sábado, agosto 19, 2006

Dos leitores

Tradução da Margarida.


"Em 28 de Abril havia centenas de polícias completamente operacionais em Dili. Como instituição, a PNTL estava intacta e operacional. Contudo, somente um pequeno número (de polícias) foi enviado para o edifício do governo sabendo-se bem que não seriam capazes de controlar as centenas de pessoas que lá se manifestavam."

Meu caro Ed, Paulo Martins, às ordens de "alguém", enviou deliberadamente para lá um número inadequado de polícias para controlar os manifestantes. A polícia também permitiu a muitos manifestantes levarem coktails molotof e outras armas. Este "alguém" quis "ensinar" uma “lição” a Marii Alkatiri. Uma “lição” cara que custou dúzias de vidas e pelo menos 150,000 deslocados.

A teoria de que a FRETILIN estava a planear lançar um golpe violento é um simples disparate. A FRETILIN tinha o controlo do Parlamento e o governo. A FRETILIN tinha acesso ao Fundo do Petróleo. E a próxima eleição estava a um ano de distância.

Em vez de usar violência, a FRETILIN podia usar os seus poderes para “comprar” votos na próxima eleição. Com o poder no Parlamento, a FRETILIN podia tirar quanto dinheiro fosse possível do Fundo do Petróleo para gastar no ano fiscal 2006/7, providenciando educação gratuita, refeições gratuitas, instalações, cuidados de saúde gratuitos, novas infra-estruturas (estradas, hospitais, escolas, etc.), aumentar os salários dos trabalhadores públicos, e outros. Isto não só levaria muitos serviços necessários ao eleitorado, mas também criaria milhares de empregos. Isto injectaria milhões de dólares na economia elevando a economia a níveis comparados com o período da UNTAET. Se reparou, estes tipos de despesas estão no orçamento do governo de Marii para 06/7 de qualquer modo. Marii prometeu crescer a economia de um nível negativo a 9% em somente um ano. Isto não é uma coincidência. Marii preparava o terreno para as eleições de 2007. Este tipo de estratégia ocorre em todos os países democráticos do ocidente. Esta é também a estratégia dos partidos políticos modernos: são máquinas eleitorais guiadas pelo mercado.

Por altura das eleições de 2007, estas políticas teriam estado implementadas criando um falso sentido de prosperidade e segurança entre o eleitorado. O eleitorado teria que agradecer à FRETILIN e a FRETILIN ganharia com certeza com uma muito maior maioria. O facto de o número de lugares no parlamento vir a ser reduzido de 88 para 55 ou 65 lugares, poria também mais pressão nos partidos mais pequenos, tornando a FRETILIN virtualmente sem desafio e Timor-Leste um Estado virtual de um partido, nos próximos cinco anos. Isto certamente pôs muitas elites Timorenses a estudar maneiras de se livrar da FRETILIN, mesmo através de meios violentos. E fizeram-no definitevamente. Assim começaram a tomar forma planos para dividir as F-FDTL, que se iniciou com um grupo de soldados das F-FDTL a queixarem-se de discriminação oeste /leste e a sua deserção; Xanana a dar-lhes o seu apoio tácito; a rejeição pelos peticionários de várias tentativas para resolver as suas queixas, mesmo readmitindo-os de volta às forças armadas, o protesto que acabou em violência, a deserção de Alfredo Reinado, o ataque contra soldados desarmados das F-FDTL por Reinado, o ataque ao quartel-general das F-FDTL em Tasitolu e depois em Dili, a deserção de Paulo Martins, a ruptura da PNTL, a distribuição das armas da PNTL, o assassinato de oficiais da polícia desarmados, o assassinato da família de Rogério Lobato, as acusações de que a liderança da FRETILIN é ilegítima, os fogos postos, pilhagens e assassinatos em Dili mesmo depois das forças internacionais terem chegado como um modo de pressionar o governo para sair e o parlamento demitido entregando então o poder total a Xanana, você nomeou-o.

O que devemos perguntar no fim é, a que preço?

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5 comentários:

Anónimo disse...

Parabéns á Margarida!

Anónimo disse...

