de fazer qualquer sentido. É esse o pressuposto básico de qualquer acordo. Se não o fosse, os beligerantes teriam tendência a prolongar os conflitos até à completa derrota de uma das partes, com custos e injustiças ainda maiores e mais irremediáveis (sobretudo quando há mortos ou graves traumas) do que as que poderiam ser objecto de qualquer reparação, por maior que esta fosse.

Pode e deve a comunidade internacional organizar-se, quer em termos de direito quer de tribunais e poderes coercivos suficientes para evitar que se cometam crimes contra a humanidade e graves violações dos direitos humanos ou, quando, apesar de tudo, esses crimes ocorrerem, para punir os autores, quer materiais quer morais, de tais crimes. Mas é a humanidade que se deve ocupar disso, e de forma preventiva.

Quem, como os timorenses, aceitou uma oferta do estado indonésio, para uma solução pacífica e democrática do conflito em que estava envolvido, perdeu, por esse mesmo facto, a legitimamente política para exigir quaisquer reparações. Era mais importante encontrar uma saída honrosa para o conflito, que evitasse mais mortes, sofrimentos e traumas, do que prolongá-lo indefinidamente, até uma muito longínqua e até improvável vitória.

Além disso, como seria possível fazer justiça condenando os executores materiais de crimes sem condenar os seus autores morais? E como fazê-la se grande parte dos políticos internacionais tiveram responsabilidades, por acção ou omissão, no drama timorense de 1975 a 1999?

Os líderes timorenses que, no seu realismo político, aceitaram a oferta da liderança indonésia, então personificada no Presidente Habibi, prestaram um enorme serviço ao seu povo. Os líderes timorenses que, depois disso, honraram os pressupostos dessa proposta e da sua aceitação, recusando-se a exigir julgamentos de militares indonésios, continuaram a prestar um importante serviço ao povo timorense.

Os líderes timorenses e indonésios que souberam dissolver os ressentimentos e diminuir os riscos da eternização do conflito, por outras vias, nomeadamente pelas exigências de justiça e suas inevitáveis retaliações, e se dispuseram a construir a amizade sobre um drama que, apesar de posições e situações diferentes, não deixou de ser um drama comum, prestaram e prestam um enorme serviço aos povos de Timor-Leste e da Indonésia, à paz e estabilidade interna destes países e da região.

O facto de terem a preocupação de registar o que se passou, permitirá um julgamento mais profundo e sério, no futuro, ao longo dos séculos. Então será possível avaliar as responsabilidades tendo em conta o contexto e as condições em que os crimes tiveram lugar, e tirar ilações sobre os factores determinantes das grandes violações de direitos humanos e das formas de comportamento e de organização que poderão minimizar os riscos de situações semelhantes voltarem a ocorrer.

Para as vítimas, o registo, tornado permanente, é o reconhecimento da violação dos seus direitos e do seu sofrimento, por um lado, mas também, em muitos casos, o reconhecimento da sua heróica abnegação, coragem e generosidade, que a justiça nunca seria capaz de valorizar devidamente. Nesse sentido, é uma reparação maior do que a que qualquer justiça poderia proporcionar.

De facto a justiça não se faz apenas pela retribuição, ela faz-se, também, pela reconciliação. Os cristãos saberão que, nos Evangelhos, o perdão e o Amor estão muito acima da justiça, e contam muito mais do que esta na história da salvação de cada um e de cada comunidade.

O respeito pelas vítimas pode exigir mais do que o registo das violações dos seus direitos, e incluir uma atenção mais continuada a eventuais situações de stress pós traumático.

Mas, como dizia Xanana Gusmão em artigo publicado no Semanário de 13 de Março de 2005, “se resistimos, para defender um grande ideal, somos heróis, não somos vítimas”. A própria Constituição timorense fala de heróis, “os quais dedicaram as suas vidas na luta pela independência e soberania nacional”, e não de vítimas. Por respeito para com a própria dignidade dos timorenses, mesmo os que não combateram de armas na mão, que viram os seus direitos violados por terem tomado parte, duma forma ou de outra, na heróica gesta da luta de libertação do seu Povo e da sua Pátria, é necessário que as preocupações com a justiça, sempre incompleta e falível e tantas vezes enganosa, não reduzam os heróis e as heroínas timorenses à condição de simples vítimas.


6.1.3. Estabelecer relações de confiança com a Austrália é fulcral para o futuro de Timor-Leste

Apesar do Governo da Austrália ter tido um gesto inamistoso para com Timor-Leste, ao retirar-se das instâncias internacionais de arbitragem de questões relacionadas com o mar, e de ter desempenhado algum papel na saída de Mari Alkatiri do Governo, é do maior interesse para Timor-Leste estabelecer e desenvolver uma boa relação de confiança, privilegiada, com a Austrália (como com a Indonésia).

Nesse quadro de confiança entre vizinhos, Timor-Leste poderá ter muito boas relações com a China ou com qualquer outro país. Sem esse quadro de confiança com a Austrália, as relações com a China assustam a Austrália, e também os Estados Unidos, e levam a reacções muito prejudiciais para Timor-Leste.

