segunda-feira, fevereiro 12, 2007

“Timor regrediu dez a 15 anos com a crise de 2006”


Mário Carrascalão, o ex-governador de Timor entre 1982 e 1992, diz que a unidade nacional definhou e que Xanana foi marginalizado

Expresso, 09/02/07
Por: Pedro Rosa Mendes

A autobiografia política de Mário Carrascalão, recentemente lançada em Dili, tinha como título ‘O Ciclo do Fogo’. O ex-governador de Timor-Leste, entre 1982 e 1992, durante a ocupação Indonésia, chamou por fim à obra “Timor Antes do Futuro”. Fundador da UDT em 1974, líder do PSD na II República timorense, um presidenciável fazendo mira à chefia do governo em 2007, este engenheiro silvicultor, de 69 anos, fala da mesma forma como escreve: ‘factual’, frontal e brutal.

PRM – A saída do livro significa o fim de um ciclo em Timor?

MC – Eu pensava que o ciclo se tivesse fechado. Na introdução ao livro, falo do eterno retorno e do mito do fogo. Depois dos acontecimentos de 2006, vi que o fogo continua. O ciclo não se fechou. Voltámos à fase da repetitividade.

PRM – Por que escreveu uma lista de culpados pelas 200 mil mortes?

MC – Está lá o meu nome.

PRM –É o número 19, em 23, antes de Xanana Gusmão. Qual a ordem da lista?

MC – É difícil estabelecer uma ordem. De certeza que eu não estaria em número um, mas não sei qual é a minha posição. Fui o primeiro iniciador de um partido político em Timor, depois do 25 de Abril. Só isto já me atira culpas para cima. Depois, fui governador em Timor. Que prejuízos e vantagens decorreriam de uma atitude diferente?

PRM – Arrepende-se de algo?

MC – Enquanto governador, várias vezes admiti a hipótese de tomar uma posição em relação em relação à Indonésia do género daquela que de Gaulle tomou quando visitou o Canadá. “Vive le Québec Libré!”. Não estou arrependido, porque teria sido travada a minha acção em Timor. Pensei várias vezes, numa daquelas cerimónias públicas com milhares de pessoas a assistir, surgir com uma coisa do género. Mas reconsiderava. Instantaneamente.

PRM – Fala do massacre de 1975 ainda por investigar?

MC – Está por investigar porque é que quem administra o território é gente ligada aos massacres.

PRM – As valas estão por abrir?

MC – Estão.

PRM – Tem uma amargura em relação a Portugal. Os portugueses falharam ao povo timorense?

MC – O meu pai era português. Foi um homem que lutou contra a ditadura e veio aqui parar como preso político. A minha mulher é portuguesa. Os meus melhores amigos estão em Portugal. Parte do meu coração está lá. Quando vejo os portugueses actuarem de uma forma que desprestigia Portugal, sinto-me muito mal.

PRM – Você é candidato à Presidência da República?

MC – O nosso candidato seria Xanana Gusmão. Se ele não avançar, veremos se há outro candidato aceitável. O meu partido interessa-se sobretudo que eu venha a ser primeiro-ministro. Ao partido não interessa que eu seja um corta-fitas.

PRM – Se Xanana Gusmão apoiar José Ramos-Horta à Presidência o seu partido apoiaria também?

MC – Já apoiou! Mas quando Ramos-Horta depois de saber que ele é o candidato do Presidente Xanana, depois de saber da minha afirmação de que o PSD não poria obstáculos para ele avançar, vai declarar que o candidato dele é Taur Matan Ruak. Isso significa que não está à altura. Não tem confiança em si próprio. O Presidente da República candidata-se. Não há outra pessoa a candidatá-lo. Eu, se for a pessoa mais apropriada, candidato-me. Só vou apoiar outra pessoa se achar que eu não sou o mais apropriado.

PRM – Timor regrediu?

MC – A soberania está em regressão. Timor retrocedeu dez a 15 anos com a crise de 2006. Se persistirmos com as teimosias, não vamos ter força moral para conseguir uma posição condigna frente às disputas nas fronteiras marítimas com a Austrália e com os vizinhos indonésios.

PRM – Que aconteceu ao enorme capital moral ganho após a independência?

MC – Timor era um país que tinha conseguido unir o seu povo. O pai dessa unidade nacional é Xanana Gusmão. Só que esse homem foi praticamente marginalizado. A unidade começou a definhar.
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5 comentários:

  1. Todos nos sabemos que na democracia ninguem esta acima da lei. O governo de Suharto dizia que a Indonesia era um pais democratico e como tal ninguem esta acima da lei. Sera que esta a democracia que queremos ter em Timor-Leste?

    Cada cidadao Timorense tem o dever de saber se a lei nao e controlado por um individo ou grupo.

    O procurador geral devia dar mais tempo ao processo judicial contra Mari Alkatiri e nao feichar e abrir o processo.

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  2. 1.Quando Mário Carrascalão refere que está por investigar porque é que quem administra o território é gente ligada aos massacres de 1975, esclarece muito do que motivou o golpe de Abril/Maio de 2006. Então também é isso, ainda é isso. Ainda são as feridas da rivalidade UDT/FRETILIN de 1975!?! Já não chegou a tragédia que então se seguiu? Vinte e tal anos de brutal ocupação Indonésia, milhares de mortes e sofrimento? Não aprenderam nada?!!
    A vingança e o ajuste de contas não levam a lado nenhum. A FRETLIN em 2006 tinha a legitimidade de ter ganho as eleições.
    A história não parou em 1975. As novas gerações não vão perdoar aos líderes por mais sofrimento. Têm de se livrar dos fantasmas e das sombras do passado e pensar no futuro.

