quarta-feira, maio 17, 2006

Enquanto que esperamos...

Mais um texto fantástico do Kona Ba Liu Liu:

O Teatro da Vida Há algum tempo atrás, Joaneto Didascálico, famoso actor e encenador teatral português, deslocou-se a Timor Leste.

A ideia era realizar uma série de "work-shops" sobre a intervenção demiúrgica do actor no espaço cénico pós-brechtiano, de modo a cativar o povo timorense para o teatro contemporâneo.

Os apoios vieram da Sociedade Portuguesa de Protecção aos Intelectuais de Esquerda e da Associação dos Amigos do Queijo de Nisa.Como timorense e membro honorário do "Uma Fukun", fui convidado para jantar com Joaneto Didascálico no City Café ( pagou ele! ).

Ao longo da conversa, consegui obter dele diferentes opiniões sobre o modo de representar um mesmo problema com actores ingleses, portugueses e timorenses.- Como sabe - afirmou ele -, o problema mais universal é o da infidelidade conjugal.

Agora imagine como é que os ingleses representariam semelhante peça:

George: Rebecca...

Rebecca: Diga, querido.

George: Há algum tempo que ando para lhe dizer uma coisa... ( na verdade, este é já o 5.º Acto e o gajo andou a peça toda a empatar tempo )

Rebecca: Não seja tão britânico... Diga logo!

George: Bem... eu... isto é... não sei se vai gostar.

Rebecca: Penso que já sei o que me vai dizer.

George: Então espero que não faça uma cena shakespeariana. Já me bastam as aulas que tive em Oxford.

Rebecca: Olhe que agora já é tarde.

George: Também acho... Gin?

Rebecca: Pode ser.

George: Obviamente que a culpa é toda minha.

Rebecca: Não se martirize mais, George.

George: Água tónica?

Rebecca: Pouca.

George: Conheci-a em Bagdad.

Rebecca: Espero que seja mais bonita do que a indiana de Calcutá...

George: Chama-se Soraia.

Rebecca: Soraia? Mas Soraia não era aquela que conheceu em Tombuktu?

George: Em Tombuktu era a Rosaly, lembra-se? Mas nada que se assemelhe às duas gémeas que conheci no Cairo.

Rebecca: Oh, George, como o império é vasto!

George: Sim, "Britannia rules the world!"


- Os portugueses, por outro lado, fariam a peça de maneira diferente:

Mercedes: Afonso...

Afonso: Diz, minha pescadinha de rabo na boca.

Mercedes:Tenho-te sido infiel...

Afonso: Cabra!

Mercedes:Vês, nunca passaste de um ordinário! A mamã é que tinha razão.

Afonso: Vagabunda!

Mercedes: Há quem não se queixe...

Afonso: Pois, imagino... É de Caicoli?

Mercedes: Sim, são! Como é que adivinhaste?

Afonso: Já tinha dado pela falta das cervejas no frigorífico.

Mercedes: Se me amasses de verdade, acho que compreenderias...

Afonso: Debochada!

Mercedes: O amor é uma coisa tão bonita!

Afonso: Pindérica!

Mercedes: A culpa foi daquele livro que me ofereceste, da Margarida Rebelo Pinto.

Afonso: Galdéria!

Mercedes: Tenho-o lido todas as noites.

Afonso: Vadia!

Mercedes: Ah, já me esquecia. Chegou hoje o dinheiro da herança do papá. Vamos jantar fora?

Afonso: Sim, minha pescadinha de rabo na boca.



- E finalmente os actores timorenses ( certamente influenciados pelas "work-shops" de Joaneto Didascálico ):

Bibá Ximenes: Gugu.

Gugu Ximenes: Hum.

Bibá: Queria dizer-lhe uma coisa. Tenho um amante.

Gugu: Já sei disso há um ano.

Bibá: Não é isso. Quero dizer que tenho um novo amante.

Gugu: Mas, então, o que acontecerá ao Fifi Sarmento?

Bibá: Não sei.

Gugu: Coitado. Hei-de convidá-lo para sócio da minha nova empresa petrolífera, no Suai.

Bibá: Acho que é uma obrigação sua. Afinal, você nunca foi muito amável para ele.

Gugu: Nunca mo apresentou.

Bibá: É verdade, tem razão! Tinha medo que soubesse...

Gugu: Tinha medo de quê? Não me estava a ver de catana em punho a cortar a cabeça de vocês os dois, pois não?

Bibá: Por acaso, estava.

Gugu: Não seja bárbara! Já viu a quantidade de sangue que se espalhava pela sala? Seria péssimo para os nossos tais de Lospalos.

Bibá: Ao menos podia mostrar uma pontinha de ciúme. Qualquer dia, atiro-me por aquela janela, só para lhe chamar a atenção.

Gugu: Não seja trágica! Estamos no 25.º andar. Já viu a queda que dava? Só iria complicar ainda mais o trânsito do suco.

Bibá: O Gugu não me liga nenhuma.

Gugu: Por favor, tive um dia difícil! A bolsa de valores de Bobonaro voltou a descer, comprei mais cinco petroleiros que estão parados em Baucau e tenho seis contas no B.N.U. dependentes da oscilação das taxas de juro da Reserva Federal Norte-Americana.

Bibá: O Gugu despreza-me...

Gugu: Ah, chegou o meu helicóptero particular. Vou ter que sair.

Bibá: Sim, sim, deixa-me outra vez sozinha para ir jogar com os seus amigos...

Gugu: Isso é impressão sua.

Bibá: Ai sim?... Então por é que leva o galo debaixo do braço?



Fielmente vosso,Tonho do Ramelau

Sem comentários:

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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