Ficaria bem ao Governo Australiano voltar a aceitar a jurisdição das instâncias internacionais de que se retirou em 2002. Seria um factor muito positivo para as relações entre a Austrália e Timor-Leste, seria um bom exemplo para as relações entre os estados da região (onde há tantas disputas fronteiriças e interesses económicos envolvidos), dar-lhe ia uma credibilidade e prestígio que perdeu, quer internacionalmente, quer perante a sua própria população, que tem uma longa tradição democrática. Além disso evitaria que a Austrália continuasse a ser perseguida pelo fantasma da ilegalidade e injustiça que tem vindo a praticar.

Era importante que a Austrália tivesse um gesto de respeito para com Timor-Leste e as suas imperiosas necessidades de desenvolvimento, aceitando, de forma construtiva, que o processamento de gás natural do principal poço no Mar de Timor fosse feito em território timorense. Este, com efeito, é um projecto que pode dar trabalho a muitos timorenses e servir de instrumento para a criação de pequenas empresas de serviços no jovem país.

Em 9 de Maio de 2006, Philip Adams escrevia no Australian que muitos diplomatas e empresários ocidentais receavam que Mari Alkatiri, ao insistir em ter as instalações para o processamento do gás em território timorense, pudesse estar a pensar em abrir as portas a uma presença chinesa demasiado próxima da Austrália. Apesar de o Governo Timorense liderado por Mari Alkatiri ter dado provas de uma excepcional isenção nas decisões sobre concursos internacionais, inclusive publicando, na íntegra, os respectivos relatórios em que baseou as suas decisões, o realismo político talvez recomendasse que se desse atenção a esses receios, e que estes fossem apreciados e discutidos, até se encontrar uma solução equilibrada que não pusesse nem ponha em causa a efectiva soberania timorense. Para os timorenses será mais importante ter uma soberania limitada mas real, do que ter uma soberania aparentemente absoluta, mas meramente fictícia, com o risco de o seu país se tornar um estado falhado. E pode ser mais útil transformar uma fonte de conflito num motivo para desenvolver a cooperação, como acontece com a Comissão de Verdade e Amizade indonésio-timorense, do que insistir na afirmação de direitos que, por mais consagrados que possam estar, são mais geradores de conflitos e de miséria do que de paz e desenvolvimento.

Valeria a pena ponderar, no quadro de relações equilibradas e múltiplas, a possibilidade, as vantagens e os inconvenientes de Timor-Leste eventualmente estabelecer um qualquer tipo de acordo ou tratado de cooperação na defesa e segurança dos dois estados e da região, eventualmente envolvendo também a Indonésia, e, em todo o caso, na condição de isso não afectar, minimamente, as suas relações com a Indonésia.

E poderia ser muito útil haver diálogos frequentes e francos entre governantes e outros líderes timorenses e australianos, sem prepotências e ameaças, e o crescente desenvolvimento de parcerias, nomeadamente na área económica, entre os estados e entre cidadãos e empresas de Timor-Leste, da Austrália, da Indonésia, de Portugal e de outros países, construindo assim, uma teia de colaborações efectivas e de relações de confiança que a todos beneficiasse.

De facto a condição primeira para um estado ser viável é saber escolher o bloco ou grupo de interesses a que deve aderir, e aderir ao mesmo sem se deixar corromper.

A corrupção dos líderes por forças estranhas, estados ou empresas, desgraça completamente os respectivos países.

Mas as ilusões e o excesso de expectativas quanto à possibilidade de ser independente, embora menos corrosivas do que a corrupção, também têm um preço muito elevado.

Se, no plano interno de um país, a política é a arte do possível, no plano internacional essa asserção ainda é mais verdadeira e importante. Sobretudo para um pequeno país, como Timor-Leste, e principalmente quando se encontra num estado de tão grande vulnerabilidade.

O domínio dos mais fracos pelos mais fortes tem uma longuíssima tradição histórica, e ainda não deixou de ser prática corrente, no planeta. Podemos achá-lo desumano, injusto e não conforme ao direito internacional. Mas, por mais egoísta que possa parecer, o certo é que são muitas as justificações históricas e políticas desse comportamento, dominante na cena internacional.

Os conflitos de interesses entre as grandes potências são uma realidade muito marcante, e a luta, económica, política ou até militar, directa ou por interpostos estados ou grupos, tem sido, infelizmente, um dos principais instrumentos de “regulação” desses conflitos. Não é de um momento para o outro que se mudam comportamentos, pelo menos antes de uma catástrofe de enormes proporções obrigar a mudar alguma coisa.

Não é de estranhar, neste contexto de realidade, que os interesses vitais para a sobrevivência e continuidade dos poderes realmente estabelecidos, determine atitudes e intervenções que não se ajustam ao quadro idealizado pelo direito.

Já atrás falamos dos interesses geoestratégicos relacionados com a existência de passagens profundas entre os oceanos Índico e Pacífico, vitais para a segurança global, junto de Timor-Leste, e também sobre a competição energética entre a China e os Estados Unidos (e seus mais próximos aliados, como a Austrália) e os interesses sobre os recursos petrolíferos do Mar de Timor.