    2. Timor já não é, como diz Mário Carrascalão, apenas um território. É um país independente. E por isso Carrascalão erra quando refere que Timor Leste regrediu 10 a 15 anos. Timor Leste andou para trás mas não, não voltou ao tempo da ocupação Indonésia. Nem vai permitir que novos colonialismos subjuguem o país.A liberdade e a autodeterminação foram conseguidas à custa de muito sangue para agora poderem ser desbaratadas!

    3. Refere Mário Carrascalão que os membros do Governo "não sabem o que foi o sofrimento deste povo e tomam decisões administrativas que não levam em consideração o aspecto emocional que existe".
    Mário Carrascalão engana-se e faz demagogia. A FRETILIN sabe bem o que foi o sofrimento do povo. A FRETILIN não é só uma pessoa nem se reduz a dez pessoas, nem a 100 pessoas. A FREILIN tem muito apoio popular e de muitos que lutaram na resistência armanda, na frente clandestina e na frente diplomática. E todos deram o seu valioso contributo para a libertação do país. E todos podem continuar a dar o contributo para o desenvimento do país e para o fortalecimento da nação.

    4.Diz Mário Carrascalão que a FRETILIN não sabe governar sozinha. Precisa, entende-se da sua ajuda. O que propõe é uma coligação pré-eleitoral? Pós-eleitoral? Ou é ainda a ideia do governo de unidade nacional que leve ao poder também os partidos minoritários que perderam as eleições?
    Em democracia o jogo político faz-se com os partidos políticos. Os diferentes partidos políticos que agrupam/aglomeram as diferentes ideias e propostas para o país. Governos de unidade nacional servem para mascarar a democracia, distorcer a votade do povo, subverter os resultados eleitorias.
    Se a FRETLIN ganhar as eleições com maioria absoluta deve ser governo sozinha. Se for outro partido a ganhar deve governar só. E depois responder perante o povo pela concretização do que levar a cabo do seu programa de Governo. Quem perder as eleições deverá fazer oposição no parlamento e controlar e fiscalizar o Governo na assembleia.
    Outra solução que não seja a de que governa quem ganhar as eleições não é democrática. E não sendo democrática viola a Constituição.

    Viva a liberdade. Viva a tolerância. Viva a unidade nacional.
    Viva a FRETLIN.
    Timor Leste vencerá.

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  3. O engº Mário Carrascalão, meu antigo vizinho e membro de uma conhecidíssima e numerosa família, é um dos grandes valores de Timor-Leste. Quando foi governador indonésio de Timor, houve quem visse nisso algum colaboracionismo. Não acredito, porque sei que MC é homem de convicções inabaláveis e não vira a casaca como muitos. Eu tenho a certeza de que ele ajudou muito o povo timorense. Naquela altura, Mário Carrascalão foi o melhor possível que Timor poderia ter. Tem contra si o facto de estar do lado oposto da barricada em relação ao partido dominante, o que lamentavelmente impede que as suas qualidades sejam aproveitadas em prol do País, a não ser que haja um terremoto na próxima eleição legislativa.

    Também eu gostava que esses escassos valores de Timor pudessem estar todos do mesmo lado e trabalhar em conjunto, como foi durante a ocupação indonésia. Mas infelizmente temos que aceitar a realidade e essa diz-nos que o implacável sistema partidário divide inevitavelmente as pessoas. Paradigma desta minha afirmação e da utopia da "união nacional" são os irmãos Carrascalão (João e Mário) que seguiram caminhos divergentes, depois de terem começado juntos na UDT.

    No entanto, essas diferenças ideológicas não devem sobrepor-se às regras de sã convivência entre seres humanos, que são adversários mas não devem ser inimigos. A política às vezes cega as pessoas e isso acontece a gente de qualquer quadrante político.

    Portanto, a "união nacional" é uma utopia. Uma ideia bonita, mas utópica. Já Salazar sonhou com ela. Estaline também gostava da "União das Repúblicas Socialistas". Mas dificilmente os Homens estão de acordo em tudo; hão-de discordar, nem que seja na marca de cerveja preferida ou no clube do seu coração.

    Resta-nos trabalhar com o sistema político que temos e... andar para a frente. Felicidades, engº Mário Carrascalão.

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  4. Muito bem dito senhor H Correia! Concordo plenamente consigo!
    Ze Cinico

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  5. Camarada das 5:52AM de 13 de Fevereiro.
    Eu sou da FRETILIN e lutei pela independencia da minha Patria. Ao meu lado tombaram muitos que eram apenas nacionalistas; nao eram da FRETILIN ou de qualquer outro partido. Eram so nacionalistas. Rogo-lhe do fundo do meu coracao para que nos compreenda. Camarada nao deve ter estado aqui em Timor-Leste, por isso nao viu nada. So vem com teorias. Eh por causa de gente como o camarada eh que nos vamos perder as eleicoes. Temos esperancas que os da oposicao quando ganharem nao pensem como o camarada pensa. Nos temos que estar unidos. Por causa de gente como o camarada eh que agora nem arroz ha para comprarmos.
    Seja feliz camarada e deixe-nos ser felizes tambem.

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