quinta-feira, fevereiro 07, 2008

“ Reconhecimento e gratidão”

Jornal de Notícias, 01/02/08
Por: Manuel António Pina

Luiz Pacheco dizia, sobre a irrisão de tudo, que “daqui a 100 anos já ninguém se lembra”. Era um optimista.

Quais 100 anos! Nos tempos que correm, em meia dúzia de meses já ninguém se lembra de coisa nenhuma. Certos políticos fazem mesmo disso profissão, da falta de memória (além da falta de um incómodo apêndice que equipa alguns homens comuns, a coluna vertebral). Passados oito anos sobre a independência de Timor-Leste, agora que um é presidente e outro primeiro-ministro, já nem Ramos Horta nem Xanana Gusmão se lembram dos 200.000 timorenses massacrados às ordens de Suharto (quem?, quantos?, ah, sim?, perguntarão).

Por isso, Ramos Horta o benze, pedindo “que Deus, o todo misericordioso o tenha em sua graça”, enquanto Xanana põe gravata preta e vai ao funeral, de lágrima ao canto do olho, para o acompanhar à última morada “como expressão – segundo o seu porta-voz – de reconhecimento e gratidão do povo de Timor-Leste a Suharto por aquilo que fez de positivo no país durante os 24 anos de ocupação indonésia”.

Ninguém se admire se, um dia destes, Xanana mandar erguer uma estátua no Cemitério de Santa Cruz, e se Ramos Horta, após reclamar o Nobel da Paz para Durão Barroso, aparecer a pedir à Santa Sé a beatificação do ditador.

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