Ignorar esses interesses, é uma enorme imprudência. Opor-se-lhes, para além do possível, é loucura. Conviver com eles e tirar disso o partido possível, dentro do razoável, será a atitude mais inteligente. E isso negoceia-se, com firmeza e flexibilidade, com realismo e honestidade.

Apesar das muitas críticas que se podem fazer à Austrália e aos Estados Unidos, o certo é que a intervenção militar da INTERFET, liderada pela Austrália, e decidida pelas Nações Unidas graças à concordância do poder americano nesse sentido, em 1999, foi crucial para livrar o Povo timorense da completa catástrofe.

A actual operação Astute, também liderada, de facto, pela Austrália, apesar de corresponder também a interesses australianos, e não apenas a interesses timorenses, diminuiu os riscos de uma guerra civil em Timor-Leste, e poderá abrir caminho a um futuro de paz e democracia para o país, o que, para o Povo Timorense é vital.

Estas intervenções poderão ser consideradas de valor maior do que os cerca de 50% de petróleo e gás natural, legitimamente pertença de Timor-Leste, de que a Austrália se tem apropriado.

O importante é que delas não resulte um estado falhado, mas que contribuam para a estruturação de uma verdadeira democracia, para um rápido desenvolvimento, para a criação de um estado democrático, forte e estável em que o Povo Timorense viva em paz, segurança e liberdade.


6.2. A construção de um novo estado, a partir de uma situação de grande fragilidade, exige a participação de todos, de forma tão inclusiva quanto possível

A sociedade timorense, já muito traumatizada, aquando do referendo de autodeterminação, depois de 24 anos de ocupação e do “Setembro Negro” de 1999, está agora ainda mais traumatizada.

A incompetência e interesses internos, por um lado, a eficácia divisionista de interesses estrangeiros, por outro, conseguiram criar uma divisão, antes praticamente inexistente, e um conflito real muito grave, entre “lorosaes” e “loromonos”, fragilizando ainda mais a sociedade timorense.

A insegurança e o medo afectam, enormemente, a vida de grande parte da população, não só a que tem procurado refúgio em campos de acolhimento de deslocados internos, mas também de muitos outros, que viram as suas casas queimadas, que, em numerosos casos, ficaram literalmente sem nada, e que, para não serem espancados ou mortos, tiveram que abandonar os seus empregos e, por vezes os próprios cônjuges, agora identificados como pertencentes a grupos diferentes. Com isso toda a vida social e económica, e obviamente, também a vida política dos timorenses, foram fortemente afectadas.

Timor-Leste ficou perto da situação de um estado falhado, situação da qual a Austrália pode tirar partido, no imediato, mas que é extremamente lesiva dos interesses dos timorenses e, a longo prazo, se pode tornar preocupante para a própria Austrália e para a estabilidade da região.

Muitos timorenses ficaram reduzidos a uma situação de dependência, que está longe de ser a melhor para construir uma sociedade democrática, sadia e produtiva em que as pessoas se possam sentir realizadas.

Essa extrema fragilidade exige, agora, ainda mais do que antes, que o poder político seja o mais possível inclusivo e, sobretudo, que contribua para os timorenses readquirirem a confiança uns nos outros, em si próprios e no seu futuro, tornando-os participantes activos na construção do seu futuro pessoal, social e nacional, e beneficiários do seu esforço e contributo para o desenvolvimento da sua sociedade e do seu país.

Uma ampla reconciliação nacional é necessária, envolvendo os órgãos do estado, os partidos políticos, as igrejas e outras organizações religiosas, ONGs e outras entidades da sociedade civil.

Mas essa reconciliação nacional não poderá ter lugar sem, previamente, terem sido criadas condições de segurança e perspectivas políticas de desanuviamento, de franca e efectiva cooperação entre os principais líderes políticos e sociais, e de criação de um quadro institucional favorável à participação construtiva de todos, de forma inclusiva e tão abrangente quanto possível. A luta pelo poder pessoal ou do partido, qualquer que ele seja, tem que dar lugar àquilo a que Xanana Gusmão chamou, em 1999, “a outra metade do objectivo da independência”: “A Libertação do Povo”.