“Meu caro Ed, Paulo Martins, às ordens de "alguém", enviou deliberadamente para lá um número inadequado de polícias para controlar os manifestantes. A polícia também permitiu a muitos manifestantes levarem coktails molotof e outras armas. Este "alguém" quis "ensinar" uma “lição” a Mari Alkatiri. Uma “lição” cara que custou dúzias de vidas e pelo menos 150,000 deslocados.” (trecho da tradução da margarida)



Exactamente o meu ponto!! Esse “alguem” foi o Rogerio Lobato de acordo com o plano para criar uma razão para chamar as tropas. Quanto a lição a ser ensinada, eu estava sob a impressão que foi de facto o Mari Alkatiri que pensou ensinar uma lição aos peticionários quando mandou as tropas contra eles. E para maior agravo da situação, ele fez isso em transgressão das leis vigentes. (tradução do tradutor)


” (Quanto) A teoria de que a FRETILIN estava a planear lançar um golpe violento é um simples disparate. A FRETILIN tinha o controlo do Parlamento e o governo. A FRETILIN tinha acesso ao Fundo do Petróleo. E a próxima eleição estava a um ano de distância.” (trecho da tradução da margarida)

(tradução do tradutor)

Mais uma vez, estas foram as questões importantes consideradas pela Fretilin que os levou a a traçar o plano para atrasar as eleições de 2007. Vejamos em mais pormenor.

Ainda que a Fretilin tinha o controlo do Parlamento e governo eles tinham menos de um ano de poder. A situação actual do país era tal onde as pessoas viviam em condições muito piores desde a retirada da missão da UNTAET. Houve um aumento da pobreza e uma taixa mais elevada de desemprego que criava grande frustração nas pessoas. Em geral, havia muito descontentamento público quanto às condições de vida no país.

As condições de vida teriam que ser substancialmente melhoradas para que as pessoas recuperassem a confiança no governo da Fretilin. Para lidar com isso, e como mencionou correctamente, o Mari aumentou significativamente o orçamento do estado de modo a proporcionar algumas melhorias bem visíveis que as pessoas podessem ver.

Havia no entanto um grande obstáculo para tal acrescido orçamento, e um que tem vindo a afligir Timor desde o momento em que Timor se tornou independente. Isto é, uma baixa capacidade de execução orçamental dos ministérios resultante de um nível inadequado de habilitações na administração e um altamente centralizado sistema de aprovisionamento. O governo e a economia em si tem vindo a ser debilitado nos últimos 4 anos por uma muito fraca capacidade de execução orçamental que tem resultado em muitos ministérios atingirem taxas de execucão orçamental inferiores a 50% com orçamentos de estado comparativamente mais pequenos para esses esses periodos.

Esta baixa capacidade seria muito mais perceptível com o orçamento muito maior que Mari estava a propor para o ano financeiro de 2006/07. Isto significa que o governo precisaria de mais tempo para implementar o orçamento por completo de modo a atingir os objectivos de proporcionar melhorias visíveis nas condições de vida, ganhando com isso a confiança do povo e impulsionar o nível de aprovação da Fretilin nas próximas eleições.

Como tal, algo tinha que ser feito para atrasar o calendário das eleições e o próprio Mari já avisava antes da crise ser possível o atraso da eleições visto que o pré-requisito das lei eleitoral e da comissão eleitoral não estavam feitas nem as preparações logísticas para as eleições estavam em curso.

No entanto, o atraso das eleições não podia ser feito à simples vontade do governo. Teria que haver fundamentos razoáveis para um tal adiamento e um ambiente de instabilidade iria criar uma atmosfera não conducente à eleições livres e justas e teriam que ser adiadas pelo tempo necessário até que as condições melhorassem. A presença de um grande volume de armas ilegais enquadra-se também muito bem num tal plano. E a presença de grupos de civís armados não identificados é um testemunho disso.

