domingo, julho 02, 2006

Transcrição completa da entrevista no Publico que não está online:

Figuras da Igreja e estrangeiros aliciaram os militares para um golpe de Estado em Timor-Leste

Público, 30/06/06, Entrevista de Adelino Gomes a Mari Alkatiri

Público: A opinião pública portuguesa tem-se mostrado de algum modo desiludida com o que se passa em Timor-Leste. Desistiram da independência?

Mari Alkatiri: Toda a gente apoiou os timorenses, realmente, mas tiveram algumas ilusões. Os timorenses são seres humanos como os outros. Saíram de uma guerra prolongada e dura, e esto exigia uma melhor perspectiva e sistematização. Viram-se as partes mais economicistas e políticas do problema, mas descuraram-se as questões social e cultural.

Público: Quis preservar os benefícios do petróleo para as gerações vindouras. Mas - criticam alguns - esqueceu-se de que os timorenses não vão chegar lá com a barriga vazia.

Mari Alkatiri: As pessoas esquecem-se de que o primeiro dólar dos 600 milhões que agora estão no Fundo do Petróleo entrou em Setembro do ano passado. Não se podia usar dinheiro sem o ter. Segundo ponto: para uma política de desenvolvimento avançar, tem que desenvolver a capacidade da administração pública e desconcentrá-la. A sociedade deve acompamhá-la. Ora, isto não se faz de um dia para o outro.

Público:Quem vá a Timor-Leste depara com a sensação, no homem comum, de que este não ganhou nada com a independência.

Mari Alkatiri: Naturalmente. Se conseguir dar-me o exemplo de um país que tenha chegado à independência e três ou quatro anos depois tenha conseguido resolver os seus problemas, reconheço o meu erro.

Público: Devia comparecer hoje diante de um procurador. Rejeita as acusações de que armou um grupo paramilitar, mas a verdade é que se encontrou com os responsáveis do grupo.

Mari Alkatiri: Pedi um adiamento. O meu advogado (português, cujo nome Alkatiri não revela) não chegou ainda. Quando me encontrei com eles, vinham como delegados ao Congresso da Fretilin. Pertenciam à organização de segurança, que todos os congressos têm.

Público: O antigo comandante da Polícia Nacional, Paulo Martins, diz que o informou, por carta, dessa distribuição de armas.

Mari Alkatiri: Paulo Martins anda a mentir descaradamente.

Público: O ex-ministro do Interior, Rogério Lobato, confirma que organizou esse grupo armado. Isso torna-o responsável.

Mari Alkatiri: Não li ainda o depoimento dele. Esse caso devia ser do conhecimento do primeiro-ministro, é verdade. Mas não me foi pedida opinião nenhuma. (Se tivesse sido) Teria dito que não.

Público: Foi traído por Lobato?

Mari Alkatiri: Prefiro não estar a enterrar mais ninguém. Deixemos que as conclusões sejam retiradas pelo tribunal.

Público: Lobato há muito que era objecto de acusações. Não acha que foi no mínimo imprudente nomeá-lo para funções daquelas?

Mari Alkatiri: Acredito na transformação das pessoas. Continuo convicto de que com a mudança as pessoas se transformam.

Público: Há quem pense que, de protector, passou, a partir de certa altura, a ficar refém dele.

Mari Alkatiri: Eu não sou refém de ninguém. E muito menos dos meus ministros. (O comandante do grupo) Railós apareceu como a gota de água que fez transbordar o copo. Foiaproveitado. Encontrou-se aí um argumento político. Doutra forma, ter-se-ia respeitado o princípio da presunção da inocência.

Público: John Martinkus (antigo correspondente australiano em Timor-Leste) acaba de escrever um artigo (NewsMatilda.com) em que o cita, dizendo que figuras de topo da Igreja e da oposição, acompanhadas por dois elementos estrangeiros, tentaram convencer o brigadeiro Matan Ruak e o tenente-coronel Falur a derrubar o Governo. Confirma?

Mari Alkatiri: Confirmo, mas não disse o nome dos oficiais contactados. E não disse se era o Governo A, B ou C. Mas disse “estrangeiros”, sim.