Quanto a nós esta exige, entre outras coisas, o seguinte:

a) A revisão da Constituição, de modo a conferir ao Presidente a possibilidade de interferir na vida política da Nação e demitir o Governo e o Parlamento Nacional, no caso de ocorrer uma grave crise, seja de segurança, social ou política;

b) A revisão da legislação sobre o financiamento dos partidos, prevendo que sejam financiados predominantemente pelo estado, com verbas dependentes do número de votos recebidos por cada um deles nas últimas eleições;

c) O lançamento de programas, projectos e obras de desenvolvimento que criem oportunidades de emprego e expectativas de que a independência abre caminhos à realização pessoal, familiar e social;

d) A realização de acções de formação em gestão (gestão de projectos, gestão de serviços e de empresas, gestão de pessoal, gestão de recursos, etc.);
e) A reestruturação do sistema educativo, de modo a que, a todos os níveis, forme cidadãos capacitados para o exercício profissional e para a transformação real das condições de vida em Timor-Leste;

f) A realização de acções de formação e de iniciativas com vista ao desenvolvimento do empreendorismo e à criação e funcionamento rentável e socialmente útil de empresas timorenses;

g) A promoção de cursos e acções de formação que permitam, o mais rapidamente possível, generalizar o uso das duas línguas oficiais de Timor-Leste, entre todas as camadas etárias da população, evitando que esse continue a ser um factor de segregação, nomeadamente de jovens que não falam o português;

h) O combate à corrupção, a todos os níveis.

Estes são alguns dos elementos de um programa de inclusão, contra a exclusão do Presidente, contra a exclusão dos partidos políticos, contra a exclusão da sociedade civil, nomeadamente da Igreja, contra a exclusão dos jovens, contra a exclusão dos desempregados, contra a exclusão dos que não falam ou não dominam as línguas oficiais de Timor-Leste.

Finalmente, dada a situação de mútua exclusão e conflito entre ‘‘lorosaes’’ e ‘‘loromonos’’, resultante da crise de 2006, é fundamental desenvolver, a todos os níveis, um vasto plano de reconciliação e mútua integração.


6.3. Os veteranos, a heróica história da resistência e as forças de defesa e segurança devem tornar-se pilares da construção da unidade nacional


6.3.1. Os veteranos merecem o reconhecimento da nação, e a história da sua heróica resistência deve ser registada e divulgada, como exemplo e factor de unidade nacional

Sem a coragem, a abnegada dedicação dos combatentes das FALINTIL, sem a sua total entrega à causa da libertação do seu Povo, a maior parte das vezes com a entrega da própria vida, Timor-Leste nunca teria visto o dia da sua autodeterminação, nem teria a sua independência reconhecida pela comunidade internacional.

Sem a coragem e determinada dedicação dos restantes membros da Resistência, muitos dos quais pagaram com a prisão e horríveis torturas, a sua entrega à Causa do seu Povo, a luta não teria tido sucesso.

Os Veteranos das FALINTIL e, mais geralmente, os veteranos da Resistência, em seu nome próprio e como representantes de todos os que deram a sua vida pela Pátria, merecem todo o reconhecimento e respeito da Nação Timorense, e mesmo da Comunidade Internacional, por cujos valores de liberdade e dignidade se bateram, em condições tão extremamente duras e difíceis.

Esse reconhecimento, respeito e admiração devem manifestar-se, de forma concreta, visível e eficaz.

Isso não passa, necessariamente, pela sua integração em forças armadas que carecem, agora, de um profissionalismo de tipo completamente diferente do do tempo da guerrilha.

Isso passará pela valorização e compensação da sua dedicação à Pátria, das suas vidas oferecidas pela dignidade e liberdade do seu Povo, proporcionando-lhes condições de habitação e de vida dignas, para o seu futuro.

Isso deverá incluir a valorização do património das suas memórias, das suas heróicas lutas e vitórias, das suas dores e fracassos, da sua enorme abnegação e tenacidade.

Isso deverá valorizar, também, o enorme papel que podem ainda desempenhar na construção ou reconstrução de locais e objectos com história e símbolos da heróica luta de libertação nacional, de verdadeiros marcos e referências da Pátria e da sua unidade que, com o seu sacrifício, tanto ajudaram a construir.

Isso deverá incluir, também, a criação de condições para facilitar e promover a sua inserção activa na sociedade pacífica, livre e democrática que se pretende que seja a de Timor-Leste.

Isso deverá passar, urgentemente, pela atribuição de condecorações aos veteranos e pela sua participação, em lugar de destaque, em cerimónias públicas nacionais em que a sua abnegação ao serviço da Pátria e do seu Povo sejam realçadas.

Isso passará pela criação ou valorização do arquivo e de um ou mais museus da Resistência, que perpetue a sua memória e sirva de exemplo e estímulo, às gerações futuras, para elas também se dedicarem ao serviço da sua Pátria e do bem comum.


6.3.2. A constituição de forças de defesa e de segurança é uma questão muito delicada, que exige enorme bom senso e profissionalismo

Depois da crise de 2006, é imperioso reanalisar as necessidades de defesa e de segurança de Timor-Leste, reequacionar a constituição de forças de polícia e, eventualmente, de defesa, verdadeiramente nacionais, sem interferências partidárias e altamente profissionais, que sejam factor de paz, de justiça, de liberdade, de democracia e de unidade nacional.

Ramos Horta, no decurso da crise de 2006, considerou a hipótese de as forças armadas terem, basicamente, duas componentes: uma unidade (companhia?) de engenharia militar e outra, de intervenção rápida.