O que não fazia parte do plano foram os eventos que se desenrolaram após o incidente de 28 de Abril em Tacitolo. O governo não previu a reacção do Alfredo e dos outros majores do Exército que fez a situação sair for a do seu controlo. A afirmação infame de que o Alfredo tinha emboscado soldados das F-FDTL “desarmados” foi desde já desmascarado pela cobertura de David Oshea do incidente. Semelhantemente ao massacre de Santa Cruz em 1991, o governo de Alkatiri era desconhecedor do facto de um jornalista da SBS estar em posição de gravar a alegada “emboscada” do Alfredo aos soldados “desarmados” (das F-FDTL). O filme do tiroteio que se seguiu prova sem margem para dúvida que a afirmação do governo eram uma invenção, e não só os soldados das F-FDTL não estavam desarmados como causaram baixas ao grupo do Alfredo.

Outro desenvolvimento não planeado foi a desintegração da PNTL mas isso foi mais uma consequência não intencionada do incidente de 28 de Abril em Tacitolo. Visto que as F-FDTL tinham sido reduzidas aos soldados que eram predominantemente do ORIENTE como resultado do despedimento em massa dos soldados predominantemente do OCIDENTE (peticionários), o incidente de Tacitolo não foi um bom pressagio para a questão de “Lorosae-Loromonu”. Em verdade, ao mobilizar um exército “Oriental” contra ex-soldados “Ocidentais” deu uma nova vida à muito falada divisão “lorosae-loromonu”.

Se essa divisão ainda não tinha resultado num alto nível de hostilidade generalizada entre os dois grupos até à data, essa notada divisão ficou gravemente intensificada quando o Alkatiri decidiu fazer uso da letal força militar. A partir desse momento em diante essa divisão ganhou um novo ímpeto e espalhou-se de forma incontrolável como um cancro maligno pelos restantes postos das forças de segurança causando a deserção do Alfredo e os outros majores e a desintegração da PNTL ao longo das mesmas linhas divisórias de leste-oeste.

A desintegração da PNTL foi também efectuada por outras questões internas tais como as antigas divisões dos polícias “nacionalistas” contra os seus colegas que tinham trabalhado sob o regime indonésio, sendo o Superintendente um deles, e as rivalidades entre as F-FDTL e a PNTL que culminou no ataque fatal do exército ao QG da Polícia que resultou no assassinato a sangue frio de oficias da polícia desarmados.

Quanto à questão de “compra” de votos, não podia resultar tão bem numa eleição geral como na eleição de um congresso partidário. Primeiro, os números de pessoas envolvidas eram muito maiores e, segundo, não poderia haver um regulamento implementado para fazer que as pessoas votassem de braço no ar. Com um voto secreto, seria practicamente impossível à fretilin verificar que iriam obter na realidade o que tinham “comprado”.

Portanto, ainda que a forma como a crise se desenrolou não foi da maneira intencionada pelo governo, mas resultou de um plano accionado num papel de fundo para servir a tentativa da Fretilin em garantir para si mesma a vitória nas próximas eleições gerais.

Anónimo disse...

Anónimo das 1:20:48 AM: então o seu argumento agora é que a Fretilin queria afinal… atrasar as eleições! E por isso “armou” toda esta crise. E como exemplo até diz “o próprio Mari já avisava antes da crise ser possível o atraso da eleições visto que o pré-requisito das lei eleitoral e da comissão eleitoral não estavam feitas”. Azar o seu, mais uma vez. Então não sabe que as leis eleitorais aprovadas pelo Governo de Alkatiri estavam desde meados de Abril no Parlamento Nacional a aguardar que este agendasse a sua discussão e votação?

Anónimo disse...

Fico satisfeito por ver que mais alguém partilha da minha opnião, que já aqui deixei neste blogue há quase 1 mês, que tudo isto começou exactamente pela tentativa da liderança da FRETILIN em atrasar sine die as eleições legislativas de 2007.
E a minha fundamentação foi exactamente a mesma.

A Lei eleitoral estava no Parlamento a aguardar discussão e aprovação. Ainda por cima era uma Lei que visava a eliminação dos pequenos partidos da vida parlamentar de duas formas: reduzindo o número de deputados e fixando o patamar dos 5%.
Mas faltava a Lei que criaria a Comissão Nacional de Eleições, a sua regulamentação, a Lei do recenseamento eleitoral, o recenseamento em si, e a criação do STAPE ou equivalente.