Público: Esta crise mostra um enorme fosso entre a geração da resistência e as gerações seguintes. Os senhores falharam a passagem do testemunho?

Mari Alkatiri: O espaço entre os veteranos e a geração actual não está devidamente ocupado. (Os líderes mais jovens) Estão aí. São os que viveram intensamente a ocupação (indonésia). Há jovens bastante determinados, embora um pouco perdidos. É preciso é que não haja mais conflitos destes.

Público: O Presidente chamou “ilegítima” à sua direcção. Vai convocar novo Congresso?

Mari Alkatiri: Se o Tribunal de Recursos confirmar essa ilegitimidade. Só ele tem competência constitucional para o fazer. O Presidente tomou uma posição política. Respeitamo-la. Mas num estado de direito democrático há órgãos próprios para tomar essas decisões.

Público: Se pudesse, que medidas tomava para ultrapassar esta crise?

Mari Alkatiri: Primeiro, formar o mais rapidamente possível um Governo constitucional. Depois, encontrar um mecanismo de consulta mais abrangente, para que todos participem no processo que leva até às eleições.

Público: Voltará a falar com o Presidente Xanana?

Mari Alkatiri: Por que não? Não sou um bom relações-públicas, mas nunca deixei de falar com as pessoas.


Não é essencial que o novo primeiro-ministro pertença à Fretilin

A comissão política da Fretilin decide hoje o nome que deverá sugerir a Xanana para a chefia do Governo. Mari Alkatiri acredita que o presidente não dissolverá o Parlamento.

Público: A Fretilin esperava 30 mil pessoas em Díli. As notícias que chegam aqui a Portugal falam em quatro mil. É bastante menos...

Mari Alkatiri: O correspondente da Lusa deve ser míope. Ou não sabe contar. Não são quatro mil nem são 30 mil, porque nãohavia viaturas que chegassem. São para cima de 15 mil.

Público: Os manifestantes pretendiam entregar um documento ao Presidente da República (PR) pedindo que este reconsidere a aceitação da sua demissão. Isso faz sentido?

Mari Alkatiri: Não vi ainda o documento. Espero que não façam isso.

Público: Já houve contacto do PR com a Fretilin? Que nome indicará para primeiro-ministro, se ele lhe pedir, nos termos constitucionais?

Mari Alkatiri: Até agora não houve nenhum contacto. Vamos ter uma reunião da comissão política nacional esta sexta-feira à tarde. Aí veremos qual a pessoa.

Público: Pode dar-nos o perfil mais adequado? Alguém entre aqueles que o Dr. Ramos-Horta já apontou?

Mari Alkatiri: Alguns, sim. Alguém que tenha um domínio dos dossiers, que tenha participado, nos últimos anos, nesta governação para saber o que é governar e (que tenha) com uma formação global, não muito específica.

Público: É essencial que pertença à Fretilin?

Mari Alkatiri: Não é essencial que seja. Mas terá que ser alguém da confiança da Fretilin, no mínimo.

Público: Se não chegar a acordo e o PR dissolver o Parlamento, o que é que a Fretilin fará?

Mari Alkatiri: Não creio que o PR avance nesse sentido. Ele tem dito que vai cumprir a Constituição. A dissolução aprofunda ainda mais esta crise que passa de política a humanitária e institucional. A dissolução significa que não teremos Orçamento, nem leis eleitorais, com todas as implicações para o futuro.

Público: Ele disse que gostava que houvesse eleições já em Novembro. Concorda?

Mari Alkatiri: Digo terminantemente que não há condições. Se conseguirmos realizá-las em Abril/Maio, o que espero, teremos muita sorte.

Público: Já falou nisso (numa entrevista publicada ontem na Visão). Em concreto o que se passou entre domingo à tarde e segunda-feira de manhã para que se convencesse mesmo a resignar?

Mari Alkatiri: A quase certeza de que, sem a minha demissão, o Parlamento será dissolvido ou o PR, inclusive, resignaria. Foi para evitar a crise institucional que isso provocaria, e o que acabei de me referir.

Público: O PR já o tinha dito antes.

