*** Pedro Rosa Mendes, da Agência Lusa ***
Díli, 27 Mai (Lusa) - Na lista de 94 nomes indultados pelo Presidente da República timorense estão os primeiros e únicos condenados em Timor-Leste por crimes contra a humanidade, incluindo os quatro protagonistas do “julgamento de Lospalos”.
Entre os nove ex-elementos de milícias integracionistas indultados por José Ramos-Horta no dia da independência, 20 de Maio, sobressai o de Joni Marques, acusado de alguns dos crimes mais cruéis cometidos antes e depois do referendo de 30 de Agosto de 1999.
Joni Marques, Gonçalo dos Santos, João da Costa “Lemorai” e Paulo da Costa, membros ou “associados” da milícia pró-indonésia Team Alfa (ou Tim Alfa), de Lospalos (leste), constituem, juntos, uma das cinco listas nominais do decreto presidencial número 53/2008.
Os quatro foram acusados de crimes contra a humanidade em Dezembro de 2000 pelo procurador internacional da Autoridade de Transição e foram os primeiros a ser julgados, a partir de Janeiro de 2001, pelo Tribunal Especial para Crimes Graves em Díli.
O “julgamento de Lospalos”, como ficou conhecido, foi um marco na história judicial do novo país, onde pela primeira vez se julgou e condenou responsáveis directos da campanha de violência que assolou o território em 1999.
Joni Marques, João da Costa e Paulo da Costa receberam penas cumulativas de prisão de 33 anos e quatro meses e Gonçalo dos Santos foi condenado a 23 anos.
Na lista de crimes de que foi acusado Joni Marques e os seus colegas de milícia conta-se a tortura e morte de Evaristo Lopes, um membro clandestino das Falintil, a 21 de Abril de 1999, em Lospalos; ataques, deportação e movimentação forçada de população de várias aldeias de Lautém entre 08 e 30 de Setembro.
O rol de crimes inclui ainda o rapto e assassínio do jovem Aleixo Oliveira a 11 de Setembro, o assassínio de Alfredo Araújo e Calixto Rodrigues, a 21 de Setembro, e o conhecido massacre de freiras, padres, um jornalista indonésio e outros passageiros, num total de oito ocupantes da mesma viatura, em Lautém, dia 25 do mesmo mês.
“Estes crimes foram parte da onda de violência generalizada, orquestrada e enquadrada pelas forças armadas indonésias (ABRI, renomeadas TNI em 1999) e pela polícia”, considerou o Tribunal Especial que julgou Joni Marques e companheiros.
“As milícias pró-autonomia eram organizadas e dirigidas por uma organização paramilitar de enquadramento, as Forças de Combate da Integração (PPI), que tinha o apoio das TNI e da administração”, pode também ler-se no primeiro auto de acusação.
No distrito de Lautém (com capital em Lospalos), as forças indonésias trabalharam em estreita cooperação com grupos armados como a Team Alfa, a BRTT (Barisan Rakyat Timor Timur) e a Pengamanan Swakarsa, grupos de “autodefesa” civil.
Joni Marques, detido em 31 de Outubro de 1999, foi comandante da milícia Team Alfa entre 1994 e 1996 e membro do Comando das Forças Especiais indonésio (KOPASSUS).
João da Costa “Lemorai” era membro da milícia. Paulo da Costa estava “associado” ao mesmo grupo, tal como Gonçalo dos Santos, segundo a acusação.
A Team Alfa, referida algumas vezes como Jati Merah Puti (que em bahasa significa “Autêntico Branco e Vermelho”, as cores da bandeira indonésia), foi criada em 1986 pelo capitão Luhut Panjaitan, do KOPASSUS, como força de recrutamento local contra a guerrilha das Falintil.
Segundo a acusação, “membros da Team Alfa eram armados, equipados e treinados pelo KOPASSUS, actuando em operações mistas” de grande violência contra a população timorense.
Joni Marques foi um dos participantes de uma reunião na base de Laruara, a 03 de Setembro, onde se analisou a violência ao longo do ano de 1999 e se definiu a campanha seguinte, de retaliação contra a vitória da independência.
Relatos do “julgamento de Lospalos” referem “a grande crueldade” e “desumanidade” dos crimes da Team Alfa, com detalhes chocantes do massacre das freiras e padres na estrada de Lautém para Baucau.
Nessa ocasião, a eliminação das vítimas foi feita a tiro, em alguns casos à catanada e à facada, e terminou com o linchamento de um jovem que o grupo de Joni Marques tinha atado a uma árvore antes da emboscada à viatura dos religiosos.
Joni Marques e os outros dois condenados a 33 anos de prisão receberam um primeiro indulto em 2004, do então chefe de Estado, Xanana Gusmão, actual primeiro-ministro. A pena ficou reduzida a 25 anos.
Com a redução da pena para metade (doze anos e seis meses) por José Ramos-Horta, todos os quatro nomes constantes do Anexo III do decreto presidencial estão em condições de pedir a liberdade condicional. A cumprir pena há quase nove anos, Joni Marques e o seu grupo já ultrapassaram a barreira legal de meio da pena cumprida, que é de seis anos e três meses.
Beneficiam também de indulto presidencial, com redução de dois anos na pena, outros ex-membros de milícias integracionistas: Mateus Punef, Sixto Barros, César Mendonça e Januário da Costa. Um outro ex-milícia, Mateus Lao “Ena Poto”, é abrangido pelo indulto presidencial com a mesma redução, mas na lista do Anexo II do decreto.
Lusa/fim
Sou o sobrinho
ResponderEliminardo Liurai Verissimo Dias
Quintas assasinado
pelo Team Alfa
o 28 agosto 1999.
E' uma vergonha.
Em TL hoje
mataram a justica!
Mais nada.
David Dias Quintas Corona
Que "linda" maneira de homenagear as vítimas - abrindo o caminho à liberdade a seus carrascos.
ResponderEliminarA dizer que perdoar significa a superioridade, não se aplica a este caso. Isto é um insulto às vítimas e à condição de ser humana.
Alguém cujo comportamento até em muito é inferior abaixo do comportamento do mundo animal não merece indulto, aministia, ou qualquer perdão. A sociedade humana reservou a tais casos o afastamento da própria sociedade através do seu confinamento às prisões ou hospícios, quando tal se comprove justificado.
Uma vez que na política nada é cortesia ou generosodade mas todos os actos vistos como políticos, é difícil de compreender o indulto presidencial de criminosos mais cruéis. Caso se trate de uma estratégia de aproximação de Timor à Indonésia e demonstração que o perdão foi concedido, não me parece ser uma boa estratégia. Há outras formas de conseguir aproximação e cooperação, mais do que necessárias dada a situação geográfica de Timor-Leste. Contudo, uma coisa é perdoar, e mesmo assim em certos limites, e outra é esquecer, neste caso todas as vítimas de crimes graves, dos abusos e outras tentativas contra a dignidade humana.
A cooperação com os seus vizinhos deve ser de igual para igual, e não é devido ao seu tamanho que Timor deve pôr se em bicos dos pés. Timor tem muitos recursos naturais, petróleo nomeadamente, tão cobiçados pelos seus vizinhos que o permitem não apenas exigir de ser tratado como igual mas também colocam numa certa posição da superioridade. O caminho que está a seguir é de auto-mutilação, auto-destruição e vitimização.
E não se pode esquecer de que quem matou uma vez cruelmente é capaz de matar as vezes que for preciso porque para tais a vida e a dignidade humanas, ou quaisquer outros valores não têm importância ou sentido algum.