A primeira poderia ter, em tempos de paz, um papel importante na construção ou reconstrução de estradas, pontes, sistemas de águas e de saneamento e outras infra-estruturas. Em caso de calamidade, inundações, terramotos, desmoronamentos de terras ou até incêndios, poderiam realizar operações de salvamento e construir ou montar, rapidamente, pontes e outras infra-estruturas para acudir a populações em dificuldades. Em caso de conflito, poderiam executar trabalhos de engenharia militar, propriamente ditos.

A segunda, componente, podendo intervir em qualquer ponto do território nacional, incluindo as fronteiras, em caso de perigo ou de atentado à segurança, poderia também participar (parte dela) em forças internacionais de paz, com o devido mandato das Nações Unidas. Esta componente, seria uma presença de Timor-Leste no mundo, como estado soberano bem inserido no concerto das nações e uma expressão da sua gratidão à ONU pela sua intervenção na defesa do direito à autodeterminação e da paz no país.

Uma questão que deverá ser novamente equacionada, é a constituição de uma marinha de guerra ou de uma polícia marítima dotada de meios de intervenção rápidos e eficientes.

As Forças de Defesa de Timor-Leste deveriam, segundo Ramos Horta, ter uma dimensão relativamente reduzida e ser altamente profissionalizadas. Teriam que ser, necessariamente, altamente disciplinadas, bem formadas e frequentemente treinadas, quer isoladamente, quer em exercícios com forças de outros países, nomeadamente da região.

Poderá e deverá ser equacionada a possibilidade de Timor-Leste deixar de ter forças militares, e ter apenas forças de polícia, para evitar conflitos e problemas como os vividos em 2006. No entanto, deverá ser considerado não só o papel militar propriamente dito que poderão desempenhar, na defesa e afirmação da soberania nacional, mas também o papel simbólico que podem representar, para um estado que existe porque os seus militares guerrilheiros resistiram durante vinte e quatro anos a uma poderosa ocupação militar, mantendo acesa a chama da esperança e criando o espaço necessário para uma solução política que conduzisse à efectiva e reconhecida independência nacional.

Seja qual for a opção que venha a ser escolhida, é fundamental que as forças de defesa e segurança sejam um factor de estabilidade, de segurança efectiva e de unidade nacional. A forma como os seus membros forem recrutadas e treinadas, a sua capacidade de ultrapassar as divisões entre “lorosaes” e “loromonos” ou quaisquer outras clivagens da sociedade timorense, será determinante do seu contributo para uma efectiva vivência do Povo Timorense em paz e segurança, condições fundamentais para que haja liberdade e democracia, e para uma verdadeira independência nacional.


7. TIMOR-LESTE PRECISA DE TER UM NOVO RECOMEÇO

A gravidade da crise de 2006 mostra que alguma coisa correu mal nestes primeiros anos de Timor-Leste como país independente.

Podem-se encontrar muitos responsáveis externos, e é verdade que alguns factores externos foram muito importantes, embora não tão determinantes como em 1975.

Mas, entre 1975 e 1999, o Povo Timorense foi capaz, embora com enormes dificuldades e a um preço extremamente elevado, de ter em conta essas condições exteriores extremamente adversas e aprender a adaptar-se o suficiente para as ir modificando até as reverter a seu favor.

É evidente que depois de tanto sofrimento e tanta luta, quando a autodeterminação e a liberdade finalmente chegaram, custava imaginar que fosse ainda preciso continuar a lutar contra condições adversas para a soberania e a liberdade se tornarem efectivas e estáveis.

Na sua sensibilidade de visionário, Xanana sabia que ia ser assim, e lembrou, em 1999, que:

“Todos deveríamos compreender que a Libertação da Pátria é apenas a metade do objectivo da independência.”

“Porque, depois da independência, a Libertação do Povo constitui a outra metade do objectivo da independência.”

Em 28 de Novembro de 2002, Xanana alertava:

“Muita gente ainda não sabe o quanto somos vulneráveis, depois da independência. Os Partidos políticos vivem a ilusão da independência, quando estamos, mais do que nunca, tão dependentes! Dependentes dos favores de outros, dependentes da grandeza e capacidade de outros, dependentes da nossa própria fraqueza... de sermos um país pobre, pequeno e inexperiente.”

(...)

“Repito: muita gente desconhece o quanto somos vulneráveis, depois de 20 de Maio. E se não corrigirmos as atitudes, se não corrigirmos as irresponsabilidades, mais vulneráveis nos tornaremos, em cada ano que passa.”

Aconteceu exactamente o que Xanana temia, em 2002, e que também já temia, em 1987 (quase 20 anos atrás), e que já nessa altura prometia combater, quando escrevia, das montanhas de Timor-Leste, ao seu povo:

"Nós viemos reconhecendo, ao longo destes anos, que o que move o povo de Timor-Leste à Luta não é fazer uma Revolução, nem em grandes nem pequenas proporções; o objectivo do Povo Maubere é libertar a Pátria da ocupação estrangeira para poder viver livre e independente. O Povo Maubere só aspira a liberdade, só aspira à sua independência como condição básica para exercer os seus direitos, para viver ele mesmo como ele é, como ele pensa e como ele age. Por isto tudo quanto disse:

“Eu declaro publicamente a minha total e convicta rejeição a teorias que promovam a supressão das liberdades democráticas em Timor-Leste!”