E a 1 ano das eleições nada disto estava preparado para ser aprovado.

Com a maioria que detinha, a FRETILIN poderia ter aprovado tudo isto em três tempos. Não o fez porque não quis.

É mais do que evidente que a FRETILIN não tinha interesse em eleições em 2007. Eleições já? Cruzes, canhoto.

A FRETILIN só estava disposta a ir a votos, quando o hiper orçamento começasse a produzir resultados.

Para obviamente daí retirar dividendos.

E tal como disse o Anónimo das 1:20:48 AM, o cenário foi montado para criar instabilidade que atirasse as eleições lá para as calendas.

Mas o passo foi maior que a perna e saiu o tiro pela culatra. A situação descambou.

A manobra de usar as FDTL para impôr a "ordem" falhou. A manobra para depurar a PNTL falhou nos resultados.

A ideia de criar forças de segurança exclusivamente por fretilinistas falhou.
Não é uma manobra inédita na história, apenas é inédita neste séc. XXI. No fundo seria uma reedição da divisão e luta entre bolcheviques e mancheviques.

Os tempos são outros, o povo é outro e a história dificilmente se repete.

E saiu tudo ao contrário.

Uma campanha eleitoral verdadeiramente livre de coacções porque fiscalizada pela ONU, vai pela primeira vez permitir eleger um parlamento de onde saia governo legítimo e legitimado pelo voto popular para o efeito.

Saibam os partidos da oposição democrática aproveitar esta oportunidade de ouro para restabelecerem a verdadeira democracia e liberdade no nosso Timor sofrido.

E saibam esclarer o povo que agora não se trata de eleger o Presidente Xanana, mas de escolher quem os governe nos próximos 5 anos e não nos próximos 50 ou 100.

Se os partidos da oposição souberem cumprir a sua missão, a FRETILIN, como qualquer partido da mesma orientação em qualquer parte do mundo livre e democrático, ficará gradualmente reduzida à sua expressão nominal, tal como o PCP em Portugal.
Que existe e bem, representado no parlamento português, para lembrar a todos os portugueses a desgraça que teria sido o PREC ter continuado. Muito pior que o regime que o 25 de Abril derrubara em boa hora.

O paralelismo com Timor 32 anos depois mantém-se.

Timor acabou de ter o seu 25 de Novembro. O golpe totalitário foi derrotado e espera-se que a oposição democrática saiba assumir as suas responsabilidades com determinação para devolverem ao povo o controlo do seu destino.

Anónimo disse...

Anónimo das 8:07:11 PM
1 - Leia este texto do Diário Digital Lusa e verá que já em Janeiro deste ano a Ana Pessoa tinha ido a Portugal para tratar de assuntos relacionados com aspectos técnicos das eleições e já informava sobre a resposta da ONU aos pedidos que o Governo tinha feito portanto no ano anterior, isto é em 2005 (a dois anos antes das eleições).
http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=12&id_news=212309

2 - Leia a Constituição do seu país e verá que lá está estipulado: “ 2. O Parlamento Nacional é constituído por um mínimo de cinquenta e dois e um máximo de sessenta e cinco deputados”( Artigo 93.º
(Eleição e composição)
http://www.verbojuridico.net/legisl/comparado/timor_constituicao.html

3 - Leia este texto da RTP e verá que já em Abril o Governo de Alkatiri tinha aprovado uma proposta de lei eleitoral com o futuro Parlamento a ter 65 deputados, o máximo autorizado pela Constituição: http://www.africamente.com/africamente/art_aut.asp?autor=RTP&codigo_seccao=0

4 - Leia este texto da lusa de 2 de Julho (“Parlamento regressa ao trabalho com lei eleitoral no topo da agenda)
e verá que “a proposta que o Governo já tinha entregue, e que estava a aguardar agendamento, deixa de ter existência legal com a queda do governo”, isto é que se não fossem as manobras do Xanana e do Horta, as leis estavam mais que aprovadas!

http://timor-online.blogspot.com/2006_07_02_timor-online_archive.html

PS: que tal habituar-se a falar com objectividade dos factos?

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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