Díli, 12 Abr (Lusa) - Eurico Guterres, o ex-comandante das milícias autonomistas em Timor-Leste em 1999, declarou que "os direitos não são apenas das vítimas", numa entrevista telefónica às agências Lusa e Inter Press Service.
"Por falar em direitos das vítimas, é uma responsabilidade do governo a forma de as ajudar. Os direitos não pertencem apenas àqueles que foram vítimas e morreram, mas também àqueles que ainda estão vivos", afirmou Eurico Guterres.
O ex-líder das milícias, libertado há uma semana da cadeia de Cipinang, em Jacarta, Indonésia, respondia a uma questão sobre as vítimas da violência pró-integracionista antes e depois do referendo pela independência, em 1999.
A violência sistemática, em que Eurico Guterres foi acusado de desempenhar um papel central, causou mais de um milhar de mortos e devastação generalizada no território.
Eurico Guterres, que sexta-feira regressou a Kupang, na parte ocidental da ilha de Timor, respondeu em língua indonésia a questões da Lusa e da Inter Press Service (com sede em Roma, Itália), num telefonema feito a partir de Díli pelo jornalista indonésio Setyo Budi, correspondente da IPS em Díli.
"Quando se trata de uma luta, é normal que isso exija também algum sacrifício e isso não aconteceu apenas em Timor-Leste, mas noutros países também", sublinhou Eurico Guterres, que foi recebido em apoteose em Kupang.
Eurico Guterres confirmou a intenção declarada à saída de Cipinang, de se candidatar à Câmara dos Representantes pelo PAN (Partido do Mandato Nacional), o movimento nacionalista e secular fundado por Amien Rais após a queda do Presidente Suharto, em 1998.
"Tenho muitos apoiantes, sobretudo entre timorenses que vivem em Timor Ocidental e se tornaram cidadãos indonésios, e também o apoio de indonésios", explicou Eurico Guterres na entrevista à Lusa e IPS.
Eurico Guterres atacou, entretanto, os que o acusaram "sem provas".
"Estou livre porque não há provas contra mim. Essa é a verdade. Portanto, os que argumentam em contrário, fazem apenas uma acusação que nunca foi provada no Supremo Tribunal" indonésio, insistiu Eurico Guterres.
"De qualquer forma, respeitei a opinião dos que me acusaram. Mas não é justo falarem apenas nos incidentes de 1999 e não falarem noutras violações de direitos humanos que ocorreram em 1959 e em 1975", salientou Eurico Guterres.
"Os direitos humanos são universais: não pertencem apenas àqueles que são pela autonomia mas também àqueles que são a favor da independência", acrescentou o ex-comandante da milícia Aitarak.
"Quando falo de futuro, falo de reconciliação. É o melhor que há a fazer, porque em 1959 houve muitos timorenses mortos pelos portugueses e em 1975 houve muitos timorenses mortos pela Fretilin em Aileu. Xanana (Gusmão, primeiro-ministro timorense) sabe disso. E, em 1999, porque foi isso que se passou", afirmou Eurico Guterres.
"Por isso precisamos de ver caso a caso na sua devida proporção. Depois apanharemos os criminosos. Não apenas os integracionistas, mas também aqueles que apoiaram a independência. Caso contrário, os ideais timorenses estarão longe de ser atingidos", disse Eurico Guterres na entrevista telefónica.
"Recolhamos, por esse motivo, os restos mortais num local e olhemos para eles como heróis de Timor-Leste e da Indonésia e demos as mãos para construir o futuro em conjunto", pediu Eurico Guterres.
"Se, no entanto, houver pessoas que não consigam aceitar isto, a reconciliação que está a ser construída pelos dois líderes de Timor-Leste e da Indonésia estará longe de se materializar", adiantou.
Eurico Guterres, principal rosto da campanha violenta contra os independentistas em Timor-Leste, afirma que após a sua libertação pelo Supremo Tribunal indonésio teria direito "a compensação, porque não existiam provas daquilo de que fui acusado".
"Esta decisão do Supremo Tribunal também me deu a oportunidade de reabilitar o meu nome, a minha dignidade e a minha perda durante dois anos na prisão", frisou Eurico Guterres, acusado, no ano 2000, de crimes contra a humanidade por um tribunal em Díli.
"Mas não vou exigir isso. Os meus amigos em Timor-Leste, por isso, se puderem, não devem turvar a situação. Olhemos para o futuro", insistiu o ex-comandante da Aitarak.
Sobre a Comissão da Verdade e Amizade (KPP), criada por Timor-Leste e a Indonésia para analisar os acontecimentos de 1999, Eurico Guterres considera que "ninguém deve ser influenciado" pelo relatório final, a ser publicado em breve.
"O que é importante é a boa-vontade dos timorenses em unir-se. Não devemos confiar noutros. Se, no final, a KPP recomendar a amnistia, essa é a opinião dos dois líderes" de Timor-Leste e da Indonésia, sublinhou Eurico Guterres na entrevista Lusa/IPS.
Com a libertação de Eurico Guterres, ficam em liberdade todos os 18 acusados pela violência antes, durante e após o referendo pela independência em Timor-Leste, em 1999.
PRM.
Lusa/fim
Sem comentários:
Enviar um comentário