sexta-feira, julho 21, 2006

Alkatiri passa a arguido no processso das armas

DN
21.07.2006
Armando Rafael

Mari Alkatiri foi ontem constituído arguido no processo sobre a alegada distribuição de armas a civis, tendo, por isso, ficado sujeito à menos gravosa das medidas de coacção previstas no direito penal timorense: o termo de identidade e residência. O que em termos práticos significa que o ex-primeiro-ministro vai continuar em liberdade, podendo até ausentar-se do país, desde que a intenção seja previamente comunicada às autoridades judiciárias.

Esta decisão foi tomada no final das duas horas de audição a que Mari Alkatiri foi ontem sujeito no âmbito de um processo desencadeado pelas denúncias do comandante Railós, nome de guerra de Vicente da Conceição, segundo as quais o ex-primeiro-ministro e o ex-ministro Rogério Lobato teriam distribuído armas a militantes da Fretilin, visando a eliminação selectiva de adversários políticos em Timor-Leste.

Estas acusações, veiculadas numa reportagem da televisão australiana, levariam o Presidente Xanana Gusmão a retirar, de imediato, a sua confiança a Mari Alkatiri e a exigir que o secretário-geral da Fretilin se demitisse do cargo de primeiro-ministro. Forçando, na altura, um braço de ferro que deixou o país à beira de uma guerra civil e que acabaria por ser travada pela saída de Alkatiri e a sua substituição por Ramos- -Horta. Mesmo que a maioria dos ministros, vice-ministros e secretários de Estado tivessem continuado.

Pelo meio, Rogério Lobato, que já foi ouvido por duas vezes, mantém- -se em prisão domiciliária, ainda que a medida tenha sido justificada por razões da sua segurança pessoal.

Rumores e suspeições

Uma medida de coacção superior à que foi agora imposta a Alkatitri, numa altura em que se desconhece a natureza do depoimento que o comandante Railós terá prestado neste processo.

O que permite alimentar os rumores de que continuam a circular na capital timorense, segundo os quais Vicente da Conceição poderá ter declarado no seu depoimento algo de substancialmente diferente daquilo que ele tem vindo a dizer publicamente. Explicando igualmente que este dossier continua a ter mais perguntas do que respostas. Nomeadamente as que se prendem com o número de armas que terão sido entregues ao suposto "esquadrão da morte" liderado por Railós. Nas declarações que prestou à reportagem do Four Corners, Vicente da Conceição falava em 30 armas. Mas, depois, só entregou 11, sem que ninguém o tivesse questionado sobre a diferença ou a origem de tais armas.

Perguntas que permanecem sem resposta, à semelhança do que sucedeu com a presença do ex-comandante da Polícia Nacional na cerimónia em que Vicente da Conceição devolveu essas armas, sem que nin- guém tivesse percebido porque é que Paulo Martins ali se encontrava.

Advogados portugueses

Seja como for, o facto é que, à saída da audição de Alkatiri, os seus advogados manifestaram um "optimismo prudente", tendo José António Barreiros e Arnaldo Matos sublinhado a "simplicidade e a dignidade" que rodearam o interrogatório.

"Timor-Leste", frisou José António Barreiros, "demonstrou que se pauta pelo critério da legalidade e que uma jovem nação só se credibiliza se seguir o Estado de Direito e da legalidade".

Uma mensagem repetida posteriormente por Arnaldo Matos, para quem a audição decorreu com total normalidade. "[Mari Alkatiri] respondeu a tudo o que lhe foi perguntado, rejeitando os factos que lhe são imputados. Respondeu a tudo e expressou o seu ponto de vista, segundo o qual não tem nenhuma responsabilidade, nem culpabilidade nesses actos."

Resta saber se Mari Alkatiri - que foi envolvido num processo que contempla a prática dos crimes de associação criminosa, posse ilegal de armas, conspiração e tentativa de revolução - vai continuar a ser interrogado e se chegará a ser acusado.

Razão pela qual se desconhece também se o ex-primeiro-ministro, que tem proclamado a sua inocência, acabará ou não por ser julgado ou, se pelo contrário, o Ministério Público acabará por deixar cair umas alegações que, até agora, nada revelaram de substancial.

4 comentários:

  1. George Speight, a disgraced Fijian businessman, launched a coup against Fiji's Labour-led government a few years ago. Speight used nationalist and ethnic rhethoric to justify his actions. The Labour government was headed by a Hindu-Fijian, Mahendra Chaudhry. Immediately after the coup, Speight was paraded by the Australian media as a hero. Today Speight is spending his time behind bars. Truth and justice prevailed in Fiji.

    In Timor-Leste, truth and justice must prevail and they will.

    No reconciliation without justice.

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  2. "Nas declarações que prestou à reportagem do Four Corners, Vicente da Conceição falava em 30 armas. Mas, depois, só entregou 11, sem que ninguém o tivesse questionado sobre a diferença ou a origem de tais armas."

    Este Armando Rafael ou e um jornalista de meia tijela ou um mentiroso-mor (ou talvez nao fale o ingles).

    No programa Four Corners a jornalista dizia que o grupo de Railos tinha 30 homens mas que apenas cerca de metade possuiam armas. Ela obteve uma lista das armas e os seus numeros de serie que supostamente estavam na posse do Railos que totalizavam 15 HK33. Nao se deve tambem esquecer que quatro armas foram capturadas pelas F-FDTL aquando do ataque ao quartel em tasitolo.

    Mas deste Sr. Rafael e do DN nao se espera nada que possa ser considerado jornalismo serio.

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  3. Jornalista sério é a do Four Corners quando diz que Railos só aparece com a denúncia pública naquele momento porque quer o derrube de Alkatiri.

    O que se pergunta é porque é que Railos conta um história a uma jornalista australiana e diz querer derrubar quem o contratou e a jornalista não faça qualquer comentário.

    E também se pode perguntar se Railos afirma que não concorda com a actuação de Rogério Lobato não foi de imediato dar conhecimento dos factos ao Presidente da República e apresentar queixa no Tribunal?

    Mas os jornalistas de qualidade não questionam só publicam histórias.

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  4. Transcrito do Diário de Notícias, por não estar on-line:

    Pelo sim, pelo não

    Armando Rafael, DN, 21/07/06

    A acusação é grave e merece ser investigada. Se alguém andou a distribuir armas numa situação de pré-guerra civil, deve ser punido. Em Timor-Leste ou noutro ponto qualquer do globo.

    A partir daqui começam as interrogações em que Timor-Leste parece ser fértil. A começar por uma que é essencial: serão os magistrados timorenses capazes de resistir à politização deste processo?

    O tempo o dirá. E, nessa altura, ficaremos a saber se as investigações seguiram o seu curso normal ou se elas foram artificialmente mantidas até às eleições previstas para Maio do próximo ano.

    O que talvez ajude a perceber as razões que levaram Alkatiri e recorrer a uma equipa de advogados de Portugal, Austrália, Indonésia, Moçambique, Macau, Malásia e Timor-Leste para se defender.

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