Mari Alkatiri: Sim, Mas havia várias iniciativas em volta para que nada disso acontecesse. O mais importante, num Estado jovem como o nosso, é que se consiga preservar as instituições democráticas eleitas. Uma demissão do PM não implicaria novas eleições, mas a do PR sim. Ora, não há eleições sem leis eleitorais. A queda do Governo era um mal menor. Senti que, se não me demitisse, a história julgar-me-ia pelo aprofundamento da crise. Fiz consultas amplas, com o presidente do partido e com outros membros da comissão política e assumi essa responsabilidade. Para servir melhor o país e servir também melhor o partido.

Público: Foi uma derrota também pessoal, a sua resignação?

Mari Alkatiri: Não me importo com derrotas pessoais, desde que haja vitórias para o povo e para o Estado. Mas não me sinto derrotado: tenho a certeza de que a Fretilin vai ganhar as eleições em 2007.

4 comentários:

  1. VIVA SENHOR PRIMEIRO-MINISTRO estou consigo, o povo timorense eh que ganhou. O Senhor Primeiro Ministro e um LIDER RESPONSAVEL.

    Sejamos mais Unidos, para que os inimigos nao tenham espacos para trazer o seu veneno. Nao confio em nenhum deles, senao vejamos: Esta e para Portugal " o Ministro dos Neg. Estr. bateu-se bem forte e com justica na crise timorense, vibrei de alegria e com vivas a portugal e muito orgulho em portugal. Mas, o que estranhou-me foi o silencio do chefe do executivo portugues. Nao me adimirou nada quando ouvi e li sobre o afastamento por questoes pessoas do Dr. Freitas. Nao acretido, nunca acreteirei no seu afastamento por questoes de doenca. O seu afastamento foi pelas posicoes justas que foi tomando ao longo dos seus quinze meses como gorvenante. A crise timorense so fez o copo tranbordar. A comunidade internacional, gosta sempre de por o dedo onde nao e chamado, exigindo muita transparencia, liberdade de expressao e na imparcialidade. Onde esta a liberdade de expressao e a imparcialidade dos jornalistas Portugueses na crise timorense?

    Dizem sempre que os timorenses vendem-se por migalhas para fazer mal uns aos outros! Quanto eh que os jornalistas portugueses respectivamente correspondentes da Lusa e RTP receberam para serem parciais? Mais uma uma vez cai, Porque pensava e confiava que Portugal fosse bater pela legalidade, mas afinal eh igual aos outros esta feito com a Autralia.

    Meu Povo e Lideres timorenses, sejamos unidos por bem, para defender os maldosos do exterior, porque todos estao feitos com a Autralia para afundar Timor-Leste.

    Filha sofrida timorense.

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  2. Tem razão amiga timorense, compete aos timorenses lutarem pelo seu futuro e pela sua independência unindo-se à volta da Fretilin. Mas não estão sózinhos. Também há muitos portugueses de boa vontade que os ajudam, esclarecendo. E não só. Também muitos brasileiros, moçambicanos, angolanos, cubanos e até australianos. Em todo o lado há gente esclarecida para quem os interesses dos povos estão à frente dos interesses do big-business. Precisamos é de não nos acanharmos e de continuarmos a esclarecer e a apontar o dedo aos oportunismas e vende-pátrias por mais "heróis" ou "laureados" que tenham sido.

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  3. A fretilin so pode contemplar uma vitoria nas proximas eleicoes sem o Alkatiri. Ele devia mesmo era ir prestar declaracoes ao PGR em vez de tentar, agora, esconder-se atras da imunidade parlamentar. Quase me fez acreditar que ele proprio queria clarificar a situacao o "mais rapido possivel". Agora diz que os seus advogados nao estao em Dili e mesmo que goza de imunidade parlamentar. Enfim agora que nao e PM virou contorcionista. E muito triste ve-lo a agir dessa forma pouco digna de quem nada teme.

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  4. Anónimo das 12:16:31 AM: mas os seus advogados não estão mesmo em Dili, pois não? E agora quer ser mais papista que o Procurador-Geral? Veja lá. Não exagere.

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