“Eu declaro publicamente que as FALINTIL ASWAIN não permitirão que se instaure em Timor-Leste um regime de esquerda que não só venha a provocar mutilações internas como desestabilize toda a área em que Timor-Leste está inserido.”

A vulnerabilidade de Timor-Leste tem que ser tida em conta nas suas relações com os outros países, nomeadamente com a Austrália, e pelos vistos, não o foi suficientemente, como atrás dissemos.

Num novo recomeço, e embora procurando ressalvar, ao máximo, os direitos actuais e não comprometer os futuros, na linha do que Mari Alkatiri fez, será necessário ter alguns cuidados mais para evitar interferências futuras tanto ou mais desestruturadoras do que as que Timor-Leste tem vindo a sofrer.

Mas a maior fragilidade é a que vem de dentro.

Ao isolar-se, no poder, a FRETILIN e a sua liderança, colocaram o estado e a nação numa situação de enorme fraqueza.

Já atrás falamos da maneira como o carismático líder histórico da Resistência, Xanana Gusmão, foi inibido, legalmente, de intervir na cena política, mediante uma Constituição que lhe retira quase todos os poderes.

Também já vimos como a lei dos partidos, ao não consagrar o seu financiamento pelo estado e ao permitir que empresas com fins lucrativos os financiem, é duplamente perversa e, na prática, leva a que praticamente só o partido no poder receba financiamentos legais, pelos piores motivos.

Essa lei é uma lei anti-democrática, que num novo e urgente recomeço terá que ser mudada, sob pena de as próximas eleições serem, objectivamente, antidemocráticas.

Também já referimos alguns esboços de marginalização da Igreja Católica, aos quais esta não terá reagido da melhor maneira, envolvendo-se, segundo alguns testemunhos credíveis, em acções pouco religiosas.

A forma como, à última hora, foram alteradas as regras de candidatura e de eleição dos líderes da FRETILIN, deixou sérias dúvidas sobre o seu empenhamento democrático. A escolha de um método de eleição por voto não secreto, isto é, por um processo antidemocrático de eleição, fez com que a liderança da FRETILIN perdesse a legitimidade democrática. Foi um desastre para o partido e para os seus líderes, foi um péssimo sinal e um mau precedente para a convivência democrática.

Com tudo isto a FRETILIN pode ganhar todas as eleições. Mas isola-se, perde o sentido da realidade, e arrisca-se a ser surpreendida, como em 2006, por novas crises, eventualmente ainda mais graves do que a actual. Não é assim que se promove uma sã convivência democrática, tão necessária ao desenvolvimento de uma sociedade livre e equilibrada.

A falta de democraticidade retira-lhe, e aos seus líderes, a possibilidade de contar com uma ampla solidariedade internacional, credível e influente, e isso fragiliza-os e fragiliza, ainda mais, o estado e a nação. Aliás, a desistência de muitos amigos, que antes foram militantes da solidariedade, resultante das divisões entre os líderes timorenses e da falta de clara e convincente democraticidade, está à vista.

É por tudo isto que Timor-Leste precisa de ter um novo recomeço.

Não que seja preciso começar tudo de novo, porque algumas coisas foram bem ou até excepcionalmente bem feitas. Falamos, atrás, de serviços bem estruturados e a funcionar bem. Poderíamos falar de alguns cursos, profissionais ou superiores com qualidade. Poderíamos falar de muita legislação e de grandes êxitos diplomáticos, como o de levar a Dili, para as cerimónias da independência, muitas das mais importantes figuras da política mundial e, sobretudo, regional, como a Presidente Megawati Sukarnoputri, da Indonésia e o Primeiro-Ministro australiano, além do Secretário-Geral das Nações Unidas, e tantos outros.

Não nos cansamos de pôr em relevo a excelente qualidade da legislação sobre o Fundo Petrolífero, e a excepcional seriedade com que os concursos e as restantes questões relacionadas com o petróleo foram, até à sua demissão, tratadas pelo então Primeiro-Ministro Mari Alkatiri. A ele se deve esse pilar fundamental em que se alicerça e se alicerçará o desenvolvimento de Timor-Leste para as actuais e futuras gerações.

Por isso, repetimos, não é preciso refazer tudo de novo. É preciso, isso sim, corrigir erros que foram feitos, erros que, mesmo os melhores, cometem.

Já no ponto anterior indicamos algumas das coisas que, em nossa opinião, deverão ser corrigidas neste novo recomeço, pelo que não as repetimos aqui.

Acrescentamos, apenas, a necessidade de ir preparando e chamando para funções de responsabilidade económica, política e social, gerações mais novas e menos marcadas pelos conflitos entre líderes que tiveram lugar no passado e que ainda hoje estão neles indelevelmente presentes.

Mas também isso deverá ser feito com sensatez e prudência. O paternalismo, a incompetência e a irresponsabilidade, fizeram parte da estratégia de domínio do ocupante. A corrupção e a violência foram a experiência diária de toda uma geração, desde o berço. É preciso ter isso em conta, para evitar desagradáveis surpresas.

Numa das suas múltiplas campanhas de solidariedade que o autor fez pelo mundo fora, foi-lhe dado conhecer, na Argentina, saída de uma ditadura sangrenta, a existência de uma escola para militantes e líderes de todos os partidos, onde a todos, por igual, era ministrada formação sobre princípios, organização, metodologias e práticas políticas, e onde militantes e líderes dos mais diversos partidos se encontravam frequentemente, e juntos debatiam os problemas do país e as possíveis (e diferenciadas) soluções que cada um propunha. Os próprios traumas de uma sanguinária ditadura e de uma guerra recente também eram aí abordados. Talvez se justifique ponderar se vale a pena criar uma escola do género em Timor-Leste.

Estimular o debate político, com respeito por todos, mas sem medos, é crucial. Mas isso exige condições de segurança e de liberdade, que neste momento não existem, e que importa restaurar.

Perdeu-se demasiado tempo sem promover um desenvolvimento suficiente para dar trabalho a muitos desempregados, alimentar a esperança e diminuir a enorme massa de pessoas sem emprego e sem perspectivas, facilmente utilizáveis e de facto usadas por interesses estranhos. É preciso recuperar o tempo perdido.

É preciso restabelecer a segurança e a esperança.

Dificilmente isso se conseguirá enquanto a liderança timorense estiver tão dividida. E será impossível de alcançar se não forem criadas condições de efectiva democraticidade.

Cada dia que passa, sem um amplo acordo e consenso, é um dia mais de crescente perda de soberania, de aprofundamento das divisões e de crescentes traumas. Esse acordo e consenso é, cada vez mais urgente, pois cada dia que passa sem ele, é mais um passo que Timor-Leste avança, rumo à situação de estado falhado, com todas as suas consequências.

Alguns dirão, com razão, que para isso é preciso respeitar as regras democráticas, e talvez acrescentem que o Presidente deveria ser o primeiro a dar o exemplo. Mas na Constituição de Timor-Leste não há um Presidente, mas apenas um figurante, e, para respeitar as regras democráticas é preciso que sejam democráticas as regras vigentes.

Por isso é tão importante e urgente rever a Constituição e a lei dos partidos políticos.

Timor-Leste teve, até agora, um líder carismático e visionário, que graças a isso e à sua especial sensibilidade e empatia com o seu Povo, conduziu a primeira metade da luta pela libertação da Pátria, e tenta, agora, conduzir a luta pela libertação do Povo.

É preciso que essa luta termine quanto antes, vitoriosa como a primeira.

Para isso, Timor-Leste deverá ter um efectivo Presidente, Xanana Gusmão ou outro, com poderes e com as regras correspondentes. Com poderes efectivos, que responsabilizem efectivamente o Presidente, sem, como agora acontece, deixar todo o peso das decisões e das responsabilidades no Governo e no Parlamento (ou na maioria) que o escolheu. Hoje, o Presidente, não tendo poderes, só tem o poder que lhe vem directamente do Povo, pela sua irmanação com ele. Não tendo poderes, também não tem os meios apropriados para intervir, atempada e formalmente, nem regras para o fazer, já que as regras a que a Constituição o sujeita, são, sobretudo, regras para o impedir de intervir.

Mas Timor-Leste não pode continuar indefinidamente a viver na guerrilha institucional permanente, sob pena de se destruir a si próprio. Por isso é necessário e urgente um novo recomeço, baseado num amplo consenso e esforço de unidade nacional.

O diálogo entre líderes políticos e sociais é imprescindível. Uma boa relação de confiança entre Timor-Leste e a Austrália (tal como entre Timor-Leste e a Indonésia), é também muito importante.

Portugal poderá, eventualmente, desempenhar algum papel nesse diálogo intra-timorense, e entre Timor-Leste e os seus mais próximos vizinhos: a Austrália e a Indonésia, se esta for a vontade dos seus líderes.

Mas o importante é que, mais uma vez, e perante uma situação tão difícil, sociedade civil, partidos e líderes se reencontrem e que a sua reconciliação, que vai mais longe e mais fundo do que a justiça, restaure as forças e a esperança para uma nova aurora de paz e liberdade.

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9. APOIOS E AGRADECIMENTOS

Este texto foi produzido no quadro do projecto financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, FCT, com a referência POCTI/CPO/44915/2000 - The Transition Process in East Timor: 1998-2005 aprovado no âmbito do Programa Operacional Ciência, Tecnologia e Inovação (POCTI) do Quadro Comunitário de Apoio III e comparticipado pelo Fundo Comunitário Europeu FEDER.

Além disso, contou com o apoio do IPAD, no quadro do protocolo entre o IASI e o IPAD assinado em 06 de Dezembro de 2004 com vista à preparação de um livro sobre a Influência do Contexto Internacional na História de Timor-Leste e da Indonésia, sob a direcção científica do Professor António Pinto Barbedo de Magalhães.

O autor está muito grato a estas instituições, bem como ao Dr. Helder Cabeçadas Dias, por ter feito o trabalho de procurar as fontes primárias de muitos dos documentos utilizados, e fazer a lista de referências bibliográficas.

O autor está, também, muito grato a algumas pessoas que, residindo em Timor-Leste, ou tendo lá estado recentemente, forneceram dados importantes para a elaboração deste texto de reflexão, cujos nomes não mencionamos, ou porque nos pediram que não o fizéssemos, ou por receio nosso de sermos injustos e esquecermos de mencionar algumas delas.

Porto, 12 de Setembro de 2006

António Pinto Barbedo de Magalhães
Presidente do IASI

Anónimo disse...

Tradução:
Asean rejeita pedido de GMA para reformas em Myanmar
Manila Standard Today
Por Joyce Pangco Pañares

Segunda-feira, Jan. 15, 2007

CEBU—A Associação das Nações do Sudeste Asiático apareceu dividida uma vez mais sobre a governação dos militares em Myanmar, mas a hospedeira da Cimeira, Presidente Gloria Macapagal Arroyo insistiu que a organização podia perder credibilidade se falhasse na acção sobre a violação dos direitos humanos nesse país.

“Concordámos na necessidade de preservar a credibilidade da Asean como organização regional efectiva ao demonstrar uma capacidade para gerir questões importantes no seio da região. A este respeito, apelámos à libertação dos que estão sob detenção [em Myanmar] e pelo diálogo efectivo com todas as partes envolvidas,” disse a Srª Arroyo.

Mas o apelo da Presidente Arroyo para uma declaração com palavras fortes para a adopção por Burma de um plano patrocinada pela Asean para a democracia e a libertação da líder da oposição e vencedora do Prémio Nobel da Paz Aung San Suu Kyi não se concretizou.

De acordo com uma fonte do Departamento dos Negócios Estrangeiros, os líderes presentes na 12ª Cimeira da Asean exprimiram aqui opiniões diferentes sobre a questão da continuação dos militares na governação em Myanmar.

“Não podiam de facto chegar a um consenso, assim as palavras da declaração da presidente tiveram que ser cuidadosamente escolhidas para reflectir o sentimento comum de haver uma necessidade de libertar os que estão detidos. Mas quanto ao que fazer em relação a isso, não houve nenhum consenso,” disse a fonte.

A Srª Arroyo usou somente o termo “encorajar”para espicaçar o responsável da junta de Myanmar, Gen. Soe Win, a “fazer mais progresso em direcção à reconciliação nacional.”

Dias antes da Cimeira, os USA tinham sofrido um veto duplo tanto da China como da Rússia depois de ter tentado a aprovação duma resolução da ONU criticando Myanmar perante o Conselho de Segurança da ONU.

China, um membro permanente do conselho, disse que os USA tinham ultrapassado os seus poderes ao tentar resolver os problemas dos direitos humanos de Burma perante o conselho.

“A situação em Myanmar não constitui uma ameaça à paz e segurança regional e internacional. Se o Conselho de Segurança aprovasse uma resolução sobre a questão Myanmar, isso excederia os poderes do conselho conforme estão delineados na Carta das Nações Unidas,” disse o porta-voz do Ministério dos Estrangeiros Chinês Liu Jianchao.

O Primeiro-Ministro da Malásia Abdullah Badawi repetiu a opinião da China numa entrevista separada aqui no Centro Internacional de Convenções de Cebu.

“Myanmar não é uma questão de segurança na região mas tivemos muitas discussões sobre Myanmar,” disse Abdullah. Recusou esclarecer sobre as trocas de opiniões dos 10 chefes de governo quem (é) discutiu a questão dos direitos humanos em Myanmar.

Mas o Presidente da Indonésia Susilo Bambang Yudhoyono, aparentemente embaraçado por o assunto quase ter ido à ONU, disse ao seu parceiro de Myanmar que a junta militar deve fazer a sua parte para restaurar a democracia em vez de se esconder por detrás da política de não-intervenção da Asean.

“Como é que os vamos ajudar se não fizerem progressos?” disse Yudhoyono.

O Primeiro-Ministro José Ramos Horta de Timor-Leste, o país que mais recentemente assinou o Tratado de Amizade da Asean, insistiu que Suu Kyi deve ser libertada imediatamente depois de passar mais de 15 anos em detenção.

“É uma questão de humanidade e de justiça. Aung San Suu Kyi não cometeu qualquer crime contra o seu país ou contra o seu povo. Pelo contrário. Por isso, é bastante injusto e não é inteligente que ela se mantenha na prisão,” disse Horta numa entrevista na televisão.

Washington já impôs restrições ao investimento e comércio com Myanmar, onde a junta no poder é acusada de violações massivas dos direitos humanos, supressão da dissidência política e recusa de implementar reformas democráticas.

O plano que está a ser empurrado pelos líderes da Asean inclui a libertação de Suu Kyi e a realização imediata de eleições onde o seu partido, a Liga Nacional para a Democracia seja autorizado a participar.

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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